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Q.I. nacional.

Q.I. nacional.

| Somir | | 20 comentários em Q.I. nacional.

Pesquisando pelo Q.I. médio do brasileiro, normalmente você vai encontrar o valor de 87 ou 89. São dados retirados de estudos internacionais mantidos por entidades que aplicam esse tipo de teste. Eu poderia começar este texto dizendo que é complicado cravar que esses são mesmo os resultados reais considerando o tamanho da amostra, a periodicidade deles… mas talvez o pior problema desse número é que ele parece mesmo retratar a realidade.

Em primeiro lugar, vamos tentar tratar o Quociente de Inteligência como ele deve ser tratado, como uma das formas de analisar um ser humano. É uma métrica entre tantas outras, não é sinônimo de sucesso, felicidade ou mesmo capacidade de produção ou comunicação, é apenas uma medida razoavelmente boa da capacidade de percepção de padrões do cérebro humano. Perceber e completar padrões tem sua importância porque é mais ou menos o modo como o ser humano lida com informação, mas você pode considerar que um Q.I. alto é como ter um motor poderoso no seu carro. Não quer dizer que o carro seja bom, não quer dizer que o resto das peças funcione direito com o motor, não quer dizer nem que é um carro rápido.

Como sempre, é importante ter condições e capacidade de usar essa potência. Uma pessoa com 90 pontos de Q.I. que nasce numa família de pessoas bem-educadas e com condições financeiras para gerar estímulo intelectual nela provavelmente vai se dar muito melhor na vida do que uma com 120 nascida numa comunidade carente. Talvez se você converse com as duas pessoas depois de adultas, a de 90 até soe mais inteligente.

Mas a crueldade da realidade é outra: pessoas que tem vantagens prévias acabam acumulando mais e mais vantagens. O exemplo do parágrafo anterior não costuma acontecer; na verdade, a Q.I. acaba refletindo e muito a condição de vida da pessoa e de seus antepassados diretos. Cérebros não são criados de forma igualitária porque não existem condições igualitárias para a humanidade em geral.

Então, voltando ao Q.I. médio do brasileiro: sim, faz muito sentido que ele esteja nessa faixa entre 85 e 90, porque vemos uma sociedade que age dessa forma. Ao invés de falar sobre inteligência, vamos ficar no ponto mais básico de reconhecimento de padrões: dizem que o brasileiro não tem memória, que é incapaz de melhorar, que acredita em qualquer besteira… todas as coisas diretamente relacionadas com reconhecimento de padrões.

Reconhecer um padrão pode ser feito da forma como os testes de Q.I. fazem, te apresentando uma sequência e te pedindo para descobrir qual seria a próxima; mas também é algo que fazemos o tempo todo com as informações recebidas pelo mundo. Se você consegue prever o que vai acontecer com base nas informações recebidas no passado, você toma decisões melhores.

Se você não consegue reconhecer padrões, a sua vida fica muito mais… aleatória. As coisas que acontecem parecem não ter motivo, ou parecem ter algum motivo místico indecifrável. Pessoas que reconhecem padrões tendem a ser menos supersticiosas e religiosas em geral: há sim uma correlação forte entre ceticismo e Q.I., porque a pessoa com maior capacidade de perceber a relação entre as coisas fica com muito menos dúvidas sobre o que está acontecendo ao seu redor. Se você entende o conceito de rotação do planeta, não precisa mais achar que é Deus que está fazendo o Sol nascer toda manhã, não?

Então, ao invés de simplesmente declarar que o brasileiro médio é burro, eu prefiro ser mais específico: o brasileiro médio não consegue perceber muitos padrões, muito menos fazer previsões baseadas neles. E isso é extremamente limitante para tocar um país pra frente. Se você não sabe o que deu errado ou porque deu errado, a sua tendência é continuar tentando mudar as coisas na base do chute. Sai Lula, entra Bolsonaro, sai Bolsonaro, entra Lula. Não percebem o padrão comum entre os dois (personalização do poder) e continuam girando a roleta sem lidar com o problema.

Ter um Q.I. alto não significa que você saiba o que fazer com ele, mas dadas as condições certas, ele permite que você passe desse nível de “morar num cassino” e comece a tomar mais controle sobre sua vida. Corrupção, incompetência e violência são resultados diretos de uma sociedade que não consegue enxergar as consequências dos seus atos, ou, como estou dizendo aqui com o Q.I., o próximo item na sequência lógica.

A pessoa que quer fazer as coisas do jeito certo fica sem capacidade de realizar ações lógicas consistentemente e pior: não consegue julgar as ações dos outros por essa mesma ótica. Mas veja só, se você não estiver prestando atenção nessa questão de reconhecimento de padrões, pode até se enganar achando que tem uma compensação na esperteza, como se o brasileiro tivesse trocado o pensamento de longo prazo pelo de curto para levar vantagem. Mas isso é dar muito crédito para pouca coisa.

