Desfavor da semana: Praça de execução.

ds-quenia

“Pelo menos 62 pessoas morreram e 63 são consideradas desaparecidas desde o início do ataque de um grupo islâmico ao shopping Westgate de Nairóbi, no Quênia” FONTE

Claro que era islâmico. Claro que os EUA tem sua parcela de culpa. Claro que foi combatido da forma mais desastrada possível… Desfavor da semana. É claro.

SOMIR

O saudoso Christopher Hitchens tinha várias opiniões impopulares, mas uma das que arrepiavam até mesmo quem partilhava da sua visão secular e humanista era sobre a (segunda) invasão americana no Iraque: Ele dizia que com ou sem armas de destruição em massa, o importante era enfrentar a ameaça islâmica. E caso você não conheça, Hitchens foi um dos mais ferozes combatentes ideológicos da religião em geral. Então nada de querer trocar uma crença irracional por outra: Todas são ruins, mas os islamismo das teocracias e dos grupos terroristas é um sério risco para a sociedade moderna. Vale a pena começar uma guerra para enfraquecê-los.

Mesmo sendo fã das ideias dele, dessa eu nunca partilhei. Afinal, é absurdo tentar a via do ataque militar direto sem antes tentar a via do PARAR DE CUTUCAR! Misture gente muito pobre com sacerdotes religiosos com muita vontade de acumular poder e temos um barril de pólvora destampado. Os grupos terroristas sempre tem algo para apontar como causa de seus atentados. E pior: Na maioria dos casos, eles alegam muito mais destruição e morte do lado deles do que acabam causando nas represálias.

Fanatismo religioso é um veneno para qualquer sociedade, discursinho politicamente correto eximindo a ideologia religiosa dos males que causa é outro pior ainda, mas… como tudo isso funcionaria na prática sem um inimigo violento e ganancioso para unir os terroristas numa só causa? O que aconteceu no Quênia não foi suficientemente coberto pela mídia aqui no Brasil. Jornais ingleses divulgaram matérias com relatos de locais sobre o TAMANHO das atrocidades cometidas dentro daquele shopping.

Relatos de gente sendo torturada, estuprada e executada; homens, mulheres e crianças! E mesmo sabendo que eram em sua grande maioria pessoas de maior poder aquisitivo, os riquinhos da cidade, não dá para ser tão cínico a ponto de achar que as pessoas mereciam tamanho grau de fúria por parte dos invasores; mesmo provavelmente estando enfiados até o pescoço no processo de exploração social que faz de países como o Quênia tão desiguais. Isso é estranhamento entre seres humanos, os terroristas não se identificam na mesma categoria de humanidade que suas vítimas.

Não é nada confirmado, mas já surgiram relatos de que as explosões no shopping foram culpa do exército queniano mesmo, e como medida de misericórdia para os reféns ainda presos ali. Com fanático não se negocia, a merda estava muito feita assim que eles invadiram. Aliás, tem mais uma coisa horrível aqui: como tudo o que se precisa para destruir centenas de vidas, seja no Quênia ou na Noruega, é apenas perder o medo das consequências.

Temos um sistema de punições na sociedade humana que depende muito das pessoas terem medo de perder alguma coisa. Dinheiro, liberdade ou a própria vida. A partir do ponto onde isso não incomoda mais uma pessoa, ela é uma das armas mais perigosas do mundo. O problema dessa desastrada guerra ao terror (fachada para mais expansão comercial de americanos, europeus e golpistas em geral) é que ela vai gerando cada vez mais dessas armas humanas. Gente que perde o temor da consequência.

Isso é resultado do discurso religioso, uma das fundações do islamismo “versão terrorista” é tratar os infiéis como gado mesmo. Mas é muito mais resultado de desigualdade social e de países como os EUA enfiando o nariz em tudo quanto é lugar onde não é chamado. Uma das maiores bases da CIA na África fica na mesma cidade do shopping. Sem esses elementos de desespero econômico e sem a provocação constante, fanatismo religioso costuma entrar por um ouvido e sair pelo outro.

Mas eles conseguem cada vez mais adeptos, os grupos terroristas estão cada vez mais próximos: trocando informações, recursos, treinamentos… Até onde vai isso? Até invadirem um shopping americano? Derrubaram dois dos maiores prédios deles e tivemos apenas mais do mesmo. Cutuca um pouco, cria mais terroristas, espera o próximo ataque, cutuca de novo… Isso deve estar rendendo muito dinheiro para as pessoas “certas”, porque não faz a porra do menor sentido se você quer resolver a situação.

Começo a concordar cada vez mais com Christopher Hitchens. Não por achar que é a primeira melhor opção, mas já que a primeira claramente não vai acontecer… Se não vai sair da moita, que pelo menos cague de uma vez!

Para dizer que eles que não são brancos que se entendam, para dizer que na África tudo está cutucado além da conta, ou mesmo para especular o que a polícia e o exército brasileiro fariam na mesma situação: somir@desfavor.com

SALLY

Tragédia em shopping no Quênia, digna de filme de ação. Aparentemente o numero de mortos vai passar de cem, mas mortos daqueles que contam, daqueles que chocam a sociedade: pessoas que não eram pobres, pessoa com algum status social, pessoas que oficialmente estão acima da violência do dia a dia. Porque pobre morre muito mais do que cem em uma semana, seja no Quênia, seja no Brasil. Mas quando morre gente que “poderia ter sido eu”, há comoção social. Some-se a isso o fator inesperado, a ação cinematográfica e uma atuação questionável das autoridades locais e muita coisa mal explicada. Virou a novelinha sádica da semana.

O grupo que realizou o ataque diz que foi uma represália por terem enviado militares quenianos à Somália em 2011, que eles chamam de “invasão queniana”. Dizem que foi um castigo também para todos os civis que apoiaram essa invasão. Chocada com o rancor dos somalianos, pensarei dez vezes antes de mandar um somaliano à merda depois disso. Como sempre, o pano de fundo dessas babaquices de grande porte que o ser humano faz é religião. Sempre é dinheiro e/ou religião.

A coisa foi bem GTA Quênia. Neguinho entrou pela porta da frente já soltando granada e dando tiro. A intenção era de grupo de extermínio mesmo: subiram os andares atirando e tiveram inclusive o cuidado de entrar e metralhar os banheiros para matar quem estivesse se escondendo por ali. Foi um plano muito bem pensado e premeditado, inclusive chegaram a esconder armas pelo shopping com antecedência para viabilizar o ataque. Evidentemente a segurança do shopping falhou.

Também falharam as autoridades públicas, que permitiram uma coisa desse porte se estender por dias e no final das contas, conseguiram desmoronar um pedaço do shopping tentando libertar reféns. Fontes oficiais dizem que o foi causado por um incêndio provocado pelos terroristas mas há relatos de pessoas que estavam lá e teriam visto um certo tipo de granada usada pelo exército dar causa ao desmoronamento. A autópsia dos corpos, se for feita com imparcialidade, vai revelar a verdade. Mas isso não importa, importa que o saldo total de mortos foi alto e que o cu do mundo piscou, pois estamos todos sujeitos a passar por uma situação dessas.

Só que dessa vez teve uma novidade: os terroristas não são gente cor de azeitona. Tinha gente branquinha junto. Mais: tinha norte-americanoS (no plural) junto. Que coisa, não? O suposto “inimigo externo” que os EUA sempre combateu e demonizou agora está brotando dentro de casa. Nisso que dá dar tanta importância paranoica a um inimigo, sempre tem gente que se fascina por ele e acaba mudando de lado. Acabou a era de terrorista de turbante e barba, estereotipado. Agora qualquer um pode ser. Isso dificulta em muito a vida de uma nação paranoica. O cidadão americano vai começar a sentir na própria pele os efeitos da paranoia e da histeria punitiva, até então só experimentado por estrangeiros.

O inimigo está nascendo dentro de casa. Não custa lembrar o recente ataque ao prédio da Marinha americana, que, em um primeiro momento se atribuía a terroristas islâmicos mas depois constatou-se ser gente de dentro mesmo. Os EUA conseguiram ser tão escrotos, tão injustos, que estão despertando a simpatia pelos terroristas. É como os evangélicos: falam mais do diabo do que de Deus, vivem falando no diabo o tempo todo e acabam alçando-o a uma importância que ele não deveria ter. Dá nisso. Um tremendo desfavor.

O cu do mundo inteiro piscou. Porque não foi um ato esperado em uma zona de conflito. Foi um descaralhamento só, sem sentido. Poderia ser em qualquer shopping, despertou a sensação de “poderia ter sido comigo”. Morreu o sobrinho do Presidente do Quênia, ninguém está seguro nesse tipo de evento. Por muito tempo ter uma certa condição social te protegia, ao menos um pouco no Brasil. Agora a violência está ficando mais… democrática. A ideia de que um grupo de pessoas pode entrar em um shopping atirando contra tudo e todos causa desconforto.

