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Mimimi alheio.

Mimimi alheio.

| Sally | | 26 comentários em Mimimi alheio.

Existem três tipos de pessoas na pandemia: 1) Os que entendem quão grave e arriscada é a situação e fazem o que é preciso para se preservar; 2) Os que não entendem ou escolhem correr o risco e saem de forma desnecessária e 3) Meu tema do dia de hoje: pessoas que ficam em casa, mas se acham os Mártires da Pandemia e sofrem por não poder fazer suas futilidades rotineiras. Sim, o texto de hoje é estranho: meu mimimi é não suportar o mimimi das pessoas durante a pandemia.

É uma situação crítica, é uma situação difícil, é uma situação assustadora, eu consigo entender isso. Desde que a coisa descambou feio no Brasil, na segunda onda, eu sempre repito que quem precisa de remédio tarja preta é quem está entendendo o que está acontecendo, anormal seria não precisar. Mas porra, o que eu entendo são reclamações pertinentes à pandemia: medo de morrer, medo de ter sequelas, medo de que entes queridos morram etc. Isso eu posso lidar. Mimimi não.

Escutar choramingo por não poder ir pro barzinho, para a festinha, para o encontrinho, para o jantarzinho não dá. Escutar reclamação por academia estar fechada, por salão de beleza estar fechado ou pior ainda: por ter que fazer fila para entrar em salão pois só pode entrar um cliente por vez. Qual é o grau de retardo mental de alguém que topa, no meio do pico de uma pandemia, arriscar a vida para ir a um salão de beleza?

“Mas Sally, você precisa entender que as pessoas têm prioridades diferentes”. Não, não preciso. Quando é algo que afeta a todos, que coloca em risco a vida de todos, eu não preciso entender o grau máximo de dondoquice e futilidade que é querer ir a um salão de beleza no pico de uma pandemia “com todos os protocolos de segurança”.

Essa frase me irrita. “Com todos os protocolos de segurança”. Sabe quem usa todos os protocolos de segurança melhor do que qualquer um de nós? Profissionais de saúde que trabalham em UTI. E eles estão morrendo. Então, talvez, assim, quem sabe, usar uma máscara e passar álcool nas mãos não te impeça de adoecer e morrer.

Sabe qual é o único protocolo de segurança 100% eficiente quando se está em um grau sem controle como chegou o Brasil? FICAR EM CASA. Não é diferença de opinião, não é diferença de prioridades, é ciência: sair só em último caso. Se salão (ou qualquer outra imbecilidade que não seja comprar comida e remédio) é último caso para a pessoa, eu entendo como caso de retardo mental e não quero escutar choramingos sobre não poder fazê-lo.

Percebam que eu não estou criticando o fato de a pessoa ir ao salão, isso não é mimimi, é uma crítica válida pois a pessoa coloca em risco a vida de todos. Eu estou criticando quem reclama de não poder ir. Quem faz desse não poder ir um drama, um motivo para encher os ouvidos alheios, uma questão. Não poder ir ao salão, ao jantar, ao barzinho, não é uma questão. Se é uma questão para você, você é um retardado mental.

Tanta gente passando um perrengue fodido nessa pandemia e tem sem noção se lamentando por não poder ir fazer o cabelo? Tá precisando enterrar uma mãe ou um filho para cair na realidade. Acha tão ruim o fato do cabelo estar com raiz a ponto de encher o ouvido alheio? Mas tá faltando muito probleminha na vida, não? Fecha um caixão com a sua mãe dentro que você vai ver o que é problema de verdade.

Mas, em meio a tantos tipinhos deprimentes mimizentos da pandemia, para mim o pior (e pode ser homem ou mulher) é o que tem o descaramento de reclamar de falta de sexo. Em sua maioria são pessoas que nunca se esforçaram para manter um relacionamento estável (sim, demanda esforço, comprometimento e manutenção) e agora, que não pode mais piranhar por aí (repito: vale para homem e mulher) ficam choramingando.

Tem quatro dígitos de pessoas morrendo por dia, mas tem alecrim dourado que acha que sua vida sexual (ou a falta dela) vale reclamações periódicas. Uma dica: sua vida sexual só interessa a você e a quem faz parte dela, terceiros não querem saber, principalmente quando é para reclamar. Se você precisa falar da sua vida sexual para terceiros (ou da falta dela), tem algo de muito carente em você que precisa ser resolvido. Repito: ninguém quer saber.

