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Publiciotários: Design social.

| Somir | | 94 comentários em Publiciotários: Design social.

Não se assustem se parecer com um texto sobre moda, é e não é. É porque eu vou acabar falando sobre roupas e suas mensagens… e não é porque eu abomino moda e acho que os campos de concentração (e seus chuveiros) deveriam ser revividos apenas para abrigar quem trabalha na área. Mas não vamos perder tempo com meus pensamentos felizes: No texto de hoje eu falo sobre apresentação pessoal (básica) do ponto de vista publicitário.

Só que eu não sou a Sally para ir direto ao ponto, antes de qualquer coisa, é importante mencionar que consultores de moda e estilo estão para os astrólogos assim como os publicitários estão para os astrônomos. Sim, a profissão deles é mais antiga, sim, eles sabem dizer o que as pessoas acham que é certo, e sim, eles podem te dar um placebo que age quase como a coisa real nas situações ideais… Mas no final do dia, charlatão é charlatão: Você vai gastar mais do que precisa e ainda não vai entender porque as coisas aconteceram. Nunca terceirize seu bom-senso.

O mercado do marketing pessoal continua crescendo, com gente se especializando nas diversas formas com as quais interagimos com outros seres humanos. Existem sim truques e fórmulas resistentes ao tempo para ganhar pontos na sua apresentação, mas muito cuidado para não confundir ciência com “simpatia”. As coisas não funcionam por mágica, e sim porque o ser humano, como eu adoro dizer, é MUITO mais previsível do que gosta de admitir. Nossos cérebros captam e processam informações basicamente da mesma forma, e isso pode ser explorado de forma racional e consistente.

“Je ne sais quoi” é o caralho.

Somos seres visuais. Eu, você e todo o resto de nós que não somos cegos. O olho humano é tão cheio de recursos e possibilidades que é mais do que natural que boa parte de nossa comunicação ocorra através dele. Que visual e primeiras impressões são importantíssimas não é nenhuma novidade, mas o porquê disso e como esse processo ocorre raramente é discutido.

Normalmente quando as pessoas pensam em design, a noção de fazer algo parecer bonito é a primeira e talvez única definição que vem à mente. E mesmo com um fundo de verdade, essa noção está errada. Design é mais do que estética pela estética, é comunicação e funcionalidade. O conceito de “bonito” varia de acordo com quem está vendo, e não depende tanto assim de técnica refinada. Uma flor pode ser uma bela imagem no meio de uma paisagem verdejante, mas também pode ser brega e vergonhosa quando entregue por um daqueles serviços de mensagens amorosas…

Imagens são apenas partículas de luz captadas pelas nossas retinas, o que o cérebro faz com a imagem é que são elas. E é aí que entra a comunicação visual: Para “forçar” a imagem a ser bem interpretada. Cada um ensina de um jeito, mas por questões de praticidade, eu vou criar uma teoria momentânea e desmembrar o conceito de comunicação visual em três blocos: Contraste, signos (calma) e fluxo. E vou demonstrar como cada um deles tem a ver com a forma como nos apresentamos ao mundo. Lembrem-se, crianças: Quando o assunto é manipulação, não é o que você diz, é como você diz…

CONTRASTE

De uma certa forma, nossa visão é basicamente o contraste entre os diferentes níveis de luz no nosso campo de vista. Se você estranhou eu não ter mencionado cores como elemento básico, elas nada mais são do que variações (comprimentos de onda) da luz.

Quanto mais luz (fótons) refletindo em uma superfície, mais claro e definido ele parece. E vice-versa. Como elemento de composição, o contraste é responsável por criar o ambiente e predispor o cérebro a emitir uma opinião sobre a imagem que está vendo. Mas não para por aí, é ele também que organiza e separa os diferentes elementos de uma cena.

