Novo nazismo?

+Os protestos que aconteceram na universidade de Berkeley antes da apresentação planejada do comentarista de direita Milo Yiannopoulos causaram cem mil dólares de danos no campus, segundo a universidade.

A notícia está em inglês porque passou em brancas nuvens na imprensa brasileira. O movimento anti-direita está saindo de controle, e a liberdade de expressão está ameaçada até nos EUA… desfavor da semana.

SALLY

Pense na história que vou te contar de forma atemporal. Pense apartidário. Pense sem nenhum fator externo te influenciando.

Uma pessoa é convidada por uma universidade para dar uma palestra. Eu disse convidada, ela não foi na marra nem impôs sua presença. A palestra não é obrigatória, quem tiver interesse vai, quem não tiver interesse não vai, inclusive as entradas estavam esgotadas, muita gente queria ver. Porém um grupo decide que o palestrante não tem o direito de falar, pois discordam do seu posicionamento. Em vez de não ir e permitir que quem se interessa ouça ou em vez de ir e argumentar, o grupo que discordava do pensamento do palestrante decretou que ele não teria o direito de falar.

Estes alunos atearam fogo em diversos pontos da universidade, quebraram vidros, janelas e montaram barricadas com os restos do que eles destruíram. Jogaram pedras e fogos de artifício não apenas nas janelas, mas também nas pessoas e nos policiais. Entraram em confronto com autoridades da faculdade, agrediram pessoas. Foi tanto quebra-quebra e agressão, que a palestra teve que ser cancelada. Alunos que iriam assistir à palestra (a Universidade disponibilizou 500 convites, que estavam esgotados) foram severamente hostilizados e agredidos, tiveram que se esconder no banheiro. Jornalistas da grande imprensa também foram agredidos enquanto trabalhavam.

Poderia ser um evento em 1969, onde uma pessoa contra a ditadura militar tentava pregar liberdade de expressão e era silenciada por pessoas defensoras deste regime. Poderia ser um evento em algum país regido por uma ditadura, uma republiqueta como a Venezuela ou um país isolado do mundo como a Coreia do Norte, onde adoradores do regime, a exemplo de seus líderes, que amam silenciar quem discorda, calassem a boca de quem os contraria ou incomoda. Mas não foi. Esta história, meus queridos, aconteceu esta semana, nos EUA.

Estamos falando de Los Angeles, Universidade da Califórnia em Berkeley. O palestrante é Milo Yiannopoulos, escritor e editor de um site de direita, e, simpatizante de Donald Trump. A pergunta aqui não é se você gosta dele, se você concorda com ele ou se quer ir a uma palestra dele. A pergunta é: você acha correto que pessoas impeçam quem discorda delas de falar? Eu não acho, independente do lado, independente da minha opinião pessoal. Quero viver em um mundo onde todos possam falar, inclusive os que eu discordo. Na minha casa, mando eu e nela só entra quem fala coisas compatíveis comigo. Mas no mundo? Em uma Universidade? Não tenho a pretensão de determinar quem pode palestrar e quem não pode.

O mais curioso é a forma como a imprensa vem noticiando: Yiannopoulos como um radical, de extrema direita, como um idiota e quem o silenciou como pessoas bacanas e cidadãs. Oi? Gente, tá ficando fácil para o Trump, estão fazendo por onde ficar extremamente fácil para o Trump! Quando os supostos defensores da liberdade conseguem ser mais radicais que “um radical de extrema direita”, bem, desculpe, falharam miseravelmente. Silenciar diversidade é tudo que essas pessoas sempre criticaram e agora estão fazendo justamente isso! Que triste que o oprimido vire opressor com tanta facilidade, que cegueira é essa que toma conta das massas?

Você pode falar o que quiser de Yiannopoulos, pode desprezar, discordar, criticar e até xingar. Mas se você cogita como legítimo que ele seja proibido de falar por você não concordar com ele, desculpa, o radical é você. Os mesmos que metiam o malho em black blocks que quebravam coisas na rua em manifestações contra o PT agora aplaudem quebrar uma Universidade, agredir estudantes e jornalistas. Gente, vai no mercado comprar meio quilo de vergonha na cara! É patético, contraditório: “se eu não gosto da pessoa, então acho aceitável censura e violência”. Por favor, a esta altura da evolução deveríamos ser melhores do que isso.

Tudo isso se agrava se gente pensar que a lei americana é bem diferente da brasileira. A coisa mais sagrada para os EUA é a liberdade de expressão. Concorde você ou não com esta premissa, é ela que sempre regeu o país, que permite coisas como sites de pedófilos como o NAMBLA. Então, o absurdo fica ainda maior, se levarmos em conta que aconteceu em um país que sempre se orgulhou e teve como base a liberdade de expressão. Não há nada, cultural ou historicamente, que ampare qualquer defesa a esse ato.

