Desfavor Convidado: Extremos.

descon-mentalidadebrasileiro

Desfavor Convidado é a coluna onde os impopulares ganham voz aqui na República Impopular. Se você quiser também ter seu texto publicado por aqui, basta enviar para desfavor@desfavor.com.
O Somir se reserva ao direito de implicar com os textos e não publicá-los. Sally promete interceder por vocês.

Desfavor Convidado: A mentalidade de extremos do brasileiro.

Há muito eu venho postergando pegar mouse e teclado para escrever este texto. Haviam timings melhores, momentos mais propícios para este, mas penso que o texto também poderia estar pior colocado. Por esta ambiguidade com relação ao momento que posto isto, me desculpem.

Desde que o Brasil é Brasil, e, bem, digo isto nos meus poucos vinte e poucos anos de vida, um complexo de vira-lata sempre pairou sobre a mentalidade do brasileiro. Aquele sentimento de “under dog” azarão, uma civilização marcada por várias explorações ao longo da história, o sentimento de pertencer ao terceiro mundo. Mesmo com os incríveis números econômicos que o Brasil atinge anualmente (infelizmente apenas econômicos, pois continuamos quase na mesma nas questões de desigualdade, preconceito, saúde e educação) em que o Brasil já é considerado um dos países emergentes de maior peso, e que também assusta pelo seu PIB, o Brasil foi classificado com outras potências produtivas, o BRIC, o que realmente o marca não mais como um país de terceiro mundo. O que proponho, é que mesmo com profundas transformações no Brasil (as quais testemunhei, não acho necessário voltar tanto assim no passado), o brasileiro sempre manteve esta mesma postura. “Só acontece aqui no Brasil mesmo”, “Não tem lugar com mais corrupção que o Brasil”, “Não importa o que a presidência faça, o Brasil não vai pra frente”, estas frases que são tão corriqueiras que já chegam amortecidas aos nossos ouvidos, nos desarmando de qualquer crítica a este pensamento fomentado pelo status quo.

Indo onde quero chegar, depois desta breve introdução do panorama (que eu noto, aqui, em Curitiba, e na internet, em que não se dá para saber de onde a pessoa está falando) daquilo que observo na mentalidade do brasileiro, é que por causa deste sentimento permanente de “cão vira-lata” o brasileiro se agarra à fortes convicções. Independente de ser direita ou esquerda, a verdade é que há muito radicalismo politizado na fala e interpretação das pessoas. Culpo o sistema de educação brasileiro, que muito pouco contribui na crítica e reinterpretação daquilo que é dito, e também das pessoas que são extremistas. Culpo à elas uma vez que estas não procuram criar uma opinião própria, elas procuram colunistas de opinião, de Leonardo Sakamoto à Olavo de Carvalho, passando por Eliane Brum, Cynara Menezes e também Rodrigo Constantino. E destas opiniões individuais, o leitor comum apenas se apropria destas, sem criar a sua própria, emendando autor com autor daquilo que mais lhe agrade os ouvidos. Digo isto não só em opiniões de assuntos variados, mas também na esfera política, pois é raro você ver na internet alguém que efetivamente tenha lido os livros “alma” de cada parcela política, que na mentalidade brasileira é apenas DIREITA e ESQUERDA. Parece-me que morreu a neutralidade ou “o caminho do meio”, como gosto de chamar. Na minha opinião, muito deste extremismo ocorre por falta de empatia na pessoa antagônica à sua, uma vez que você não goste ou até mesmo odeie aquilo que a pessoa acredita, dificilmente você irá ler as obras que esta pessoa lê. Não digo para as pessoas do facebook saírem lendo qualquer porcaria que seja colocada no mercado a fim de desenvolver sua própria opinião, dá pra fazer menos e ser igualmente satisfatório: criticar aquilo que se lê como um todo. É meter o pau no Olavo e também reconhecer as babaquices do autor que você lê. É saber que tudo pode ser criticado e questionado, e não é por que você concorde em partes com um texto que você deva se apropriar da opinião do autor como se fosse sua e sair reproduzindo-a por aí. A função destas pessoas é ser formadora de opinião, não doutrinador de opinião. Penso que deve frustrar os autores ler “concordo em 100% com o que você disse”, tirando o Olavo, que tem um ego do tamanho da internet(risos). Brincadeiras à parte, é sério o que digo, pois cada vez menos se vê um diálogo entre partes discordantes. Eu explico: é muito raro você ver alguém de direita e esquerda discutindo civilizadamente, é muito mais comum você notar pessoas de diferentes esquerdas, ou diferentes direitas discutindo entre si. Não precisa ser sobre política direta, é muito difícil ver um diálogo entre pessoas pró e contra aborto, você logo vê que o nível baixa, e que a discussão vira briga, não tendo nenhum fruto. O ponto é que hoje é muito mais difícil você ter uma opinião dividida, pois isto necessita que você reconheça que qualquer sistema, qualquer opinião, qualquer construção ideológica possui falhas e elas devem ser exploradas a fim da construção de algo ainda maior: uma opinião baseada em crenças, mas também racionalidade, o que tem faltado nos dias de hoje. É mais difícil seguir com temperança e equilíbrio entre as duas partes de qualquer questão pois isto resulta em “levar pedra” dos dois lados, mas também te coloca numa posição mais preparada para enxergar o panorama geral de cada questão. Finalizando, o brasileiro lentamente está perdendo a capacidade de enxergar as pessoas como algo misturado, ou você é A, ou você é B, descartando a possibilidade do C ou AB, se me entendem. Você é taxado diretamente por uma opinião sobre uma coisa somente, como reacionário ou esquerdopata, quando você também pode dividir suas opiniões entre os dois lados da questão. O problema é que cada vez mais você nota esta titulação escrachada em cada um por, literalmente, pouca coisa, e isto está se tornando vício na boca do brasileiro.

Eu sei que estou fazendo um texto muito horizontal e de pouca aproximação direta, já que uso o termo “brasileiros”, e não “curitibanos”, por exemplo. Mas acho que dá pra entender o que estou propondo aqui. Não acho que nós deveríamos taxar alguém baseada em apenas uma opinião, pois isto é colaborar para que esta mentalidade de apenas um polo na cabeça do brasileiro é nociva ao diálogo, à sustentação da sociedade como um todo, e até mesmo a democracia, que mesmo tendo as suas falhas, ainda propõe um diálogo entre partes discordantes, não a agressão direta como tenho visto.

Tl,dr;
O brasileiro está perdendo a capacidade de pensar nos dois lados de uma moeda, e a polarização extrema da mentalidade do brasileiro na minha opinião ocorre pela falta de crítica às opiniões de pessoas na internet, e isto colabora para uma sociedade mais conflituosa num sentido negativo, que apenas briga e não resolve nada. Também digo a importância de conhecer as duas opiniões sobre um caso antes de taxar qualquer um por qualquer coisa. Se não ficou claro, leia o texto.

Um abraço à todos que leram, obrigado.

AMK

Se você encontrou algum erro na postagem, selecione o pedaço e digite Ctrl+Enter para nos avisar.

Comments (5)

  • ”o Brasil já é considerado um dos países emergentes de maior peso, e que também assusta pelo seu PIB, o Brasil foi classificado com outras potências produtivas, o BRIC, o que realmente o marca não mais como um país de terceiro mundo. ”
    Acho interessante a questão do ser desenvolvido X ser evoluído. Desenvolvemos mas não evoluímos nem um pouco em questões humanas.

  • Mais grave (ou tão grave quanto) o extremo nas opiniões – ou é 8 ou 80, não existe mais o meio termo – é o fato de que muitas pessoas perderam a capacidade de reflexão e de considerar que mudar de opinião seja uma opção.

    Você conversa com pessoas que entendem mais do que você sobre aquilo (há primeiro que se admitir que não sabe tudo) e percebe que existia um ponto de vista inexplorado até então. Pesquisa, ouve o outro lado com atenção, dá margem para os argumentos do outro, expõe os seus e assim nasce um diálogo, uma discussão e neste processo, admite-se que sim, é possível mudar de opinião ou pelo menos refletir e não ser tão radical.

    Mas isso requer abrir mão de uma vaidade que as pessoas não estão preparadas para se desapegar. É preciso ser especialista em tudo. Em tempos de discussões tão vagas, os extremos são uma consequência maldita.

  • Não sei não,
    Todos mostram um pouco do caminho do meio, como vc chamou, em maior ou menor quantidade.
    Isto é diferente de vc ficar ‘em cima do muro’ , aceitando dos dois lados o que é ‘politicamente correto’.
    Puxa-saquismo do que está instituído também se vê muito, e é facilmente confundido com ‘discussão civilizada’.
    Me parece que sustentar sua opinião sem ofensa a opinião contrária seria muito mais correto.
    No campo filosófico e de internet é normal a discussão ,mas realmente não vai exercer influência no mundo real.
    Admiro uma pessoa com menos de trinta falar que aceita algumas das idéias da direita, que chegue a criticar a esquerda , o Petismo.
    Enquanto a direita tem poucas vozes, a esquerda chega a ser massacrante , esta pessoa guarda suas idéias , é um pária.
    Não quero liberação de drogas-Pária.
    Não gosto do mesmo sexo-Preconceituoso.
    Quero vencer sem vantagens por minha cor-Reacionário.
    Acho que a esquerda já teve sua chance-Coxinha.
    A saída da esquerda atual é realmente se apropriar do que é bom da direita.
    Explico, a esquerda está se esvaindo com os resultados ,no mundo real, das suas idéias.
    Aí voltamos no que vc discutiu como ‘ complexo de vira-lata’.
    Pois é…só aqui temos coisas que não mais são aceitas em países mais avançados ,mas comuns em países sub…
    Religião exacerbada? Assassinatos? Governos com tendencias a se associar com Cuba e outros ditadores?Dubiedade? Corrupção?
    É errôneo achar que a defesa dos necessitados , a proteção a direitos de minorias seja exclusividade da esquerda.
    E olha que para a esquerda brasileira, direita é o PSDB.
    Então, antes de achar que o mundo é cor de rosa , que a conversa e a união é a solução , temos que ver antes a realidade ,mesmo que vira-latas, do Brasil.
    O próprio desfavor é um sintoma da realidade política,social e mesmo de idéias da nossa realidade.
    Precisamos sim de antagonismo para ressaltar o ruim, e quem sabe encontrar o bom.
    A semente do desfavor é a semente do que aparece na net, nas redes sociais, da integração dos coroas e dos jovens em torno de uma idéia de mudança.
    Não ao ecumenismo politico, ainda não!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.

Relatório de erros de ortografia

O texto a seguir será enviado para nossos editores: