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Beleza precária.

Beleza precária.

| Somir | | 72 comentários em Beleza precária.

Não estou muito erudito hoje. O tema é baixaria e a minha opinião meio escrota. Todo mundo avisado? Bacana. Eu descobri mais um submundo do YouTube: mulheres que fazem vídeos limpando a casa com pouca roupa. E ao ser sugado por mais uma espiral de precariedade terceiromundista nos cantos estranhos da internet, posso finalmente afirmar: é impossível que alguma mulher possa reclamar de padrões de beleza inalcançáveis na sociedade. Não! Espera, eu posso fazer melhor do que só isso…

Foi muita informação, né? Vamos voltar o filme um pouco e estabelecer o argumento. Sexo vende, isso não é novidade. Como eu sempre digo, a internet é uma rede mundial de pornografia que alguns pervertidos usam para se comunicar. Isso eu sempre entendi: havia a parte da putaria e o resto. Se você quisesse putaria, ia pra parte da putaria. Se não quisesse, ficava no resto. Simples e intuitivo, como as seções isoladas das locadoras do passado.

Só que o mundo não ficou parado nos tempos da locadora do bairro com uma cortininha isolando a parte pornô. Aliás, posso dizer agora: tio da locadora, não adianta impedir o Somir de 10 anos de idade de entrar na área com as fotos de mulheres peladas se deixar a prateleira dos pornôs virada contra a dos clássicos. Era só fingir que estava realmente interessado em Casablanca ou O Vento Levou para ver a contracapa dos filmes pornôs. Touché!

Confissão feita, voltemos ao foco: mesmo que não existam mais locadoras, a cortina continuou existindo na separação do conteúdo na internet. Pornografia é mais fácil do que nunca de se achar, mas em tese, ainda é algo à parte da internet como conhecemos. Quer dizer, era… ao invés de tirar a cortina entre as áreas, é como se os vídeos pornôs tivessem lentamente influenciado outras prateleiras dessa “locadora global”.

Sexo vende, mas cobra caro: participar diretamente da indústria pornográfica comprovadamente aumenta as chances de comportamentos danosos e também gera um estigma social sobre a pessoa. Alguns dos atores e atrizes fizeram uma boa vida com seus trabalhos, mas boa parte acaba acidentada pelo caminho. Durante muitas décadas, foi uma máquina de moer pessoas. Mas, como ainda era um setor lucrativo e capaz de sustentar grandes empresas, o canto pornográfico da internet conseguia se manter viável.

Só que mais e mais pessoas começaram a entrar na grande rede. Muitas delas sem os filtros ou a propensão a gastar dinheiro de uma primeira geração mais elitizada de usuários. Rapidamente, aquele canto isolado da pornografia foi sendo esmagado por conteúdo grátis, de origem amadora ou pirateado. O mercado monstruoso da pornografia online estava desabando. A criação dos sites de streaming de vídeo foi o último prego nesse caixão. Uma era tinha terminado. Extinção em massa.

A questão é que sexo continuava vendendo. Mas não do jeito antigo. Da mesma forma como a indústria da música sobreviveu ao se adaptar às novas tecnologias, a indústria do sexo também. Mas como ela estava do outro lado da cortina, a maioria de nós não percebeu. Não percebemos inclusive quando ela começou a aparecer nas outras prateleiras. Mas agora não dava mais para existir daquela forma tão… explícita. Foi aí que muita gente aprendeu a se adaptar.

E uma dessas adaptações é criar uma frente mais socialmente aceitável para atrair consumidores de conteúdos do outro lado da cortina. Muitas daquelas modelos de Instagram e TikTok estão fazendo como todo bom traficante e oferecendo a primeira dose de graça. Antigamente a atriz pornô se declarava atriz pornô e vivia do dinheiro gerado pelas empresas que exploravam seu trabalho. Hoje em dia a atriz pornô te processa se for chamada assim e vende seu trabalho quase sem intermediários para o público final. Ela achou uma forma de estar dos dois lados da cortina.

Mas aqui, começamos um caminho diferente: sim, existe uma quantidade enorme de mulheres vendendo pornografia caseira na internet, e boa parte delas mantém uma certo grau de isolamento entre a personalidade pública e a atriz pornô privada. Não deixa de ser um caminho lógico: diminui o tamanho do impacto dessa escolha de carreira no resto da vida. Mas muito se engana quem acha que estou falando apenas de mulheres obviamente talhadas para vender sua imagem para homens tarados. É fácil prever que mulheres com atributos pra lá de avantajados e marquinhas de biquíni perfeitamente cultivadas vão se enveredar por esse mundo, a demanda é imensa.

