FAQ: Coronavírus – 17

Faltou oxigênio na Jordânia, teve gente furando a fila da vacina na Argentina, as coisas que acontecem no Brasil acontecem no mundo todo, mas vocês só falam mal do Brasil. Seria implicância?

No dia que a gente escrever que só no Brasil existe corrupção e incompetência, você pode falar em implicância. Não é esse nosso argumento. Nosso argumento é: no Brasil tudo acontece pior, de forma mais grotesca, seguido por impunidade de quem erra e passividade da população.

Na Jordânia morreram SETE pessoas por ter faltado oxigênio em UM hospital. O Ministro de Saúde do país foi demitido na mesma hora, o diretor do hospital foi preso e o Primeiro-Ministro do país assumiu publicamente toda a responsabilidade pelo erro e pediu desculpas à população, que não desculpou e foi às ruas em violentos protestos.

Na Argentina, quando descobriram que havia pessoas furando a fila, o Presidente da República enxotou o Ministro da Saúde (e olha que eles são amigos pessoais) e todos os que estavam abaixo dele no Ministério, fez um pronunciamento pedindo desculpas à população, que também não desculpou e foi às ruas em violentos protestos.

No Brasil, não faltou oxigênio em um hospital, faltou em cidades inteiras. O Brasil está uns 80 países acima da Jordânia no que diz respeito ao PIB e mesmo assim a crise foi muito mais grave. Na Jordânia, a cagada foi do hospital, que errou a conta na hora de pedir mais oxigênio. No Brasil os Estados estavam berrando com mais de 15 dias de antecedência que o oxigênio ia acabar e mandando pedidos de ajuda desesperados ao Ministério da Saúde, pedidos estes, ignorados.

Na Jordância, o Governo não cancelou a compra de kit intubação no meio de uma pandemia, ou seja, não contribuiu ativamente para faltarem insumos. A Jordânia não promove oficialmente um “tratamento preventivo” contra covid que não apenas não previne nada, como ainda causa danos ao organismo e piora a situação do doente se ele se contamina. Na Jordânia o Governo não incentiva a população a sair na rua e deixar de usar máscara.

No Brasil morreram muito mais de sete pessoas por falta de oxigênio. Ninguém foi demitido, ninguém foi preso e a falta de oxigênio continua. Também houve escândalo de pessoas furando fila e ninguém foi demitido. Sim, incompetência/corrupção acontece em qualquer lugar do mundo, o surreal é como o Brasil lida com isso. É o como diz o Meme: CRIME OCORRE NADA ACONTECE FEIJOADA.

Esse grau descarado de irregularidade, ilegalidades e negligência imune só é visto em poucos países, no geral republiquetas e no Brasil, doravante denominado Banânia. Você não vai achar um país com esse PIB que se preste a essa quantidade de descasos, vexames e incompetência. E, a diferença mais importante de todas: na Banânia acontece todo tipo de desaforo e o povo não move um dedo para que isso mude.

Além disso, nosso foco é o Brasil pois é no Brasil que nosso leitor está. É onde podemos fazer a diferença, é onde queremos ver uma melhora acontecer em primeiro lugar. Não faria muito sentido escrever um blog em português para criticar o governe de Papua Nova-Guiné, não é mesmo?


Que fim levou a missão comitiva brasileira que foi comprar o spray contra covid em Israel? Quando o remédio chega ao Brasil?

Já falamos desse spray inútil no FAQ 13 (quarta pergunta), mas, como sua pergunta é sobre a missão e não sobre o medicamento…

O objetivo dessa viagem era, em tese, conhecer mais e quem sabe adquirir um remédio em spray fabricado em Israel que teria potencial para combater o covid. Mas, mesmo antes da partida, já se sabia que seria uma viagem improdutiva, pois o medicamento não vai estar disponível no mercado tão cedo e nem sequer se sabe se é seguro ou eficaz.

Em resumo, foi uma viagem que custou em torno de 400 mil reais, para ir buscar um remédio que ainda não existe, que ainda está sendo testado em fase 2 (ou seja, não se sabe se é seguro, muito menos efetivo) e que, portanto, não pode ser comercializado. Nunca houve a menor chance do Brasil comprar esse spray por um motivo muito simples: ele não pode ser vendido. Faltam meses e mais meses de testes.

Que fim levou? Ernesto Araújo, Ministro das Relações Exteriores, foi repreendido publicamente por um locutor no microfone para usar a porra da máscara, passando uma baita vergonha. A comitiva brasileira (dez pessoa para ver um spray) foi impedida de cumprir a agenda para conhecer o medicamento (visitar fábrica do remédio e hospitais) pois tiveram que ficar no hotel em quarentena, de acordo com as regras do país. Vocês pagaram quase meio milhão de reais para Bolsonaro e mais 9 amigos ficarem em um hotel, basicamente.

Como já falamos em outra coluna FAQ, esse spray (o nome é HexoCD24) é completamente inútil por agora, pois não pode ser usado. Nem mesmo os israelenses estão usando. E foi dito ao Brasil que o spray não estava a venda, o que não impediu o Governo de gastar seu dinheiro e levar dez pessoas para escutar isso pessoalmente, pela segunda vez. Acho que o pessoal do governo está com saudades de viajar.

Quando o remédio chega ao Brasil nem seria a pergunta correta. A pergunta é: será que esse remédio poderá ser comercializado? Quando ele chega ao mercado? Difícil dizer, talvez no segundo semestre deste ano, talvez só no ano que vem. Isso se for aprovado nas fases 2 e 3. Se não for, não chegará nunca ao mercado.


