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Monotemáticos?

Monotemáticos?

| Desfavor | | 28 comentários em Monotemáticos?

Depois de mais de um ano falando sobre a pandemia, o Desfavor tem uma curiosidade para saciar com os impopulares: o que não poderia faltar? Sally e Somir não entram em acordo, pra variar. Mas como sempre, seguimos em frente.

Tema de hoje: Se Desfavor tivesse que ficar um ano nas mãos de apenas um autor, o que você preferia: Sally falando apenas de covid ou Somir com seus textos regulares?

SOMIR

Com a Sally. E não se preocupem, eu vou acabar trazendo a minha costumeira arrogância para este texto, não estou quebrado nem nada. Diante de uma pandemia que provavelmente vai ser lembrada como o fato principal dos anos que estamos vivendo, fica complicado ignorar a realidade. Sim, estamos te dando duas opções radicais: ou só fala de pandemia, ou não se fala de pandemia. Mas normalmente precisamos de um certo nível de exagero para clarear a mente das pessoas na hora de pensar sobre um assunto. A vida já tem nuances demais.

Se a Sally tivesse focado suas energias para falar sobre maromba ou física quântica, eu provavelmente concordaria com ela: a pessoa que só fala sobre uma coisa tende a ser chata com o andar da convivência, não importa que coisa. Só que não estamos falando sobre um interesse pessoal dela que saiu de controle, estamos falando sobre um acontecimento global cujas consequências podem ser fatais caso a pessoa absorva informação errada.

Não é uma mania, é um tema que se impôs sobre todos nós. O Desfavor sempre foi baseado na pluralidade de conteúdos, mas também sempre subordinado ao que acontece no mundo. Quando o Lula era o presidente, batíamos nele e éramos chamados de reacionários de direita, agora o Bolsonaro é presidente, batemos nele e somos chamados de lacradores de esquerda. Na verdade a gente só detesta gente corrupta e incompetente mesmo. Não faz sentido bater no PT enquanto eles estão onde queríamos: por baixo. Assim que o Bolsonaro voltar para o buraco de onde veio, vamos perder boa parte do interesse nele também.

Muitos dos assuntos que escolhemos são baseados no que está acontecendo no mundo agora. Mesmo criticando o ciclo de notícias que mastiga e cospe temas e pessoas sem parar, estamos amarrados nele. É por onde flui a informação que nos especializamos em filtrar. Sally e eu gastamos algumas horas dos nossos dias pesquisando informações em troca de uma plateia com a qual escolhemos conversar, mas nem de longe somos especialistas na maioria das informações que passamos.

Tudo depende da disponibilidade das informações. Adoro falar sobre tecnologia, astronomia… mas não sou estudioso original sobre nada disso: não crio a informação, apenas a transmito. Fazemos as conexões entre as informações com uma pesada dose de opinião. Então, pensem comigo: o que fazer quando uma pandemia toma o mundo de assalto ao mesmo tempo que vivemos uma onda absurda de negação científica e politização? Oras, temos que falar sobre pandemia.

Não é necessariamente questão de precisar fazer um serviço de utilidade pública, é constatar o absurdo de treinar por mais de uma década para fazer uma coisa, e na hora mais importante para filtrar e conectar informações, fingir que o problema não existe. Sem querer, o Desfavor foi se preparando para ter esse papel. Muito se engana quem acha que eu fiquei de saco cheio de falar de pandemia e coronavírus, eu apenas soube me adaptar à situação: Sally é uma excelente acumuladora de informações, assim como eu, mas ela tem uma capacidade de se aprofundar maior aliado a um conhecimento maior sobre saúde e corpo humano do que eu.

Se estivéssemos falando da chegada de alienígenas na Terra, eu conseguiria fazer um ou dois FAQs semanais sobre tudo o que está acontecendo. Consigo pesquisar rápido sobre os temas relacionados por ter uma base muito bem desenvolvida. Quando o assunto é uma pandemia, Sally tem esse mesmo poder. Ela rapidamente sabe onde achar informação e filtrar o que faz ou não faz sentido com base no que já conhecia.

