Dia: 21 de outubro de 2011

Tipo, unidos... tipo... vencidos!Um estudo realizado pelo banco Credit Suisse recentemente apontou que os milionários e bilionários do mundo concentram quase 40% de toda a riqueza mundial. E esses milionários e bilionários não representam nem 1% da população mundial. A título de curiosidade: Toda a riqueza mundial soma 231 trilhões de dólares.

O estudo não está descobrindo a roda ou algo do gênero, sabíamos que a distribuição da renda global era assim há algum tempo. Mas cada vez que sai um deles, o dinheiro parece mais e mais concentrado. Na pesquisa anterior, esses privilegiados somavam 5% a menos de riqueza. O mundo está ficando mais desigual, e isso é um fenômeno generalizado.

Tanto que atualmente temos um grupo de manifestantes do movimento Ocuppy Wall Street (tradução humorística: Ocupem Parede Rua) ganhando mais e mais atenção midiática, pessoas de “primeiro mundo” pedindo alguma solução para a devastadora crise econômica mundial. Pessoas que se auto-intitulam os “99%” exigem que ricos paguem mais impostos e que os governos passam a gastar mais dinheiro com o povo ao invés de salvar banqueiros.

Mesmo ignorando meu cinismo habitual (e, porra, é um movimento de hipsters, os iHippies, é muito fácil odiá-los) e concedendo o ponto de que pelo menos estão tentando alguma coisa, é difícil imaginar que a solução para essa crescente concentração de renda e caos econômico esteja apenas a algumas canetadas de distância.

O problema é que o buraco, para variar, está muito mais embaixo. O sistema de moeda da humanidade moderna nasceu torto. Numa “daquelas” analogias: Não é como se desse para acelerar ou frear o carro, o problema é que pegamos a estrada errada. Parecia a escolha certa na hora, mas o nosso modelo de “pensar dinheiro” não é exatamente escalável para uma economia de 231 trilhões de dólares.

Pare e pense um pouco comigo: 231 trilhões de dólares. A pessoas mais rica do mundo, o mexicano Carlos Slim (que curiosamente, é gordo), tem em sua posse uns 60 bilhões de dólares. Tem alguma coisa (à venda) que ele não possa comprar nesse mundo? Se um ser humano consegue chegar nesse ponto com 60 bilhões, 231 trilhões não começa a parecer um valor praticamente imaginário? A triste verdade é que esse dinheiro não está baseado em riquezas e trabalho real, ele é basicamente um monte de dívidas. Dívidas dos 99% no seu processo para tentar uma vaguinha no clube dos 1%.

É confortável achar que a culpa desse sistema é só dos ricos, mas nada é tão simples assim. Vamos aproveitar que o povo cabeça-oca já deve ter desistido de ler o texto e voltar no tempo para entender como isso aconteceu. Vivíamos num sistema de trocas simples não faz tanto tempo assim. Qualquer coisa poderia valer como riqueza, desde que alguém a quisesse. Sistema bem básico, mas claríssimo para os envolvidos.

O problema é que sua “moeda” era basicamente só o que você produzia. A pessoa era refém constante da demanda. O mesmo trabalho poderia render valores diferentes praticamente todos os dias. Isso gera insegurança. E quando a humanidade fica insegura, começa a trocar potencial por estabilidade.

O sistema de moeda e empregos, na sua versão mais básica, surge para acalmar essas mentes preocupadas. Não, é claro, sem sua contraparte. Se o pescador vender seu peixe por moedas para alguém que vai redistribuir o peixe, ele tem a certeza de renda baixa, mas consistente. O distribuidor assume o risco das flutuações do mercado, mas quando lucra, lucra bonito.

Com mais e mais gente buscando estabilidade, mesmo abdicando de riquezas maiores, temos muita gente recebendo em moeda e pouca gente controlando os recursos reais. A pessoa do salário em moedas dificilmente vai ficar muito mais rica que seus pares, a pessoa que paga o salário em moedas está com todo o potencial em suas mãos. Potencial é um risco, mas são os riscos que criam os ricos (vice-versa?).