Some-se a tudo isso o fato de que o brasileiro médio não acompanhou esta tragédia com interesse político ou solidariedade. Foi com o sadismo habitual. Apresentadora de televisão morta com o bebê na barriga? O BM não perde uma coisa dessas. O número de buscas por fotos dos mortos é bem maior do que o de informações sobre o ocorrido. O sadismo misturado à alegria de ver gente rica se fodendo alçaram esse evento a uma categoria popularesca, sendo acompanhado de perto por pessoas que nem ao menos saberiam apontar o Quênia em um mapa.

É claro, não podemos deixar de citar também que esse tipo de evento “dá ideia” para os malucos pelo mundo. Não raro vemos repetições desses eventos grandiosos por outros malucos que se “inspiraram” no maluco pioneiro. Gente doida e louca por atenção tende a realizar esse tipo de delírio megalomaníaco. Não me admiraria se outro ataque a shopping ocorresse por agora em outra parte do mundo. O limite entre a cobertura da notícia e o sensacionalismo é tênue e na maior parte das vezes, ao menos aqui no Brasil, a imprensa erra a mão e transforma uma coisa séria em um freak show, banalizando a morte das vítimas.

Para coroar o rol de desgraças, um ataque desses confere um álibi a nações que queira cometer alguma atrocidade socialmente reprovável. Obama já começou a se incomodar, por sinal, ele é filho de um queniano. Se amanhã ou depois ele tiver algum interesse escuso no local, vai ter argumentos para enfiar suas tropas lá dentro. Ele já disse que vai tomar as medidas necessárias para “desmantelar as redes que praticam esse tipo de violência”, ou seja, mais uma carta branca para espionar e violar direitos civis e a soberania de outros países. Saco…

E tem também gente que não sabe NADA, N-A-D-A sobre o ocorrido, mas acha. Porque o brasileiro médio sempre acha alguma coisa, mesmo que não saiba do que se trata. Procurar saber, estudar, é para os fracos. Daí somos forçados a ouvir aquelas opiniões ignóbeis, como eu que no outro dia tive que escutar um BM contando que mataram gente no Canyon. Eu perguntei onde e ele respondeu impaciente “No Canyon, o Grand Canyon, não conhece não?”. Socorro.

Para sugerir o Salvador Shopping ao Al-Shabab, para reclamar que o assunto foi chato ou ainda para dizer que é bem feito para quem vai a shopping: sally@desfavor.com

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Comments (17)

  • E de novo eu pergunto: até onde vai a burrice do ser humano aliada à ganância e a essa idiotice de fatores sejam religiosos, políticos ou econômicos? Poxa, triste ver que nem a morte de pessoas chega ao ponto de não incomodar mais os outros. Neste sentido concordo com o que o Somir disser sobre isso se tornar uma das armas mais perigosas do mundo.

  • Sobre a opinião de Hitchens concernente a segunda invasão do Iraque, penso que há um equívoco na pretensão de enfrentar a “ameaça islâmica”, especificamente no que se refere ao alvo escolhido por Bush. Pelo que se sabe, outros países do Oriente Médio abrigavam organizações terroristas e tinham as características apontadas pelo sr. Somir de forma mais intensa do que o país invadido. Evidentemente, o regime de Saddam Hussein era uma ditadura, inclusive com apoio em uma facção muçulmana em detrimento de outras. Entretanto, não se constituía em uma teocracia como outros governos que, aliás, são aliados dos Estados Unidos.
    Logo, reforça-se a tese de que a causa da invasão era uma conjugação de fatores políticos e econômicos. Convém frisar, aliás, que o terrorismo no Iraque, ao invés de diminuir, aumentou depois da invasão, provavelmente com a fundação e estruturação de organizações terroristas em seu território.
    Ora, qual seria o método de “combate” da “ameaça islâmica”, então? Lembrando que auxílios efetivos a esses países não são exatamente um método preferencial das grandes potências, especialmente dos Estados Unidos…

    PS: Os senhores “blogueiros” leram “Infiel”, de Ayaan Hirsi Ali?

    • Colega, aqui é um blog informal. Não sinto clima para fazer do texto um tratado técnico, acho pomposo e arrogante.

      SR. SOMIR? Credo.

      • Cortesia e educação. Honestamente, não me sinto a vontade para dirigir-me aos senhores de outra maneira, já que não há qualquer intimidade entre as partes.
        De qualquer maneira, suponho que a exposição de argumentos de modo mais ou menos formal não lhes retire a essência.