Por isso me pareceu bem lógico “deixar com ela” as postagens sobre o Covid. Nem mesmo combinamos isso, foi acontecendo naturalmente. Ao perceber que no máximo poderia repetir o que ela já disse, foi simples deixar ela tocar o tema no Desfavor enquanto eu tentava variar mais os tópicos. Quando eu digo que se tivesse que escolher, escolheria os textos dela sobre o coronavírus, é porque ela está entregando o conteúdo mais importante que nós dois poderíamos entregar.

Sim, eu conseguiria escrever bons textos sobre a pandemia, explicando várias coisas, mas não teria o mesmo nível de didatismo. Todo mundo que lê o Desfavor percebe rapidamente quem tem o texto mais fácil de entender e acompanhar. Tento aprender com ela, mas não é para imitar: gosto do meu estilo e acho pouco de quem vem falar que não entende o que eu escrevo. A missão de todo mundo que lê os meus textos é se virar para entender. Se você não está fazendo isso, está fazendo errado. Eu disse que seria arrogante, não disse?

Mas pensando de forma prática: ainda bem que foi a Sally que tomou a frente nesse tema, não? Não ia ser bacana ter que decifrar os caminhos estranhos que meus textos podem tomar para saber o que fazer para se proteger de um vírus potencialmente mortal. Sim, o Desfavor perde muito sem o que eu escrevo, assim como perde muito sem a Sally, mas nessa ocasião específica, é melhor para todo mundo que o que não falte seja o material que ela produz.

E tem mais: não é como se fosse tudo bula de remédio. Se você pegar os textos da Sally no último ano, evidente que vai perceber o foco no coronavírus, mas não é tudo do mesmo jeito ou repetições intermináveis: sempre tem algo diferente expandindo o tema, e até mesmo vários momentos de descontração dentro da pandemia. Desde os “Ei, Você!” até o (primeiro que eu gostei) Siago Tomir temático da pandemia. Todos os outros são distorções horríveis da mente doentia da Sally, ok? Ok.

Sally conseguiria variar dentro de um tema, tanto que variou. Se for para ficar preso com um de nós por um ano agora, que seja com quem mais pode te ajudar a evitar uma doença correndo solta pelo mundo.

Sem contar que vocês não estão prontos para passar um ano só com meus textos e continuar levando uma vida normal.

Para dizer que o melhor seria ficar sem essa puxação de saco, para dizer que eu sou chato demais para encarar sozinho, ou mesmo para dizer que não entendeu nada: somir@desfavor.com

SALLY

Se Desfavor tivesse que ficar um ano nas mãos de apenas um autor, o que você preferia: Sally falando apenas de covid ou Somir com seus textos regulares?

Óbvio que Somir com seus textos regulares! Bom conteúdo sobre covid-19 vocês encontram fora daqui. Vai dizer que nós somos os únicos que falam de uma forma simples sobre coronavírus? Tem muita gente boa (inclusive com uma formação melhor do que a nossa) fazendo isso – e de forma gratuita. Porém, o conteúdo do Desfavor é único, esse você não encontra mais ninguém fazendo.

O que quero dizer é: você pode encontrar com facilidade uma segunda fonte sobre coronavírus, mas não pode encontrar com facilidade um segundo Desfavor. Nem ao menos temos a proposta de ser um blog científico, não faria o menor sentido passar um ano falando apenas sobre um tema que de forma alguma é ou foi a meta do Desfavor.

Coronavírus é importante sim. Muito. Mas, falar só sobre isso fica chato, cansativo e talvez atrapalhe mais do que ajude. Ficar bombardeando o cérebro das pessoas com perigos iminentes, ameaças constantes e problemas que parecem estar surgindo todo santo dia é contraproducente. Salvo raras exceções, o melhor esperar para falar apenas o que é confirmado.

A real é que ninguém tem certeza de muita coisa ainda, o cenário muda muito rápido e a ciência não consegue acompanhar essa velocidade na hora de mensurar as consequências. As respostas vêm mais devagar do que a informação, então, escrever diariamente sobre covid seria, basicamente, escrever sobre um monte de suposições que podem ou não ser confirmadas.