A famosa imagem que usei para ilustrar essa seção do texto trabalha com contraste dessas duas formas: A cena em preto e branco com o contraste elevado passa a ideia de solenidade. A menina de vermelho concentra a atenção e torna o resto da imagem em moldura. E se não fossem por esses dois elementos gerados pelo contraste, a cena poderia se quebrar: O foco numa criança tende a suavizar o momento, uma espécie de efeito “flor nascendo no estrume”. Mas não é isso que acontece (e quem lembra do filme sabe a verdadeira intenção da imagem…). Se a cena fosse colorida e os contrastes mais sutis, o signo (calma!) roubaria a cena e criaria um clima por conta própria.

Já perceberam que em propagandas normalmente é tudo muito bem iluminado? Exageradamente iluminado? É para te desencorajar a pensar. Sério. Quanto mais se esconde, maior a necessidade do cérebro de preencher a imagem, mesmo que com significados. Uma sala escura não mostra muitos detalhes, mas te dá muito mais o que pensar do que uma iluminada. É a lógica invertida da mulher que apaga a luz para fazer sexo… Deixar a sensação influenciar a imagem o máximo possível.

SIGNOS

Não, não é astrologia! Signo em comunicação é qualquer coisa que tenha um… significado. A bandeira do desfavor, o desenho de um carro, o som de uma palavra, até mesmo aquele cheiro de chuva são signos. Não precisa ser imagem… Também tem tudo a ver com a forma como o cérebro processa informação. Você não pensa exatamente como fala, quando estamos dentro de nossas mentes, associamos significados diretamente. Só quando precisamos falar ou escrever que codificamos as ideias em palavras.

Numa explicação bem maconheiro de curso de comunicação: Signo é algo que você associa com algo, mesmo que seja o mesmo algo. Entendeu? Ótimo! Vamos continuar.

Somos capazes de depreender significados de praticamente qualquer rabisco, e o mais bacana (para quem quer te vender algo) é que boa parte deles não faz a mínima questão de passar pela sua mente consciente antes de virar significado. Esqueça aquela coisa datada de propaganda subliminar como um flash dizendo “compre” no meio de um programa normal. Sim, o olho consegue captar, decodificar e “guardar no HD” essas imagens antes de você pensar sobre o que acabou de ver, mas os resultados dessa modalidade de golpe publicitário são risíveis perto do subliminar a plenas vistas. Você é bombardeado com mais significados que sua mente pode lidar de uma vez só. Isso funciona!

FLUXO

Mas pode chamar de composição também. Eu prefiro usar a expressão fluxo porque esse é o mecanismo pelo qual se guia a pessoa pela imagem de acordo com o seu objetivo. A visão humana tem uma boa área periférica, mas temos um foco central poderoso.

Você viu pela imagem como é fácil direcionar o olhar de uma pessoa para onde você quer, mesmo disputando com um sistema tão famoso como o dos três quadrinhos, seus olhos são sugados para o lugar “errado” só por causa de um texto vermelho. Isso é MUITO importante em design. Se você deixar a pessoa olhar as coisas em qualquer ordem, fica dependendo da sorte para passar a mensagem correta. Se você precisa de uma imagem chocante para criar o clima para uma frase, faça questão de que a pessoa vai se concentrar primeiro na imagem. Seja pelo tamanho, pelas cores ou por algum signo que chama muita atenção. (Se parecer com um pinto ou peitos, é vitória automática…)

E é claro, o contraste e as cores também contam demais. Vermelho e amarelo roubam a atenção, principalmente sobre fundos com cores desbotadas ou tons de cinza. É a mãe natureza não nos deixando esquecer que muitos de seus venenos naturais vem em embalagens dessa cor…

E EU COM ISSO?

Evidente que isso se aplica também à forma como você se veste e se apresenta para outros seres humanos. Não tenho pretensão de dar dicas de que roupa vestir ou não, a ideia é demonstrar como os conceitos se aplicam a elas da mesma forma.

Escrevi este texto inspirado por um decote. Não que eu tenha pensado em design (ui, dezáini) na hora, na verdade eu não pensei em nada. Não era uma situação de flerte, era uma reunião de negócios. Depois de quase ficar com câimbra nos olhos de tanto tentar controlá-los, não pude deixar de perceber como a mulher em questão estava mal vestida para a ocasião. Não por achá-la uma vadia, nada contra mostrar mais pele. Mas isso minou a relação profissional no momento.

