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Colunas

Escrevendo um texto.

Como escrever um texto gostoso de ler e que prenda a atenção do leitor? Provavelmente existe mais de uma forma, mas eu vou falar da forma que eu conheço. Serve para um tweet, serve para uma tese de mestrado. É uma base para uma comunicação eficiente e que seja agradável de ler: um texto fácil de compreender sem ser prolixo.

Como eu disse, não é a única forma e não acho que ninguém deva ficar preso a ela. Encare estas dicas como uma rede de segurança: quando você que ter certeza de que sua mensagem chegou redondinha ao interlocutor, se agarre nesta fórmula.

“Quais são as suas fontes para falar sobre o assunto?”. Minha fonte é Arial 12. Absolutamente tudo que está aqui saiu apenas da minha cabeça. Você não vai achar isso em livros. Por um lado, é arriscado, uma vez que eu não sou uma autoridade no assunto, mas por outro, é muito mais valioso, pois é uma dica que só você vai ter. Teste: se funcionar, use. Se não funcionar, passa amanhã que tem outro texto bem legal.

E eu mesma te digo que por mais que a fórmula dê certo, não é recomendável não passar a vida preso a ela. Muito pelo contrário, depois que ela estiver internalizada e você a executar com perfeição, é muito divertido brincar com ela, subverter sua ordem, inovar. Mas, para correr, é preciso antes aprender a andar. Faça o básico bem-feito, depois você ousa.

O primeiro passo é definir qual será o tema. O tema é o assunto sobre o qual você vai falar. Escolher um tema pode ser mais difícil do que parece, pois as pessoas tendem a escolher assuntos que são interessantes para elas, mas que nem sempre são interessantes para os outros. E nós só escrevemos para nós mesmos quando fazemos um diário, então, é preciso considerar o interesse do leitor. Por isso, na hora de escolher um tema, se pergunte “como isso vai beneficiar quem está lendo?”.

Não significa que todos os seus textos tenham que ser palestrinha, com fins educativos. Um texto pode beneficiar uma pessoa de diferentes formas: pode fazer com que ela ria, pode fazer com que ela se divirta, pode mostrar um novo ponto de vista que até então não foi levantado, pode levar informação simplificada, pode induzir à reflexão, pode atualizar sobre informações novas, pode ensinar algo… pode basicamente tudo. Então, todo tema é válido, desde que ele gere um ganho para quem lê.

Continua na dúvida se um tema é interessante ou não? Converse com pessoas. Converse com o público para o qual você quer escrever e até peça sugestões de temas. Para quem escreve de forma contínua, pauta é o pior pesadelo, pois chega uma hora em que você tem a impressão de que já falou sobre tudo. Nada como ouvir os temas que são de interesse do seu público.

O tema do texto é um bom começo, mas não é tudo. Muitas boas ideias e muitos temas interessantes se transformam em textos sem força, sem apelo, sem didática que acabam não surtindo o efeito esperado. Sim, você precisa escolher um tema e a escolha do tema é importante, mas tem algo ainda mais importante do que isso, que é a alma do seu texto: que mensagem você pretende passar com ele?

A mensagem vai ser o seu fio condutor, não o tema. A mensagem costuma ser algo mais abrangente do que o tema, é o ponto sobre aquele tema que você quer compartilhar.

Em alguns casos a mensagem de fato é o próprio tema, mas em outros pode não ser. Um exemplo: você quer fazer um texto sobre “Bolo de Chocolate”. Se a mensagem que você quer passar é explicar aos outros o que é um bolo de chocolate (falar dos ingredientes, do preparo, do resultado final), neste caso, o tema e a mensagem são os mesmos.

Mas, um mesmo tema pode passar muitas mensagens diferentes. Um texto com tema “Bolo de Chocolate” pode ter outras mensagens. Por exemplo, a mensagem de que ele é a melhor sobremesa do mundo (caso no qual você explicar os motivos pelos quais essa sobremesa é superior às outras), pode ter como mensagem sua relevância social (caso no qual você vai explicar suas origens e como esta sobremesa impacta na cultura e na sociedade atual), pode ter como mensagem que você faz o melhor bolo de chocolate do mundo (caso no qual você vai explicar por qual motivo o seu bolo é o melhor).

Basicamente, um mesmo tema pode ter infinitas mensagens. Então, além de definir o tema sobre o qual você vai falar, não comece a escrever até definir qual é a mensagem que você quer passar com esse texto.