Obviamente, Trump lidou com a questão como lhe é peculiar: disse que se a universidade não permite liberdade de expressão e promove agressão e vandalismo então vai ficar sem recursos. Simples assim. Eu concordo? Não, eu não concordo. Mas vai funcionar. Porque a esquerda está em guerra faz tempo, e só não tinha virado uma guerra civil porque ninguém tinha revidado. Todo mundo, e me incluo nisso, estava enfiando galhos dentro: abusos, injustiças, mentiras e autoritarismo de uma esquerda deslumbrada com o poder. Surgiu um maluco que não tem o menor medo de se indispor e vai tacar fogo no cabaré. E, quer saber? Parte de mim acha muito bem feito, mesmo sem concordar com ele.

Façam o seguinte exercício mental: e se fosse ao contrário? E se Obama tivesse acabado de se eleger e quem era contra ele tivesse quebrado, depredado, agredido e impedido um escritor de falar por ser favorável a Obama? O que iriam dizer? Absurdo, racismo, barbárie. Pediriam a prisão e punição exemplar desses vândalos (sim, pois quando não se simpatiza com a causa, são vândalos). Porém, como simpatizam com a causa, não tem coragem de se posicionar contra essa tonelada de bosta que aconteceu.

Deixa eu te contar um segredo: você pode detestar Trump e Yiannopoulos, e, ainda assim, achar um absurdo o que aconteceu. Isto, é claro, se não tiver uma mente burra que só sabe pensar de forma polarizada. Dá para falar uma coisa dessas no Brasil? Não dá, pois se você disser que é contra esse tipo de manifestação começa o que eu apelidei “A Turma do Quer Dizer”: “Quer dizer que você é a favor do Trump?”, “Quer dizer que você odeia negros?”, “Quer dizer que você acha que tem que desrespeitar mulheres?”. Não, cacete. Quer dizer que eu acho que não é assim que se combate a intolerância do Trump: com mais intolerância.

O Desfavor nasceu para lutar pela liberdade de expressão, e assim continuaremos, independente de que político seja contra ou a favor. Nossa causa é essa, muito maior do que política e não se confunde nem se personifica em ninguém. E hoje, pasmem, quem é contra Trump está se tornando contra liberdade de expressão. Que triste como estão facilitando as coisas para o Trump…

Para descrever centenas de barbaridades ditas por Yiannopoulos como se isso justificasse censura, para pagar de analfabeto funcional e cobrar liberdade de expressão aqui dentro ou ainda para reclamar que os desfavores da semana estão ficando repetitivos (reclame com o mundo!): deixe seu comentário

SOMIR

Eu já tinha falado do Milo (não é intimidade, é que o sobrenome é tenso de ficar escrevendo sempre) antes, sobre essa característica provocadora do fabuloso gay conservador e seu potencial de tirar do sério a esquerda americana. Às vezes, mesmo que uma pessoa diga coisas que você não concorda, há de se admirar a coragem de ser vocal sobre suas posições quando vão contra o convencionado politicamente correto nos dias de hoje.

O mais bacana de alguém como o Milo é como ele demonstra uma falha no argumento dos histéricos do outro lado: se todo mundo da direita é homofóbico e racista, como explicar que um gay que fala abertamente sobre sua preferência por parceiros negros faça tanto sucesso entre eles? Ninguém vai numa palestra dele esperando a defesa de valores tradicionais da família e argumentos sobre superioridade racial dos brancos. E quem vai, decepciona-se rapidamente. A linha de Milo é basicamente contra a demonização do homem, principalmente do branco. Mas como isso entra em choque com os exageros da esquerda histérica americana, sequer se dão ao trabalho de conhecer quem estão odiando. Milo tem o poder inclusive de reduzir preconceitos se conseguir se apresentar para o público-alvo dele.

Mas tem algo de muito ruim acontecendo no momento, e é a radicalização de muita gente furiosa com a eleição do Trump. A tal da direita alternativa foi criada na visão do grande público pela campanha da Hillary, e toda a frustração com a passada de perna que foi a chegada de Trump ao poder potencializou o medo de vários grupos de perderem as vantagens que haviam conquistado nos últimos anos. O que está desenrolando no momento é muito perigoso, é um dos lados partindo para a violência deslavada.

Quando Obama foi eleito, os republicanos piraram também, mas foi muito mais latido do que mordida. Sim, desejavam a morte do negão assim como estão desejando a morte do laranjão, mas não tinha essa fúria toda sendo descontada na sociedade. A direita americana se organizou para tomar o poder no próximo ciclo, e conseguiu. O que assusta é que agora a esquerda parece não ter um plano, e sim só a vontade de rejeitar o presidente eleito. Os democratas estão em frangalhos, perderam o controle da sua base e agora vão ser infiltrados por pessoas mais e mais radicais.

A administração Obama viu o surgimento do Tea Party, uma versão radical da direita que foi resultado direto da frustração deles com não ter eleito seu candidato. Mas o Tea Party foi tratado como piada, e não agiu de forma violenta nos oito anos que teve que entubar Obama como presidente. Os radicais de esquerda, por sua vez, já estão mais violentos agora do que todo o outro lado nesse tempo todo. Isso tem um grande potencial de problemas, porque as pessoas aguentam esse tipo de pressão violenta por algum tempo antes de agirem de acordo.

E vamos lembrar que o lado do Trump é o lado das pessoas que estão armadas até os dentes. Só precisa de um maluco de direita no meio de mil malucos de esquerda pra começar a revidar. O bando de animais de destruíram uma universidade só porque não gostam do que uma pessoa diz podem ficar ainda piores se isso escalar para violência armada. Não tem santo em nenhum dos lados. A polarização de opiniões está cada vez mais como a cara dos tempos atuais, um barril de pólvora esperando para explodir.

E acontecimentos como em Berkeley são faíscas. Faíscas que vão se repetindo com uma frequência cada vez maior. E tudo alimentado por uma mídia que ainda não consegue engolir como tomou esse chapéu da população, que escolheu a pessoa “errada”. É uma era de ouro para a mídia de esquerda (democrata/liberal) americana, Trump vai dar motivo atrás de motivo para chiliques, e vai ter muita gente vendo. Atrapalha também a campanha quase militar de dizer que o povo americano vai se unir e ficar mais forte para resistir ao Trump.

Isso JÁ mexeu com a cabeça de muita gente. Embora eu acredite que vândalo é vândalo independentemente do motivo, a reação popular sobre os abusos vai ficar menos severa enquanto essa mentalidade de defesa contra as maldades do maluco da Casa Branca estiver ativa. Na guerra vale tudo! Eu não apostaria numa guerra civil por aquelas bandas, mas que isso pode ficar feio rapidamente, pode. Enquanto não conseguirem tratar o acontecido na universidade como a antítese do que os EUA deveriam representar, como uma afronta terrível contra a liberdade de expressão, o tema vai continuar relegado ao segundo plano, permitindo que imbecis violentos continuem tentando essa campanha de censura debaixo do nariz da nação que morre de orgulho de ser contra a censura.

A esquerda americana vacilou feio alienando metade da população validando o discurso de demonização do branco e do homem, nem que fosse por fazer vistas grossas para os radicais do seu lado, e agora tende a vacilar feio de novo não combatendo esse câncer violento dentro de seus ranques. A coisa vai ficar muito feia quando começarem a revidar. Isso poderia ser evitado, mas enquanto estivermos tão afeitos a esse maniqueísmo de mocinhos e bandidos de acordo com sexo e raça, as coisas vão continuar nesse rumo.

Intolerante também é intolerante, independentemente do motivo. Os novos nazistas vão ser contra o nazismo… a humanidade é fascinante.

Para dizer que ficou curioso sobre o Milo, para dizer que censura sempre funciona muito bem para esconder ideias (só que não), ou mesmo para dizer que daqui a pouco começam os tiroteios contra o Trump: somir@desfavor.com

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Comments (19)

  • Por mais que eu discorde de alguns posicionamentos do Milo, acho ele muito foda. O cara é inteligente e pouca gente sabe debater como ele. Além disso, acho que não tem homem hétero quando ele tá presente…eu me considero hétero e ele é um dos raríssimos caras que eu olho e penso “hmm…”.

    Quanto ao radicalismo da esquerda, ainda mais depois dessa demonstração nos EUA, penso duas coisas conflitantes: ao mesmo tempo que eu queria que as autoridades abrissem fogo e mandassem esse bando de filho da puta pra vala, também acho que seria um erro porque se tem uma coisa que a gente não pode dar pra essa gente, são mártires.

  • Pois eu conheci os vídeos do Milo ontem, sem ter lido o texto de vocês. Cheguei nele pelos stand-up do Bill Burr. É o momento da inversão do pêndulo. O bom do Milo e da Paglia é que são gays e aí desmonta aquela coisa estereotipada de “nos VS eles”. E o Milo só desmascara fraudes estatísticas da esquerda e da terceira onda feminista. Sem falar que o visual do Milo já vale o ingresso. Imagina o Félix da novela com o cabelo platinado. Uma bicha má no melhor estilo Oscar Wilde.