        • Não, não. É perfeitamente possível ter cortesia e educação sem tanta pompa e formalidade. Isso é coisa de gente insegura!

            • Posso sim. Falar difícil é ótimo no meio acadêmico, em tese de mestrado e doutorado eu falo difícil. Mas em um lugar onde a proposta é ser democrático, falar difícil limita a compreensão do que está sendo dito a poucos. Acho isso elitista, o conhecimento deve chegar até todos e no que depender de mim, quem fala para poucos não tem voz aqui.

              • Talvez padeça de incapacidade interpretativa, mas há uma pretensão de censura em relação a quem utiliza-se de um modo de expressão mais “complexo”?

                • Censura? De forma alguma, se houvesse nem o seu primeiro comentário teria sido aprovado. Você apenas está ciente de que não é bem vindo aqui. Se quer ter a falta de amor próprio de continuar frequentando a “casa” de quem te diz que você não é bem vindo e não tem o perfil, a vergonha é sua.

                  • Seu sectarismo é patético. Onde está a “democracia” se há esse tipo de reação em relação a quem utiliza-se de tal ou qual tipo de linguagem?
                    No mais, não sei se a srta. notou, mas usei o termo “censura” no sentido de “repreensão” que, pelo visto, é tão intensa a ponto de causar-me perplexidade.

                    • Burrinho você, hein? Primeiro que ninguém aqui disse que isso é uma democracia, o blog é meu e eu escolho as pessoas com as quais quero conversar. Só não censuro ninguém. Ausência de censura não significa democracia. Burrinho mesmo. Sobre te repreender? Não sou sua mãe. Não vou te repreender de nada, VOCÊ me perguntou porque eu não gostava do que você escrevia e eu respondi. A pessoa pergunta, ouve a resposta e depois se vitimiza falando em censura… engraçado! Não é censura. Apenas não te quero aqui, acho que você empobrece meu blog.

                      Patético é você ser carente a ponto de ficar voltando, voltando e voltando em um lugar onde não é bem vindo. Minha casa, minhas regras. Não vou te censurar, mas pedir para gostar de você e conversar com você é demais, né? Muita pena da sua carência e da humilhação à qual está se sujeitando.

                      Você precisa tanto de atenção que fica voltando aqui, ainda que seja para ser esculhambado. Deve ser o choque, porque o brasileiro médio fica fascinado por imbecil que fala difícil e pela primeira vez você se deparou com alguém que não se espanta por isso.

                      Enfim, é isso. Vou repetir: VOCÊ NÃO É BEM VINDO AQUI e sua postura é incompatível com a nossa filosofia. Não vai ter censura, mas também não vai ter a obrigação de te tratar bem.

                      Agora já deu, minha cota de atenção a você se esgotou. Se quiser continuar vindo, continue. Será ignorado e cada comentário será mais uma humilhação para você, forçando presença em um lugar onde a dona já deixou claro, em público, que você não é bem vindo. Humilhe-se, isso vai me divertir e provar meu ponto.

  • “Chocada com o rancor dos somalianos, pensarei dez vezes antes de mandar um somaliano à merda depois disso”

    Os somalianos também são os piratas no Oceano Índico, sequestrando desde pequenas embarcações de aventureiros a petroleiros, que fizeram com que os exércitos dos grandes países escoltassem os navios mercantes que passam naquela região. Não é por menos que a região merece ser chamada de chifre da África não apenas por uma questão de geografia.

    E, da série juntando a fome com a vontade de comer, há muitos israelenses no Quênia, tanto turistas quanto empresários (um andar do shopping era dominada por eles). Logo, ataques a negócios, hotéis voltados para israelenses e até a aviões comerciais deles (tentaram derrubar um 757 com uma bazuca dez anos atrás) vem acontecendo desde os anos 80. Assim, desde sempre Israel já pedia para os quenianos reforçarem a segurança do shopping. E nada…

  • Sally e Somir:
    Já disse a vocês que tenho procurado me informar sobre assuntos como esse olhando primeiro sempre no Desfavor? Parabéns a ambos. Os dois textos se complementam. Ah! E fiquei desacorçoado com o que a Sally relatou no último parágrafo do texto dela…

    • O Brasileiro Médio se informa tal qual passarinho, que come a comida vomitada na boca pela mãe: o que a imprensa joga para dentro mastigadinho entra sem a menor resistência. Uma pena.

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