Sempre mantenha presente na sua mente qual é o tema do seu texto (assunto) e qual é a mensagem que você pretende passar por ele. Se preciso for, antes de começar a escrever, anote em um papel o tema e a mensagem e, de tempos em tempos, a cada parágrafo escrito, olhe e se pergunte: “este parágrafo contribuí para falar sobre o tema e chega na mensagem que eu quero passar? Você vai se surpreender com a quantidade de parágrafos que não convergem nem com o tema nem com a mensagem.

Uma vez definidos e sempre presentes o tema e a mensagem, você vai começar com um parágrafo ou uma frase de introdução. Algo curto e que deixe claro ao leitor qual é o tema do seu texto. Se possível, algo que aguce a curiosidade e faça com que o leitor tenha vontade de ler tudo, até o fim, para saber mais sobre o assunto.

Mas, por favor, por favorzinho, sem usar iscas falsas para isso. Se o tema não é interessante o suficiente para prender a atenção do leitor por si só, pense em outro tema melhor em vez de inventar uma introdução sensacionalista. Faça o que fizer, durante todo o texto, não traia a confiança do leitor. Entregue tudo que você prometeu.

Exemplo didático: quero fazer um texto sobre baleia azul com a mensagem de que este é um animal muito interessante. Uma boa introdução seria: “Hoje vamos falar sobre a baleia azul e compartilhar com você informações sobre o maior mamífero do planeta que vão te surpreender!”.

E de fato, dê informações surpreendentes. Nada de repetir que é o maior mamífero do planeta, isso não é surpreendente, isso já foi dito na introdução. Surpreendente é dizer que o pênis da baleia azul é maior do que o leitor, podendo chegar a 2,7 metros de comprimento e 22 centímetros de diâmetro, com um peso que varia entre 170 e 400 quilos. Em uma única ejaculação, a baleia-azul é capaz de liberar entre 30 e 40 litros de esperma. Você está surpreso? Eu fiquei quando li.

Exemplo do que não fazer: mentir, iludir usar de iscas, coisas como “Venha conhecer informações secretas que mais ninguém conhece sobre a baleia azul!”. Feio, muito feito. Talvez esse texto até consiga uns cliques a mais, mas, quando as pessoas entrarem e perceberem que não tem nenhuma informação secreta, elas nunca mais vão querer ler um texto seu. Não se provoca sensação de desilusão no leitor, para isso já basta a vida.

Depois de fazer uma introdução curta, começa o desenvolvimento do assunto. São parágrafos onde você vai falar sobre o tema sempre com o enfoque da mensagem que você quer passar. Quantos são? Depende de você. Em um texto clássico são 2 ou 3, mas podem ser mais ou menos, dependendo do que se escreve e para quem se escreve.

O importante é que no primeiro parágrafo (ou nos primeiros) você dê ao seu leitor todas as informações e ferramentas para que ele compreenda o seu raciocínio, que virá nos parágrafos seguintes. Sair falando sobre o tema presumindo que todo mundo tem o conhecimento necessário para acompanhar o seu raciocínio é uma causa frequente de impopularidade de textos.

Como saber até que ponto você deve explicar o tema? No Brasil, faça a seguinte pergunta, se não se tratar de um púbico especializado: o que a minha sobrinha de dez anos sabe sobre isso? O que uma criança de dez anos não souber, deve ser explicado, de forma didática e resumida.

E por falar em didática e resumo, esses também são pontos nos quais as pessoas falham miseravelmente. Para que uma explicação seja boa ela não deve ser longa nem deve usar termos rebuscados. Imagine-se explicando o assunto para uma criança (se não for um público especializado), pois, geralmente, essa é a mentalidade e a capacidade de foco do leitor médio.

Exemplo didático: quero fazer um texto onde o tema são vacinas, onde a mensagem é que elas são boas. Devo começar pincelando rapidamente sobre o que são vacinas. Eu vou falar de tipo de vacina? De RNA Mensageiro? De Vetor Viral ou Vírus Inativado? Só se eu quiser que o leitor abandone o texto.

Começa-se no básico do básico e só depois de aprofunda, assim você pega o leitor pela mão e permite que ele acompanhe seu raciocínio. E, o básico do básico sobre vacinas é algo como “vacina é uma forma que a ciência descobriu de treinar o nosso corpo contra invasores, ela leva informação sobre a doença que deve ser atacada e prepara nosso corpo para combatê-la se um dia tiver contato com ela”. Só depois se aprofunda.

“Mas Sally, eu quero escrever sem explicar, quem não entender foda-se”. Nesse caso, saiba que você está escrevendo para você mesmo, e não para o público. Escreve em um diário que é melhor.

