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FAQ Desfavor – Guerra 2

Sim, Somir também responde FAQ agora. De forma menos didática e com grande risco de sair em tangentes aleatórias, mas responde.

Quem é mais poderoso numa guerra, EUA ou Rússia?

Resposta curta: EUA. Resposta longa: Estados Unidos da América.

Mas não quer dizer que seria um passeio. Longe disso. Numa guerra teórica, nenhum país do mundo tem chance de vencer os americanos, mas… não existem guerras teóricas. Na hora de fazer a guerra acontecer, existem diversos fatores que influenciam o resultado final.

Vamos começar com um pouco de história: os russos têm muita história, e como é de costume com muita história, muitas guerras. Nas suas diversas variações pelos séculos passados, o poder russo sempre quis manter uma área de influência entre eles e o resto da Europa. Isso não começou com a União Soviética, os czares russos já se metiam em todo tipo de conflito para ter controle sobre as suas áreas adjacentes.

Já os EUA são uma potência bem mais recente. Antes da Primeira Guerra Mundial já tinham força regional, depois dela começaram a projetar um poder mais global. Depois da Segunda Guerra Mundial, perceberam que o mundo estava pronto para ser conquistado e continuaram investindo horrores em seu exército para garantir isso.

Durante a Guerra Fria, ambos os países entraram numa corrida armamentista para definir quem controlaria o mundo, mas como nunca entraram em confronto direto, a definição do conflito veio através do colapso econômico dos soviéticos. O que nos faz chegar até o momento atual, onde EUA e Rússia são respectivamente o maior e o segundo maior exército do mundo.

Sim, os EUA têm mais de praticamente tudo o que se conta numa guerra. Mas é aqui que precisamos entender como e onde essa guerra teórica se desenvolveria.

Se estamos falando de soldados, tanques e canhões, os dois países estão bastante equilibrados. Os americanos têm 1.4 milhões de soldados na ativa, os russos 900.000, mas os russos têm mais gente na reserva do que os americanos, numa proporção de 2 russos para cada 1 americano. Em tanques, ambos têm perto de 3 mil cada, com 5 mil peças de artilharia também.

A principal diferença é na qualidade do equipamento. Os russos ainda têm muita coisa desatualizada, do tempo dos soviéticos. O orçamento militar americano é mais de 10 vezes maior que o russo, com impressionantes 715 bilhões de dólares gastos todo ano. As armas e tanques dos EUA foram sendo renovados com o passar do tempo, e tendem a ser mais avançados e novos que os dos russos.

O que não resolve muita coisa no curto prazo: essa vantagem de orçamento americana se desenvolveria com o passar do tempo, com mais capacidade de consertar e repor materiais necessários durante uma longa guerra. Por mais que a tecnologia tenha avançado nas últimas guerras, um tiro de canhão ainda é um tiro de canhão. Num primeiro momento de guerra no solo, eu aposto que a coisa ficaria muito próxima entre os dois exércitos.

Mas, faz tempo que guerra não se decide apenas no solo. Um dos fatores determinantes na capacidade de projetar seu poder ao redor do mundo é a Marinha de um país. E nesse campo, os americanos são imparáveis: eles contam com 11 porta-aviões contra apenas 1 dos russos. A vantagem é clara em virtualmente todos os tipos de equipamento militar marítimo. Numa guerra entre americanos e russos, os americanos conseguem sufocar as saídas para o mar dos russos, mas os russos não têm a menor chance de sequer chegar até os EUA.

Desde Pearl Harbour os americanos nunca mais brincaram em serviço com sua Marinha. Os russos seriam isolados do comércio internacional em questão de horas, e não teriam a menor chance de virar o jogo nos mares. Os oceanos são território americano, e ninguém chega perto deles. Se Putin tiver meio neurônio, ele nunca vai depender de nada que flutue para enfrentar os americanos.

Mas batalha nos mares parece tão… século passado, não? Eu até concordo, mas não temos noção exata de quanto daria para lutar nos oceanos pela forma como os EUA tomaram conta desse território. Os outros países acabam até desmotivados de tentar enfrentar o poderio americano dessa forma. Os chineses estão tentando montar uma Marinha mais poderosa, mas sem ilusões de tomar os oceanos, é apenas para ter uma forma de proteger seu comércio marítimo caso os EUA deixem de fazer o serviço.

Vamos então para os céus. Aviões já desequilibravam guerras desde o tempo que eram feitos com madeira e pano. Com a Segunda Guerra Mundial, ficou claro que nada é tão poderoso numa guerra quanto sua capacidade de voar sobre o inimigo. Por mais que falemos de outras quantidades em análises sobre guerras, é o número de aviões e sua capacidade de colocar eles sobre o inimigo que realmente define o poderio militar de um país.

Os russos sabem disso e focaram quase todos seus esforços recentes nessa área. É o que mais se renovou desde que Putin assumiu o poder por lá. Os EUA têm mais de 1.500 aviões militares prontos para o combate, os russos vêm logo atrás com quase 1.200. É o tipo de diferença que dá vantagem para os americanos, mas não o suficiente para fazer com que a Rússia seja esmagada em questão de dias como os outros países que os americanos enfrentaram nas últimas guerras.

