Rede furada.

Fundador do Facebook volta a se desculpar por escândalo de uso indevido de dados de usuários por consultoria e promete trabalhar para garantir integridade das próximas eleições, incluindo Brasil. O fundador e presidente-executivo do Facebook, Mark Zuckerberg, enfrentou nesta terça-feira (10/04) uma série de questionamentos durante um depoimento aos comitês de Justiça e do Comércio, Ciência e Transportes do Senado dos EUA. Ao longo da audiência, os senadores criticaram o modelo da rede social e as medidas tomadas para proteger os dados de usuários. LINK


Descobriram agora que a internet não é segura e que as empresas como o Facebook ganham dinheiro com seus dados? Desfavor da semana.

SOMIR

Vamos estabelecer algumas coisas: o Facebook é uma empresa privada com fins lucrativos. Idealmente, no final do dia o negócio de Zuckerberg tem que ganhar mais dinheiro que gastou. E para isso, é necessário ter um modelo de negócios. O do Facebook é vender propagandas para seus usuários. Qualquer um pode abrir um perfil no site e começar a usar os sistemas e servidores para consumir o conteúdo gerado pelas aproximadamente duas bilhões de pessoas que o utilizam.

Se você quiser, pode subir milhares de fotos das suas crianças ou animais de estimação remelentos, escrever comentários ou gravar vídeos falando a asneira que quiser, compartilhar imagens de bom dia com anjos ou bundas… ficar jogando joguinhos e até mesmo comprar e vender coisas lá dentro. O Facebook lida com tudo isso como qualquer outro site existente: tem computadores trabalhando para analisar e armazenar a informação que as pessoas colocam lá dentro.

E para que tudo isso seja possível, eles precisam de uma estrutura tecnológica muito maior e mais complexa que a maioria das pessoas pode conceber: eles tem prédios abarrotados de computadores caríssimos trabalhando vinte quatro horas por dia catalogando, guardando e distribuindo cada pedacinho de informação que as pessoas produzem. Ao redor do mundo todo. O Facebook gasta bilhões de dólares para manter isso funcionando. De uma certa forma, é como se eles estivessem mais para um país do que uma empresa. Milhares de funcionários cuidando de bilhões e bilhões em patrimônio físico e bem tangível.

Com todos esses gastos, eles ainda tem que pelo menos empatar na arrecadação para continuarem existindo. Países de verdade podem operar no negativo por décadas e serem “salvos” pelo seu povo, mas um país tipo o Facebook não tem essa chance. Ou o dinheiro dá para pagar as contas, ou eles tem que fechar as portas e acabar tudo. E para manter isso possível, o modelo de negócios da empresa é vender espaço de propaganda para empresas querendo vender algo para seus usuários. Mas, de uma forma bem diferente das propagandas mais tradicionais: no Facebook, você mostra o seu produto ou serviço para pessoas específicas.

Se eu quero vender carros de luxo, por exemplo, eu digo pro Facebook montar para mim um grupo de pessoas que gosta de carros e que tenha dinheiro suficiente para fazer essa compra. E o Facebook faz isso analisando cada uma das fotos, vídeos, comentários e curtidas de cada um de seus usuários. Mais: ele também analisa quem são seus amigos, como você interage com eles, onde mora, onde trabalha… a rede social não me diz o seu nome ou me mostra como você se parece, mas me dá todas as outras informações possíveis. E, posso afirmar com conhecimento de causa que é um modelo de negócios que agrada muito os anunciantes. Conseguir mostrar a propaganda certa para a pessoa certa aumenta muito a possibilidade de compra.

Os usuários normais custam bilhões de dólares para a estrutura do Facebook, mas as empresas que querem vender algo para eles pagam de volta pelo privilégio de aparecerem para eles de acordo com seus gostos e interesses. Então, pense comigo: qual a surpresa com o fato do Facebook ter os dados sobre cada um de seus usuários? Sobre ler suas conversas, sobre analisar cada uma das suas interações na rede social? Você está usando a estrutura bilionária deles de graça, realmente achou que eles não iam fazer dinheiro de outra forma? Seus dados estão lá e são monetizados.