Quer fazer sexo? Tem duas opções: arrisca a vida e faz ou entuba que agora não dá e segura o tranco. Sabe o que não é uma opção? Ficar reclamando disso. Sabe o que é menos ainda uma opção? Ficar reclamando disso com qualquer pessoa que perdeu um ente querido recentemente. É uma afronta. É um deboche. É motivo para levar um tapa na cara.

Aliás, para a vida, independente de pandemia: em vez de reclamar de falta de sexo (algo que é humilhante e depõe contra você, caso você não tenha percebido), use esse tempo para olhar para dentro, se analisar e entender o que você pode/deve fazer para se tornar uma pessoa mais desejável. Vai ser um tempo mais bem gasto. Vai malhar, fica com um corpo bacana. Vai fazer terapia, para ter uma personalidade menos desagradável. Vale tudo, menos ficar entulhando o ouvido alheio com suas reclamações.

Outro tipinho que me dá náuseas é o “pela saúde mental”. Gente que fica buscando nos outros validação para fazer alguma atividade social “pela sua saúde mental”. Aí tem que ouvir excrescências como “o ser humano não nasceu para viver trancado”. E para ficar doente? Nasceu? Para ficar com um tubo que entra pela boca e termina no pulmão, nasceu? Quer sair? Compra o barulho de ser reprovado por boa parte das pessoas que te cercam e sai. Não fica mimizando tentando justificar sua imbecilidade.

Ficar em casa e encher o ouvido alheio com essa premissa bosta de que para ter saúde mental é preciso sair consegue ser ainda pior do que ir a festa clandestina. Não vai vir validação daí. Se, para ter saúde mental você precisa sair de casa, em vez de mimizar absurdos no ouvido alheio vai fazer uma terapia, pois sua cabeça está muito ferrada.

Mais uma figurinha nesse álbum dos horrores: o empresário/empreendendor merda. O mesmo que vivia vomitando umas frases motivacionais para se sentir foda, agora tá mimizando. “tem que matar um leão por dia”, “Adapte-se ou morra”, “Trabalhe enquanto eles dormem”, “é a lei da oferta e procura”, “se reinvente”, “só os fortes sobrevivem no mercado” virou um choramingo escroto: “mimimi, o governo não me deixa trabalhar”.

Irmão, você teve um ano para se adaptar à pandemia. Se sabia que o vírus não ia embora, era só olhar pro resto do mundo. Se sabe que essa merda vai durar anos e não meses, não mudou seu negócio para algo online por causa de quê? Não era você o rei da adaptação, do mercado, de se reinventar? Agora vem “mimimi o governo não me deixa trabalhar”? Não, você que estagnou e virou as costas para a realidade.

Você tinha a opção de se adaptar e migrar seu negócio para online ou mudar de ramo, de atividade, de foco e fazer coisas que possam ser executáveis online. Quem perdeu um marido, uma esposa, um filho, um familiar não teve qualquer opção. Mas, por favor, nos conte um pouco mais do seu sofrimento por não poder se dar ao luxo de ficar estagnado na sua zona de conforto, pequeno cosplay de Eike Batista!

A pessoa pretende que, no meio de uma crise mundial com milhões de mortos, tudo no seu entorno continue favorável para que ela possa fazer exatamente o que fazia antes. Quantas vezes uma pessoa dessas tem que ir tomar no cu? Todo mundo está tendo que se reinventar, que se reacomodar, que se adaptar, mas o pequeno Steve Jobs tupiniquim está choramingando pois vai ter que funcionar em horário reduzido ou por ter isolamento social. Você não pode reinventar sua mãe, seu pai, seu filho, mas porra, o seu negócio você teve um ano para mexer!

Se, em vez de choramingar, reclamar e não se conformar essas pessoas usassem esse tempo e essa energia para elaborar essa nova realidade dentro delas, provavelmente estariam melhor. Não vai acontecer, pois são os fodidos da cabeça, então, simplesmente poderiam calar a boca e ficar nas suas casas sem azucrinar o ouvido de ninguém. Se surgir um desejo incontrolável de reclamar, liga pro disk-amizade, por R$9,99 o minuto provavelmente vai ter alguém disposto a escutar.

O curioso é que essas pessoas sempre falam do sacrifício que é ficar em casa como se fosse uma novidade, uma coisa muito especial, algo que acomete exclusivamente a eles. O alecrim dourado não sabe que tudo que ele passa por ficar em casa qualquer pessoa passa por ficar em casa? A diferença é que todo o resto do mundo está calado, lidando e trabalhando essas restrições consigo mesmo, de forma digna e silenciosa enquanto as aberrações ficam vomitando isso nos outros.

