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Desfavor da semana: Emburrecimento geral.

| Desfavor | | 26 comentários em Desfavor da semana: Emburrecimento geral.

“Para trabalhar como gari em Cambé, no interior do Paraná, não basta ter o ensino básico completo. É preciso conhecer também o bordão de uma personagem do humorístico “Zorra Total” e saber o nome da atriz que interpretou Pereirão na novela global “Fina Estampa”.

Essas questões fizeram parte de um concurso público que causou polêmica na semana passada ao testar conhecimentos dos candidatos sobre programas de TV e cantores populares.” FONTE

a) Desfavor da semana;
b) Desfavor da semana;
c) Desfavor da semana;
d) Desfavor da semana;
e) Todas as anteriores.

SOMIR

Eu considero que esse tipo de pergunta num concurso público seja um sintoma de falência intelectual de um povo, mas precisamos levar em consideração um fator importantíssimo: Todo o sistema dos concursos públicos já está dando sinais de desgaste, e aberrações como a que ilustra a coluna de hoje tendem a ficar cada vez mais comuns.

Evidente que vão tomar muito cuidado para não colocar esse tipo específico de conhecimento popularesco em edições futuras, mas eu me refiro ao quadro geral de testar conhecimento de coisas que NADA tem a ver com a função que deveria ser exercida pelo candidato à vaga.

A concorrência em qualquer porcaria de concurso já está tão absurda que a maioria das pessoas que passa é boa em… prestar concursos. Essa habilidade, que deveria ser secundária ao conhecimento da área, já é responsável pela maioria das aprovações. Pessoas “normais” não são capazes de alcançar as médias absurdas exigidas atualmente.

A pessoa tem que estar treinada para manter registros fotográficos do material estudado e tomar cuidado para manter a habilidade cerebral de correlacionar informações suficientemente adormecida para alcançar o grau de acertos necessário. Pensar é perigoso numa prova dessas, o segredo é lembrar.

Não é nem uma crítica a quem passa nesses concursos, é uma crítica ao sistema cretino que torna empregos públicos do tipo tão valiosos para o cidadão médio. A concorrência exagerada cria o efeito “Vestibular” (estude para passar, não para aprender), premiando quem decora ao invés de quem poderia exercer melhor a função.

Até um certo ponto, concorrência tem seus méritos, mas como tudo nessa vida, há um limite. Para limar a quantidade avassaladora de pessoas disputando as mesmas vagas, a estratégia é colocar várias armadilhas aleatórias no meio das provas para, num golpe de sorte, derrubar uma considerável parcela de pessoas disputando.

Uma prova baseada em conhecimento específico e a habilidade de aplicá-lo acabaria com dez mil pessoas empatadas com a mesma pontuação disputando uma vaga. Isso é péssimo para quem está organizando. Agora, uma prova que exige memória apurada e apresenta questões aleatórias sobre conhecimentos “gerais” é muito mais indicada para limitar o número de pessoas com pontuação parecida.

E é numa dessas que perguntas cretinas como as sobre Michel Teló e novela da Grobo entram. Não é conhecimento útil ou necessário em nenhuma esfera de serviço público, mas existe uma chance razoável de que várias pessoas tenham “trocado de canal” e não acompanhado o desenrolar dessas baboseiras. (Eu achei as perguntas fáceis, mesmo sendo elitista saberia responder todas; mas eu sou pago para acumular e transformar conhecimento inútil… Não para cuidar da limpeza pública…)

A merda aqui é que esses concursos cada vez mais estão focados em eliminar candidatos. E isso é um absurdo. Não sei se já escrevi aqui no desfavor, mas faz tempo que eu defendo que se derrube os salários de cargos concursados e se elimine a estabilidade… Cargo público não pode ser tão interessante assim. Perguntem para a Grécia se deu certo esse oba-oba com funcionalismo público, perguntem…

Oferta e demanda. Se tem dez mil candidatos por vaga, quer dizer que está interessante até demais. Se piorar a qualidade da vaga, ainda vai ter mil por vaga, e o funcionário que passar vai ter basicamente o mesmo nível. Como as provas se baseiam em decoreba com algumas perguntas “roleta-russa” para pegar otário, não estamos colocando a nata da nata intelectual nas nossas repartições mesmo…

Já esperam tão pouco de quem vai fazer um concurso que conhecimento geral vira conhecimento inútil. Caso o pessoal da UTFPR (FaFuP Paranaense) não saiba, daria para fazer perguntas tão fáceis quanto essas de indústria cultural popularesca no campo de conhecimento “tradicional”. Pergunta quem desenvolveu a Teoria da Relatividade, e coloca o Tiririca como opção ao Einstein; pergunta o nome do presidente chinês e coloca Jackie Chan com opção ao Hu Jintao… A maioria das perguntas ficam fáceis com opções ridículas, e se a maioria errar, é mais incentivo para melhorar a educação.