Mas existe um submundo desse submundo. Sexo vende, mesmo que precise fazer promoção. Longe dos holofotes das redes sociais da moda e sem as milhares de curtidas de uma legião de fãs sedentos, muitas mulheres menos… esculturais… descobriram meios de colocar a mão no dinheiro desse mercado aparentemente infinito. Meus olhos choram, mas meu lado libertário ri: há mercado para qualquer baranga que tiver a coragem de se exibir. A indústria pornográfica explodiu em milhões de pedaços e tem caco para todo mundo! Viva a iniciativa livre!

A cada dia que passa, o YouTube recebe mais e mais vídeos de mulheres que dariam traço de audiência no Instagram fazendo as coisas mais banais imagináveis: lavando o piso do banheiro, tirando o pó da estante, dizendo como começam seu dia, eu vi até o vídeo de uma que simplesmente colocou uma camisola e dormiu… o segredo é fingir que não sabe que está expondo alguma parte do corpo. Tudo na mais incrível precariedade: câmera horrorosa, iluminação inexistente, áudio com eco… o cenário normalmente é feio, com paredes sem reboco, tudo bagunçado, mofo, musgo, cachorro vira-lata passando… só não digo que é puro suco de Brasil porque apesar das brasileiras fazerem muito isso, é um fenômeno global (de países pobres).

“Somir, larga de ser viado! Desde quando homem liga pra parede sem reboco se a mulher é gostosa?”

Disse a pessoa que não estava prestando atenção no texto. O mais fascinante disso tudo é que muitas vezes estrelando esse combo de subdesenvolvimento está uma mulher mais feia que um pitbull invadindo uma creche na hora da soneca. Não sou eu com ataque de exigência excessiva de nerd (“cotovelos muito pontudos, nota 5”), são mulheres que você nunca diria que estão no mercado de vender sua beleza. Eu não vou linkar vídeo de brasileiras porque não quero dor de cabeça com possíveis (prováveis) barraqueiras, mas segue um exemplo internacional.

Que jogue a primeira pedra quem nunca deu uma “barangada” nessa vida. Não tem pedra nenhuma na minha mão, com certeza. Apesar dos adjetivos coloridos que eu estou usando, longe de mim querer regular quem transa com quem. Mas, essa mulher do exemplo não é bonita, não é nem bonitinha, é um trubufu. Agora, vai olhar os comentários do vídeo. É um babão atrás do outro mendigando atenção. A cidadã faz vídeos sugestivos no YouTube balangando suas gorduras e mostrando alguns momentos de nudez “acidental”, e tem uma grande audiência. E se você for olhar a descrição do vídeo, vai ver o link do Onlyfans dela: um site onde você paga para ver conteúdos mais ousados do que nos vídeos normais dela. Entenderam o drama? Cidadão paga mensalidade para ver essa mulher mostrar um pouco mais peito caído que no vídeo do YouTube!

Eu quero mostrar esse vídeo e esses comentários para o primeiro cretino ou cretina que começar a falar de padrões de beleza inalcançáveis na mídia para as mulheres. Vai olhar essa cara de bolacha e esses bracinhos de merendeira e ouvir que tem gente que PAGA para ver ela um pouco menos vestida! Não é enfiando o braço inteiro na buceta ou comendo cocô, não é tara por bizarrice, é homem babando por um milímetro de perna exposta de uma mulher que ninguém desconfiaria que tem esse tipo de atenção.

Eu tenho raiva dessa mulher específica? Nem um pouco. Eu estou pagando um pau para ela, isso sim. Está ganhando seu dinheirinho honestamente (ninguém é obrigado a pagar nada) e ainda enfiando uma trolha enorme no mimimi do feminismo moderno sobre padrões de beleza. E ela é só um exemplo: como essa existem milhares de outras fazendo a mesmíssima coisa em diferentes graus de beleza com grupos e mais grupos de homens torrando dinheiro para ver um peito ou ganhar um bom dia.

