Skip to main content

Colunas

Arquivos

Des Cult: Terminando bem.

| Somir | | 18 comentários em Des Cult: Terminando bem.

descult-terminandobem

Já deu tempo de todo mundo com uma conexão de internet ver o final de Breaking Bad. Mesmo se você estivesse esperando sair uma daquelas versões com legendas em “brasileiro” gravadas sobre a imagem, num formato bisonho como rmvb e ainda sim baixando do emule, deu tempo. Mas só para garantir: Se ainda não viu a série ou só falta ver os episódios finais, este é um texto basicamente só com spoilers.

Assim como Sally, eu também fiquei puto com o final de Dexter. Tudo bem que é difícil agradar em final de série, mas tem uma diferença entre contar uma história com começo, meio e fim e contar uma história até não aguentar mais. Dexter apodreceu, Breaking Bad acabou. Acabou porque tinha que acabar, porque a história levou até esse ponto. Parece uma obviedade, mas méritos para Vince Gilligan e os roteiristas que souberam sair enquanto estavam ganhando.

Menos aqui no Brasil, mas o grande momento midiático de Breaking Bad foi justamente a segunda parte da temporada final. Seria fácil fácil dar uma esticada no roteiro para acomodar mais alguns milhões de lucro, mas no caso da história de Walter White, cada ação tem uma consequência. A história não podia mais voltar atrás após o final da primeira parte da temporada final. Quando Hank finalmente tem seu momento de iluminação no trono, todo mundo sabia que a coisa ia azedar, e rápido.

“Mas a história já estava pronta, não iam voltar atrás mesmo…”. Na verdade, não. Vince Gilligan (a cabeça por trás da série) já disse várias vezes fazia parte do processo criativo escrever cenas que colocariam todos os roteiristas contra a parede sem saber de antemão como a coisa se resolveria. Ao contrário do pessoal do LOST, a equipe de Breaking Bad nunca mentiu dizendo que sempre sabia como tudo ia terminar. Antes de escrever o último capítulo, ainda não sabiam nem se Walt ia realmente morrer em cena.

Tudo ficou muito aberto, teria sido fácil mesmo dar uma de espertos e esticarem mais uma ou duas temporadas. O canal que exibe renovaria num piscar de olhos: Breaking Bad teve recorde atrás de recorde de audiência nos últimos capítulos. Claro, haveria um custo terrível, como vimos em Dexter. Esticar uma série baseada em tensão e consequências leva a roteiros babacas e previsíveis.

Mas deixemos isso de lado. Vamos ao fim da série. Pra quem acompanhou a história desde o começo, foi o antepenúltimo episódio que realmente “pagou” o investimento de tempo e atenção até ali. Ozzymandias é provavelmente um dos melhores episódios não só de Breaking Bad como de séries em geral de todos os tempos. Hank morre, W-Wa-Waalter Jr. descobre o que pai faz, a polícia cai em cima dele de vez… Várias coisas que todo mundo meio que queria e não queria que acontecesse. E elas acontecem de forma visceral, pancada atrás de pancada durante os quase 50 minutos do episódio. Breaking Bad tem seu clímax no antepenúltimo episódio. Depois disso, tudo tem a ver com “closure”.

“Closure” é um termo da língua inglesa que até pode ser traduzido como encerramento, mas na verdade vai um pouco além. É fim, mas também é satisfação. É ver algo acabar para conseguir lidar com isso. Vi gente reclamando que os dois últimos episódios de Breaking Bad não foram tão “explosivos” quando Ozzymandias, e apesar de realmente não serem… isso não é um problema se você entender que uma história dessas tem que amarrar todas as pontas soltas antes de poder terminar.

E é até impressionante como conseguiram isso só com dois episódios. Não ficou aquela sensação de coito interrompido como em LOST (ainda não perdoei aquele final) ou mesmo de broxada retumbante como em Dexter. Breaking Bad acabou. Repito isso várias vezes porque foi um dos grandes méritos da série. Todo mundo que ainda fazia parte da história no final teve seu encerramento.

E olha que uma cena do capítulo final conseguiu pegar todo mundo de surpresa e ainda sim ser fidelíssima ao espírito da série: Quando Walt invade a casa de seus ex-sócios da Gray Matter, Gretchen e Elliot. Primeiro que tem todo aquele suspense dele andando pela casa sem os dois perceberem. Essas cenas “banais” que eles enchem de tensão são uma das marcas registradas de Breaking Bad. Planos brilhantes do Walter White também… Quando Saul avisa que não tem o menor jeito dele dar o dinheiro para a família, ele está certíssimo. Ninguém nem estava especulando essa saída de forçar o casal a repassar o dinheiro para a família dele como caridade. Nem precisava de um momento desses, mas eles entregaram para os fãs.

Além disso, fecha um dos maiores arcos da história: O de Walter deixar dinheiro para sua família depois de uma morte prematura. Nesse sentido não teve lição de moral barata alguma (ao contrário de Dexter, onde “Deus pune quem é malvado”). Walter bandido venceu. Com consequências terríveis e fodendo sua família no processo, mas ele venceu. Precisa ter coragem para escrever um final com essa parte.