Sem contar que: é uma rede social! Quem entra lá quer compartilhar informações… entrar na porra do Facebook com expectativa de privacidade é que nem entrar num ringue de MMA esperando meditar com o outro lutador… muito estranha esse senso de reserva sobre suas informações seletivo. Oras, não quer dar informações para o Facebook? Não fique gastando o dinheiro deles navegando e postando coisas nos servidores caros que eles mantém. Simples assim. Se vai usar o serviço, tem um custo.

E infelizmente não existe segurança perfeita na internet. Evidente que sempre vai existir o risco dos dados vazarem. Tente não deixar nada comprometedor nas mãos dos outros, ainda mais se você não está pagando nada para essas pessoas e usando o serviço deles de graça. Está mais do que na hora de assumirmos a responsabilidade pessoal sobre os nossos dados. Ao invés de ficar olhando para o “papai” Zuckerberg e fazendo cara feia porque ele usa seus dados para ganhar dinheiro em troca de tudo o que ele oferece de graça, que tal entender que não existe mágica nesse mundo e todo mundo vai te cobrar alguma coisa em troca eventualmente?

Eu sempre soube do risco de vazamento de informações e nunca fui muito fã de dividir minha vida pessoal na internet… adivinha quem não tem conta no Facebook e não gasta o dinheiro deles para ficar reclamando depois? Eu. Tudo bem não gostar das regras de um jogo, mas pelo menos tenha a decência de não entrar no jogo!

Para dizer que eu fui comprado, para dizer que eu só não vou pra rede social porque minha vida deve ser muito chata, ou mesmo para dizer que depois da entrevista tem certeza que o Mark é um robô: somir@desfavor.com

SALLY

Esta semana foi realizada uma audiência na Comissão de Energia e Comércio da Câmara de Representantes dos Estados Unidos para discutir com o Mark Zuckerberg umas cagadinhas cometidos pelo Facebook. Coisas como vazamento de dados de usuários e coleta de dado de pessoas que nunca nem entraram no Facebook. E as coisas que Zuckerberg revelou foram bem desagradáveis e incendiaram a opinião pública. Mas, na boa? Pior do que a pisada de bola do Facebook foram as pessoas reagindo a isso.

Quando você se inscreve em uma rede social, tem que “assinar” um contrato enorme que especifica tudo que podem fazer com seus dados. Esse contrato é assinado através de um clique em uma caixinha escrito “eu concordo”. A maioria assina sem sequer ler, acreditando que aquilo que sua cabecinha dita com bom senso é o que estará ali. Só que não. E mesmo que existam as melhores regras do mundo nesse contrato, qualquer pessoa com um cérebro dentro de uma caixa craniana sabe que não há controle na internet. Não há privacidade. Não há garantias. Então, estar em uma rede social é um risco que você resolve assumir. Colocar a culpa no Tio Zuckerberg porque “ele prometeu” é se portar como uma criança de cinco anos de idade.

E quando falo em internet, não me refiro apenas a redes sociais. Zuckerberg admitiu que eles coletam dados de pessoas que nunca usaram ou se registraram no Facebook também, ou seja, basicamente, eles coletam dados de todo mundo, “por questões de segurança”. Sobrou para todo mundo, inclusive para quem não é usuário do Facebook. Adianta reclamar? Não. Provavelmente todos nós já tivemos dados coletados, expostos, compartilhados ou até vendidos em algum momento da vida. Eu vou faniquitar por isso? Não. Foi um risco que eu escolhi assumir. “Mas fulano prometeu isso, sicrano prometeu aquilo”. Bem, felizmente eu não pauto minhas escolhas em promessas de empresas e sim na minha avaliação. Sugiro que todos façam o mesmo.

