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Desfavor Convidado: Umbanda

| Desfavor | | 9 comentários em Desfavor Convidado: Umbanda

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Desfavor Convidado é a coluna onde os impopulares ganham voz aqui na República Impopular. Se você quiser também ter seu texto publicado por aqui, basta enviar para desfavor@desfavor.com.
O Somir se reserva ao direito de implicar com os textos e não publicá-los. Sally promete interceder por vocês.

Série Jornalismo Literário: Umbanda.

Na faculdade aprendemos que verdadeiro jornalista é aquele que vai atrás da notícia, que busca o novo e que sempre tenta surpreender seus leitores. Alguns até conseguem fazer isso, mas esses são privilegiados e geralmente trabalham em redações onde a criatividade é levada em consideração. No jornalismo do dia a dia a verdade é que a notícia tem que sair de qualquer maneira, já que a periodicidade diária mata qualquer resquício de criatividade.

É por isso que os jornais ficam limitados e acabam recorrendo aos mesmos assuntos de acordo com sua importância ou conforme a época do ano. Isso é tecnicamente chamado de Agenda Setting e é considerado um dos maiores vilões da produção jornalística. A agenda determina o assunto do dia, como por exemplo no Natal, data que sempre esperamos reportagens comparando preços de brinquedos, de ONG’s que levaram presentes para comunidades carentes, de Papais Noéis irreverentes encontrados pela cidade, etc.

A agenda nasceu inocente, apenas para cobrir buracos e assim manter a periodicidade, mas foi um dos grandes motivos para o sensacionalismo midiático. Quando algum desastre acontece, a agenda entra em ação e pauta todos os meios de comunicação para divulgarem aquela notícia. Por isso não se enganem, quando vocês encontram reportagens similares em vários jornais, é porque a Agenda Setting está entrando em ação e por trás dela com certeza estará um jornalista infeliz e estressado por aquele trabalho enfadonho que qualquer estagiário faria.

A agenda também favoreceu o crescimento das assessorias de imprensa, que divulgam os produtos de suas empresas livremente como forma de notícia e assim influenciam nos gostos dos leitores. Permitiu também que políticos manipulassem a opinião popular ao seu favor ou contra seus inimigos (TV Globo manda lembranças). Por isso meus caros, sempre sejam críticos sobre qualquer tipo de mídia que acompanhem e não se deixem ser levados pelos interesses dos outros.

VI

A Umbanda é a primeira religião 100% brasileira e assim como o país, surgiu a partir da mistura de raças, credos e valores sociais. Vindo do interior da África, a crença nos Orixás é antiga e remete aos primórdios da existência humana na Terra (isso se levarmos em consideração que o homo sapiens surgiu na África, como afirmam alguns pesquisadores).

Quando os europeus chegaram ao Brasil e perceberam que os índios não iam se render à escravidão, eles resolveram buscar mão de obra escrava lá na África, onde essa prática já acontecia entre as tribos africanas. Porém, a escravidão africana era comum e muitas tribos cuidavam de seus escravos como se fizessem parte da família. A serventia do escravo era apenas para pagar alguma dívida para com o senhor e quando essa era paga, o escravo era liberto.

No início essas tribos vendiam os escravos para os portugueses na base da inocência, mas quando perceberam o lucro que isso dava, começaram a vender na maldade e as guerras tribais foram aumentando e esse é um dos motivos pra o continente negro viver na pindaíba até hoje.

Os europeus, espertos que eram, pegavam escravos de diversas tribos e os misturavam na senzala. Assim as rixas tribais continuavam em solo brasileiro, já que nem a mesma língua eles falavam. Porém, uma tribo se destacava das demais: a dos Mandingas. Os Mandingas eram muçulmanos e versados nas artes da escrita e da matemática. Por isso, muitos senhores os colocavam em posição de destaque, geralmente como capatazes que tinham a função de punir os outros escravos. Com o ódio e rancor dos outros escravos, a palavra mandinga virou sinônimo de coisa ruim, de coisa malévola.

