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Somir Surtado: Parceiro virtual.

| Somir | | 48 comentários em Somir Surtado: Parceiro virtual.

O ataque de nervos da maior minoria do mundo ontem aqui na República Impopular me deixou pensando. Não no assunto da coluna de minha CARA per se, mas numa extrapolação nerd-futurística da famosa guerra dos sexos. Tenho a nítida impressão que todas essas tensões entre homens e mulheres tem data para acabar.

Não que eu acredite que estaremos vivos para presenciar esse momento praticamente utópico para nossas gerações, mas a conjuntura da evolução social e tecnológica humana parece nos carregar para esse estágio.

O meu argumento hoje passa pela probabilidade da maioria dos relacionamentos amorosos/sexuais da humanidade futura partir para o campo da virtualidade, não mais com outras pessoas, mas com inteligência artificial mesmo. Até porque não deixa de ser o que muita gente nesse mundo quer, inclusive com parceiros de carne e osso.

E se você ainda não se tocou que essa coluna (Somir Surtado) tende a ser bem chata para quem não gosta desse tipo de “viagem”, é hora. Não vai melhorar.

O ser humano JÁ tem uma tendência impressionante de formar laços afetivos tipicamente humanos com muitas outras coisas que não são outros seres humanos. Desde a pessoa (relativamente comum) que trata o bicho de estimação como alguém da família até o doido que acha que namora com uma personagem de desenho animado. Humanizar o que não é humano é uma constante de nossa mente, um exemplo “simples” é o surgimento da religião através da humanização do Sol.

Estou batendo nesta tecla agora porque quero deixar claro, logo de saída, que a base para tratar algo “não humano” como parceiro afetivo/sexual está presente em todos nós, embora isso não se manifeste dessa forma na grande maioria das pessoas. A mente humana pode funcionar assim.

Atualmente, temos um considerável grupo de pessoas percebidas como malucas por tratar objetos e personagens fictícios como interesses amorosos. E não é exclusividade masculina, por mais que pareça assim. Vou passar o link de dois documentários bacanas (mas que vão te dar um pouco de raiva/pena da humanidade), um sobre homens que mantém relacionamentos com bonecas “realistas”, outro sobre mulheres que se apaixonam por objetos aleatórios.

Para quem não teve saco ou não está com o inglês em dia, o primeiro acompanha a vida de homens que vivem com suas “Real Dolls”, bonecas de silicone de tamanho real, anatomicamente corretas. O segundo se chama “Casada com a Torre Eiffel”, e conta a história de mulheres que tem relacionamentos românticos com coisas que sequer lembram seres humanos. Como a mulher que se julga amante da Torre Eiffel. Até por falta de opção, são relações estritamente platônicas.

Evidente que em ambos os casos são pessoas com sérios problemas, que se cagam de medo de uma relação real e a possibilidade de rejeição ou decepção, mas tem um porém aí: Mesmo que de forma doentia, algumas das “qualidades” dos objetos estão nos desejos de muita gente que ainda não pirou completamente. Existe todo um fator de controle e satisfação egoísta que só mesmo os mais hipócritas diriam que não tem sua graça.

O “namorado da boneca” tem sexo (pelo menos o que ele julga como sexo) quando quiser, com múltiplas parceiras (pelo menos o que ele julga como parceira), do jeito que quiser. Ele não precisa fazer nenhuma manutenção na relação, não precisa nem mesmo tomar banho… Ele é dono da parceira e ela só existe para satisfazer o que ele quer satisfazer. A “esposa da Torre Eiffel” tem uma relação sólida (como o aço), nunca vai ser traída, nunca vai ser abandonada, nunca vai ser julgada (nunca vai ficar gorda)… Embora não sejam exatamente os mesmos desejos do cara da boneca, a questão do controle inquestionável ainda está presente.

Essas pessoas, ainda que por vias pra lá de transversas, conseguiram zerar a quantidade de conflitos de interesse em suas relações. E vamos concordar que são esses conflitos que realmente complicam os relacionamentos normais. De uma certa forma, estamos sempre tentando dirimir essa tensão, mas puxando a sardinha para o nosso lado. Numa briga de casal, sempre tem quem está certo e quem está brigando com você, não é mesmo?

Você deve estar pensando que mesmo assim, não vale a pena ter a palavra final se o custo é ser uma dessas pessoas. E eu concordo com você. Mas não podemos ignorar o fato de que a humanidade segue um caminho bem previsível de eliminar as dificuldades e pular direto para a sobremesa sempre que possível.

Estou jogando tudo isso para um bom tempo no futuro. Não imagine mais uma boneca estática. Imagine um andróide ou uma simulação de realidade virtual praticamente sem diferença (visível) de um humano real. Imagine a tentação de parceiros atraentes, obedientes e voltados exclusivamente para te satisfazer. Você pode até ser do tipo que não aceitaria uma covardia emocional dessas, mas pode botar a mão no fogo pelo resto da humanidade?

A mesma humanidade que já se rendeu a todo o tipo de vício, que está cada vez mais obesa, que está cada vez mais fútil (curtiu?)… Apesar de achar que o futuro tende a ser muito melhor para nós do que os tempos atuais, nada é de graça. A tendência de ficarmos cada vez mais orientados a buscar gratificação rápida em grandes quantidades está aí desde que o mundo é mundo. Ficamos melhores nisso, século após século.