E porra, a cena dele voltando para casa, apesar de algumas liberdades artísticas com a facilidade com a qual ele consegue, é de uma maturidade impressionante. Confesso que eu não fico maquinando demais enquanto assisto um filme ou série, mas quando Walter admite pela primeira vez que fez o que fez pelo seu ego inflado e para se sentir importante, eu realmente não estava esperando.

Skylar, a mulher que todos amamos odiar durante a série, reage como se estivessem tirando um caminhão das costas dela. Eu nem tinha me tocado até aquele momento que do ponto de vista dela, toda vez que Walter falava que fazia tudo pela família, jogava a culpa nas costas dela e dos filhos. Toda aquela merdalheira por causa deles? Boa parte da minha bronca com a personagem Skylar morreu ali. E bônus: Não tem beijinho, não tem “eu te amo”, tem só alívio das duas partes pela verdade vir à tona. Roteiro inteligente e atuações do caralho. Pra mim é a cena que fecha o arco mais importante de toda a história: A divisão entre Walter e Heisenberg. Eles sempre foram a mesma pessoa. E permitindo-me reclamar de novo, isso é algo que Dexter tentou fazer e cagou totalmente na execução.

Depois disso, sobra a última ponta solta: Os nazistas que ameaçaram sua família. Walter tem mais um momento McGuyver e parte para o duelo final, estilão velho-oeste dos bons tempos (de onde os roteiristas chupinharam muita coisa, admitindo com orgulho). É a cena mais explosiva, a mais divertida, mas a mais simples. Tensão, geringonça, mortes… Breaking Bad clássico. O que mais chama a atenção, pelo menos para mim, é a forma como Walter e Jesse se reencontram: Acaso. A história deles estava fechada desde o antepenúltimo capítulo. Isso é deixar o roteiro viver por conta própria ao invés de tentar forçar a barra para tudo se encaixar.

Os nazistas morrem, Todd acaba enforcado por Jesse, Lydia tem a morte mais satisfatória possível… Aliás, isso é um capítulo à parte. Já disse que não fico pensando muito enquanto vejo, então boiei quando deram o zoom na caneca de chá de camomila com leite de soja (já tem que morrer só por isso) dela. Foi ótimo ser surpreendido nessa hora. E como Lydia era a personagem mais paranoica de todas, nada melhor do que fazê-la pirar contemplando a própria e inevitável morte. E como o próprio Vince Gilligan disse, alguém tinha que morrer com aquela ricina. Não se mostra algo assim durante temporadas e temporadas sem nunca usá-la na prática.

E seguindo a tradição de “consequências” de seus atos, mesmo após salvar Jesse, o máximo que eles trocam é um discreto acenar de despedida. O que Walter fez tem consequências, e ele acabou lidando com todas. Nenhuma das despedidas foi feliz, nem do dinheiro, nem da família, nem do amigo/sócio. Todas as decisões pesaram. E sobre o Jesse: Ele estava sendo um babaca mulherzinha toda a temporada final, mas, puta que pariu, ele precisava escapar para dar algum equilíbrio no final. Ele ficou traumatizado e fodido da cabeça por uma vida toda por ficar ao lado de Walter, não que ele tenha sido inocente, mas flertou com o desastre e acabou pagando mais do que devia.

Ainda bem que os escritores fizeram Walt morrer em cena. Não tem “acabou” maior que a morte do protagonista. Não achei a escolha de música tão ruim quanto a maioria das pessoas, a série nunca fez questão de ser fina. Breguice e banalidade estavam na alma de Breaking Bad desde o começo. É o que acontece escondido por trás dessa alma prosaica que realmente dá o clima. Não é a música, é o Walt morrendo ali. Morrendo cercado pelo seu orgulho, não porque resolveram dar lição de moral, mas porque como ele mesmo disse para Skylar, essa foi a escolha dele.

Para quem não se tocou ainda, os roteiristas são FANÁTICOS por detalhes e easter eggs. Se você prestar atenção, vai ver que nem LOST tinha tanta coisa com significado extra em cada cena. Desde um elemento de cenário até um enquadramento de câmera, é impressionante como se conta muito da história sem diálogo algum. A cena final é basicamente idêntica à cena final de um dos melhores episódios da série: Crawling Space. Depois de ouvir de Skylar que todo seu dinheiro tinha ido para Ted (o cara com qual ela o traiu), e desesperado pelo dinheiro para fugir, Walt se entrega ao destino e começa a rir de forma maníaca. A câmera vai subindo, subindo… Na cena final, Walter se entrega com um sorriso. A câmera vai subindo, subindo…

Breaking Bad acabou. Que pena e que bom!

Bônus: Sabem por que Walt deixa o relógio em cima da cabine telefônica? Porque esqueceram de colocar o relógio naquela cena “futura” no começo da temporada. O próprio Vince confirma. A explicação da história é porque o relógio foi dado pelo Jesse e estava na hora de acabar essa relação de vez. Isso é respeito por que assiste, não só por acertar a cena, mas por admitir o que realmente aconteceu.

Para dizer que é espertão/espertona e anteviu tudo (deve ter sido meio chato, hein?), para dizer que também demorou a acreditar a série do “pai do Malcom” merecia ser vista, ou mesmo para perguntar se o Huell chegou a sair do quarto do motel: somir@desfavor.com

Comentários (18)

Deixe um comentário para Ge Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado.