Desfavor Convidado: Cosme e Damião.

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Série Jornalismo Literário: Cosme e Damião.

Por vezes os escritores e jornalistas resolvem escrever sobre fatos históricos. Impossibilitados de recorrerem diretamente à fonte, nessas ocasiões é dever do escritor pesquisar sobre a história que vai relatar e retirar um pequeno espaço desse tempo para dar o maior número de detalhes possíveis. Para isso, ele pode recorrer a documentos, historiadores, museus ou até mesmo aos descendentes das pessoas que viram de perto a História que esta sendo relatada.

No Brasil, um dos escritores mais conhecido nesse estilo é o Fernando Morais, que já escreveu biografias sobre Paulo Coelho, Olga Benário Prestes, Assis Chateaubriand, dentre outros. Na língua inglesa e muito mais ficcional, temos Bernard Cornwell que, na minha opinião, é um dos melhores escritores da atualidade.

II

Os mesmos lugares onde hoje voam bombas e gases mortais, serviram de palco para a vida e obra de dois grandes homens chamados Acta e Passio. Gêmeos nascidos na Arábia, um estudou medicina e o outro farmácia e são hoje conhecidos como os santos Cosme e Damião. Essa é a história desses dois irmãos e sua festa que é sempre comemorada em Setembro, sendo que aqui em campinas a comemoração foi feita no dia 22.

O sol raiava na Arábia quando a parteira finalmente retirou um dos meninos do ventre da mãe. O interior da tenda estava quente e elas suavam tanto que as gotas faziam pequenas poças no chão. O menino nasceu saudável e não demorou muito para começar a chorar. Achando que seu trabalho esta feito, a parteira se preparava par se retirar, mas sua auxiliar fez um alerta:

_Olhe senhora, tem mais uma cabeça saindo ali.

A parteira voltou ao trabalho no mesmo instante e a mãe já estava esgotada, mas conseguiu fazer com que aquele segundo filho saísse vivo e forte como um touro. A parteira raramente fazia parto de gêmeos e quando isso acontecia, considerava o ato como uma benção divina:

_Esses meninos serão especiais, cuide deles com muito carinho. – disse ela ao entregar os dois para a mãe que, sedentos, já procuravam-lhe os seios para mamar.

A partir de então a mãe fez como a parteira havia recomendado e cuidou dos meninos como se fossem dois príncipes. O pai não concordava muito com essa atitude e sempre que podia cortava alguma regalia, para que os meninos conseguissem algumas coisas a partir de seus próprios esforços.

Apesar desse pequeno embate entre os progenitores, nunca faltou nada para os dois meninos e eles levavam uma vida sem dificuldades. Até que um dia um pequeno grupo de cristãos chegou ao vilarejo, eles estavam sedentos e muito cansados por causa da longa caminhada que haviam feito.

Apesar de serem desconhecidos, foram recebidos com festa e alegria, pois traziam as boas novas de Jesus Cristo. E como os meninos adoravam as histórias do Mestre. Quando a fogueira se acendia, eles sempre tentavam se sentar o mais próximo possível e ouviam com atenção as mensagens enviadas por Deus:

_Um dia Jesus andava pelas ruas e encontrou um aleijado que pediu por sua ajuda. O Mestre então se aproximou e apenas disse: “Levanta-te e anda”. Então o homem se levantou e andou, pois estava curado daquele mal. Isso nos ensinou que Jesus é o médico dos médicos, pois opera com o poder de Deus.

Os dois irmãos ficaram intrigados com o pode de cura de Jesus, pois desde pequeninos eles gostavam de brincar de fazer curativos nos amiguinhos. Alguns resultados saiam melhores do que o esperado, como daquela vez em que Abdulah havia quebrado a perna e eles haviam feito uma tala improvisada. Em apenas algumas horas a perna já melhorava visivelmente e ele pode voltar a brincar antes mesmo da noite cair.

No dia seguinte eles já anunciavam: “Nós agora vamos curar em nome de Jesus”. A partir de então, a fama dos dois começou a se alastrar, pois eles sempre conseguiam curar os males das pessoas, não importava qual fosse a doença. Por isso, pessoas vinham de muito longe para se consultar com eles, que nunca cobravam pelos seus serviços.

Quando chegaram na juventude, um foi estudar medicina e o outro farmácia. Se formaram como os melhores alunos em suas áreas e se tornaram missionários na Egéia, onde continuaram seu trabalho de cura com as pessoas. Quando alguém agradecia, eles simplesmente diziam: “Não agradeçam a nós, mas sim a Jesus, que é quem nos dá o poder de cura”.

Num desses dias eles caminhavam em uma rua cheia de pessoas, mas no meio do caminho havia um cãozinho muito doente. Tão doente que mal conseguia se erguer. Então os dois pararam e se aproximaram do pobre animal: “O poder de você foi feito para curar os homens, nunca conseguirão curar um animal inferior como esse cachorro” – disseram os transeuntes. Porém os dois não se detiveram e fizeram sua obra sem se importar com a opinião alheia.

Após alguns instantes o animal estava curado e correndo feliz pelas ruas: “Vejam irmãos, curamos o cão. Vocês disseram que ele era um animal inferior, mas aos olhos de Deus, todos os seres vivos possuem igual importância. Não se esqueçam que toda a criação aguarda, com ardente expectativa, pela manifestação de Deus”.

Apesar do milagre, muitas pessoas não concordaram com a atitude dos gêmeos e a língua maligna do demônio começou a perpetuar e chamaram a atenção das autoridades locais. O cãozinho curado, ao contrário das pessoas, começou a seguir fielmente os dois por todos os lugares aonde iam e recebeu o nome de Raf, por ter sido curado pelo poder divino. Por onde o trio passava, eram recebidos com muita alegria, principalmente pela crianças, que adoravam fazer festa com Raf.

Mas um dia o que era festa virou tragédia, pois os romanos começaram a perseguir os cristãos. Como os dois irmãos eram muito conhecidos, foram rapidamente identificados pelos soldados romanos. Ao serem interrogados se eles eram mesmo cristãos, os dois não negaram a fé e foram presos.

Na prisão, eles foram torturados cruelmente com a intenção de negarem o cristianismo: “Vocês são acusados de feitiçaria e de usar meios diabólicos disfarçados de cura. Se negarem isso agora e se converteram aos deuses romanos, serão perdoados agora mesmo” – propôs o torturador. Mas os irmãos responderam: “Nós curamos apenas em nome de Jesus Cristo e pela força de seu poder. Não podemos negar a nossa fé, pois é ela que nos sustenta nesse mundo”.

Quanto mais eles negavam a religião romana, pior ficavam as torturas. Eles resistiam bravamente até que um dia receberam um ultimato: “Vocês confirmam que são cristãos e que divulgam as palavras de Jesus?”. “Sim, confirmamos”. “Vocês negam que realizam feitiçaria ?”. “Sim, negamos”. “Vocês confirmam que chegaram a realizar a cura de um cachorro ? “. “Sim, confirmamos”. “Então fica claro que são feiticeiros, pois só uma feitiçaria maligna poderia curar um ser inferior”.

Sendo assim, eles foram condenados à morte por decapitação e suas cabeças ficaram expostas na rua para que outros cristãos tomassem aquilo como lição. As pessoas que foram curadas pelos irmãos tinham medo e vergonha de passarem ali e serem reconhecidas, sendo que o único a se manter fiel pelos dois foi Raf que, apesar de sempre ser expulso dali, acabava voltando para ficar ao lado das cabeças de Acta e Passio.

Quando as cabeças ficaram irreconhecíveis, elas foram enterradas ao lado dos corpos de seus donos. Raf continuou sua vigília no túmulo de seus antigos donos, até que um dia, dois irmãozinhos passaram por ali e acabaram adotando o pequeno galgo, que viveu por muitos anos e trouxe imensa felicidade para a casa daquelas crianças.

Já o local exato onde os corpos foram enterrados se perdeu ao longo do tempo, mas dizem que é possível ver duas árvores exatamente iguais em diversos pontos da Síria e que para encontrá-las, basta ter a ingenuidade e a humildade de uma criança.

Notas: A história de Cosme e Damião contada no texto está de acordo com o divulgado pela Igreja Católica, porém tomei algumas liberdades poéticas. Uma delas é o cachorro Raf, apesar dos irmãos realmente usarem seus dons para curarem animais, não há relatos de que eles possuíam algum animal de estimação. Tomei essa liberdade para demonstrar que muitas vezes os animais são mais fiéis que os humanos ingratos. Outro detalhe é o das árvores gêmeas, que inseri apenas como detalhe sentimental ao texto.

Chester Chenson

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Comments (3)

    • além da história deles, o motivo para a adoção é o mesmo da Igreja Católica, ou seja, os milagres realizados a partir de pedidos para Cosme e Damião, que são os protetores das crianças enfermas….

      Na Umbanda Cosme e Damião recebem o nome de Ibeji, entidade que assume a forma infantil nas manifestações, protetor das crianças, vibrando nas linhas de Ogum, Xangô e Oxalá, principalmente. Governa os nascimentos, os princípios, na Natureza ou nos fatos da vida. Possui a capacidade de tornar os ambientes alegres e felizes pela sua vibração característica, estimulando as diversões e prazeres com fins de aliviar as tensões surgidas com as atribulações, dono da energia mais sublime, canalizada dos planos mais elevados.

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