Brazil brazileiro.

Semana Outros Carnavais: nesta semana vamos trazer uma nova luz sobre acontecimentos históricos brasileiros. Muitos deles sugerem que só podem ter sido decididos numa bebedeira de carnaval…

Pena Capital.

Eu me arrependo de ter falado mal do Rio de Janeiro, me arrependo mesmo. Encontro-me numa cabana precária no meio de absolutamente nada, cercado por lama ressecada e lagartos para onde quer que se olhe. O calor é igualmente infernal, mas não há mais nada para se fazer. Eu sei que fiz meu juramento e estou numa missão, mas é impressionante como combater o comunismo nessas terras é uma sucessão de problemas.

Quando você acha que os brasileiros já chegaram no seu limite, surpresa! Algo pior. Todo aquele trabalho com o Getúlio e o imbecil do Café Filho me perde a eleição! Ele já era presidente! Qual a dificuldade? Estou escrevendo este relato para pedir perdão: o plano de mover a capital brasileira para São Paulo falhou. Eles voltaram com aquela ideia ridícula de Vera Cruz… e agora vai se chamar Brasília. E é aqui que estou.

Mas, faço questão de contar o acontecido. Como já é sabido, estou integrado ao governo brasileiro há alguns anos, conseguindo a confiança do presidente Café Filho como emissário diplomático do governo americano. Depois do meu apoio no caso do “suicídio” de Getúlio Vargas (porco comunista!), acreditei-me invencível. Com o suporte do presidente e com toda a máquina estatal nas mãos, a reeleição parecia apenas uma formalidade. E depois de muito trabalho, já havia conseguido convencê-lo a mudar a capital do país para São Paulo, local que atendia aos desejos de interiorizar a sede dos poderes e ainda permitia que aplicássemos nossa ética de trabalho capitalista de forma consistente para esses selvagens. Evidente que no Rio de Janeiro nada seria feito, aquela cidade é um antro de drogados comunistas.

E ainda mais com o apoio da minha nova secretária enviada pelo consulado, Sally. Respondam-me algo: ela é uma espiã, não é? Eu tentei apertar seu traseiro e ela me respondeu com um tapa. Nenhuma secretária faz isso, só uma espiã, não é mesmo? Seja como for, ela se provou uma aliada essencial. Acabamos até descobrindo algumas histórias sobre antepassados ingleses nossos neste fim de mundo, acreditam?

Trouxemos especialistas em propaganda dos EUA, conseguimos uma gorda verba de apoio à candidatura de Café Filho, parecia tudo muito simples. Até que o maldito Juscelino começa a chamar a atenção dessa massa ignorante. Aparentemente a única coisa que conta no Brasil é o carisma, o povo mal sabe escrever o próprio nome, quanto mais comparar planos de governo. Sally e eu escrevemos um plano, que modéstia à parte, ganhava de longe do de Juscelino Kubitschek, mas, como esse prometia mundos e fundos na sua campanha, arrebatou os corações do povão. As pesquisas que fazíamos começavam a nos preocupar.

E então, decidimos usar o Brasil contra os brasileiros. Era carnaval, e bolei um plano infalível: destruir a imagem pública desse homem que ameaçava os nossos objetivos no país. Sally disfarçou-se de organizadora de um baile especial no Rio de Janeiro, e o fez tão bem que só reforçou minha desconfiança de sua vida dupla como agente. Utilizamos uma considerável parcela da nossa verba eleitoral para montar uma festa espetacular, e gastamos semanas e mais semanas convencendo Juscelino a participar. Ele mal podia desconfiar da minha participação, então Sally foi essencial ao tomar a frente da organização.

Não sei o que ela fez, mas funcionou: conseguimos atrair Juscelino para o baile. Com ele, uma corja de “artistas” e “pensadores” da sociedade local. Notório pé de valsa, não demorou muito para começar a se engraçar com as vedetes contratadas para animar a festa. O plano era fotografar um homem casado, como era, agarrando-se com uma das dançarinas, muito bem pagas para tornar a missão simples. Mas, o acaso aconteceu. Depois de muito beber, Juscelino, que deixara a mulher em Minas, começou a se aproximar de uma mulher que não estava na nossa folha de pagamento.

“Mulher”… me pareceu bem evidente que se tratava de um homem travestido, mas devo admitir, dançava extremamente bem. Caso vocês não saibam, durante o carnaval, é aceitável para os homens brasileiros vestirem-se de mulher. E não se acham degenerados por isso. Fascinante, não? De qualquer forma, era tão óbvia a impossibilidade de haver uma mulher compondo aquele casal que dançava alegremente pelo salão que não demorou muito para conhecidos de Juscelino retirarem-no dali. O que fez sob protestos.

E, não tínhamos a foto ainda. O problema é que o povo brasileiro poderia interpretar Juscelino e aquele… ser… dançando apenas uma galhofada carnavalesca. Segundo muitos que eu conheço, a resposta padrão é “quem nunca?”. Eu nunca, mas eu sou americano nascido e criado em São Francisco, terra de homem macho! Sally, sozinha no baile, teve que pensar rápido: com um exército de vedetes, chacoalhou o grupo que tentava tirar o presidenciável dali e sorrateiramente o acompanhou de volta até o centro do salão. O problema… o problema é que Juscelino era um homem teimoso.

E com seus amigos ocupados com a fina nata da vadiagem carioca, ele ficou livre para retomar o contato com sua… seu… seja lá o que fosse aquilo. Sally observou horrorizada enquanto os dois procuravam por um ambiente mais privativo, mas eventualmente perdeu o “casal” de vista. Acredito que tenha sido pedir demais de uma mulher. O que importa é que alguns minutos depois, Juscelino sai, branco como uma folha de papel, de um dos banheiros adjacentes ao salão. Sai do baile apressado, sem conversar com ninguém.

Mais tarde conseguimos falar com sua companhia. Era mesmo um homem, vindo do interior de São Paulo, de uma cidade que já tinha fama de enviar os seus travestidos para o Rio de Janeiro. Ele contou que depois de um agarrão mais… íntimo, Juscelino perguntou o que estava acontecendo. O rapaz contou que estava só brincando e que isso era comum na terra de onde viera.

Pois bem, nada mais que fizemos foi capaz de convencer Juscelino que São Paulo deveria ser sua nova casa. Na verdade, ele desengavetou um projeto que mandava a capital para um local muito distante daquele terra, que segundo ele, não era de Deus. Café Filho, com o carisma de uma toalha molhada, não foi páreo para o mineiro. Tentamos. Tentamos mesmo. Estamos nesse lugar perdido que chamar-se-á Brasília. Eu, indicado com honras para o planejamento da nova sede de nosso consulado. Tenho mais vários e vários anos para passar aqui, vendo essa cidade horrenda (já viram os projetos?) nascer diante dos meus olhos. Sally conseguiu se manter no Rio, mas ela que me aguarde, vai ser minha primeira indicação de funcionária indispensável para os interesses americanos em Brasília. Isso não acabou.

Mr. Sommir

Novos Quadros.

Conforme combinado, volto a me comunicar com vocês. Estamos em Brasília e o presidente de chama Jânio Quadros. Novamente, tudo o que tentamos dá errado nesse país imprevisível. É como tentar controlar um animal selvagem. Estávamos prestes a derrubar Juscelino, antes mesmo de tomar posse, mas um dos nossos funcionários esqueceu de subornar um dos marechais, que fez um levante e evitou que déssemos o golpe para retirar JK do poder. Tivemos que esperar mais cinco anos.

E, vejam só, ficamos amarrados com justamente esse marechal na campanha para a próxima eleição. Porque era ele ou o comunista do Jânio Quadros. Novamente sofremos com a falta de carisma de nosso candidato, ainda mais que o comunista usava o discurso de limpar a corrupção absurda do governo anterior (o que é a mais pura verdade). Nosso candidato foi humilhado nas urnas. Tive mais uma vez que lidar com um presidente desalinhado com nossos interesses.

Sally (que vocês ainda não me disseram se é uma espiã) voltou a trabalhar comigo logo depois da posse de Jânio. Ela insistiu em não ser mais secretária, perguntei se ela preferia ser cozinheira. Outro tapa. Tive que inventar um cargo para ela, não foi de todo ruim, acho muito bonitinho quando mulher acha que trabalha. Elas levam tão a sério, né? Não demorou muito depois da posse, já era carnaval. E conhecendo este país, era hora de tentar um novo plano, todos por aqui ficam vulneráveis a quem tem um cérebro nessa época do ano.

Como era o primeiro carnaval de verdade em Brasília, foi muito fácil armar a melhor festa da cidade. E por falta total de opções, Jânio resolveu nos visitar. Fechamos a embaixada, enchemos de bebidas e “distrações”, e decidimos que iríamos embebedar Jânio até ele confessar, em áudio, que era amigo de Che Guevara. O plano, novamente, começou muito bem. Mas, acabou indo bem demais… eu achei que seria interessante adicionar um pouco do tal de “lança-perfume” na equação, para acelerar ainda mais o processo.

Jânio ficou fã do lança-perfume, consumiu sem parar a noite toda. Tanto que depois de horas de tentativas frustradas de tirar alguma frase coerente de sua boca, desistimos. Mas, isso acabou funcionando no longo prazo. Jânio Quadros continuou usando depois do carnaval. Ficando cada vez mais incoerente nas suas ações. Até lançou uma lei proibindo a droga para disfarçar, mas nós que estávamos por perto percebíamos claramente o que acontecia.