O papel que nós planejamos para o Desfavor na pandemia é justamente o contrário disso: ser um filtro. A gente entra em contato com tudo que está sendo dito, filtra o que tem mais credibilidade e espera a informação se confirmar, só então a condensamos, a simplificamos e a colocamos à disposição.

É quase que uma curadoria de conteúdo: a gente é exposto às mentiras tóxicas, asquerosas, radioativas, passamos por elas, até chegar a um conteúdo que ande de mãos dadas com a ciência e que tenha estudos respaldando, lemos tudo que podemos sobre isso e resumimos da melhor forma que nossas limitações de leigos permitem.

Somos uma referência no assunto? Não. Nem queremos ser. Nem temos qualificação, formação ou título para ser. Queremos contribuir dentro das nossas possibilidades, para, quando tudo isso passar, olhar para trás e saber que fizemos algum bem no meio de uma pandemia. Para escrever todo santo dia sobre o mesmo assunto, você tem que ser uma referência nesse assunto, uma notoriedade. A única coisa sobre a qual eu posso escrever todo santo dia é Siago Tomir.

E mesmo que eu tivesse a capacidade de segurar um blog por um ano escrevendo todo santo dia sobre covid, cá entre nós, ninguém aguentaria. Encheria o saco e isso teria um efeito rebote pior ainda: quando é uma vez por semana, a pessoa respira fundo e lê, acessa a informação. Se o leitor ficar de saco cheio, depois de duas semanas não volta mais e informações importantes deixarão de ser lidas ou compartilhadas. Não é didático, não é produtivo e fugiria completamente à proposta do Desfavor.

Não se enganem: rir, se distrair e relaxar é tão importante quanto ter informação assertiva sobre covid no meio de uma pandemia. Não é como se eu pegasse a parte importante e o Somir a parte fácil. É muito mais difícil fazer rir durante essa época complicada que estamos do que jogar informações técnicas mastigadas. Então, o trabalho do Somir não é nem mais fácil nem menos importante.

Tanto é que escutamos relatos de leitores que estavam mal, que estavam tristes e até com depressão e, de alguma forma, foram ajudados por textos “estilo Desfavor”, que lhes deu algum alívio cômico na vida. Isso salva tanto quanto uma informação técnica na hora certa para quem precisa dela.

E é isso que o leitor do Desfavor espera quando vem até aqui, pois é isso que entregamos há mais de dez anos. Seria uma puta sacanagem trair o leitor depois de tanto tempo empurrando um conteúdo que não é a proposta do blog. Os textos do Desfavor são e tem que ser a regra, os textos sobre covid ou qualquer outro assunto urgente, são a exceção.

Falar sobre covid é uma pequena colaboração, não a razão de ser do Desfavor. Quando você faz uma coisa por muito tempo, é muito fácil acabar esquecendo do seu propósito, do seu fio condutor, do porquê daquilo. E quando você se perde no caminho que estava trilhando, acaba não chegando aonde quer.

Então, acho muito importante revisitar a raiz do que se faz, de tempos em tempos, em tudo na vida. Relembrar o motivo de estar fazendo aquilo e ter sempre isso em mente, para agir de forma coerente. O nosso propósito é: tentar trazer algo diferente, seja na forma ou no conteúdo. Tentar falar o que mais ninguém fala. Tentar trazer um novo ponto de vista e induzir a reflexão.

Ficar parágrafos e mais parágrafos dizendo como funciona uma vacina, como um vírus se reproduz ou como evitar contágio pode ser muito importante, mas não é a essência do Desfavor, portanto, o blog não pode se transformar nisso, se não, deixa de ser o Desfavor.

Ainda que dê para trazer algum alívio cômico, como por exemplo, respondendo perguntas fascinantes sobre peido gerar contágio, ficaria um blog monotemático. Isso não é o Desfavor. Se o nosso leitor tem alguma certeza nessa vida é a de que ele pode abrir isso aqui um dia e encontrar qualquer coisa, qualquer coisa mesmo, desde textos sobre física quântica até textos sobre diarreia.

Vocês não podem preferir algo que mate a essência do Desfavor. Simples assim.

Para dizer que concorda com ambos, para dizer que não concorda com nenhum ou ainda para dizer que tanto faz, é tudo uma merda aqui: sally@desfavor.com


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