Coluna sagrada.

Começa mais uma Semana Anta aqui na República Impopular do Desfavor, uma época de reflexão sobre como as pessoas acreditam nas coisas mais sem pé nem cabeça. Mas já começamos com uma questão difícil, Sally e Somir discordam sobre uma nova coluna no Desfavor. Os impopulares decidem.

Tema de hoje: o Desfavor deve ter uma coluna sobre a Bíblia?

SOMIR

Ponto positivo: vai ser a Sally escrevendo. Ponto negativo: vai ser sobre a Bíblia. É por isso que eu voto no não. É muito ônus, ônus demais para o bônus de possíveis desrespeitos à fé alheia.

Como ela não foi criada num ambiente parecido com a média tupiniquim, ela nunca teve acesso aos descalabros da cultura cristã da mesma forma que a maioria de nós, então a Bíblia nada mais é do que um livro maluco escrito por selvagens alguns milhares de anos atrás (e reescrito várias vezes para beneficiar quem estava no poder na época). Mas na prática é a fonte de muitos dos atrasos mais absurdos da sociedade ocidental moderna.

E é isso que eu não gostaria de ver aqui. Eu realmente acredito que o melhor jeito de se livrar de uma influência negativa é parar de dar atenção para ela. Talvez falar mal funcionasse alguns anos atrás, mas hoje em dia, na era da polarização? Não sei qual a vantagem. Ainda mais considerando como o brasileiro médio tem merda na cabeça, não vão nem entender a piada na coisa toda.

Uma das vantagens do Desfavor sobre outras produtores de conteúdo é nossa total falta de respeito com as invenções das religiões de massa, não nos preocupa ir contra dogmas porque simplesmente não acreditamos neles. Nem deuses nem diabos fazem parte de nossa linha de pensamento. E por mais que não tenhamos nenhuma restrição a ter leitores religiosos lendo e comentando, pelo menos não por religião, faz parte da cultura local não considerar conceitos religiosos como argumentos.

Pode dizer que seu deus fez isso, aquilo e tudo mais, só não vai servir como parte séria de uma conversa aqui dentro. E até mesmo nossos leitores habituais religiosos entendem isso. As religiões que mais deixam comentários estúpidos aqui são Lulismo e Bolsonarismo, para ser honesto. Por enquanto, temos um equilíbrio bacana e atraímos uma maioria de religiosos que entendem que as pessoas podem discordar da fé deles sem briga.

Mas o que acontece quando tivermos uma coluna sobre a Bíblia que atrai gente que tem interesse pela Bíblia? Veja bem, uma coisa são nossos leitores que acreditam em um deus e caem aqui para discutir desde política internacional até funções excretoras, outra coisa completamente diferente é atrair gente que quer mais informação sobre a fé que já tem.

E como temos uma maioria de analfabetos funcionais neste país, vai entrar uma gente muito perdida aqui achando que a forma como a Sally escreve é literalmente uma defesa de seu deus e escritura sagrada. Essa gente vai começar a deixar comentários imbecis, que em tese não ferem as nossas regras (proibimos autismo de quem fala a mesma coisa sem parar, ofensas aleatórias e revelar dados pessoais de pessoas que querem permanecer anônimas), e que podem começar a infestar os outros textos com opiniões cada vez mais bizarras.

E comunidades que dão espaço para gente maluca acabam parecendo bons lugares para malucos. Malucos ocupam espaço e começam a desmotivar os não-malucos. Os nossos religiosos atuais estão de ótimo tamanho, é gente que não incomoda com pregação e até faz comentários bacanas. Eu não quero o outro tipo que procura informações sobre a Bíblia em sites aleatórios da internet.

O Brasil é mais de 90% cristão, mesmo que 89% sejam falsos, ainda é muito papo furado sobre deuses, regras aleatórias (a regra sobre considerar gays abominações eles gostam, mas a regra seguinte sobre não comer camarão eles não gostam) e a mistura cada vez mais doentia com ideologias autoritárias (Jesus seria ignorado ou mesmo odiado pelos cristãos médios se voltasse falando o que falava na Bíblia).