Uma vez que você fez uma introdução deixando claro qual é o tema e instigando a curiosidade do leitor e fez um parágrafo explicando as informações básicas para que o leitor entenda o tema e acompanhe o seu raciocínio, chega a hora de você desenvolver o tema.

Desenvolver o tema é abordá-lo de acordo com a mensagem que você quer passar. E é nessa hora que a maior parte das pessoas se perde. Lembra que eu te falei para anotar o tema e a mensagem que seu texto quer passar? Agora é hora de olhar para essa anotação, ela vai ser o fio condutor da sua escrita.

Normalmente, as pessoas que se perdem no que estão dizendo, cujas palavras começam a vagar de forma desordenada, esquecendo do tema, da mensagem, ou de ambos. Tudo que não é necessário para esclarecer sobre o tema e contribuir para sua mensagem deve ser cortado.

Exemplo didático: quero escrever um texto sobre o Flamengo e minha mensagem é que o Flamengo é um dos times de futebol mais importantes do Brasil. Um texto coerente vai desenvolver algo nesta linha: “Flamengo é um time tradicional, com mais de cem anos de existência, tem a maior torcida do Brasil e detém títulos importantes, nacionais e internacionais”.

Vamos esmiuçar o que foi dito, pensando no tema (Flamengo) e na mensagem (é um dos times de futebol mais importantes do país). 1) ser um time tradicional com mais de cem anos de existência é sobre o Flamengo? Sim. Ser tradicional torna um time mais importante? Sim. 2) Ter a maior torcida do Brasil é sobre o Flamengo? Sim. Ter a maior torcida do Brasil confere importância a um time? Sim. 3) Ter muitos títulos importantes é sobre o Flamengo? Sim. Ter muitos títulos confere importância ao time? Sim. Ótimo, está tudo de acordo com o tema e com a mensagem.

Agora vamos pensar no que não fazer com o mesmo tema (Flamengo) e a mesma mensagem (é um dos times de futebol mais importantes do país): “Flamengo é o melhor time de todos, toda a minha família torce para o Flamengo e o Flamengo meteu muita goleada no Vasco”.

Vamos esmiuçar o que foi dito, pensando no tema (Flamengo) e na mensagem (é um dos times de futebol mais importantes do país). 1) Flamengo é o melhor time de todos é sobre o Flamengo? Sim. Ser considerado o melhor de todos por você confere importância ao time? Não, desculpa, mas opinião pessoal não é argumento para determinar relevância de time de futebol. 2) Toda a sua família torcer para o Flamengo é sobre o Flamengo? Não, é sobre a sua família e, a menos que você esteja escrevendo uma biografia sua, não cabe no tema. Sua família torcer para o Flamengo o torna um dos times mais importantes do país? Não, sua família não é uma forma de mensurar a importância de um time e 3) Flamengo meteu uma goleada no Vasco é sobre o Flamengo? Sim. Flamengo meter uma goleada no Vasco o torna um dos times mais importantes do Brasil? Não, até a CSA, na segunda divisão, meteu goleada no Vasco.

Releia cada frase, cada parágrafo e se pergunte: “isso é sobre o tema que eu escolhi?”. Depois releia cada frase e cada parágrafo e se pergunte “Isso é argumento/informação que reforça a mensagem que eu quero passar?”

“Mas Sally, se eu fizer isso minha vida vira um inferno e eu demoro 17 horas para escrever um texto!”. Não. No começo vai demorar um pouco mais, porém, se fizer isso sempre e praticar, em pouco tempo tudo isso que eu falei aqui se torna automático e você começa a fazer sem sequer precisar pensar nisso.

O começo de escrita é difícil para todo mundo, foi difícil para mim também, mas o começo de tudo é difícil. Quando esse modelo entrar no seu sistema, quando ele sair automático, aí você não vai fazer o menor esforço para escrever assim – e vai poder começar a brincar de fugir dele.

Uma dica genérica: sempre que tiver que explicar algo que pode ser de difícil compreensão, algo complicado, algo muito abstrato ou algo que saia da zona de conforto do seu público, se possível, dê exemplos e use metáforas ou qualquer comparação que ajude as pessoas a visualizarem o que você está falando. Quando escrevemos um texto é nossa responsabilidade que o interlocutor nos entenda, se ele não nos entender, a falha é nossa, não dele.