Acabou medicamento para intubação na minha cidade. Disseram pra gente na semana passada ia ter uma reunião de emergência para discutir a escassez de medicamento para intubação e o problema ia ser resolvido. Qual foi o resultado dessa reunião? Conseguiram comprar mais? Quais medidas serão tomadas para reverter a falta de medicamentos? Quando eles vão chegar?

Sua dúvida é a dúvida de muitas cidades, de muitos estados, de muitos hospitais. Tem muita gente nessa situação. Apesar de não ser o foco principal dessa coluna, me pareceu uma informação relevante o suficiente e fui pesquisar como se desenrola essa burocracia no Brasil. Queria saber se havia entraves jurídicos, exigências internacionais ou outras barreiras que pudessem atrasar o processo. Tem gente morrendo por falta de insumos, é uma questão realmente importante.

Fui pesquisar sobre as medidas tomadas para resolver o problema e fico até constrangida de responder… que vergonha. De fato, havia uma reunião agendada para tentar resolver o problema, mas ele não foi resolvido. Não por entraves jurídicos, mas por uma questão muito mais básica: ao que tudo indica, a ANVISA esqueceu de enviar os e-mail confirmando dia e hora da reunião, por isso, ninguém compareceu e ela não aconteceu.

A explicação oficial não é muito melhor do que isso: segundo o diretor da ANVISA, Romison Mota, estava tudo certo, mas a assistente dele não “apertou o botão enviar” para que a mensagem chegasse às pessoas convocadas para a reunião. Olha, eu sei que isso parece mentira ou uma piada de péssimo gosto, mas, além das minhas fontes, tem também fontes oficiais corroborando com esta informação.

Então, sinto muito, é com muita vergonha (apesar de não ser brasileira) que eu te comunico que a reunião destinada a salvar o país com mais insumos ainda não aconteceu e sua cidade vai ter que esperar um pouco mais sem os medicamentos para intubação. Desculpa, não sei nem o que dizer.

Você pode tentar conseguir uma liminar no Judiciário obrigando o Estado a disponibilizar o medicamento (você vai precisar de um advogado ou um Defensor Público para entrar com a ação judicial), mas já te adianto que o problema está começando a aparecer no país inteiro, não sei se vão ter de onde tirar.

Novamente, sinto muito. O Brasil surpreende negativamente a cada dia que passa.


Tem muito lugar adiantando feriado para tentar conter o contágio. Isso é útil?

Não. No Brasil, você adianta feriado e as pessoas vão para a praia, vão viajar, vão bundear na rua. Essa história de que o deslocamento das pessoas está atrelado ao trabalho é uma mentira já desmentida pela análise do GPS dos celulares. Às vezes, transita mais gente pelas ruas nos finais de semana do que em dias de semana. No Brasil, antecipar feriado não é sinônimo de manter as pessoas em casa.

Não basta decretar lockdown, é preciso obrigar seu cumprimento. Isso se faz com policiamento e punição para quem descumpre as regras (sair uma vez por semana para comprar comida e remédio). Qualquer coisa além disso tem que implicar na apreensão do carro, em multa, em um processo criminal para “tirar o réu primário da pessoa”, em suspender o pagamento de qualquer benefício que a pessoa receba do Governo e mais uma série de punições.

Enquanto não houver fiscalização e punição nada vai mudar. Enquanto não fecharem TUDO que não seja atividade essencial, nada vai mudar. Tem que fechar comércio, restaurante, academia, igreja, escola, salão de beleza… Vamos simplificar: farmácia, supermercado, veterinária e hospital ficam abertos ao público, mas de forma restrita e controlada. O resto tem que fechar.

Por fim, para que o lockdown seja efetivo, nesse ponto de danação, seria desejável que 80% ou mais da população não pise o pé fora de casa. Pela medição feita com base no GPS do celular, esse índice nunca subiu muito além de 40% nas grandes capitais. Aí fica difícil, continuarão sendo um celeiro de novas variantes, até surgir uma que escape das vacinas (já se trabalha com essa possibilidade oficialmente no Brasil), e aí, meus queridos, a reação do resto do mundo não vai ser nem bonita nem amistosa. Se o Brasil continuar como está, não é uma questão de SE vai acontecer, é uma questão de QUANDO vai acontecer.


A situação do Brasil parece não ter solução. O que pode ser feito para que uma pessoa sensata assuma o comando nessa pandemia?

A resposta mais óbvia ser o impeachment do Bolsonaro, mais isso, pelo que vejo, não vai acontecer por diferentes motivos que não cabe discutir aqui.

Outra alternativa é o Congresso e o STF decretarem uma tutela judicial do Ministério da Saúde, ou seja, eles passam a dar as ordens ao Ministério da Saúde. Em tese, isso pode ser feito no Brasil, sobretudo em uma situação calamitosa como a atual. Mas, ao que tudo indica, também não vai.

Mais uma opção: uma intervenção internacional obrigando o Brasil a adotar certas medidas para o combate à pandeia. Seria traumático, pois provavelmente o Presidente resistiria e metade da população ficaria berrando coisas sobre soberania e se recusaria a cooperar e o desfecho acabaria sendo violento, mas certamente ainda seria melhor do que o cenário atual.

A outra alternativa eu prefiro não dizer, por questões de responsabilidade jurídica. Só vou dar uma dica: se não rodar a faca, pode não dar certo.

Para dizer que eu vou ser enquadrada na Lei de Segurança Nacional (boa sorte tentando encontrar uma pessoa estrangeira em outro país), para passar pano e perguntar quem nunca esqueceu de enviar um e-mail ou ainda para dizer que vai fugir do Brasil no porão do primeiro navio de carga que aparecer: sally@desfavor.com

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