E francamente, a Bíblia não é tão interessante assim. É um livro bem do mal escrito, uma coletânea meio sem sentido de mitos da antiguidade conhecidos pelos povos do Oriente Médio que já foi refeita de mil formas diferentes por outras mídias. É o entendimento do cidadão médio do tempo em que as pessoas morriam de infecção quando cortavam o braço. Não é exatamente algo que agregue ao conhecimento moderno, não?

Religião tinha até algum verniz de pensamento abstrato na antiguidade, e alguns religiosos participaram do desenvolvimento da ciência como conhecemos, mas tudo o que tem na Bíblia tem muito melhor em livros e artigos científicos modernos. Quer entender a natureza humana? Estuda um pouco de psicologia. Quer saber mais sobre como o universo funciona? Física, química e biologia. Quer conhecer os povos do passado? História, arqueologia, sociologia… tem tudo o que tem lá muito melhor e mais bem explicado.

Eu acho que os talentos da Sally são mais bem aproveitados com temas melhores do que esse. E não acho que vai trazer gente interessante para conversar conosco aqui no Desfavor…

Para me chamar de chato, para dizer que Sally fez até um drogado parecer interessante, ou mesmo para dizer que prefere crente do que lacrador aqui: comente.

SALLY

Finalmente estou realizando o projeto que já queria colocar em prática faz tempo: estou lendo a Bíblia. Como já disse em outros textos, sempre tive na cabeça que histórias que sobreviveram por séculos e impactaram tantas pessoas deveriam ter algo de interessante para ser olhado, muito além do ponto de vista religioso.

Em um primeiro momento achei que não ia gostar, mas, à medida que avançava na leitura, comecei a ficar fascinada pela quantidade de violência, baixaria e principalmente pela postura de Deus perante suas criaturas. Tenho que confessar: me identifico totalmente com esse Deus violento, desproporcional e impaciente.

Então eu pensei: isso dá uma coluna para o Desfavor! Taí uma coisa que não se encontra todo dia. Uma pessoa que não tem religião, que não foi influenciada por religião na infância e que está disposta a ler e comentar a Bíblia.

Provavelmente o olhar da maior parte de vocês vê com normalidade muitas cenas às quais vocês foram apresentados e dessensibilizados desde pequenos. O meu não. Não passa um capítulo sem que eu pense “mas que porra é essa?”. E muitas vezes o susto vai escalando: “MAS QUE PORRA É ESSA?”. Fico olhando para o livro como o meme da Nazaré Confusa.

Além de achar que rende bons textos, também acho que rende um material bem incomum. Eu não sei se existe alguém que não acredita em Deus, no catolicismo e em Jesus que tenha se dado ao trabalho de ler a Bíblia de cabo a rabo e de expressar sua opinião sobre ela. Não deve ter muita gente disposta a isso. Muito menos de graça.

Então eu fui conversar com meu companheiro de blog, que foi terminantemente contra: Desfavor não é lugar para isso. Vai atrair gente chata. Vai ser chato para o leitor esse conteúdo. Temos coisas mais importantes a dizer. E, por fim, seria apenas achismo meu, já que eu não tenho qualquer condição, preparo, estudo ou maturidade para abordar a Bíblia de um ponto de vista minimamente crível, sensato ou coerente.

Discutimos bastante e resolvemos trazer a questão para apreciação de vocês, afinal, não escrevemos o Desfavor para nós mesmos, escrevemos para vocês. Por isso, queremos escutar as opiniões. Vocês querem ler a minha versão da Bíblia, resumida e comentada de acordo com meu ponto de vista? Deixa aqui nos comentários. Até o fim do dia, vamos contabilizar se tem mais “sim” do que “não”.

