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Colunas

FAQ: Coronavírus – 56

Foi só dar problema hepático em criança que vocês pararam de falar sobre vacinas, né? Muito conveniente…

Vamos desmentir esta fascinante afirmativa por partes.

O último FAQ foi em março deste ano (FAQ 55), os casos de hepatite em crianças começaram, pelo menos, 30 dias depois. Não teve FAQ nesse intervalo de tempo por não ter nada de novo a dizer, uma vez que estamos naquele período entre ondas. Como estamos começando a ver um novo aumento de casos no mundo, que pode indicar uma nova onda se formando, retomamos o FAQ.

Sobre tentar vincular vacinação de crianças a casos de hepatite, ou é muita desinformação ou é muita falta de caráter: a faixa etária onde esses casos de hepatite sem explicação estão surgindo é uma faixa etária para a qual ainda não existe vacina contra covid-19 (zero a cinco anos de idade). Então, para que fique bem claro: as crianças que estão apresentando esses casos de hepatite não estavam vacinadas.

Os casos de hepatite aguda que estão afetando crianças em diferentes países do mundo ainda são um mistério sem explicação. Para quem não sabe do que estamos falando, uma onda de casos de hepatite em crianças está intrigando a comunidade médica: as crianças apresentam a doença, mas nenhum dos cinco vírus de hepatite conhecidos foi encontrado nos exames de sangue. Em alguns casos, a doença aparece de forma tão violenta que a criança precisa de transplante de fígado.

A faixa etária média das crianças que estão desenvolvendo esses casos de hepatite é três anos de idade, ou seja, uma criança que ainda não poderia tomar a vacina contra covid-19. “Mas Sally, essa é a média, será que as crianças mais velhas não tomaram a vacina?”. Não. Isso foi oficialmente descartado. E não falo de países bostas, no qual não se pode confiar. Países sérios descartaram essa possibilidade. Por exemplo, a agência britânica de saúde UKHSA diz que a vacina contra covid é “a única coisa que pode ser descartada definitivamente no momento porque nenhuma das crianças afetadas recebeu nenhuma dose dela”.

Também estão culpando a quarentena, mas não existe nenhuma prova concreta disso. Em muitos casos, seque faria diferença a quarentena, pois são crianças tão novas que nem chegaram a pegar quarentena. E também existem casos no Brasil, um país onde nunca houve quarentena, por mais que o brasileiro teime em dizer que houve.

O que pode ser essa hepatite? Existem muitas suspeitas, as principais são um novo adenovírus ou uma sequela da Ômicron (sim, nós acentuamos Ômicron por ter horror a ver gente falando Omicrón) que só começamos a ver agora. Mas são apenas suspeitas, não é possível afirmar nada até aqui. Imagino que em breve sairão estudos que esclareçam o que está acontecendo. Até lá, vamos deixar de lado o viés de confirmação e parar de acreditar em qualquer merda que fale contra as vacinas e vamos ter a decência de dizer “não se sabe de onde vem, mas se sabe que não vem das vacinas”.

Sobre as crianças que estavam vacinadas, o que podemos dizer é que já temos estudos e dados que vem do próprio Poder Público, aquele que questionou a segurança das vacinas: no Brasil, nem uma única criança ou adolescente morreu por causa da vacina contra covid-19, o que é perfeitamente compatível com tudo que dissemos até aqui: vacinas são seguras, vacinas salvam vidas.


O que é Ômicron XQ?

É mais uma derivação da Ômicron: uma combinação das sublinhagens BA.1.1 e BA.2 da Ômicron. Ao que tudo indica, essas duas sublinhagens se fundiram, criando uma nova. Vamos explicar com calma.

A Ômicron é uma nova variante, mas suas sublinhagens não são consideradas variantes (até aqui). Só é variante um vírus que seja muito diferente dos anteriores, com características próprias. Quando é o mesmo vírus, com pequenas diferenças, se considera uma sublinhagem.

Vamos pensar em raças de cachorro. Um poodle pode ser branco ou ser preto. Não deixa de ser um poodle por mudar de cor. Mas se for um cão maior, orelha em pé, focinho longo, vai deixar de ser chamado de poodle e passará a ser chamado de Pastor Alemão. As sublinhagens da Ômicon são apenas poodles de cores diferentes, não são uma nova raça de cão.

Hoje temos muitas sublinhagens de Ômicron, essa variante parece ser muito boa nisso. A Ômicron clássica é o BA.1, a outra modalidade mais conhecida é a BA.2, que circulou na Europa. Depois vieram BA. 3, BA. 4 e BA. 5. E agora, a XQ, uma combinação da BA.1 com a BA.2.

