Outro lado – Parte 2

PARTE 1

Patrícia pensa em dizer alguma coisa, mas o choque de ver alguém absolutamente idêntico diante de si cria um engarrafamento de ideias na mente. Ela só consegue olhar boquiaberta. A sua cópia, no entanto, começa a falar:

“Patrícia. Nós precisamos conversar. Mas primeiro, eu preciso fazer uma coisa.”

É quando ela começa a prestar mais atenção na figura que acabara de entrar na sala: vestida com um tailleur preto sobre uma camisa social branca, cabelo preso num coque, uma pasta numa das mãos e um… rádio na outra. Ou algo muito parecido com um rádio portátil.

A mulher coloca o equipamento sobre a mesa, aperta um botão que faz um visor começar a exibir números aleatórios. Patrícia ameaça falar:

“O que…”

Ela é parada pelo dedo em riste da mulher. Os números no aparelho finalmente se decidem numa sequência, e a luz vermelha num dos cantos fica verde.

“Pronto, quem quer que estivesse te ouvindo, agora não está mais. Este aparelho emite uma onda que interfere com a captação de audio no equipamento que deve estar dentro do seu corpo. Podemos conversar.”

Patrícia começa a tatear a própria roupa, procurando por algo.

“Você não vai encontrar assim. Eu sei que você deve ter muitas perguntas, mas nós temos um tempo muito limitado. Sim, eu sou você, ou, a versão de você neste universo.” – a mulher finalmente se senta do outro lado da mesa enquanto começa a conversar.

“Eu não consigo lidar com isso…” – Patrícia cobre o rosto com as mãos.

“Consegue sim, nós somos a mesma pessoa e eu sou líder da força-tarefa 10 da OPD, Organização de Proteção Dimensional. Você só está assustada, que nem naquela vez que o Binho subiu naquela árvore, lembra?”

Patrícia arregala os olhos. Binho era um gato de rua que tentara levar para casa diversas vezes, mas que sempre fugia. Aos oito anos de idade, teve que subir numa árvore mesmo morrendo de medo de altura para resgatar o bichano. Sabia que levaria uma bronca dos pais por fazer isso, por isso nunca contou para ninguém que subiu uns três metros de altura para pegar o animal.

“E ele desceu como se nada assim que eu cheguei perto…” – diz Patrícia, já mais tranquila.

“Hahahaha… sim. E quando a gente olhou para baixo depois?” – a mulher abre um largo sorriso.

“Meu Deus. Parecia um prédio de tão alto… espera… por que aquele agente da CIA falou sobre eu ser de outro universo no carro se tinha gente me ouvindo?” – Patrícia muda de assunto com uma cara de confusão, apontando para o aparelho na mesa entre as duas.

“Essa é a Patrícia que eu conheço. Eu não cheguei aonde cheguei deixando passar esses detalhes. Andersen e CIA não são de confiança. Na verdade, ninguém aqui é de confiança. O aparelho na sua frente está impedindo a gravação do sistema de áudio desta sala também. E atrás daquele espelho? Ninguém. O procedimento é deixar uma testemunha meia hora sozinha antes de começar a conversar com ela. Temos mais 10 minutos antes de alguém perceber que eu estou aqui.” – Patrícia “alternativa” fica séria, olhar fixo.

“O que ele disse não é verdade?”

“Não toda a verdade. Você se lembra por que estava viajando para Tóquio?”

“Eu ia visitar… eu… espera…”

“Você se lembra de ter comprado a passagem? É mais cara que qualquer vôo internacional de primeira classe.”

“Eu comprei na… eu… eu não lembro de ter comprado. Eu estava super nervosa na fila, com a sensação de que tinha algo de errado.”

“Como você chegou a São Francisco?”

“Meu Deus… eu não sei.” – Patrícia fica pensativa.

A outra Patrícia olha para o celular. O timer mostra menos de 4 minutos.

“Sua verdadeira memória vai ser reativada aos poucos, o aparelho que colocaram em você faz mais do que gravar sons, ele provavelmente mantém sua mente anuviada. Eu não vou conseguir tirar ele de você, não aqui. Mas se você fizer o que eu vou te dizer, nós vamos nos encontrar de novo.”

Estação de Trem Shinjuku, Tóquio.

O homem acabara de atravessar o portal, e assim como tantos antes dele, ficara parado por alguns segundos tentando fazer senso da mudança brusca de ambiente. A atendente chama sua atenção educadamente, o que o faz começar a se mover até a fila da imigração.

Chegando lá, é atendido por uma senhora de meia idade que mal olha nos seus olhos, apenas pega o cartão de suas mãos e passa pelo scanner. O sensor não apita como na outras vezes. Ela tenta novamente. Nada. Finalmente a senhora olha nos olhos dele: um homem do alto dos seus 40 anos de idade, vestindo um terno cinza muito bem alinhado, no rosto, uma grande barba ruiva era o ponto de maior destaque.

Ela se desculpa pelo problema e aponta para ele uma saída alternativa, onde dois guardas esperam. O homem olha ao redor, sem se mover. A mulher repete o pedido, os guardas começam a se mover. Ele encontra um espaço entre as grades da fila e dispara em corrida.

Os guardas começam a perseguir depois de alguns segundos de hesitação. O homem corre rápido, trombando em transeuntes e fazendo movimentos em zigue-zague para forçar seus perseguidores a enfrentarem o máximo de trânsito possível. Enquanto corre, puxa o celular do bolso interno e divide sua atenção entre a tela e o caminho adiante. Os gritos dos guardas despertam atenção do resto da equipe de segurança.

Com mais de vinte homens à sua caça, ele consegue completar uma ligação. Ele vai em direção à entrada da estação, enquanto alguns guardas já começam a se posicionar no caminho. Ele coloca o telefone perto da boca e diz alguma coisa. A gritaria e a confusão tornam impossível entender a resposta. Ele finalmente pula a catraca de entrada e num movimento só, mantém a corrida rumo ao céu aberto.

Assim que a luz do sol atinge seu rosto, sente uma pressão na cabeça, e nada mais. Os guardas se juntam aos civis chocados com a cena: o homem está caído no chão, uma poça de sangue escorrendo da cabeça.

Continua…

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