Desde já adianto que na condição de leiga, antipatizante e totalmente sem base, não sairá nenhuma análise que preste para nada além de divertir quem tem o coração podre e cabeludo como o meu. Não esperem precisão, coerência, coesão ou sensatez. Não esperem profundidade e nem ao menos uma análise acertada, é bem evidente que eu vou entender tudo errado e falar bosta. Justamente essa é a proposta, mostrar como esse compilado de absurdos soa aos olhos de um leigo. O propósito não é instruir, é reagir. É um react da Bíblia por escrito, nada mais.

E a intenção não é ofender, ok? Não vou ficar apontando erro e militando ateísmo. É só uma reação genuína de choque, de espanto, por motivos de ô livrinho baixaria. Ô Deus violento e intolerante da porra. Nunca antes em nenhuma religião se viu um Deus tão parecido com o Rafael Pilha.

Eu curto esse Deus? Demais. Eu faria as mesmas coisas que ele se tivesse esse poder? Provavelmente. Eu vou começar a dizer que o Rafael Pilha é Deus encarnado? Inevitavelmente.

Então, se você tem a curiosidade de acessar as partes mais bizarras, inusitadas e preocupantes da Bíblia sem precisar ler um zilhão de páginas, se você quer saber das fofocas sem precisar passar por uma leitura extenuante com um linguajar difícil, se você quer opiniões de uma pessoa sem o menor respeito e pudor pelo suposto sagrado dessas histórias, estamos aí.

E não tem data mais emblemática para começar do que nesta semana temática do nosso feriado Semana Anta, que, segundo definição da nossa Constituição é uma semana “em que se debaterá a imbecilidade daqueles que insistem em nortear suas vidas por dogmas religiosos”. Por mim, começo amanhã mesmo.

Somir acha que o tempo que seria de um texto bíblico poderia ser melhor utilizado, com um Des Aprende ou um Desfavor Explica. Mas essa é a beleza do Desfavor, essa esquizofrenia de temas, essa roleta-russa de colunas. Em um dia pode ter um texto explicando física quântica e no outro um texto sobre o cu do Gugu.

E com isso quero dizer que inserir este tema não vai deixar o blog monotemático. Será apenas mais um alívio cômico que aparecerá de vez em quando, sei lá, uma vez por mês. Não vai “roubar o lugar” de ninguém. Em vez de falar que o ator do seriado “The Bear” tem boca de cu de galinha vou comentar algumas passagens bíblicas sem o menor embasamento para isso.

Na real, Somir está sendo burro. Muito pior do que não falar da Bíblia é me dar um microfone e carta branca para comentá-la. Provavelmente ele não leu a Bíblia, ou quando leu não tinha idade para alcançar a mais profunda baixaria que se passa ali, que faz “A Fazenda” parecer um monastério tibetano. Talvez tenha bloqueado o conteúdo por trauma ou aversão. Bem, eu lhes garanto, o que tem ali é puro ouro e merece ser comentado.

Obviamente, estou no começo, pode ser que se torne menos divertida com o passar dos livros ou capítulos. Mas essa é a beleza desta coluna: eu vou filtrar as partes chatas para vocês. Vocês terão acesso somente ao puro suco de baixaria, desgraçamento e porradaria. Quem mais faria isso por vocês?

Eu já iria para o inferno de qualquer forma pelas milhagens que acumulei, vamos fazer valer esse calorzinho gostoso que eu vou passar depois que morrer! Vote sim nos comentários, diga que quer ler a nossa versão comentada da Bíblia!

Para dizer que não contente em ir para o inferno eu ainda estou tentando levar vocês (se rir do que eu escrever vai pro inferno comigo), para dizer que não foi inteligente colocar esta votação em semana de feriado (é sobre qualidade, não quantidade) ou ainda para dizer que eu vou fazer Jesus chorar: comente.

