Flertando com o desastre: A irrelevância popular.

Vocês estão me ouvindo? SIIIM! Mentira!Jesus e Hitler são duas figuras constantes na nossa cultura popular. Virtualmente todo mundo já usou uma das duas figuras em alguma argumentação. E como personagens “pop”, ambos expressam conceitos diametralmente opostos: Enquanto o hippie judeu representa o bem, o anti-judeu faz o papel de grande vilão universal.

(Muito embora um deles tenha sido apenas um ditador cretino com péssimo senso estratégico e o outro provavelmente nem tenha existido, trato aqui das personagens que ficaram para a história…)

Ambos são incrivelmente famosos, mas só um deles é realmente popular: JC. É socialmente aceitável dizer que segue os ensinamentos de Jesus, o mesmo não pode ser dito de Hitler. Popularidade, neste contexto, se mede pela aceitação de uma pessoa ou idéia. E não se pode negar que nesse aspecto o “filho do hômi” ganha de lavada em qualquer disputa com o déspota alemão.

Porém, e este não é um “Flertando com o Desastre” à toa, Hitler tem muito mais influencia como personagem no dia-a-dia. Popularidade é uma vala comum onde a relevância encontra o seu descanso final.

Mas, não nos percamos ainda; falava sobre a maior influência de Hitler na vida do cidadão comum. O impacto de se comparar alguém com o vilão é maior de que a exigência de equiparação com o herói. Ou, em termos mais simples: Chame alguém de nazista por estar fazendo alguma coisa e você VAI conseguir uma reação. Diga que alguém não está sendo cristão em determinada situação e fale com as paredes…

Pessoas e idéias populares se apóiam em visões tão variadas que é inevitável a relativização dos conceitos. Se quase todo mundo define algo como bom, pode ter certeza que dificilmente é pelo mesmo motivo. Se quase todo mundo julga algo como negativo, pode apostar que as explicações vão combinar.

Faz parte da “alma” humana: Gostamos de muitas coisas diferentes, não gostamos basicamente de sentir medo.

É muito mais direto apelar para a repulsa pelos conceitos representados por Hitler do que esperar algum padrão de compreensão dos representados por Cristo (“é bom esse tal de próximo ser parecido comigo!”). E não estou fazendo juízo de valor; não é uma coisa necessariamente boa ou ruim, é uma constatação sobre eficiência.

Constatação que já foi feita por incontáveis outros antes de mim, constatação que dirige nossa mídia ontem, hoje e sempre. Popularizar é sinônimo de descaracterizar. Quanto mais vazia uma mensagem, mais significados podem ser inventados por aqueles que a recebem. Podemos inventar mais desculpas para entender as coisas do jeito que nos é mais confortável assim.

Não é à toa que a mídia de massa se baseia em conteúdo pobre e limitado, não é à toa que estar na moda não significa absolutamente NADA. Relevância e popularidade são inimigas naturais. Se busca-se uma, jamais encontra-se a outra.

Mas ambas podem te levar à fama. Voltando aos exemplos do começo do texto, temos o fato mais curioso: Hitler buscava a popularidade, Jesus buscava a relevância. E foi justamente a fama que inverteu esses papéis… Ambos se tornaram versões unidimensionais do que representaram, caricaturas exploráveis. E como apenas uma dessas imagens venderia algum produto (no caso, sua salvação), apenas uma delas se tornou popular.

E temos vários outros exemplos da vida cotidiana que demonstram como a popularização é o holocausto do pensamento crítico.

Eu venho falando disso há tempos, mas não custa relembrar: A qualidade da televisão brasileira DESABOU assim que o público ganhou voz ativa no conteúdo. Qualquer traço de relevância se diluiu na praga da popularidade. Acabei de ver a notícia de que um Zé Ruela qualquer ganhou o prêmio final naquela merda de reality show rural da Record.

Não acompanhei quase nada sobre o show, mas só de ler quem estava participando também, tive certeza que aconteceu mais um daqueles casos onde o povão elimina qualquer participante com um traço de personalidade em favor de quem não ameaça em nada o “status quo” de que pensar dói.

Como é que num show onde participam um bando de figuras como Sergio Mallandro, Viola, Monique Evans e a porra da Nany People as pessoas PREFEREM premiar alguém tão bovino quanto os animais no curral?

Tudo bem que o mundo seria um lugar melhor se uma bomba caísse em cima da fazenda e matasse todo mundo, mas é terrível saber que o povo está empurrando a praga da popularidade na primeira oportunidade que tem.

(E o “Prêmio Enrolada para Falar de Assunto de Burro e Pobre” do ano de 2010 vai para… Tiaaaaaago Soooooomiiiirrrr! *palmas*)

Estamos vivendo numa era onde não gerar polêmica vale mais do que ter algo a dizer. E não é papo furado de quem ignora o passado: Isso SIM mudou muito nos últimos anos. Popularidade palpável com a “diminuição” do mundo parece uma droga que está nos viciando de forma irreversível.