Novamente, o diferencial é o orçamento americano: os russos contam com alguns caças modernos, mas não na proporção dos americanos. Numa batalha rápida provavelmente seria próximo, mas quanto mais o tempo passa, mais evidente ficaria a vantagem americana. Mais caças modernos e muito mais capacidade de mantê-los funcionando.

E quando falamos de drones, aviões não-tripulados, a diferença é brutal: os americanos têm mais de 400 deles, os russos têm algumas dezenas. Drones são o grande avanço militar do século XXI. Os ucranianos estão conseguindo complicar muito a vida dos russos com meia dúzia de drones comprados da Turquia, imagine só o sofrimento do exército de Putin para lidar com os mais modernos do mundo vindo em ondas de centenas por vez? Um drone é muito rápido, difícil de abater e assume riscos imensamente maiores que qualquer aeronave tripulada. A guerra do futuro é a guerra dos drones. A Rússia ainda não está no futuro.

Temos que pensar também na lógica de uma guerra entre os dois países. Não se começa uma guerra aleatória, ela é baseada em alguma coisa. No caso mais recente, seria baseada na Ucrânia ou num país da OTAN invadido pelos russos. Isso é guerra de território num mundo cheio de regras e tratados militares: não é razoável achar que os americanos atacariam Moscou, por exemplo. Seria uma guerra onde aconteceu a agressão com o mundo todo olhando para recriminar se alguém subir demais o tom. Talvez numa disputa territorial num país com pouco litoral a Rússia conseguisse ser chata o suficiente para fazer os americanos negociarem antes de partir para uma guerra total como aconteceu no século passado entre Eixo e Aliados.

Perceberam que até agora eu não falei nada sobre armas nucleares? Foi por um bom motivo: armas nucleares são o grande equalizador quando falamos de guerras. Basta você ter uma para o seu adversário pensar mil vezes antes de entrar num conflito. Os russos contam até com mais ogivas nucleares que os americanos (oficialmente): quase 6.000 contra quase 5.500 dos americanos.

Qualquer um desses números é de deixar todo mundo de cabelo em pé numa guerra entre os dois países. Mas apesar da vantagem russa, isso não quer dizer exatamente que eles sejam a potência nuclear mais forte. Ogivas não querem dizer explosões no território inimigo: precisa lançar e acertar um míssil. Soltar bombas de aviões como os americanos fizeram no Japão é um risco imenso hoje em dia. O método de lançar essas bombas é baseado em mísseis intercontinentais (basicamente foguetes) e submarinos nucleares. Os russos têm um bom número desses submarinos, e é complicado achar um deles antes de ser tarde demais. Os americanos, é claro, têm mais ainda.

No quesito de lançar e acertar os mísseis, os americanos tendem a levar vantagem. Apesar dos russos terem desenvolvido tecnologia de mísseis hipersônicos (vulgo tão rápido que você tem pouca chance de pegar), isso não significa que dá para atirar todos assim, e muito menos que você não vai tomar centenas de bombas atômicas na cabeça em retaliação. O sistema americano de proteção contra mísseis nucleares é o melhor do mundo, porque eles estão investindo horrores nisso há décadas e décadas. O sistema russo é até capaz de pegar alguns mísseis americanos, mas dado o que é conhecido sobre a capacidade de ambos os países, é muito mais provável que os americanos acertem mais bombas nos russos do que os russos nos americanos.

O que na prática talvez não faça tanta diferença. Uma troca de explosões atômicas seria um desastre sem paralelos na nossa história. Mesmo que os russos sejam forçados a se render ou percam totalmente a capacidade de revidar depois dos primeiros, já é o suficiente para causar o caos no mundo. No final das contas, os russos não têm capacidade para vencer os americanos, mas conseguem fazer com que o custo dessa guerra seja tão alto que ninguém esteja minimamente interessado em começá-la.

E se serve de consolo para nós que estamos de fora disso, essa ideia de que uma guerra nuclear acabaria com o mundo é bem exagerada: o planeta Terra é enorme e o ser humano já segurou situações bem complicadas sem uma fração da tecnologia que temos agora. Sim, várias áreas do mundo se tornariam radioativas, mas não se esqueçam que vivemos concentrados em pequenas áreas desse mundo. Tem muito espaço para se realocar depois de uma guerra nuclear, e por motivos de logística básica, esse tipo de guerra não duraria mais que algumas dezenas de bombas trocadas: a primeira coisa que qualquer um faz numa guerra dessas é destruir o arsenal inimigo e sua capacidade de atacar de volta. Rapidamente teríamos um vencedor (quase que 99% de chance de ser os EUA) e o mundo teria que começar a lamber suas feridas.

Isso só é uma discussão por causa do arsenal nuclear e o medo de começar uma troca de bombas atômicas. Os EUA provavelmente venceriam em todos os cenários possíveis, mas em alguns deles o custo dessa vitória não vale a pena. É com isso que a Rússia conta e vai continuar contando enquanto tiver gente como Putin no poder. Isso vai longe.

Para dizer que prefere a Sally que responde a pergunta de verdade, para dizer que os russos são mais machos (fazia diferença antes da arma de fogo ser inventada) ou mesmo para dizer que diversidade é a fraqueza: somir@desfavor.com

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EUA, guerra, Rússia

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