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Comments (24)

  • Acho válido o argumento do Somir, mas como sempre quis ler a bíblia confesso que é tentador fazer isso sob a visão da Sally. Então meu voto é SIM.
    Se precisar eu até ajudo a moderar os comentários dos malucos que aparecer por aqui.

  • Não apenas Bíblia, mas também sugeriria (aqui ou como DC) Espiritismo, Islamismo, Candomblé (já houve um post aqui inclusive), Budismo, Judaísmo (trabalhei no Bom Retiro e morei em Higienópolis durante alguns anos, e achava curioso o motivo de alguns judeus se vestirem de preto e utilizarem um xaxim na cabeça mesmo com 35 graus à sombra, assim como saber de uma mulher aqui e ali terem optado por se converter àquela religião, mesmo sem se casar com judeus).

  • Wellington Alves

    Os pontos do Somir são super válidos, embora eu também goste da ideia de ver como está sendo essa experiência da Sally… então voto sim. Qualquer coisa, se realmente não se mostrar tão interessante, é só parar.

  • SIM
    Vai ser muito divertido ver o ponto de vista de uma pessoa que não foi criada como cristã comentando a respeito.
    Eu acho a Bíblia interessante como material histórico, e cheguei a lê-la no início da adolescência, naquela época em que as pessoas católicas fazem catequese. Metade das mulheres da minha família eram freiras, e elas ficaram um pouco chocadas quando eu disse que não me considerava católica, nem cristã, e não tinha gostado de ler a Bíblia. Não lembro exatamente das passagens que me chocaram, mas lembro de ter achado que era um livro estranho, difícil e com punições eram exageradas e injustas. Nunca cheguei a reler tudo, só o Livro do Apocalipse, porque tinha sido a minha parte favorita. Hoje em dia, reconheço que talvez fizesse muito pior do que o deus da Bíblia se tivesse essa onipotência retratada hahahaha

  • Ovelha cansada

    Como estou em transição de crente para descrente, seria muito interessante ler os comentários Sallycionados da Bíblia. Por favor, nos enalteça com sua análise desse famigerado livro que me acorrentou por tanto tempo numa prisão sem paredes (leia-se numa seita de controle mental).

  • Não não e não! Somir está certo, textos sobre a Bíblia aqui iria atrair uma legião de loucos e pessoas bem desagradáveis aqui pra nossa república. Não quero que até em outros textos isso se contamine…

  • Um pouco de diversão, voto SIM
    Tendi nada das ursas, mas gostei, os 42 rapazes se ferraram, e quem viu parou de fazer bullying.

    • A moral da história é que zombar de pessoas tem consequências e pode ser perigoso. Na vida real, esses ursos poderiam ser conhecidos do homem calvo, ou até o próprio homem revidando sozinho, com bastante força ou até uma arma. Não é uma história literal, mas parece que isso é difícil de ser compreendido por algumas pessoas…

      • Que a Bíblia não é literal todo ateu concorda por motivos óbvios, mas dentro das regras e da lógica do livro é uma menção a uma intervenção divina, e esse é o ponto central do que costuma-se criticar nessa passagem.

      • A questão é que, segundo a vertente em que eu fui educada, a Bíblia é, sim, interpretada literalmente. Eu diria, inclusive, que boa parte das pessoas creem na Bíblia a interpretam de maneira literal.

        Então essa história, assim como muitas outras, é ensinada como algo que de fato aconteceu e, como Deus está sempre certo, não houve exagero nenhum ali.

        • Ah, sim. Acredito que minha família tenha sido mais flexível nessa questão.
          Hoje em dia creio mais num deus como energia, não como um velho invisível que fica fiscalizando foda.

  • “sempre tive na cabeça que histórias que sobreviveram por séculos e impactaram tantas pessoas deveriam ter algo de interessante para ser olhado, muito além do ponto de vista religioso.”

    Esse algo são as parábolas e alegorias ensinando coisas sobre a vida, tipo fábulas do Esopo e tal.

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