Moeda era valor real, já que vinha diretamente de metais em alta demanda, como prata e ouro. A moeda não precisava estar no formato de moeda para valer alguma coisa. E melhor: A moeda podia ser acumulada para aproveitar oportunidade ou se livrar momentos difíceis. Ela tinha suas vantagens, mas foi a primeira etapa nesse processo de criar o 1%.

Não demora muito para os banqueiros aparecerem, quase que por acaso. As pessoas gostam da ideia de deixar suas riquezas em cofres protegidos por guardas, e no passado, eram os ourives (que produziam as moedas em primeiro lugar) que tinham essa estrutura de segurança. Primeiro foram os amigos deles, depois o povão. A pessoa guardava seu ouro no cofre do ourives e recebia um certificado de quanto ela havia depositado.

E é quando fazemos mais uma troca de potencial por segurança/estabilidade. Melhor do que andar com um monte de moeda de ouro por aí é andar com o certificado e trocá-lo por produtos. O dinheiro de papel começa seu legado. O tempo passa, os ourives começam a cobrar uma pequena taxa por essa praticidade (o que todos julgam razoável), e subitamente, o mercado de guardar moedas começa a parecer muito interessante.

Mais ainda quando esses banqueiros antigos percebem o que tornaria seu negócio o mais lucrativo da história da humanidade: O empréstimo. O ourives tinha moedas de muitas pessoas, podia emprestar para alguém de confiança, e a não ser que todos os donos originais das moedas viessem buscá-las ao mesmo tempo, só precisaria se preocupar com calotes. E até pelas possibilidades bem maiores de acabar enforcado se atrasasse uma parcela, calotes não eram comuns.

Sem a anuência de nenhum dos depositários, os banqueiros/ourives começaram a lucrar horrores com esse processo de emprestar dinheiro alheio. Principalmente quando perceberam que as pessoas confiavam tanto neles que poderiam simplesmente inventar moedas e emprestá-las. Ele tinha mil no cofre, mas tinha girando no mercado uns dez mil. Era só as pessoas não virem buscar as moedas fisicamente. Os certificados CRIAVAM riqueza sem nenhuma garantia de pagamento. O dinheiro em circulação era basicamente dívida. E não nos esqueçamos de uma regra básica de economia: Quanto mais dinheiro existe, menos ele vale. Quanto menos ele vale, mais caras as coisas ficam. Inflação, seja bem-vinda ao mundo!

E você acha que é isso que ainda acontece hoje em dia? Quem me dera. A coisa engrossa. Enquanto a confusão da “moeda-dívida” só influenciava a iniciativa privada, existia uma certa noção de responsabilidade pessoal. O banqueiro que se virasse com a turba enfurecida se descobrissem. O dinheiro falso sumiria junto com os batimentos cardíacos do espertalhão.

Mas governos existem para tornar tudo melhor. Adivinha quem começa a se endividar com os banqueiros para pagar suas dívidas cada vez maiores? (criadas pelos banqueiros, que encareceram tudo) Quando se tocam do que os banqueiros fizeram, é tarde demais. A economia já está girando com o dinheiro de mentirinha dos banqueiros, inclusive os impostos que o povo paga. Se o Estado quebra os banqueiros, os banqueiros quebram o Estado.

Alguém poderia ter tomado o remédio amargo no passado, mas o poder é tão sedutor… Para manter o sistema vigente, a solução dos governantes é centralizar de vez a produção de dinheiro e criar alguma regulamentação para os bancos. Mas, novamente, é difícil pressionar muito quem tem o poder de te derrubar. Alguns lugares regulam mais o quanto os bancos podem “inventar” de dinheiro, outros lugares deixam correr solto. (Adivinha o que os países que quebraram desde 2008 faziam com seus bancos?)

E nesse processo de centralização, o Estado diz que garante que o ouro referenciado nas notas existe mesmo e pode ser sacado. O que todos sabemos que é mentira. O Estado pode, no máximo, imprimir mais certificados falsos de depósitos para segurar as pontas, não sem ganhar inflação de presente.

