Parabéns, Hillary!

Acho até poético que eu esteja trocando o dia com a Sally hoje. Todo mundo esperando para ver o que uma mulher faria na situação, e um Zé Ruela aparece do nada no meio do caminho. Somir: é o que tem pra hoje. Mas chega de falar da gente, aliás, nem vamos tentar falar muito do Trump neste texto, agora é hora de parabenizar Hillary Freix… Clinton! Perder do Trump foi um feito histórico.

Hillary Rodham Clinton parecia ter um dos caminhos mais abertos da história para se tornar a primeira mulher presidente dos EUA. A confluência de fatores era incrível! Vamos pensar no básico: ela tinha um nome conhecido não só por ter sido primeira-corna, digo, dama… no governo do marido, também vinha de uma prestigiosa posição de Secretária de Estado do governo Obama, sem contar toda uma carreira sólida no setor público e privado. Tinha concorrido pela indicação com Obama na primeira tentativa dele e não foi peso morto ali. Tecnicamente ela era bem mais forte como nome do que o Obama em 2008, mas o carisma de Barack era quase impossível de parar.

Acontece. Ela teve que esperar dois mandatos de Obama para dar seu próximo tiro. E com o partido basicamente aceitando que estava na hora de tentar com ela, Hillary já era barbada como candidata do partido democrata bem antes da concorrência interna começar. Vamos lembrar disso por todo o texto: havia quase que um consenso no partido e em boa parte dos eleitores democratas que o terreno estava pronto e essa era a eleição da Hillary. Antes das primárias, era Hillary e o resto na disputa pela vaga de candidato do partido. As outras opções eram meio que piada.

Já voltaremos para as primárias dos democratas… vamos continuar montando o cenário indo para a dos republicanos: o partido estava fraturado, em frangalhos ideológicos por causa da forma como abriram as pernas para os reacionários religiosos mais malucos de lá. Os republicanos eram piada já, por colocarem seres como a Sarah Palin para disputar eleições presidenciais e outras gracinhas. Enquanto os democratas pareciam estar com a casa bem arrumada com uma administração que navegou o país por uma grande tormenta econômica e se manteve flutuando e um nome muito forte para a eleição vindoura.

E com o partido republicano tentando reencontrar alguma seriedade para retomar o respeito minguante da parcela mais intelectual da população, ainda meio perdidos por duas derrotas doloridas para Barack Obama, começam a surgir dezenas de proponentes à vaga para a disputa presidencial. Alguns mais razoáveis, outros menos, mas, na média dos republicanos, até que havia alguma luz no fim do túnel. Se conseguissem ser levados a sério de novo, teriam alguma chance.

E aí, Trump aparece. Ninguém levou a sério, nem o partido. Trump começa a ganhar força, mas todos ainda acham que é só questão de tempo até ele se destruir sozinho. Para os democratas, perfeito: nessa palhaçada toda que Trump fazia, os republicanos estavam implodindo e enfraquecendo quem quer que viesse disputar com Hillary. Ela, talvez até de forma compreensível naquele momento, vai fazendo sua campanha tranquilamente, como se sua vitória em Novembro do ano seguinte fosse uma inevitabilidade.

Só que aí começam os primeiros sinais de problema, dos dois lados das prévias: do lado republicano, Trump começa a demolir seus adversários um a um, e vai ficando cada vez mais perto da indicação. Não nego que seja razoável achar uma vantagem ter o Trump como adversário, mas já era hora de começar a se coçar, porque para alguém como ele estar ganhando tanta força, algo estava acontecendo no país. Do lado democrata, Hillary começa a suar com o crescimento de Bernie Sanders, um velhinho idealista que sabia falar exatamente o que os mais jovens estavam doidos pra ouvir: oferecia educação de graça dentre outras ideias que para os americanos são basicamente comunismo.

Hillary foi olhar para essa base eleitoral dando trela para alguém radicalmente mais de esquerda do que ela? Não! Hillary continuava agindo como se fosse inevitável. Sanders foi ganhando força e muitos começaram a acreditar que ele poderia ser o Trump inverso e ganhar a vaga surpreendendo a todos. O que não ficou muito longe de acontecer, Hillary teve os votos que precisava, mas o partido democrata estava rachado. Faltava carisma na figura de Clinton, faltava aproximação com a base mais jovem, faltava algum charme nela para conquistar o público.

Quando Bernie Sanders concedeu sua derrota e apoiou Hillary como candidata, muitos corações se quebraram na base dela. Não só esse povo estava morrendo de esperança de ter o “bom velhinho” como seu candidato, como viam em Hillary o exato oposto no contexto de idealismo e desejo de mudança. Ao cooptar Sanders, por incrível que pareça, Hillary ficou menos simpática ao público que já deveria ser dela: pareceu que ela destruiu o sonho de um senhorzinho que só queria dar escola de graça para todos os americanos. E é aí que essa coisa de “ser a vez dela” começa a voltar para mordê-la na bunda. Hillary acaba vista como alguém que ia fazer tudo para chegar onde queria. Uma política “puro sangue” sem medo de sujar as mãos para ser presidente.

Do outro lado, os republicanos ficaram com aquela batata quente e laranja nas mãos: Trump ganhara a indicação nos votos. Ele parecia um desastre pronto para acontecer se mantivesse seu estilo com força total na eleição. Hillary ia comê-lo vivo. Todo mundo achava isso, eu incluso. E no final das contas, Trump soube se controlar EXATAMENTE o suficiente para chegar vivo até o final da campanha. Porque Hillary destruiu Trump em 99% da campanha: muito mais inteligente, preparada, profissional… campanha mais bem organizada, com a bênção de basicamente toda a mídia americana.

Nos debates? Qualquer pessoa com um cérebro viu uma adulta treinada para o momento batendo num moleque que parecia inventar as coisas na hora. A história provavelmente vai mostrar as tiradas de Trump, mas quem acompanhou melhor viu que foi vergonhoso para ele. E na reta final de campanha ela tira da cartola um vídeo onde Trump diz que por ser rico pode pegar qualquer mulher pela buceta, quando quiser! Depois de ter dito DURANTE a campanha que os mexicanos eram estupradores e assassinos, de ter falado que ia impedir a entrada de muçulmanos no país, prometendo um projeto ridículo de um muro entre os EUA e o México que faria os mexicanos pagarem… Trump faz tudo o que podia para se implodir.

Mas, parabéns, Hillary! Parabéns por ter caído a máquina toda na mão. Celebridades de Hollywood faziam vídeos no Youtube dando apoio a ela e batendo feio em Trump, comediantes e analistas políticos destruíam a imagem dele dia após dia, nem mesmo o maior reduto conservador da mídia deles, a Fox News, estava particularmente interessada em ajudar o candidato republicano. Trump parecia tão tóxico que nem a fuckin’ Fox News teve coragem de abraça-lo. E nesse meio tempo, Hillary continua sorrindo e acenando como se estivesse disputando contra um imbecil sem chances, como se o mundo todo estivesse do seu lado com exceção de uma parcela de “deploráveis” como ela mesma definiu num discurso.

Hillary estava com o jogo ganho, mas foi arrogante de achar que podia se beneficiar da cultura da histeria para ofender aqueles que votariam em Trump, sem tentar conquistar nenhum deles. Você votaria numa candidata que te chama de racista e misógino (mesmo que veladamente) só porque você escolheu outro? Essa coisa de poder sentar a pata livremente no homem branco explodiu espetacularmente na cara dela. Sim, esse público já aprendeu a não chiar muito e escutar meio calado as ofensas que recebe, mas isso vai acumulando. A maior parte da população americana é branca, de classe média e baixa. E a concentração de votos nas mãos deles por causa do sistema eleitoral vigente é suficiente para, para quem já esqueceu, eleger e reeleger o Bush nem tão pouco tempo atrás!

A noção de inevitabilidade e a arrogância que contaminou seus defensores – anônimos ou famosos (praticamente todos os famosos diziam que votariam nela, era bom para a imagem) – fez todo mundo esquecer que essa pancadaria da indústria da ofensa estava enchendo o saco da maioria da população e que Trump, por mais imbecil que fosse, tinha dez vezes mais carisma que ela. Hillary conseguiu perder de Trump porque achou que podia ficar encastelada no seu “safe space” com a turma do politicamente correto, cuspindo impropérios pra cima da maioria dos votos de colégio eleitoral do país e ainda sair ilesa.

Parabéns MESMO, Hillary. Não era nem muito motivo de orgulho ser mais preparada que o Trump, não era mais do que a obrigação ser a candidata que tinha alguma noção do que fazer quando eleita se esse era seu adversário. Porque eu vejo inclusive isso: um orgulho infundado de ser menos idiota que Donald Trump! Oras, isso é o básico, o mínimo. Faltou todo o resto: faltou queimar essa base tóxica de crianças mimadas de redes sociais e tentar falar o americano médio, como Obama de alguma forma sabia falar. Sim, todas as eleições tendem a ser apertadas por lá, mas o tamanho da porrada que ela levou prova que ela conseguiu a proeza de ser mais rejeitada do que Trump!