Tanto que alguns meses depois resolveu condecorar aquele bandido comunista argentino! Jânio estava fora de controle. Não demorou muito tempo, teve a brilhante ideia de renunciar para que o povo brasileiro saísse as ruas para pedir sua volta. Um povo que não tinha a menor noção do que estava acontecendo, ainda mais nesse fim de mundo chamado Brasília. O povo continuou mais preocupado com seus carnavais, e assumiu seu vice. Outro comunista. Mas esse Jango parece ainda mais incompetente que seu predecessor. Vamos torcer. Eu estou vendo algo de muito bom – pelo menos para nós – no futuro desse país.

Mr. Sommir

Jango Jango

Atualização! Jango é realmente um completo imbecil. Depois de um carnaval sob a nossa supervisão, bebeu tanto com Che Guevara que escutou o comunista e acaba de nacionalizar refinarias e desapropriar terras! Estamos chegando lá! Estamos chegando lá!

Mr. Sommir

Duro Golpe

Agora eu tenho certeza que Sally é uma espiã, nunca que uma mulher normal seria tão inteligente. A situação do país está cada vez pior, mas o povo ainda não estava dando suporte para os militares, que já estão nos nossos bolsos. Ela teve a ideia de fazer um baile de carnaval secreto para… os bispos da Igreja Católica daqui! Eu confesso que duvidei que isso poderia dar certo, mas ela me arranja uma fazenda distante, monta um evento chamado “Retiro Espiritual dos Pequenos Milagres” e faz chegar ao ouvido de todas as lideranças católicas locais.

Fizemos um voto de silêncio sobre o que aconteceu naqueles três dias, mas o que importava é que tínhamos fotos e gravações que garantiam o apoio irrestrito da igreja na tentativa de golpe militar. O povo brasileiro, talvez pela culpa de tudo o que faz durante o carnaval, obedece cegamente seus padres e bispos. Não demorou quase nada para que começassem a aparecer marchas nas ruas pedindo a cabeça de Jango e o fim da ameaça comunista. Era isso! Nós vamos conseguir eliminar o comunismo de uma vez por todas do Brasil. Nunca mais que a esquerda estraga essa terra maldita, nunca mais!

E, por favor… eu posso voltar? Se eu passar por mais um carnaval, eu não sei o que faço.

Mr. Sommir

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Comments (7)

  • “E ainda mais com o apoio da minha nova secretária enviada pelo consulado, Sally. Respondam-me algo: ela é uma espiã, não é? Eu tentei apertar seu traseiro e ela me respondeu com um tapa. Nenhuma secretária faz isso, só uma espiã, não é mesmo?”
    HAHAHAHAHA ONDE JÁ SE VIU!? ESSAS MULHERES ATACANDO NÓS HOMENS DESDE O SÉCULO XX, POR ISSO QUE O BRASIL NÃO VAI PARA FRENTE!

  • Mr. Sommir, de fato, fazer de Brasília capital deste país foi o mais brega da história tupiniquim, coisa digna de BM… Uma cidade no meio da Selva, construída do nada – só pode ter sido para roubar com mais facilidade. E a parte do Juscelino com o traveco kkkkkkkkkkkk hilária! :P

    • “Nós precisamos de um projeto arquitetônico que pareça barato e desatualizado em uns… cinco ou seis anos. Vocês conseguem?”

  • D. Sir. V.S.ª

    Mr. Sommir e Sec. Sally,
    5 anos em 50 é o (sentimento) constante mesmo, quase um “mandamento zero”; por mais lamentável que seja e permaneça

  • Larissa Tropicalia

    Mr. Sommir,

    Você realmente sofre de tupiniquinismo agudo.
    Aceita cara… dá a mão pro Caetano e vai!! Caminhando e cantando e seguindo a cançao!!
    Liberte-se!! Faça um retiro na tribo Papacú!! ;)

    Tá muito preconceituoso, tá muito machista!!
    Secretária tem que deixar passar a mão na bunda?
    Mulher que pensa que trabalha?
    Que foi? o que que tá passando? porquié que tu tá nessa? xD

    Todos os seus planos dão errado cara!!
    Tá igual ao desenho do papaleguas!! hahahaha!

    *Tá tranquilo, tá favorável.

    • Ms. Larissa,

      Não é de se espantar que você ainda não tenha um marido, com esses modos. Ao invés de datilografar minhas mensagens e passar para seus superiores como uma boa garota, você responde? Esses seus arroubos feministas não se sustentarão, essa tal de “liberação” não vai durar, tenho certeza.

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