Grandes merdas se todo mundo errar o nome da música do Michel Teló, capaz até de acharem que o povo está ficando mais esperto. Pior… Grandes merdas se todo mundo ACERTAR o nome da música! Isso não se chama conhecimento inútil à toa!

Sem contar que é ofensivo a quem presta o concurso de gari. Essas merdas de perguntas caem em concurso para juiz por um acaso? As perguntas são para derrubar a moral dos participantes e aumentar a probabilidade deles errarem as próximas? Até porque tem muita gente com diploma fazendo concurso de gari nos últimos tempos…

Pior do que mediocridade cultural é se contentar com mediocridade cultural.

Para dizer que eu só estou com raiva porque não passei no concurso de gari, para dizer que é funcionário público e não é completamente retardado (bom, se você se sentiu ofendido, não conte muito com isso…), ou mesmo para reclamar que os textos estão atrasando no feriado (caguei): somir@desfavor.com

SALLY

Repito aqui o que eu já disse tantas outras vezes: funcionário público tem que ser escolhido com absoluto cuidado e rigor, pois sua função normalmente envolve alguma atividade privativa do Estado, ou seja, algo que se ele fizer mal feito, não existirá chances de procurar na iniciativa privada. Nada mais lógico que se faça uma prova procurando avaliar o conhecimento, a inteligência e a capacidade de raciocínio da pessoa, para assegurar uma prestação de serviço de qualidade. Pena que não é isso que acontece. O reflexo está nesse serviço público de merda, com funcionários medíocres e acomodados.

Esse concurso público que estampa o Desfavor da Semana é apenas um exemplo, dentre tantos outros, de uma prova burra que de forma alguma mede conhecimento. Chama mais a atenção pelo grotesco, uma vez que não é todo dia que se pergunta em concurso público qual foi a música de Michel Teló que o jogador Cristiano Ronaldo dançou ao comemorar um gol ou qual é o bordão da personagem Valéria do Zorra Total. Fecha o caixão do atual sistema de avaliação para seleção de funcionários públicos: pessoas que tenham alta capacidade de decoreba, pessoas adestráveis, sem qualquer preocupação com raciocínio ou inteligência. Mas não se enganem, não é apenas esse concurso, são todos, só que alguns de forma mais sutil.

Graças a esse método de seleção, que aprova quem consegue decorar mais, criaram-se estes funcionários públicos automatizados, que decoram o que tem que fazer mas emperram quando algo sai do script, visto sua total falta de capacidade de raciocínio e de improviso ao lidar com algo imprevisto. Pois é, não ter inteligência e criatividade pode ser um problema. Burocracia, ineficiência e corrupção frutificam em um meio como esse. Acontecem coisas bizarras como a falta de um carimbo gerar anos de atraso em um trâmite relativamente simples, quando o tal carimbo poderia perfeitamente ser acrescentado depois sem prejudicar em nada o processo.

Quando você pergunta em uma prova qual foi o jogador que ficou famoso por liderar a “democracia corintiana” ou quem foi que interpretou o personagem “Pereirão” na novela “Fina Estampa”, está selecionando exatamente o que? Uma pessoa medíocre, provavelmente. Alguém é forçado a acompanhar futebol ou novela global para exercer algum cargo público? É o tipo de prova que deveria reprovar quem respondesse de forma correta! Definitivamente o conceito de “conhecimentos gerais” foi para a casa do caralho, porque as perguntas não tiveram nada a ver nem com conhecimento, muito menos gerais. Sério mesmo… “democracia corintiana” é conhecimentos GERAIS?