Como usuária da internet, eu sei que as coisas tem um preço. Desde 2009 entoamos aqui o mantra de que não existe segurança ou privacidade na internet, então, mesmo sem estar na rede social X ou Y, eu estou sujeita a ter todos os meus dados vazados. A escolha é minha: usufruir da internet como ferramenta de ampla comunicação e pesquisa e ter meus dados arrombados, distribuídos, vendidos e expostos ou abrir mão da internet e preservar meus dados? Eu fico com a internet. Por isso não vou ficar de chororô. Foi um risco que EU assumi, independente de promessa que fulano ou sicrano tenham feito, em última instância, a responsabilidade é minha.

Não dá para controlar o que acontece na internet. Nem Zuckerberg nem ninguém podem assegurar nada. A qualquer momento meu e-mail pode ser invadido, todas as minhas mensagens podem ser lidas e publicadas. A qualquer momento meu celular pode ser invadido e todas as minhas fotos e arquivos podem ser vistos e publicados. Então, em vez de depositar a responsabilidade no outro, estilo “Zuckerberg prometeu que é seguro” e viver sem me preocupar com nada, escorada nisso, eu apenas tento tomar certos cuidados. Dá trabalho? Dá sim. Mas não delego a terceiros a responsabilidade sobre minha vida e meu bem estar. E, quem o faz, com o perdão da sinceridade, tem mais é que se foder na vida.

Não existe segurança na internet. Esta é a regra do jogo e muito se ilude quem pensa o contrário. Como eu não quero sair da internet, pois pesando na balança acredito que ela me dê mais coisas boas do que ruins, eu tomo os cuidados que julgo necessários para que, em caso de invasão da minha privacidade, o dano seja o menor possível. Isso se chama adaptação. É assim que as coisas são? Beleza, não concordo, que merda que seja assim, mas não tenho o poder de mudar a realidade, então, vou me preservar no que for possível em vez de ficar faniquitando que Fulaninho prometeu que seria diferente. Eu sou a responsável pela minha vida.

Botox Zuckerberg ao menos foi sincero e disse que eventuais medidas para tornar o Facebook mais seguro serão adotadas, mas demorarão cerca de um ano para serem implementadas. Ou seja, ele está dizendo que o desrespeito que indignou milhões vai continuar por mais tempo. Se a pessoa está realmente indignada com isso, sai fora, como Elon Musk e alguns outros famosos fizeram. Se a pessoa fica, então está disposta a tolerar. Escolha um posicionamento. Mas no geral, as pessoas não tem essa capacidade de frustração, querem o que as satisfaça sem perdas: ficar no Facebook e ter toda a segurança do mundo. Não dá, tem que escolher. A receita mais rápida para ser infeliz é estar constantemente procurando bônus sem ônus.

A pessoa quer o que Facebook seja como ela gostaria, não como ele é, reflexo de uma geração mimadinha. Não tem a menor capacidade de frustração e, por consequência, são incapazes de fazer escolhas. Escolher é perder, você abre mão de uma coisa para ter outra que lhe é mais importante. Essa geração não quer ter que escolher, quer ter tudo: querem ficar onde estão sem abrir mão de nada e reclamando pra cacete que as coisas não estão do jeito que eles queriam. Não tem a capacidade de aceitar que com o bônus vem sempre um ônus.

É preciso escolher se querem ter sua vida devassada, vazada ou vendida para quem te manipule com isso ou se querem ficar sem uma rede social. Não tem certo ou errado, cada um avalia o que lhe é mais benéfico, mas é preciso escolher. Uma rede social segura onde isso não aconteça simplesmente não é possível e não será seu choro ou reclamação que mudará isso. Continuar na internet e reclamar pra cacete quando falha a segurança tem nome: perda de tempo.