Não foi uma troca, o brasileiro médio preso nessa média de Q.I. não tem escolha a não ser essa “esperteza”, pensar rápido com os dados disponível naquele momento. Esperteza por esperteza, sabe quem dá um show no ser humano médio? O chimpanzé. A memória de curto prazo dos nossos primos é absurdamente superior à nossa, eles conseguem fazer exercícios de memorização rápida com uma capacidade que nem o melhor dos humanos consegue. Essa esperteza de reagir muito rápido só com as coisas que estão diretamente na sua frente é uma característica importante para a sobrevivência, mas a história da humanidade é baseada na troca dessa esperteza pela inteligência de reconhecimento de padrões no longo prazo.

Só que para fazer essa troca e começar a enxergar o “quadro geral”, a pessoa precisa de muitas facilidades para sobreviver. É aqui que eu volto ao argumento do Q.I. da pessoa ser muito resultado do seu ambiente. Ficar fazendo planos de longo prazo e analisando a situação ao seu redor só faz diferença se sua barriga está cheia e você tem segurança de que vai estar tudo bem no futuro. Se não, você provavelmente vai ter um Q.I. baixo e vai criar mais pessoas de Q.I. baixo. Não porque você é uma pessoa ruim ou incapaz, mas porque seu cérebro não vai te deixar na mão no meio de uma situação de crise. A meta é sobreviver agora, não amanhã.

Poderíamos aposentar o Desfavor com um texto de um parágrafo dizendo que os problemas do Brasil são baseados em baixo desenvolvimento intelectual e que só MUITO tempo corrige isso, mas claramente não estamos desistindo, porque o mundo parece não ter desistido também. Agora entra a parte que sempre gera discussão aqui: mesmo que aos trancos e barrancos, a média geral de Q.I. aumenta em todos os cantos do mundo; teve até a história do Brasil estar em queda, mas é bom prestar atenção no fato de que não se fazem muitos testes aqui e alguma variação pode acontecer com amostras pequenas.

É normal ficar desanimado com a incapacidade desse povo de não cair sempre nas mesmas armadilhas, por ter imensa dificuldade com reconhecimento de padrões e previsões realistas, mas não é para achar que isso é eterno. Nada é. O Q.I. médio do brasileiro alguns séculos atrás deveria ser muito menor, como também era na maior parte do mundo. Condições socioeconômicas impactam, e muito. Isso aqui era um país de índios e escravos com meia dúzia de psicopatas europeus durante séculos e séculos, essas médias baixas de Q.I. não são um raio que só caiu aqui. Quase todos os países do mundo nas mesmas condições sociais e econômicas estão num barco parecido.

E tem toda uma questão de tratamento de crianças em civilizações mais atrasadas que causa problemas terríveis para a inteligência média dos cidadãos. Tem que fornecer elementos básicos como alimentação, segurança e saúde, além de ter muito estímulo positivo (intelectual e emocional) para extrair o potencial de um ser humano. Se uma civilização não se “dá ao luxo” de tratar suas crianças muito bem, mas muito bem mesmo, não tem como subir a média geral de Q.I. e formar adultos menos dependentes de “esperteza símia” (somos todos macacos) e mais aptos a lidar com pensamento de longo prazo.

O Brasil tem muitos problemas, mas o principal deles é mesmo o povo. Mas eu não quero que a imagem que fique para nós que temos mais condições de sair da média seja de que as pessoas são ruins ou não querem melhorar. O brasileiro médio com 87 ou 89 pontos de Q.I. tem dificuldades mecânicas mesmo de relacionar causas e consequências, as informações ficam todas espalhadas na mente e não viram padrões. Tudo o que você diz para essa pessoa é tratado da mesma forma, e informações não se contradizem, porque raramente são comparadas e colocadas em alguma ordem.

Até um certo ponto de desenvolvimento dessa capacidade intelectual, não me parece nem uma escolha da pessoa entrar nessa loucura de polarização ou mesmo se acomodar em situações terríveis como o brasileiro tende a fazer: não tem de onde tirar uma reação melhor. Não tem solução da noite para o dia com esse povo, mas não significa que não exista mérito em tentar explicar as coisas e desfazer essa neblina mental do povo. Tem, mas os resultados são visíveis no longo prazo.

Existem padrões visíveis no desenvolvimento da nossa sociedade, padrões de evolução intelectual lenta, mas constante. Padrões de aumento de altruísmo e pensamento de longo prazo para populações que passam por menos dificuldades financeiras, que tem acesso a educação e liberdade de expressão. Enxergar o mundo como ele é agora sem considerar o antes e o provável depois é sinal de que você não está usando o seu Q.I., apenas reagindo a um mundo aparentemente aleatório e sem sentido como boa parte da população mundial é obrigada a enxergar por falta de oportunidades.

Se você tem a chance de trabalhar com o seu Q.I. num nível maior e perceber padrões, aproveite. Aproveite para se destacar e aproveite para não ficar tão desesperado com a situação do mundo atual. Olha para o padrão, conecte os pontos, perceba como as coisas são muito maiores que uma notícia ruim ou um problema momentâneo. As pessoas que ficam pregando que a humanidade está acabando são as pessoas que querem menos inteligência e mais esperteza. Inteligência derruba ditadores, esperteza os coloca no poder, adivinha qual delas quem está no poder quer incentivar?

Para dizer que nunca vai ceder ao meu argumento, para dizer que seu Q.I. Esportivo discorda, ou mesmo para dizer que não é burro, só não se importa: somir@desfavor.com


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