E passar essa necessidade de relacionamento para um campo onde temos controle e aceitação em doses cavalares, sem nos esforçarmos por isso, me leva a acreditar que eventualmente a maioria das pessoas vai estar se relacionando com inteligência artificial, acabando com a maioria das tensões entre os sexos.

É tudo uma questão de quão simples e socialmente aceitável é entrar na onda. Vamos lembrar que há uns 15 anos atrás era loser até mesmo ter um computador. Hoje o estranho é aquele cara que não tem Facebook. Mudamos de opinião (como grupo) muito rápido quando as condições ficam propícias.

Hoje em dia se relacionar com inteligência artificial é vergonhoso, porque é complicado e as recompensas dependem demais de imaginação e investimento. Se a maioria das pessoas sequer conseguiria fazer, mesmo que quisesse, pode apostar que vai ter pressão social pelo conformismo. Mas os computadores estão ficando mais rápidos, menores, mais afeitos a interagir com os usuários… Os robôs estão aprendendo a enxergar, andar… Já existem vários experimentos de sistemas que conseguem ler e influenciar os impulsos cerebrais e motores… E tudo isso com uma tecnologia baseada num modelo arcaico de zeros e uns.

A tecnologia VAI chegar num modelo de parceiro romântico artificial viável para a maioria da população mundial. Não é mais SE, é QUANDO. Parceiros virtuais que podem assumir qualquer forma e topem todos os fetiches possíveis e imagináveis, esposa ou marido cibernético que estejam com o jantar pronto e ouvidos ávidos por tudo o que você quiser dizer (ou não dizer, no caso masculino) quando você chegar em casa. Várias opções, nenhuma obrigação de monogamia. Botão de desliga!

E eu imagino, nesse exercício de futurologia, que os homens vão ser os primeiros a abandonar o barco das relações tradicionais. A complexidade de uma mulher virtual que satisfaça um homem tende a ser bem menor do que o caso inverso. Cobrindo razoavelmente a parte sexual, vai começar a debandada.

Mas é claro que em pouco tempo elas começam a aderir, em peso. A tentação é forte, e com o mercado de homem ficando ainda mais difícil, logo elas estarão conectadas ou enroscadas com inteligência artificial. Vamos lembrar lá do começo do texto: A mente humana torna isso muito possível, mesmo que atualmente soe como maluquice.

Só para não perder a deixa: Provavelmente os programas para as mulheres serão BEM menos obedientes e prestativos do que os feitos para os homens, para que elas não percam o interesse. O modelo que chifra vai ser um dos mais vendidos.

E provocações baratas como essa serão coisa do passado. Sem a necessidade de entrar em conflitos para satisfazer a necessidade de conexão com alguém, homens e mulheres vão se enxergar de forma muito mais racional. Como lados da mesma moeda. Sim, são hormônios diferentes agindo de formas diferentes, mas na média, somos a mesma merda. A inteligência artificial que se vire com egoísmo, carência, insegurança e outros menos cotados.

A tecnologia vai resolvendo problemas, mas deixa suas marcas. Não precisamos mais produzir nossos alimentos, não precisamos mais passar frio ou calor, não precisamos mais nos deslocar fisicamente para todos os lugares, não precisamos mais sofrer com uma porrada de coisas que nossos antepassados não só precisavam lidar, mas também julgavam importantíssimas para formar caráter e ensinar sobre o valor das coisas.

Em muitos casos, até que tem fundamento. Começamos a desperdiçar e banalizar muitas coisas que poderiam fazer muito bem para uma pessoa. Em troca de facilidade.

Tenho a impressão, e sinceramente estou interessado em outras opiniões, de que esses relacionamentos românticos que tratamos como essenciais em nossas vidas ainda vão se tornar relíquias de um passado mais complicado. Desconfio também que um Somir da vida, daqui há muitos e muitos anos, vá chamar de hippies nojentos aqueles que ficam se encontrando para fazer sexo real e formar laços românticos com outras pessoas.

E que toda essa guerrinha dos sexos, com ambos os lados reclamando (muitas vezes sem a menor lógica, homens pra lá de incluídos) o tempo inteiro, ainda vai ser fruto de estudo de historiadores. E nem acho tão bizarro assim… Porque hormônios à parte, essa porra nunca fez muito sentido mesmo (vai dizer que não tem ninguém no seu passado amoroso que não consegue entender como foi parar lá?).

Vai ver toda essa mecânica de relacionamento amoroso entre dois seres humanos seja como uma daquelas histórias que só ficam divertidas se “você estava lá”. Estamos todos nessa realidade agora, mas eu não apostaria muito que meus possíveis tataranetos nasçam num mundo onde isso ainda será tão atrativo.

E mesmo que tudo isso soe viagem demais para você, lembre-se que só se faz uma previsão minimamente boa se você compreender como as coisas estão se desenvolvendo. Estamos caminhando para esse futuro “masturbatório”, e não é só pela tecnologia, é pelos desejos que financiam e impulsionam esses avanços.

Todo mundo está mais exigente. E nem sempre são exigências que levam em conta que nosso modelo de relacionamentos humanos atual precisa de OUTRA pessoa (conflito de interesses) para fazer sentido. Já vejo muita gente teimando que quer um parceiro “virtual”, mesmo que ainda nem sonhe com o conceito.

Para perguntar o nome da minha Real Doll, para dizer que minha previsão é estúpida e vai me esculachar no seu Facebook para os seus mil amigos, ou mesmo para dizer que estou também prevendo o fim da produção mundial de álcool: somir@desfavor.com

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