Não é sobre o Facebook. É sobre a postura das pessoas. Até porque, o nome do Facebook acaba de ir para a lama, a tendência é que não seja mais cool ter um perfil por lá. A rede vai morrer lentamente, outra mais moderna vai tomar o seu lugar e as pessoas migrarão para lá. A nova rede vai prometer algo impossível, que é segurança na internet e as pessoas vão se colocar nas mãos dessa promessa novamente, achando que conseguiram tudo, sem precisar abrir mão de nada. Novos problemas surgirão, as pessoas se indignarão novamente. Assim caminha a humanidade, tendo sua intimidade devassada por não aprender que não há segurança na internet.

A questão é entender e aceitar que a vida é feita de escolhas e escolher é perder, não existe a possibilidade de que as coisas sejam exatamente do jeito que a pessoa quer. Entender que porque Fulaninho prometeu, não necessariamente é verdade. Entender que você, e mais ninguém, é o responsável pelo seu bem estar, sua privacidade e sua vida.

Vamos aceitar uma coisa de uma vez por todas? O mundo não é um lugar justo. Adapte-se a cada nova realidade da forma que for melhor para você: fica e paga o preço, abre mão e paga o preço. O que não dá é ficar e reclamar sem parar. Se acha tão ruim, sai fora. Chega de gastar tanto tempo e energia chorando ou esbravejando porque o mundo não está do jeito que você considera certo. Escolha. Aprenda a perder, pois a vida basicamente se resume a isso.

Para dizer que o que mais te chocou é a cara de dedão do Zuckerberg depois de tanto botox, para dizer que está perplecto pois achou que atacaríamos o Facebook ou ainda para dizer que quando prometem bônus sem ônus você fica feliz demais para duvidar: sally@desfavor.com

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Comments (6)

  • Eu concordo com o fato de que nunca estamos seguros na internet.
    Posso citar um fato pessoal: trabalhei para o Google por um breve período. Tive varios cursos sobre privacidade de dados e eles falavam abertamente sobre toda essa espionagem. Eles diziam que “não poderíamos confiar em nenhuma outra empresa, pois todas elas coletam informações indevidas” (inclusive o próprio Google!)

    Poderia escrever um desfavor bônus sobre essa experiência em gera, desde a questão de privalidade aos abusos verbais que ouvia diariamente….

  • Tenho por mim que algo pior vai acontecer: a maioria das pessoas vai continuar a usar o Facebook, e fornecer seus dados para mr. Zuck e seus acionistas como bem entender.

    Esse rolo de “segurança das informações” só está ocorrendo porque interesses muito poderosos (leia-se: a turma que apoiava Hillary) estão possessos com a chance de Trump ter utilizado melhor as bases de dados das redes sociais para se eleger presidente – e resolveram fazer uma caça às bruxas contra supostos “traidores” da causa progressista, como o dono do “Face”.

    A médio prazo, talvez, a única coisa que vá acontecer será tirarem Zuckerberg do comando da empresa que criou – assim como aconteceu com Steve Jobs uma vez. O resto, acho difícil acontecer.

    • Fábio, isso acontece em TODOS OS LUGARES da internet. TODOS, sem exceção. Whatsapp, Intagram, até aqui no Desfavor, se a gente quiser ser filho da puta, acaba conseguindo um monte de informação do leitor. Quem está na internet não pode esperar privacidade, o que se diz em e-mail, whatsapp, site, blog ou rede social tem que poder ser lido pelo Bonner no Jornal Nacional na frente da sua família, se não, melhor não dizer.

      • Claro, Sally, mas diante dos fatos temos duas opções: pagar mais pela segurança das informações OU deixar que suas informações sejam utilizadas para “manipular” você?

        • Não temos opções. Não há pagar mais que compre segurança. Não há segurança na internet. Ponto final.

          A opção é; 1) ficar e tentar preservar aquilo que você não quer que venha a publico não escrevendo ou clicando em nada que você não tolere que fique público, 2) ficar e ligar o foda-se correndo todos os riscos ou 3) não usar internet

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