E a internet serve também como termômetro. Luciano Huck tem dois milhões e meio de seguidores no seu twitter. Agora, me respondam: O QUE CARALHOS ESSE BOSTINHA TEM PARA DIZER? Que roubaram seu rolex? Lógica “bíblica”… Luciano Huck tem muitos seguidores porque Luciano Huck é popular e tem muitos seguidores. (Lógica bíblica original: A bíblia está certa porque está escrito na bíblia que a bíblia está certa…)

Resposta genérica: Sim, é tudo inveja. TUDO.

Sempre foi uma escolha ser popular ou ser relevante, não é esse o problema. O problema é que cada vez menos se lembra que relevância é uma opção. Relevância é buscar a discórdia. A boa discórdia.

Sally uma vez me disse que para fazer uma pessoa te achar inteligente bastava concordar com ela, concordei na hora. Brilhante! Gentinha que busca concordância só quer uma boa desculpa para continuar exatamente no mesmo lugar. Digamos que é a famosa busca humana pela “zona de conforto”. Promova a conformidade vazia e seja recompensado com popularidade.

Não se pode ser relevante dizendo apenas o que as pessoas querem ouvir, afinal, se está apenas repetindo algum discurso aceitável, poderia ser você ou um papagaio treinado. (Eu tenho minhas políticas com atividades repetíveis por animais treinados…)

Relevância não é sinônimo de racionalidade ou de idéias evoluídas, tenham em vista o exemplo citado neste texto. Mas até mesmo um mau-exemplo é uma informação aproveitável. Se te traz uma novidade em termos de idéias, é uma vantagem.

“Toda popularidade é irrelevante.” – Somir.

Se eu me tornar popular, a frase acima vai ser interpretada de uma forma completamente diferente. Provavelmente seria citada em algum discursinho sobre humildade (coisa que eu abomino…). Se eu me tornar relevante, alguém vai corrigir a anta que fizer essa associação. A popularidade não precisa de consistência, ela é uma amálgama de idéias pré-formatadas (e frequentemente estúpidas) na mente das pessoas.

Querem um exemplo? Vejam esse Deleta Eu! especial e confiram quem a anta evangélica em questão cita no final do seu texto. Vejam se nos comentários não caem matando em cima disso… Relevância! Ah, que inveja!

Não que a popularidade não tenha seus bônus, mas perder a voz e se rebaixar ao menor denominador comum é um ônus que nem todos estão dispostos a aceitar. Eu acho o fim da diversão. Nem a Sally, ególatra que é, aceita.

Eu andava precisando de uma injeção de motivação (“ha! injeção, né? viado, né? ha!”) e um comentário de ontem foi exatamente o que eu precisava! Ao ler que tem gente que preferia que eu não postasse mais aqui, eu me lembrei de como é bom ser impopular. Escrevi este texto todo com um sorriso no rosto. (“ha! sorriso, né? por causa da injeção, né? viado, né? ha!”)

Seja lá a histérica que escreveu aquele comentário: Obrigado. Foi muito relevante.

Para dizer que achou o texto irrelevante, para dizer que vai esperar a reação popular, ou mesmo para dizer que ser do contra é ser manipulável por vias inversas (ha! vias inversas, né? viaaa…): somir@desfavor.com

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Comments (13)

  • "O departamento de Processa Eus! é da Sally, mas se ela tiver algum daqueles ataques de negação de sua vertente nerd…"

    Não foi ela quem escreveu sobre o He-Man?

    Suellen

  • "Um "processa eu" sobre o Aquaman seria relevante, que tal?"

    Concordo. O departamento de Processa Eus! é da Sally, mas se ela tiver algum daqueles ataques de negação de sua vertente nerd, eu mesmo escrevo.

  • Eu gostei do texto… acho que algumas partes me descrevem perfeitamente.
    O ruim é ser cercada de gente burra, acontece que quando a relevancia se torna evidente as pessoas se afastam, preferem ser amigas de alguém (burro) no mesmo nível de popularidade. Pensa numa pessoa maior de 20 anos que gosta de Justin Bieber E de Lady Gaga. Atestado de retardo mental, a gente se vê na rodinha dos populares e vadias burras.

  • "Somir: salame à parte, como é que você lida com essa qustão da relevância VS popularidade no trabalho com marketing?"

    Problemas são relevantes, soluções são populares.

    A publicidade cria problemas para a população: "Sua buceta fede."

    O marketing disponibiliza a solução vazia: "Compre Vagisil na farmácia mais próxima."

    Tem gente que trata publicidade como uma das ferramentas do marketing, mas a verdade é que as duas vivem numa dinâmica de "bad cop, worst cop" desde que a economia é economia.

    A campanha tem que ser relevante, mas o produto tem que ser popular. Dissonância cognitiva pré-compra é uma praga… a mente da pessoa tem que esvaziar quando ela está prestes a comprar.

  • Paulo César Nascimento

    Somir: salame à parte, como é que você lida com essa qustão da relevância VS popularidade no trabalho com marketing? Abs

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