Porque é isso que acontece com quem ignora a realidade. Se ela tinha a força da internet com suas vítimas profissionais, Trump tinha o lado B da internet lutando DE CORAÇÃO para elegê-lo também. E eu garanto: esse lado B tem dez vezes mais cérebro que as princesas (de ambos os sexos) que se ofendem nas redes sociais. Quando a equipe de Hillary se toca que a batalha da internet estava pendendo pro outro lado, age da forma mais escrota possível: começa a pagar gente para desestabilizar os locais da “recém-criada direita alternativa”. Mandaram ovelhas para o abate. Apoio real tem muito mais poder que o comprado.

Trump se diz bilionário, mas Hillary gastou muito mais. Os democratas tentaram ganhar essa no grito, com dinheiro, celebridades e a impressão que o povo americano médio tinha cérebro suficiente para perceber que ela, apesar de não ser flor que se cheirasse, pelo menos tinha um mínimo de capacidade de realizar o trabalho. Contaram com o ovo no cu da galinha, colheram titica. Como é que não perceberam que a maré estava virando? Como é que não focaram mais em reconquistar a base fraturada do partido, com as viúvas de Sanders (que meio que cagaram o jogo dela também) e com aqueles que apesar de não gostarem do Trump, só queriam não ser chamados de monstros por um bando de histéricos e histéricas do politicamente correto.

Carisma não se compra. Então que se mexesse para ganhar essa mesmo sem isso. Eu ainda acho uma cagada Trump ter vencido, mas admito que estou me divertindo com a turma do politicamente correto se descabelando nesse exato momento. Parabéns, Hillary, parabéns, histeria! Vocês viraram o pêndulo. E bem antes da hora… o que tinha de bom no discurso de vocês não foi assimilado. E quem vai discursar agora… bom, esse aí não vai falar nada com nada.

Azar? Não, incompetência. Perdeu do TRUMP! Caralho…

Para dizer que não aguenta mais essa colonização, para dizer que pelo menos vai se divertir com isso, ou mesmo para dizer que essa coisa de mulher mais bem preparada perdendo vaga é um clássico: somir@desfavor.com

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Comments (11)

  • “mas admito que estou me divertindo com a turma do politicamente correto se descabelando nesse exato momento.”
    Não consigo descrever o grau de diversão que isso ta me proporcionando!

  • O Trump parece um alienado, nunca foi politico e vive falando merda, mas apesar disso tudo nao parece ser uma pessoa violenta nem ruim. O Bush era fanatico por guerra. Trump nao vai fazer porra nenhuma, numa vibe nao fede nem cheira. Parece que as merdas que ele falou foram pra ostentar e criar polemoca. Acho que eu teria mais medo do Bush. Chupa Clinton Freixo!

  • Poxa, Somir…eu tava até com uma certa expectativa pra hoje, de ver o lado da Sally sobre tudo isso hahaha

    O texto dela vai ficar pra Desfavor da Semana?

  • Quando você mencionou a Hillary mandando seus soldadinhos virtuais para os redutos pró-Trump, me lembro da situação da mesa de política do 4chan. Até então o público lá apoiava o Trump quase que unanimemente, mas um belo dia começam a aparecer tópicos enaltecendo a Hillary ou decretando o fim da campanha do Trump por alguma coisa que ele disse ou fez.

    Foi até engraçado porque apesar do anonimato, a mesa de política tem um detalhe: cada pessoa postando num tópico tem um pequeno código numérico marcado no post. E os soldadinhos da Hillary não notaram isso, então acontecia de você entrar num tópico anti-Trump e ver uma pessoa postar alguma coisa e fazer mais uma meia dúzia de posts “concordando” com o que ela disse no começo. Os usuários comuns se divertiam bastante com isso.

    Uma hora eles perceberam esse detalhe e passaram a botar três ou quatro soldadinhos em cada tópico, e dessa vez fazendo “memes” como a do Trump, só que com o sapinho feliz usando o boné da Hillary. Só que lá, quando você posta uma imagem, meio que escondido atrás da imagem tem o nome da imagem que estava no computador de quem postou. E passando o mouse por cima das “memes” pró-Hillary, o que aparecia? Nomes como hillary-camp_001, 4chan_hillary044 e hill_meme_images. Pessoas diferentes postando as mesmas imagens com os mesmos nomes de arquivo.

    • Típico de quem ainda não entendeu as pessoas que entendem de internet. Ser “prafrentex” com a turma da rede social é uma coisa, tentar jogar o jogo dos super autistas no campo deles é pedir pra quebrar a cara.

      • MAV estadunidense também é errado desde a concepção (com trocadilho, como “ideia” de ser assim e como pessoa), pqp !

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