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Publiciotários: iPreço

| Somir | | 29 comentários em Publiciotários: iPreço

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Não vai ser DS, então vou aproveitar para tratar do assunto. Com muita pompa e babaquice, foram lançados oficialmente no Brasil os novos iPhones 5S e 5C (ênfase no oficialmente). (sub)Celebridades, histórias de malucos na fila para comprar e tudo mais que se espera de um evento consumista do tipo… Menos, é claro, gente que sabe o que diabos o aparelho que comprou faz ou deixa de fazer.

Olhando pelo lado apenas da tecnologia, a Apple já deixa a desejar faz alguns anos. O negócio de vender status ficou grande demais, esses novos celulares vem remontados a cada ano com mais desculpas para “renovar o guarda roupa” do que propriamente funcionalidades inovadoras. Comprar o novo iPhone é mais questão do antigo sair de moda do que qualquer outra coisa. A Apple anda preguiçosa desde que seu fundador ficou offline…

Olhando pelo lado dos lucros, só elogios. Vender praticamente a mesma coisa cada vez mais cara seguidas vezes para as mesmas pessoas? E essas pessoas achando o MÁXIMO? Quem diz que Steve Jobs era um gênio pela sua capacidade de inovação tecnológica claramente não entende muito de tecnologia ou de como o processo de criação nessa área funciona… Quase todas as sacadas da empresa nas últimas décadas tem muito mais a ver com sacadas comerciais do que com inovação propriamente dita.

Se é para chamar Steve e seu time de genial, que seja pela ideia de inventar toda uma nova categoria do que comprar para o cidadão médio. Antes da revolução fashion da computação encabeçada pela empresa da maçã, tecnologia de informação era basicamente o meio para um fim. Comprava-se um computador para se ter acesso às suas funcionalidades. Essa fase passou… Agora compra-se computadores, notebooks, tablets e celulares porque é isso que pessoas normais fazem.

Não tem mais um porquê claro e definido atrás desse tipo de consumo, é mais uma coisa para comprar. Ninguém mais te chama de maluco se você torrar milhares de reais com um celular… Muita gente diz que a grande arma da Apple para praticamente imprimir dinheiro a cada lançamento é a grife na qual se converteu. Isso com certeza ajuda, mas o cerne da questão está bem mais enraizado, foi um lento processo de convencimento popular em todas as camadas sociais.

Muito se engana quem acha que a explosão de Xing-Lings com o sistema operacional Android é um problema para uma empresa como a Apple, na verdade nada mais é do que a confirmação que o povo mordeu a isca e o negócio de vender essa tecnologia para quem nem liga para essa tecnologia está funcionando muito bem, obrigado. Quanto mais a concorrência vender, melhor.

Se você analisar as propagandas da Apple desde o retorno de Jobs, vai perceber que elas na verdade se concentram muito mais no mercado em geral do que no produto. A “popularização do nerd” não foi um merecido reconhecimento da sociedade para quem inventou basicamente tudo o que facilita sua vida, e sim parte de um plano bem maior. Essa coisa do geek entrar na moda foi empurrada goela abaixo da população, fruto de pesados investimentos em propaganda e uma esperta simplificação de uso dos equipamentos eletrônicos.

Solta uma campanha dizendo que usar essa tecnologia é coisa de gente bacana e descolada, faz o produto ser simples a ponto de um chimpanzé usar… Pronto! Mercado aberto. Os primeiros desesperados por atenção vão aderir ao movimento e lentamente ganhar mais companheiros até que soe aceitável fazer fila de dias na frente de uma loja para comprar o último pedaço de plástico e circuitos montados por escravos asiáticos…

Não é só o status que comprar esse produto agrega ao seu camarote, é a doce conformidade tão desejada por bilhões de pessoas nesse mundo. É ter o que comprar numa sociedade capitalista, é não se sentir deslocado do bando, é ter uma certeza do que é a coisa certa a se fazer. O ser humano em geral se caga de medo de fazer escolhas impopulares.

