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EM Drive.

EM Drive.

| Somir | | 2 comentários em EM Drive.

Provavelmente você não viu, mas nerds (de verdade) do mundo todo tiveram sua atenção apontada para um relatório de uma divisão da NASA que testou e conseguiu resultados de um motor que fisicamente não deveria ser possível: o EM Drive. O relatório passou por revisão de outros cientistas e foi publicado oficialmente. Isso quer dizer que quebramos a física?

Não. Provavelmente não. Mas talvez você não clicasse no continue lendo se eu tivesse escrito antes, né? Vamos situar primeiro o que seria um EM Drive: proposto pela primeira vez em 1999 por um inventor inglês chamado Roger Shawyer, é um “motor” que em tese deveria gerar impulso sem o uso de combustível. O inglês não teve medo de prometer mundos e fundos com a ideia, e a internet acabou se empolgando, como de costume. As promessas eram grandiosas como carros voadores, energia praticamente infinita e até mesmo viagens para outras estrelas! Incrível… literalmente.

UM MOMENTO

Mas primeiro, vamos falar de momento. Não a medida de tempo, mas a definição física do produto da massa pela velocidade de um objeto. De uma forma bem simplificada, esse momento do qual falo é a medida da pancada que algo vai gerar quando bater em algum lugar. Imagine uma pedra e uma vidraça: uma pedra pequena apoiada sobre um vidro difcilmente vai quebrar alguma coisa, mas se você aplicar força nela e ela tiver velocidade o suficiente para atingir o vidro, aquela massa que sozinha não quebrava o vidro agora quebra. É importante falar de momento aqui porque é ele que costuma fazer as coisas se movimentarem. E, o EM Drive é uma espécie de motor.

EM significa Eletro Magnético, e segundo a proposta, usando uma característica “estranha” de partículas/ondas como a da luz, por exemplo, ele pode gerar impulso sem queimar nenhum combustível no processo. Foguetes, por exemplo, tem a maior parte do seu peso composto por combustível, num processo pouco eficiente de ter que gastar quase toda a energia para fazer o próprio combustível subir até o espaço.

O EM Drive em tese usa a ideia de que partículas/ondas como o fóton, apesar de não terem massa, tem momento. A luz, por incrível que pareça, exerce sim alguma força sobre o que atinge, embora seja negligível para quem tem basicamente qualquer massa. Não se esqueça de que a luz está te atingindo a todo momento na… na velocidade da luz! Essa velocidade é tão imensa que se o fóton tivesse uma grama que fosse, precisaria de mais energia que todo o universo tem para mantê-lo nessa velocidade.

Então, o “truque” seria usar o momento dessas ondas eletromagnéticas para empurrar algo para uma direção específica. Se você jogar luz dentro de uma caixa fechada, ela vai rebater em todas as paredes basicamente ao mesmo tempo, e se gerasse algum impulso dentro da caixa, seria para todos os lados ao mesmo tempo. O que no final das contas não resolveria nada. O sistema continuaria estático. Mas, o design do EM Drive parte do princípio que dá para burlar esse processo forçando as ondas a gerarem mais momento de um lado de um objeto que do outro.

BACANA, ENTÃO PROVA!

Depois das alegações incríveis do inventor britânico, algumas pessoas resolveram testar a ideia. Construíram a parafernalha até:

Como um dos lados é maior, em tese as ondas rebateriam mais rápido quando estivessem do outro lado, menor, gerando mais força ali do que no sentido oposto (usando o momento delas – todas na velocidade da luz, mas desequilibradas em distribuição para o lado menor). Um campo magnético posicionado estrategicamente garantiria a frequência ideal para que tudo funcionasse.

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Parece e não parece muito científico…

Pois bem, foram feitos alguns testes. Alguns não demonstraram nada, como era de se esperar pelas leis da física (não tem energia suficiente sendo colocada no sistema para gerar impulso, e não dá pra quebrar essa regra), mas, alguns geraram ALGUM impulso. E isso é de quebrar a cabeça de qualquer um interessado no tema. Ou o que sabemos sobre a física não está certo (o que é quase certeza, mas tem que ser provado), ou o experimento está fazendo alguma coisa errada. Evidente que sabemos qual a opinião mais razoável aqui, não? Na dúvida, duvide do experimento.