“Mas Sally, se é o mesmo bicho, não tem motivo para ter medo, né?”. Quem está com a vacina em dia, não tem motivo para ter medo não. Ter a vacina em dia significa ter tomado duas doses de uma vacina e uma terceira dose de outra, sendo esta terceira dose nos últimos seis meses. Se já se passaram seis meses da sua terceira dose (ou se te deram três doses da mesma) você teve ter cuidado (não medo, cuidado), com qualquer sublinhagem da Ômicron.

Isso quer dizer que não adiantou nada se vacinar? Não. Alguma proteção você tem, mas se sua última vacina foi em 2021, a imunidade do seu corpo já está caindo e ele não tem mais a melhor defesa possível contra contágio. É caso de fazer quarentena? Não, pessoas vacinadas não têm que fazer quarentena, apenas precisam ter alguns cuidados em vez de sair na rua como se estivessem blindadas pela estrelinha do jogo Mario Bros.

Mas Sally, se é tudo a mesma coisa, pra quê o FAQ?”. Pela visão geral. A Ômicron está ficando cada vez mais contagiosa ao mesmo tempo em que a imunidade do brasileiro está caindo, por ter se vacinado faz tempo.

Na África do Sul os casos estão subindo por causa das versões BA.4 e BA.5 e nos EUA por causa de uma novidade: a BA.2.12.1. “Mas Sally, você falou que era o mesmo cachorro, é tudo poodle de cores diferentes, não são todas igualmente contagiosas?”. Não.

São todos poodles, mas a pequena diferença entre eles é essa: ficam cada vez mais transmissíveis. Isso quer dizer que a vacina não adianta mais? Não. Isso quer dizer que não pode dar mole com a proteção, pois no primeiro descuido ela entra. Assim que a resposta imune da vacina cai um pouquinho, as novas Ômicrons podem entrar. Então, se sua vacina está “expirando”, estamos aqui te pedindo para tomar outros cuidados extras.

Vamos pensar naquele exemplo que a gente vem usando desde o começo da pandemia: ladrões que querem entrar na sua casa. Você colocou um sistema de alarme movido a bateria, e ele funciona muito bem. Quando um ladrão tenta entrar, o alarme toca e seguranças matam o ladrão. Porém, no manual do seu alarme diz claramente que a bateria deve ser trocada a cada seis meses, caso contrário o alarme para de funcionar ou funciona de forma menos eficiente.

Se, em seis meses você não colocar uma bateria nova e um ladrão invadir a sua casa, a culpa é sua, não da bateria, concorda? “Mas Sally, não depende de mim, minha cidade não está vacinando”. Ok, então você tenta buscar outras formas de proteção, como fazíamos quando não havia vacinas: usa máscara, higieniza muito as mãos, ventila os ambientes, não aglomera e todas as outras recomendações que vocês já sabem.


Quanto tempo vai para a próxima onda? O que podemos fazer agora?

Não sei e ninguém sabe. A próxima onda pode nem acontecer. A tendência é que sim, ela aconteça, em média duas vezes por ano, mas ninguém tem certeza do comportamento das novas variantes. Vamos ter que viver para ver.

Se uma nova onda acontecer (e as chances de que ela aconteça são maiores do que as de que não aconteça) será, provavelmente, pelos seguintes fatores: a imunidade de quem foi vacinado já está caindo (uma imunidade boa contra covid-19 dura entre 4 a 6 meses após a vacina, na melhor das hipóteses), o inverno está chegando (o que deixa o ar mais seco e o frio faz ventilar menos os ambientes, criando mais chances de contágio), as pessoas estão tomando menos cuidados (o uso de máscara é opcional, o medo do vírus está caindo, as pessoas estão aglomerando).

Para piorar, a vacinação mundial não está no patamar que todos gostaríamos. Pouco mais de 20% da população mundial tem dose de reforço, que é essencial para conter a Ômicron com eficiência. Também vale lembrar que em alguns grupos, mesmo com vacina, a imunidade cai mais rápido, como é o caso de idosos e crianças.

E vemos gente que ainda não entendeu como vacinas funcionam. Idoso que bate no peito e diz que está protegido por ter se vacinado em março de 2021, um ano atrás, por exemplo. Vai, pega o neto de um ano (que não pode se vacinar) no colo e depois faz cara de Pikachu surpreso quando a criança vai parar no hospital com baixa saturação. A não compreensão sobre o funcionamento das vacinas está fazendo muita gente agir de forma arriscada sem ter ciência disso.