    • Pena que ainda vai demorar até cair a ficha de forma massiva de que os oprimidos viraram opressores com uma rapidez constrangedora

  • Olha, Sally e Somir, concordo com vcs. Eu mesma detesto esse Milo, ele é um completo imbecil, mas porra, deixa esse cara falar pro público dele, quebrar tudo por causa dele só mostra o quão fascista essas pessoas são. É só não ir! Mas pra estas pessoas, nada mais importa, só os sentimentos delas, só o que elas querem, isso mostra um egocentrismo muito perigoso.

    • Minha opinião, com a qual você pode concordar ou discordar: não deve haver limites para opinião. Cada um pode expressar a opinião que quiser. O que devem ser punidos são atos.

      • Fora que se as pessoas forem absolutamente livres para se expressar, é bem mais fácil localizar os preconceitos diversos da sociedade e criar uma forma realmente eficaz de combatê-los, ao invés de fazer quem os tem falar escondido e tomar um susto quando age… se fosse mais fácil identificar racismo/intolerância religiosa/machismo/homofobia, ia ser bem mais fácil impedir a concretização de atos de violência. Melhor lutar contra um inimigo visível do que cobri-lo com a capa da invisibilidade e fingir que sumiu.

        • Paula, muito bem dito. Quanto mais as pessoas colocam seus preconceitos pra fora, melhor o diagnóstico do problema. Que nem doença, quanto mais se admitirem os sintomas, mais fácil ficará a cura. Do contrário, varrer os sintomas pra debaixo do tapete só piora.

  • Eu acho que essa intolerância é o maior tiro no pé que qualqurr grupo político pode dar. O resultado mais evidente é dar munição pro adversário falar mal, dar uma liberdade implícita para retaliações e, no fim, enforcar um.movimento com a própria corda de atos dele. Ainda mais um que prega tolerância e faz uma porra dessas pra impedir alguém de se expressar.
    Faço minhas as palavras de vocês. Não gosto do Trump e acho que ele está fazebdo coisas absurdas, mas destruir a liberdade de expressão só por pirracinha de ter perdido a eleição é algo mais absurdo e perigoso ainda.

  • O mais revoltante é ver a mídia ou ignorando o caso ou no máximo noticiando como “palestra de militante da extrema-direita provoca protestos em campus universitário”.

    Será que o descrédito pela esquerda e pelos guerreiros da justiça social ainda há de alcançar o público em geral por lá?

    • Sim, a mídia pintou o cara como radical e quem queimou e quebrou tudo como entusiastas da liberdade. A mídia está cegamente contra Trump, é bom todo mundo ficar sabendo e chegar bem cada notícia.

  • Mas é assim mesmo. Qualquer pessoa que se posicione como de direita ou de esquerda já está tomando uma postura radical. Como se existisse um lado “certo” e um lado “errado”, um lado “bom” e um lado “mau”, e que os opositores devem ser calados e neutralizados de qualquer forma possível. “Liberdade de expressão? Claro!, mas só pra quem for da nossa turma”. HAHAHAHA. Como se a merda fosse melhor do que a bosta.

    • Mas é assim mesmo. Qualquer pessoa que se posicione como de direita ou de esquerda já está tomando uma postura radical.

      Edu, quase (?) totalmente o que penso…E, em algumas vezes que (já) comentava como “terceira via” ou “meu sonho de novo centrismo”, talvez houve ou ainda haverá quem achou / ache “rotulável de isentão”…Sério mesmo, não duvido (!)

  • Por mim eles começam uma nova guerra de Secessão e param de invadir outros lugares. Vamos lá gente, se vocês não querem esse presidente sequestrem a Mulania ou o Barrão e em vez de resgate peçam que ele renuncie. Mas não é pra machucar ninguém não. EUA é bem grande, tem espaço para todo mundo. Dá pra fazer uns 3 países ali. Aproveitem e deixem o Alaska com o Canadá e o Hawai com a Polinésia.

    • Dá pra fazer uns 3 países ali.

      Leona, “te juro” que, há alguns anos, eu havia lido uma vez sobre separatismos estadunidenses que cogitavam, e como seria ocorrendo todos (daí apenas, na época, comentavam “é mais fácil ser assim com a Rússia”) : Mas tudo escrito (onde ?) estava “em aparência apartidária”, sem comparação (!)

      Aproveitem e deixem o Alaska com o Canadá e o Hawai com a Polinésia.

      “Quem dera” isso do Alaska (?), “coerência geográfica”…(risos)

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