Até porque a força gerada pelo EM Drive só seria impressionante pela bagunça com as leis físicas, porque não empurraria muita coisa. Estava vendo uma comparação, e precisariam de alguns bilhões desses EM Drives funcionando ao mesmo tempo para levantar uma pessoa do chão por uma fração de segundo. Evidente também que é fácil rebater isso dizendo que não passa do protótipo do protótipo, mas com uma força tão minúscula sendo captada, é virtualmente impossível excluir quaisquer outros fatores. Até uma leve brisa teria mais força que o EM Drive.

Não é muito confiável. Mas aí entra o time EagleWorks da NASA. É uma equipe de engenheiros e estudiosos que fica caçando novas tecnologias e testando todo tipo de maluquice em nome do “vai que…”. Esse time tem toda a estrutura da NASA para brincar (e eu falo isso com carinho, acho importantíssimo que tenha gente fuçando supostas bobagens porque realmente… vai que…), fizeram seu próprio EM Drive dentro de uma câmara de vácuo. E detectaram impulso também. Minúsculo, mas estava lá.

Esse experimento foi publicado, vários outros cientistas fizeram uma análise dele e deram o ok para ele ser publicado. O que não significa de forma alguma que foi comprovado, apenas que uma parte da comunidade científica topou conversar sobre isso por no mínimo achar que o experimento foi feito de forma séria. Agora é caçar os problemas e fazer outros experimentos paralelos para ver se realmente tem algo de válido ali.

PARADO, MELIANTE!

Como eu até escrevi num comentário recente sobre o tema, eu torço muito para estarmos todos errados sobre a física e o EM Drive esfregar na nossa cara que dá para fazer tudo o que seu criador prometeu, mas… só torço. Não faz sentido esperar que seja algo além de um erro de medição ou mesmo um fator externo perfeitamente explicável criando o impulso registrado.

Tudo isso porque por mais que a ideia seja muito bacana, a verdade é que… é bom demais pra ser verdade. Como partículas/ondas como a luz não tem massa, elas conservam seu momento. Nada desacelera a luz, mesmo quando ela bate num espelho, ela só volta na direção oposta na mesma velocidade. Com um comprimento de onda curtíssimo ou longuíssimo, ainda sim é a mesma velocidade. E como vimos que velocidade é um elemento central do momento, percebem que se algo usa o momento de uma onda sem massa para gerar impulso, esse impulso seria basicamente infinito?

E continuaria se acumulando. Porque quando começa a mexer, o processo não deveria mais parar, as ondas continuariam a colocar seu momento na parede do EM Drive, e dado tempo suficiente, ele atingiria uma velocidade espetacular basicamente sem usar energia nenhuma! Isso é contra a lei. Se você cria um EM Drive para acelerar um objeto preso numa alavanca, cria um motor eterno que dá mais energia do que gasta! Nada funciona assim. Tudo é uma relação de gasto de energia: nossa produção é isso, transformar muita energia que não conseguimos usar em pouca energia que conseguimos.

Eu torço muito para o universo ser hackeado dessa forma, mas está meio na cara que não é assim que a banda toca. SE o impulso do EM Drive for real, com certeza tem algum outro problema que vai impedir a criação de máquinas mágicas como as propostas pelo inventor, mesmo que seja a realização de que por mais que tentemos, nunca vai existir um EM Drive forte o suficiente para empurrar para frente qualquer coisa prática.

Mas, a ideia mais realista aqui é que foi algum erro de leitura dos instrumentos ou outra coisa que não a ideia por trás do EM Drive. E já tem muito cientista correndo atrás de descobrir isso. Eu não me empolgaria. Mas, que foi uma ideia muito interessante, isso foi.

Para dizer que ciência é muito sem graça, para dizer que só quer ser acordado quando tiver o Warp Drive, ou mesmo para dizer que aquilo parece uma chaleira vitaminada: somir@desfavor.com

Comentários (2)

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