Tirando os mandingas, as outras tribos se viravam como podiam para se entender e logo perceberam que, como estavam todos no mesmo barco, eles iam precisam encontrar algo em comum ou acabariam se matando. Aqui entra em prática o velho ditado: o inimigo do meu inimigo é meu amigo, então logo os escravos se uniram para lutar contra as imposições do homem branco. Essa união se deveu principalmente pela crença nos Orixás, algo que todas as tribos possuíam em comum, apenas com leves diferenças.

Dessa primeira união surgiu o Candomblé, cujo nome significa barracão (que era onde os negros se reuniam para realizar eventos diversos). Porém havia uma grande dificuldade para manter a regularidade dessas reuniões, já que o homem branco obrigava os negros a seguirem o catolicismo. Os negros flertaram com o desastre ao mascarar sua fé nos santos católicos, aos quais eles faziam referências aos Orixás africanos. Somente assim eles conseguiam enganar o homem branco, que achava que eles rezavam fervorosamente para Nossa Senhora quando, na verdade, eles oravam para Iemanjá.

A audácia chegou ao ponto deles pegarem esses santos e em seu interior colocarem pedras coloridas referentes ao Orixá daquela imagem. Quando o homem branco descobriu essa ideia, além de dar uma sova nos escravos, adotou a ideia para colocar ouro dentro das imagens e assim evitar o pagamento que a coroa portuguesa pedia. Assim nascia o santo do pau oco.

Muitas vezes as obrigações dos Orixás precisavam ser feitas na natureza selvagem e foi aí que entrou a mãozinha do índio nessa história. Senhores nativos das florestas, os índios simpatizavam com os negros, que um dia haviam sido senhores nativos nas florestas africanas. Eles também tinham em comum a crença no poder dos espíritos das florestas, além do ódio mútuo pelo homem branco. Por isso, quando os negros precisavam fazer suas obrigações na mata, o índio se prontificava para servir de guia.

A história passou, a escravidão acabou, os índios morreram a rodo por causa das doenças trazidas pelos estrangeiros e uma nova religião passou a ser a vedete dos brasileiros: o Espiritismo. Como o brasileiro é um povo sem identidade desde o início, ele precisou buscar na França o que se tornaria um verdadeiro vício entre os brancos: a consulta de espíritos na mesa branca.

As reuniões de mesa branca eram feitas secretamente e não se permitia a entrada de negros, índios ou qualquer tipo de gentalha. Você pode impedir a carne, mas impedir o espírito fica mais difícil já que diversas dessas sessões recebiam entidades que se identificavam como um Preto Velho ou um Caboclo. Essas entidades eram expulsas do trabalho e se teimassem em voltar, quem acabava expulso era o médium que as recebia.

Esse tipo de prática continuou até que surgiu um homem chamado Zélio de Moraes, que recebia como entidade o Caboclo das Sete Encruzilhadas. Juntos eles enfrentaram o preconceito e fundaram a primeira tenda umbandista na cidade de São Gonçalo no Rio de Janeiro. A essa tenda deram o nome de Nossa Senhora da Piedade, sendo que seu primeiro trabalho ocorreu no dia 16 de Novembro de 1908.

Porém, o dia 15 de Novembro é considerado como a data de origem da Umbanda, pois foi nesse dia que Zélio e seu caboclo anunciaram que no dia seguinte iriam se iniciar os trabalhos na tenda. A filosofia da nova religião seria que todas as pessoas e entidades seriam aceitas, independente de raça, cor, fé ou evolução espiritual. Ali a nota de ordem era praticar a caridade, trabalhar na cura da carne e da alma, além de auxiliar espíritos pouco evoluídos na busca pelo progresso.

O sucesso foi imediato e a Umbanda começou a se expandir para todo o Brasil e hoje ela possui mais adeptos que o judaismo, que é uma religião bem mais antiga.

Notas: Como puderam notar, o preconceito contra as religiões afro não é de hoje. Tanto que muito se fala em Macumba, mas macumba nada mais é que um instrumento musical parecido com o reco-reco. Já o fato da Umbanda ser mais popular que o judaísmo é meio óbvio: ela aceita qualquer um a qualquer momento, enquanto que o judaísmo é fechado e não tem muito interesse em converter fiéis fora das famílias judaicas (coisa que vem mudando atualmente).

Chester Chenson

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