Exemplos facilitam a compreensão. Seu texto não tem que ser um desafio para quem lê, tem que ser um prazer. E o cérebro humano ativa as recompensas da sensação de prazer quando aprende uma informação nova, quando identifica coerência na argumentação e quando sente que pertence a um grupo de forma positiva (ao grupo dos que entenderam o texto, e não ao grupo dos que não entenderam o texto).

Você pode e deve dar o seu “tempero” pessoal ao texto. Alguns inserem alívios cômicos fazendo pequenos comentários divertidos, outros escrevem de forma mais incisiva, enquanto outros preferem inserir toques de cultura geral relacionados ao tema. Conheça o seu público e aprenda o que funciona melhor com ele, ainda que seja na tentativa e erro. E espere estar craque na escrita para começar a experimentar.

Quando você pegar a prática de escrever de forma coerente, clara, lógica e precisa, pode inserir seus toques também. Mas, nunca se esqueça: o objetivo de um texto é que ele seja compreendido e que ele seja apreciado (que seja agradável de ler e acrescente algo ao leitor), nunca exibir o seu conhecimento, erudição ou estudo.

Se o texto permitir, desenvolva o tema de forma crescente: comece com as informações menos impactantes/surpreendentes/fortes e vá em uma crescente, deixando as de maior impacto para o final. Lembrando que nem sempre o texto vai permitir isso, quando não couber no seu texto esse formato, não force. Por exemplo, quando você está contando uma história, deve, via de regra, respeitar a ordem cronológica. Mas, se não comprometer a coerência e a compreensão do texto, tente colocar ele em ordem crescente.

Exemplo didático: vamos supor que eu vou falar dos absurdos cometidos pelo Bolsonaro durante a pandemia. Se eu começar falando que ele deixou morrer 600 mil pessoas pela recusa em comprar vacina e optou por distribuir medicamentos ineficazes contra covid e depois falar que ele correu atrás de uma ema com uma caixa de Cloroquina na mão, a segunda informação parece irrelevante. Porém, se eu começar leve, dizendo que ele correu atrás de uma ema com uma caixa de Cloroquina na mão e desenvolver até chegar ao ápice onde revelo que ele deixou morrer 600 mil pessoas, encerro o texto em alta.

Minha mensagem não é a de que ele cometeu atrocidades na pandemia? Um texto eficiente termina com as pessoas indignadas com o que estão lendo, portanto, eu encerro com a informação mais forte, aquela que tem mais peso para corroborar com a minha mensagem.

Por sinal, é sempre bom encerrar um texto em alta, o que nos leva a mais uma dica: saia enquanto está ganhando. Saia quando o leitor está impactado, chocado, surpreso ou maravilhado com o que você disse. Saia depois da sua cartada mais alta, pois isso dará ao leitor a sensação de “quero mais”, de “estava muito bom e acabou”. Prolongar o texto até que ele vá perdendo força é dar a ele uma morte lenta e dolorosa.

Para finalizar, vem a conclusão, que deve ser, assim como a introdução, curta: um parágrafo ou uma frase. Na conclusão você amarra tudo que foi dito: o tema do texto à mensagem que você quer passar. Quanto mais forte for a sua conclusão, quanto mais ela mexer com o leitor, quanto mais ela marcar e for lembrada, melhor.

A conclusão é a cereja no sundae, não pode ter caráter explicativo ou argumentativo. Se falou explicar ou argumentar algo, então você errou no desenvolvimento. A conclusão é um simples fechamento que resume o texto todo e reforça a mensagem que você pretendeu passar com ele.

Um exemplo de conclusão, para aquele texto onde o tema é “Flamengo” e a mensagem é convencer o leitor de que ele é um dos times de futebol mais importantes do país: “O Flamengo tem a tradição, o público, as conquistas, a arrecadação, a fama, a qualidade de futebol e a mídia infinitamente superiores à média dos times brasileiro, tornando inegável que ele é um dos times mais importantes do país”. Resumiu tudo, falou do tema e reforçou a mensagem.

Despeço-me de vocês por aqui, pois já passei do meu limite permitido de páginas e recomendo fortemente que ao menos tentem estas dicas e comparem seus textos antes delas com os depois. Espero de coração que seja útil para alguém e, se é que vale de alguma coisa, saibam que as pessoas que eu treinei para o ENEM tiraram nota máxima na redação.

Para dizer que o Flamengo não é um dos times mais importantes do Brasil, para dizer que você parou de escrever e só se comunica por emoji ou ainda para dizer que só te pagando muito bem você se dá ao trabalho de fazer essa palhaçada toda: sally@desfavor.com

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argumentação, escrita

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