Do or do not, there is no try (Yoda, Mestre). Aceita o risco e sai (e, nesse caso, se afaste de pessoas que se cuidam) ou se conforma e faz o que precisa ser feito. Ficar em casa e ficar reclamando como se fosse um mártir é simplesmente patético.

Literalmente, o mundo todo está passando por isso e todo mundo está sentindo mais ou menos a mesma coisa. Quem é um adultinho com um mínimo de estrutura psíquica está empenhado em fazer o que precisa para se cuidar, quem não, choraminga como se estivesse sofrendo mais do que os outros.

“Mas eu me sinto de tal jeito”. Sim. Só você, floquinho de neve único e especial, todos nós estamos muito felizes, estamos rindo e vamos mandar fazer uma camiseta escrito “Pandemia 2020 – Eu fui”. Só você está tendo que lidar com sentimentos negativos, tristeza e angústia, pequeno toletinho simétrico de cachorro! Todo o resto do planeta está com a vida ganha, a conta bancária no azul e a vida perfeita, só você, ser único, sensível e insubstituível está se sentindo assim!

Morreu a mãe de um, o filho do outro, teve gente que perdeu três ou quatro familiares para a doença, mas tem que validar o sofrimento da Fulaninha que teve uma crise de choro quando descobriu que não vai poder fazer a viagem que queria ou a festinha que queria. A sua festinha, eventinho, encontrinho vale mais do que a vida de 400 mil pessoas e você, pequeno alecrim cagado, vai se encarregar de fazer o mundo saber disso discorrendo sempre que pode (inclusive em redes sociais) sobre o quanto está sofrendo por não poder fazer uma festa brega de casamento.

Tem gente passando fome. Tem gente sendo despejada da casa e dois filhos debaixo do braço sem ter onde morar, tem gente morrendo, mas vamos falar mais sobre quanto tempo faz que você, pequeno espermatozoide vitorioso, não vai ao bar com os amigos!

A comunidade médica e científica trabalha dia e noite, dormem de pé, trabalham de fralda para não precisar fazer intervalo para cagar, mas vamos falar um pouco mais sobre quanto tempo faz que você, pessoa mais importante do mundo, não faz sexo. Por favor, conte mais! Estamos todos ótimos, com disponibilidade emocional 100% e com tempo de sobra para escutar mais sobre esse seu terrível sofrimento.

Mais de 3 milhões de mortos no mundo, mas vamos falar mais sobre o seu sofrimento, pequeno unicórnio que caga ouro em pó, em não poder ir para a academia, em não poder fazer as unhas, em não poder ir para a praia. Por favor, reclame mais conosco, de forma totalmente gratuita, em vez de pagar 300 reais a hora para um bom profissional, é um prazer para todos escutar sua sofrência em vez de fazer algo útil das nossas vidas.

Novas variantes surgindo que podem escapar às vacinas, mas vamos falar mais sobre o seu sofrimento, trevinho de cinco folhas, que não pode ir ao restaurante e está tendo que cozinhar a própria comida como qualquer adultinho que se preze fez a vida toda. Conte mais sobre o sofrimento que é cozinhar todo dia para nós, pessoas que fazemos isso diariamente sem reclamar faz vinte anos.

Vamos deixar uma coisa clara: está todo mundo muito fodido nessa pandemia, salvo raríssimas exceções. Tá todo mundo ruim de dinheiro, tá todo mundo ruim de cabeça, tá todo mundo enfrentando uma infinidade de desconfortos por ter que ficar dentro de casa. Mas, só uns poucos carentes e chatos estão reclamando disso o tempo todo, como se fossem os únicos ou os mais afetados.

Tenham senso do ridículo! O ouvido dos outros não é penico! Antes de abrir a boquinha para reclamar de qualquer coisa, se perguntem: “o que eu posso fazer para melhorar ou me adaptar a essa situação” – e faça. Espernear por querer que a vida continue como antes ou pela vida estar atualmente desconfortável é futilidade. Vão mimizar na casa do caralho!

Para dizer que vai enviar o texto anonimamente para uma pessoa mimizenta, para dizer que eu não tenho empatia ou ainda para dizer que mimizar sobre mimizentos é ainda pior que os mimizentos em si: sally@desfavor.com


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