E isso tem uma explicação simples: O contraste, os signos (o da esquerda e o da direita) e o fluxo da imagem dela não conseguiam abrir um canal de comunicação. Além do destaque excessivo causado pela combinação de imagem atraente (peitos) e o contraste entre pele e roupa escura, ainda tinha um elemento de fluxo ali: Uma seta.

Sim, imagine um decote em “V” e você vai ver como forma uma seta apontando para baixo. Seguir setas está praticamente no nosso DNA. Sociedade que se baseou em lanças para caçar por milhares e milhares de anos…

A seta apontava para longe do rosto. Sempre vai ter alguém para dizer para as mulheres que elas vão se dar bem se jogarem um decotão e se inclinarem, só esquecem que se dar bem vai além de ser amante ou secretária especialista em linguística. Não é preconceito masculino, é pós-conceito mesmo. Mantenha a atenção no seu rosto, tolinha. É assim que se age no mundo profissional.

Duvida? Vocês acham que homens usam ternos só porque é fácil? Ternos são uniformes, sim. Mas são caros e especialmente incômodos quando faz calor. Era bem mais fácil que o uniforme fosse chinelo, bermuda e camiseta surrada. Mas mesmo assim o terno é padrão. E é por dois motivos: Rosto e mãos. Os dois elementos mais fortes da comunicação não-verbal humana.

Ternos tem uma única cor ou detalhes muito sutis, variam entre tons escuros e cinzas, e sempre estão acompanhados de uma gravata. As duas áreas expostas são a cabeça e as mãos. Todo o conjunto visual do contraste leva até elementos de comunicação. Até a gravata age como seta para apontar o rosto (e combater a que aponta para baixo com ele fechado).

Preste atenção em propagandas: Boa parte usa rostos e mãos para passar informações. Destaque para as mãos. Elas sozinhas formam uma infinidade de signos (linguagem dos sinais? pois é…). Fazer o seu conjunto visual negligenciá-las é basicamente se tornar um boneco na frente dos outros.

Roupas muito reveladoras ou berrantes tem suas funções, mas raramente no mercado de trabalho mais… convencional. É importante saber que cada porcaria de elemento visual que você exibe tem uma mensagem, e pior: Somados eles podem passar uma mensagem completamente alheia à sua intenção.

Só escrevo este texto porque o que muita gente acha que é preconceito ou “enveja” quando são julgadas pelas suas roupas na verdade é puramente uma questão de “design social”. Cores, formas e sequências visuais que direcionam e predispõem a visão alheia. Às vezes as coisas são simples mesmo.

Longe de mim dizer que só existe terno e “decote comportado” como opção válida. Eu pessoalmente detesto ternos, não nasci para ter chefe e usar uniforme. Em várias situações, dá para derivar os conceitos do design para o ambiente. Uma pessoa de terno no setor de criação de uma agência é que nem a menininha de vermelho do filme… Cada situação é uma situação. Mas a lógica é CONSTANTE: Contraste, signos e fluxo. Entenda isso e se apresente como achar melhor.

Ah, importante: Toda mulher acha que sabe escolher roupa para homem e ficam nos pentelhando para nos vestirmos melhor. Não caia nessa, colega de gênero. Qualquer profissional da área de maquiagem e figurinos vai te dizer como elas fazer MUITA merda ao escolher roupas. Trabalhar com vídeos abre os olhos de uma pessoa… Elas não se vestem tão melhor, nós é que cagamos e andamos se elas errarem! Raramente elas tem moral para reclamar da sua bermuda furada e sua camiseta de torcida organizada. Pode ignorar sem nenhum peso na consciência. Homens gostam de repetição e mulheres de imitação. Elas seguem a moda, e pode confiar que moda é um puta de um embuste, ainda mais trollagem e golpe que publicidade (o que é um feito).

“A moda do verão é roupa verde limão!”

Boa, campeã.

Para dizer que estava gostando do texto até o final, para reclamar que eu não entendo nada de moda (ainda bem!), ou mesmo para dizer que agora vai ficar procurando setas em tudo quanto é lugar: somir@desfavor.com

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