E a publicidade sabe disso. A Apple trabalha com um certo quê de elitismo em suas campanhas e produtos, mas consegue evitar vez após vez ser vista como uma marca de luxo puro. O dia em que iPhone for VISTO como artigo exclusivo para poucos e abastados, a empresa começa sua derrocada rumo à falência. Podem apostar que com a verba que tem e com os profissionais que pode contratar para fazer sua comunicação, se a Apple quisesse ser vista como a Louis Vuitton dos celulares e computadores, já seria.

O lance é ser popular e parecer que não é. Os diferenciais de marca da Apple servem para eliminar dúvidas na cabeça do consumidor, principalmente aquele que não sabe e nem quer saber sobre as peculiaridades tecnológicas do que está comprando. É ter o que comprar e ter uma escolha fácil na hora de botar a mão no bolso. E por incrível que pareça, é o alto preço médio dos seus produtos que permite essa popularidade toda.

Vejam bem, quem não entende patavinas sobre um produto quase sempre fica apenas com a questão do preço para definir sua qualidade. Os celulares lançados recentemente não são caríssimos só porque a Apple também se amarra num lucro abusivo, o preço existe aqui para não minar a já frágil confiança do consumidor médio no valor daquilo que compra. Imagino que se desse a louca na Apple e seus produtos caíssem todos para uma faixa de preço próxima dos chineses sem marca (ao contrário dos chineses com marca), isso faria a Apple vender MENOS. Não só em valor, mas em unidades.

Se o consumidor tiver que escolher entre diversos produtos de marcas distintas mais ou menos na mesma faixa de preço, ele fica inseguro. Ou não compra, ou começa a formular estratégias (algumas incoerentes) para não achar que desperdiçou seu dinheiro. Os mais interessados começariam a comparar as funcionalidades, os menos comprariam o que desse o maior desconto. O valor da marca é intangível demais por si só.

Não digo que os produtos da Apple sejam ruins, eu não gosto muito, mas há de se admitir que costumam ser bem feitos e até bem pensados. Só que sem a pecha de ser o melhor que tem e sem custar o equivalente a essa ilusão (tem muita coisa bem feita nesse mercado, Apple é só mais uma das marcas com essa capacidade), o cidadão não abriria a carteira com tanta disposição. As pessoas querem comprar confiança e a sensação de pertencimento… E isso a Apple sabe vender como poucos.

Se o produto fosse a estrela, podem apostar que as pessoas não trocariam de celular a cada novo modelo lançado. O produto é o de menos, é o que se pensa dele que vale o investimento. Se a Apple quisesse te vender a versão 4 do iPhone como o pináculo da tecnologia moderna e como produto essencial para sua vida NA PRÁTICA, conseguiria. Mas a que custo? Se seus consumidores se sentirem seguros até mesmo depois do lançamento de uma nova versão, duvido que venderiam tanto. Duvido que cidadão economizasse por anos pra trocar pela versão 5. Quando o consumidor coloca a mão no bolso para comprar algo tão abstrato quanto o número que vem depois do nome de um produto, o mercado inteiro sorri.

Uma das minhas maiores críticas à publicidade é a mania de transformar produtos em ideias genéricas, a indústria da aspiração da qual já falei seguidas vezes nesta coluna é resultado direto dessa abordagem distrativa tão em voga no mercado. Vendem tudo menos o produto. Mas ao mesmo tempo, é essa a forma com a qual a propaganda consegue ir mais longe como comunicação e passar ideias direto para a mente das pessoas. É um grande poder usado a abusado com cada vez mais frequência.

Uma sociedade cada vez mais superficial e consumista com certeza influi no sucesso de iCraps da vida, mas há de se reconhecer mérito onde ele existe: Foi um plano longo e caprichado até chegarmos nesse ponto. Vender algo como o mero alívio de finalmente ter o produto da moda pode te deixar rico, vender a ilusão de que algo assim pode ser comprado pode te deixar bilionário.

Para dizer que eu só tenho Enveja do seu celular chinês dourado, para discutir a grafia de Xing-Ling, ou mesmo para dizer que ser nerd nunca vai estar na moda (pura verdade): somir@desfavor.com

Comentários (29)

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