Homem não tem limite! Homem é uma praga que corre atrás de qualquer coisa com buceta (e hoje em dia, talvez nem precise mais de buceta, só uma peruca já está servindo pra muitos). Não tem padrão de beleza porra nenhuma! O problema dessas feministas modernas de 10 arrobas com cabelinho azul é que elas não querem a adoração dessa casta inferior de homens que topam qualquer coisa, elas querem derrubar os padrões de beleza dos homens mais atraentes para elas. Ou, talvez ainda mais patético, só ganhar um confete mesmo sem fazer nenhum esforço por isso. As barangas fazendo vídeo limpando a casa de camisola pelo menos estão tentando dar alguma coisa em troca da atenção masculina. E mais: estão se colocando na linha de fogo, porque alguém vai acabar dizendo coisas horríveis. Não tem “espaço seguro” nesse submundo.

Se a nova indústria pornográfica (estou usando o termo de forma mais abrangente, mesmo quando são só fotos e vídeos provocantes a ideia é a mesma de vender sua imagem sexual) nos ensina uma coisa, é que o discurso de falta de diversidade nos padrões de beleza não se sustenta na vida real. A libido do cidadão médio continua funcionando para todo tipo de público, ainda mais considerando que os supostos grupos injustamente chamados de feios são os que mais se reproduzem. Onde está faltando a mulher se sentir bonita? Porque mesmo na precariedade máxima de ficar se olhando por uma telinha de smartphone, basta dar um mole para ser afogada por atenção masculina. E se quiser fazer um negócio paralelo com essa atenção, o dinheiro vai fluir. O Onlyfans não é feito só de modelos estonteantes… longe disso.

Que padrão de beleza é esse que exclui as “mulheres reais”? O da grande mídia? O dos homens muito atraentes? Porque quando entramos nesses meios, estamos falando de concorrência elevada, óbvio. Quem pode escolher, escolhe. Será que estamos vendo uma geração criada com um bombardeio interminável da mídia de massa e suas celebridades dando de cara com a realidade? Porque é o que parece. Gente que criou uma ilusão desde a infância que a aceitação generalizada e a fama eram direitos universais. Mas ao perceber que a concorrência por cada uma daquelas vagas debaixo dos holofotes era absurda, quiseram mudar as regras do jogo. Não para criar um mundo mais justo, mas para saciar um desejo de validação muito pessoal.

Talvez as próximas gerações já tenham essas expectativas mais moduladas pela realidade. E muito pela ajuda dessa nova realidade do mercado do sexo: desde cedo relacionando atenção de tarados com retorno financeiro, é capaz de ficarem mais cínicas com a relação toda. Menos ilusão de aprovação social, mais foco em pagar as contas num mundo cada vez mais complicado para profissões tradicionais. A própria ideia de fama muda: não é mais um passaporte para os maiores palcos globais, e sim um emprego como qualquer outro. Não são mais meia dúzia de vagas no topo da indústria do entretenimento, são milhares, quiçá milhões de vagas no mercado de vender ilusão de sexo para homens cada vez mais desesperados.

E aí, o discurso de democratização do padrão de beleza se esvazia. Porque na verdade, sempre foi vazio onde as pessoas realmente vivem. Se tem uma coisa que a pandemia fez de muito bom, foi começar a ruir de vez os modelos de negócio antiquados da indústria do entretenimento. Tem gente pagando para ver uma idosa acima do peso lavar o banheiro só de calcinha, mas não tem quem pague para ver a lacração de quem quer usar questões sociais como trampolim para fama milionária. Mas, façam mais um reboot de filme famoso com elenco feminino, quem sabe dessa vez funciona?

Eu sempre fui de reclamar desses caras que pagam pela atenção de qualquer vadia genérica de internet, dizendo que estavam criando um monstro. Mas, ver dezenas de vídeos de mulheres feias em situações precárias e ganhando dinheiro (provavelmente mais do que eu ganho) me deu uma certa esperança. Disfunção erétil também, mas prioritariamente esperança de que o mundo não tem lugar para a lacração no longo prazo. Pessoas tem necessidades primais e contas para pagar, e as gerações com as ilusões de fama “antiga” vão acabar definhando, por mais que esperneiem.

E no lugar delas, a beleza (e a falta dela) real de quem topa qualquer coisa tende a imperar. Essa é a humanidade, de verdade.

Para dizer que gosta desses temas baixaria, para dizer que não deveria ter clicado no vídeo, ou mesmo para perguntar o que eu estava fazendo quando achei esses vídeos: somir@desfavor.com


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