E quando você questiona em qual novela a cantora Paula Fernandes (whoooo?) atuou antes da fama ou qual dupla sertaneja anunciou sua separação e depois voltou a cantar, quer avaliar o que? Era prova para trabalhar no TV Fama? Estas perguntas bizarras não eram pouca merda dentro do contexto não, tá? Em uma prova de 40 questões, 10 eram de “conhecimentos gerais”. O mais engraçado é que os idiotas responsáveis por esta cagada em vez de enfiar o galho dentro e admitir o erro, ou ao menos ficarem calados, parecem ter prazer em piorar a própria situação: “As perguntas atendem ao edital da prova”. CLARO, devido ao grau de subjetividade do edital, seria possível enquadrar qualquer merda ali. E, mesmo que o edital previsse um tópico só sobre o programa Zorra Total, continuaria sendo imoral. Idiota quem fez a prova E idiota quem fez o edital. Parabéns a todos os envolvidos, viu?

Como se isto não fosse o bastante, conseguiram piorar a situação, justificando que questões da prova forma retiradas da revista VEJA. Então tá, revista VEJA agora é referência acadêmica para embasar escolha de tema de prova. Bacana o nome de quem fez esta cagada: Fundação de Apoio à Educação (defina educação) Pesquisa e Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Paraná (em algum lugar, o Grande Mestre Alborghetti se revira no túmulo). Esta Fundação está vinculada à Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Defina “tecnológico”, por favor. Fudeu a mariola, a idiotização dominou até o meio acadêmico. Idiocracy, aqui vamos nós!

Quem já fez concurso sabe a fortuna que se lucra: taxas de inscrição caríssimas, numero elevado de inscritos, margem de lucro enorme. SOBRA dinheiro, é um negócio rentável, não há a menor necessidade de fazer essa bandalha mal feita. Quem paga imposto e tem que entregar CINCO FUCKIN’ MESES de salários por ano ao Poder Público sabe o quanto essa brincadeira custa caro. Sim, pagando com o salário do povo digníssimos profissionais qualificados que sabem qual é bordão da “Valéria, do Zorra Total”. É um deboche. Também é um deboche com os próprios funcionários públicos, quero dizer, aqueles que realmente tiveram que estudar e passar em uma prova difícil, pois todos ficam com fama de imbecilóides quando uma manchete dessas estampa o jornal. Em resumo, todo mundo saiu perdendo com essa merda, mais uma vez, parabéns aos envolvidos pelo tamanho da bosta.

Fato: a metodologia de avaliação de concurso público está ERRADA. Premia a burrice, a decoreba. Consolida uma massa de funcionários públicos, nos mais diversos níveis, completamente incapazes de raciocinar. Este caso é especialmente grotesco, mas a metodologia de todos os concursos precisa ser revista, caso contrário continuaremos com um serviço público burocrático e ineficiente, com funcionários acomodados que nunca mais abrem um livro ou se aprimoram ao passar em concurso.

Que tal aplicar provas que meçam inteligência, ética, capacidade de solução de problemas e raciocínio? Que tal aplicar provas ANUAIS para sempre a todos os concursados, condicionando sua aprovação à estabilidade? Só assim para esse bando de filho da puta se atualizar, só colocando a faca no pescoço do brasileiro é que ele estuda. É assim no colégio, é assim na faculdade e continua assim na sua vida profissional. Já que não estudam voluntariamente, para se aprimorar como profissionais, que o façam por medo então. UMA VERGONHA. Uma vergonha de acomodação, amplamente recompensada pelos concursos públicos, pagos com o salário do povo.

O povo? O povo, como sempre, se fode duas vezes: primeiro por pagar cinco meses do seu salário para bancar funcionários desqualificados, segundo por ser obrigado a ser atendido por funcionários desqualificados em atividades que são monopólio do Poder Público, onde não há opção de procurar outro prestador de serviços. Se ao menos houvesse alguma teoria da conspiração, eu até acharia chique. Eu adoro aventar teorias da conspiração. Infelizmente neste caso, a resposta é simples: prova feita por gente BURRA e INCOMPETENTE que está colocando no serviço público mais gente burra e incompetente. Sabe quando este círculo vicioso vai se quebrar? Quando VOCÊ cansar, pegar um avisão e sair dessa bosta de país.

“A esperança não existe, a esperança é o caralho” – Skylab, Rogério

Para se orgulhar em dizer que não passaria nessa prova, para se orgulhar em dizer que já não mora mais no Brasil ou para se orgulhar em dizer que você não é cidadão brasileiro e sim cidadão da República Impopular do Desfavor: sally@desfavor.com


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