Para completar, a Ômicron parece estar mutando com bastante eficiência, tanto é que ela vem reinando sozinha, nenhuma outra variante conseguiu predominar. Pode acontecer (e eu disse PODE) da Ômicron mutar tanto, que ela deixe de ser Ômicron e passe a ganhar uma denominação nova, por ter ficado muito diferente das demais.

A tendência é que, se houver uma próxima onda, ela seja causada por um vírus ainda mais contagioso. O que isso significa? Mais gente vai se contaminar de forma mais rápida, mas a onda vai durar menos tempo (pois quem tem que pegar, vai pegar rápido). Chega rápido, contamina rápido, vai rápido. Mais ou menos como foi o último pico da Ômicron no Brasil, em dezembro/janeiro.

Isso é bom por um lado, pois não é muito tempo de restrições e sacrifícios, mas também é ruim. Quando todo mundo adoece junto o colapso no sistema de saúde é maior, a quantidade de funcionários doentes em casa é maior (fazendo com que muitos serviços tenham que ser paralisados) e temos menos tempo de reação (quando percebemos que a nova onda está chegando, já está todo mundo doente).

Por isso, neste esquema atual de “vem rápido, vai rápido” ou você se protege antes da onda chegar, ou vai acabar pegando. Mas, para muita gente, especialmente no Brasil, a proteção preventiva é “neurose”, “paranoia” e “histeria”, por isso, dificilmente a população tome algum cuidado antes de algo concreto acontecer.

Vale lembrar que mais da metade dos brasileiros ainda não tomou dose de reforço, isso significa que se vier uma nova onda muito contagiosa, não dá tempo de correr para vacinar quem falta, pois falta muita gente.

Também vale lembrar que ainda existe uma faixa etária de não vacinados: as crianças de zero a cinco anos, que ainda não tem autorização para se vacinar. Para quem convive com uma pessoa sem nenhuma vacina, aí uma nova onda pode ser trágica.

Relembrando: as vacinas que temos contra covid-19 são projetadas para que quem contraí a doença não morra. Essa é a função, não evitar o contágio. Portanto, se você está vacinado, mas tem um filho não vacinado, saiba que, mesmo vacinado, você pode pegar a doença (mesmo sem ter sintomas) e contaminar quem não está.

E também vale lembrar que tem muita criança pelo mundo morrendo de Ômicron, esse papo de “Ômicron mais leve” é um desfavor. Não é o vírus que é mais leve, ele continua podendo matar, são as pessoas que estão mais vacinadas. Quem não está, deve tratar a Ômicron com o mesmo respeito e cuidado com que tratou as outras variantes.

Então, no caso de uma nova onda com picos de contágio, eu recomendo que quem convive com não-vacinados se comporte como se não estivesse vacinado, tomando as mesmas medidas de controle que usávamos antes de surgirem as primeiras vacinas.

Outra possibilidade de nova onda seria uma nova variante completamente diferente da Ômicron. Não sabemos nem quando nem como o vírus vai mutar, então, a possibilidade sempre existe.

No melhor dos casos não muda muito (a gente toma mais cuidado no pico da onda, depois flexibiliza um pouco), mas, no pior dos casos, se as vacinas não protegerem contra essa nova variante, voltamos à estaca zero. 2020 novamente, só que pior, com um vírus muito mais transmissível.

Vamos torcer para que isso nunca aconteça e, pelo comportamento geral dos vírus, ainda não estamos lá. Não tem uma quantidade tão grande de pessoas vacinadas pelo mundo para que a mutação mais bem sucedida seja a que escapa a vacinas, por hora, quem prospera é quem fica mais contagioso.

A variante que nós apelidamos carinhosamente de “Fode Vacina”, em tese, tenderia a aparecer quando mais de 70% da população estivesse completamente vacinada. Não é uma certeza, é uma estimativa que pode estar errada e essa variante pode nunca aparecer, que é o desejo de todos nós, mas, também é nossa obrigação informar que, no futuro, pode ser que ela apareça.

Caso ela se manifeste (no ano que vem ou no outro, pelas projeções mais pessimistas), a única coisa que vai nos ajudar é ter trabalhado a resiliência para recolhimento a lockdown completo até que uma nova vacina que proteja contra ela esteja disponível. Mas não se aflijam, pode ser que ela nunca chegue.

Para reclamar que em 2022 o Brasil não emplacou nenhuma variante, para dizer que se proteger preventivamente é para os fracos e os fortes só se protegem quando começa a morrer gente ou ainda para dizer que no Brasil a hepatite em criança deve ser fruto de mãe louca colocando cloroquina na mamadeira: sally@desfavor.com

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