Esse papo de que os governos resolveram só agora salvar os bancos falidos não leva em consideração que todo o nosso sistema financeiro é BASEADO no Estado (ou seja, todos nós) pagar se alguma coisa acontecer aos bancos. Ia acontecer, mais cedo ou mais tarde. O dinheiro em circulação no mundo é essencialmente empréstimo que banco faz.

Quando você tem uma cédula na mão, você não tem exatamente uma representação de valor real, você tem uma promessa de pagamento. Não existem 231 trilhões de dólares em coisas “compráveis” no mundo. É basicamente dívida que vai aumentando por causa de capitalização de dívida. “Eu te pago 10 que eu não tenho hoje, mas se você me cobrar amanhã, eu te pago 20 que também não vou ter amanhã!”

Sério, o nosso sistema econômico é isso. Uma bolha. Se um dos governantes dos países ricos assinar uma lei cobrando 50% de imposto dos milionários, vai simplesmente encher seu cofre de dinheiro de mentirinha. O governo sabe que não vale nada a não ser que esteja no mercado.

Se o povo do 1% distribuir todo o dinheiro para os mais pobres, ele não vai valer nada. É MUITO dinheiro, que por “não existir”, não pode voltar para o mercado. Se cada um dos 3,1 bilhões de pessoas que tem menos de 10 mil dólares de riquezas triplicar o que tem, eles vão gastar essencialmente com coisas “reais”. Vai faltar água, comida e equipamentos para satisfazer essas pessoas. Eu sei que é uma sacanagem, mas o dinheiro investido lá no topo, pelos 1% com 40% da renda, não gasta tantos recursos naturais como o que nós, 99%, investimos.

Se o Carlos Slim usar seus 60 bilhões para comprar a Apple, não vai influenciar a quantidade de recursos disponíveis no mundo. Se ele resolver comprar carne para alimentar todos os miseráveis do mundo, não tem vaca, porco e galinha que bastem (não estou nem contando água e vegetais).

Os quase 90 trilhões de dólares dos milionários e bilionários do mundo NÃO pode descer para o resto do mundo. Se todo mundo tiver muito mais dinheiro, e sabemos que esse dinheiro representa basicamente dívidas, TUDO fica TÃO mais caro que é capaz até de aumentar o número de pessoas passando fome. Sem contar que os bancos e as grandes empresas quebram, as pessoas perdem fonte de renda, o Estado quebra.

A economia mundial depende dessa concentração para que a ilusão de valor continue existindo. Enquanto todo mundo acreditar na farsa, a coisa vai andando. Não é nas mãos de quem está esse dinheiro, É o dinheiro. E o sistema é tão nosso quanto dos obscenamente ricos.

Se você toma um empréstimo, se você atrasa sua fatura do cartão, se você ajuda a criar dinheiro, você também está participando do jogo. Provavelmente contra sua vontade, mas mesmo assim. A verdade REALMENTE inconveniente é que o problema do mundo é o excesso de gente, gente pobre que precisa contrair dívidas o tempo todo.

E como tudo isso já está grande demais (a dívida interna americana é de 14 trilhões de dólares, não tem o que fazer, não tem…) para resolver com impostos e incentivos, é apenas questão de tempo até o mercado se auto-regular com mais e mais mega-crises. Previsão MINHA: A economia mundial vai começar a se acertar quando a população da Terra entrar em declínio. Ninguém vai “resetar” o sistema de “dinheiro-dívida” e arriscar quebra-quebra generalizado, além de deposição de inúmeros governantes.

Se tem alguma solução a curto-prazo, ela não está em Wall Street. Ela está em… argh… comunidades auto-sustentáveis baseadas em trocas, como as primeiras da nossa história. Só assim para fugir disso tudo. Como eu não sou hippie, ou hipster (reclamando das injustiças sociais ouvindo seu iPod), sinto muito, mas vou continuar ralando para fazer parte dos 1%. É mais prático, e até me permite ajudar mais gente.

Para dizer que não ganhou nada com este texto, para tentar oferecer alguma solução totalitária que nunca deu certo antes no mundo, ou mesmo para dizer que aposta que agora vamos começar a cobrar mensalidade: somir@desfavor.com