Conversa fiada.

Em entrevista à GloboNews nesta quarta-feira (18), o presidente Lula (PT) se declarou contrário à implementação de uma CPI na Câmara dos Deputados ou no Senado para investigar os responsáveis pelos atos golpistas que ocorreram na Esplanada dos Ministérios no dia 8 de janeiro. Lula afirmou que, tendo em vista a existência de uma investigação em curso por parte das autoridades policiais, uma apuração paralela por parte do legislativo pode atrapalhar o trabalho investigativo. LINK


Ué… não quer CPI? Mas não quer ir atrás dos golpistas? Desfavor da Semana.

SALLY

Lula e o PT estão desde o dia 08 de janeiro dizendo que os atos dos bolsonaristas foram uma tentativa de golpe. Sempre que podem, alertam sobre o perigo para a democracia e para o país que esse tipo de gente gera e não se acanham de vincular os eventos ao Bolsonaro.

Porém, na hora de tomar uma atitude a respeito, surpreendentemente, pisam no freio. Tem muita gente interessada em investigar e punir o que aconteceu, mas, acima de tudo, chegar no Bolsonaro, pois é óbvio que ele está diretamente relacionado com toda essa baderna.

Por isso, o Senado já deu aval (há apoio da quantidade necessária, mais de 27 senadores) para uma CPI, com o objetivo de investigar e fazer com que os responsáveis percam, inclusive, seus direitos políticos.

Isso, em bom português, significa tornar o Bolsonaro inelegível. Não seria maravilhoso? Ter a certeza de que esse estrupício não senta nunca mais na cadeira de Presidente da República? A ideia não só me agrada como ainda ganha status de uma das melhores coisas que teria acontecido nos últimos anos no Brasil.

Porém, o PT não concorda. Curiosamente, o PT, que se diz tão combativo contra o Bolsonaro, não acha uma boa. Lula se posicionou publicamente contra a instauração de uma CPI, que já tinha requerimento de criação, feito por Soraya Thronicke, vulgo Sorayão, aquela moça bacana que esculhambou Padre Kelmon no debate. Não é que o Lula tivesse que fazer alguma coisa, já estava tudo pronto, mas, mesmo assim, ele fez questão de ir a público dizer que é contra.

A explicação dele é evasiva, confusa e contraditória: “Nós temos instrumentos para fiscalizar o que aconteceu nesse país. Uma comissão de inquérito pode não ajudar e ela pode criar uma confusão tremenda, sabe? Nós não precisamos disso agora”.

Desculpa, qual instrumento você tem para tirar do Bolsonaro seus direitos políticos? Certamente não será uma investigação de delegacia que vai fazer isso. Criar confusão? Quem criou confusão foram esses tios do zap que defecaram em documento. Francamente, acho vergonhoso que alguém que está no poder não queira investigar e punir o ocorrido de todas as formas possíveis, ainda mais quando dizem que foi uma tentativa de golpe.

Eu, que acho foi apenas baderna de classe média privilegiada chamaria até espírito, orixá, santo e pajé para averiguar e punir de todas as formas possíveis os envolvidos. A conta não fecha: a mesma boca que fala que são abomináveis, que são um perigo para a democracia, que alimenta o medo, diz que melhor não criar uma CPI para investigar isso pois “pode criar uma confusão tremenda”.

Façam suas apostas. Estaria Lula querendo preservar os direitos políticos do único candidato que ele consegue vencer em 2026? Bolsonaro é o candidato ideal: está mais queimado do que nunca, mas, ainda assim, tem uma legião de seguidores malucos que vota nele – o suficiente para colocá-lo no segundo turno, mas não para que ele vença. Convém preservar os direitos políticos de quem garante que o PT vença nas próximas eleições.

Não seria nada novo, Lula e o PT sentaram o cu na cadeira e assistiram Bolsonaro matar mais de meio milhão de brasileiros durante a pandemia pelo mesmo motivo. Quando era FHC, foram centenas de pedidos de impeachment. E o mesmo com todos os outros que o seguiram. Mas quando Bolsonaro diz que vacina causa AIDS, deixa hospital colapsar e pessoas morrerem por falta de oxigênio… nada.

Se Bolsonaro sofresse impeachment ele ficaria inelegível e Lula teria que enfrentar um segundo turno com outro candidato que tivesse menos rejeição. Deixa o povo morrer, deixa o país pegar fogo, deixa a dor, o sofrimento e o ranger de dentes correr solto, assim o PT volta como o grande salvador da pátria. Se isso não é canalhice, então eu não sei o que é.

Além disso, não se enganem, tem muitos políticos eleitos, do quais Lula precisa para governar do jeito que ele quer ($$$) que estão metidos até a raiz dos cabelos nesses atos bolsonaristas. Se investigar e chegar neles e Lula perde aliados, perde maioria, perde políticos pelos quais já pagou e terá que pagar aos novos que entrarem no lugar. Melhor manter tudo como está.

Mas para mim a cereja no sundae da canalhice foi dizer, assim como quem não quer nada, que a CPI “é uma decisão do Congresso, mas se eu tivesse que dar um conselho, diria que melhor não”. Vai bem tomar no cu, cachaceiro dissimulado!

Nada é “uma decisão do Congresso”. Tudo que é feito no Brasil é costurado entre todos os poderes e quem vota a favor recebe para isso. O Congresso não vai decidir isso sozinho, nem com base na sua consciência, pensando no que é melhor para o Brasil e para os brasileiros. Votarão com quem lhes pagar mais. E quem tem os cofres públicos na mão agora é o PT, portanto, receberão seu mensalão (ou qual for o nome que se resolva dar para propina por voto aliado em 2023).

Todo mundo ganha se os políticos envolvidos não forem investigados: político ganha um subornão gordo para não mexer aí, o PT mantém um adversário do qual pode facilmente ganhar em 4 anos e também mantém uma carta na manga, a retórica “não pode falar mal do PT se não o Bolsonaro volta” e com isso cala a boca de muita gente pelos próximos anos.

Baixo, feio, vil, asqueroso, repugnante, nauseante. A contradição está aí, escancarada, mas ninguém fala nada, pois o PT é “a esperança de um Brasil melhor”, ou “pelo menos não é o Bolsonaro”. Então, deixa eu falar uma coisinha aqui: se vocês insistirem em não criticar nada do que o Lula faça, vocês entram no grau de fanatismo que tanto criticam no “gado”.

Não é tão difícil assim de perceber: quão contraditório é que pessoas que odeiam o Bolsonaro estejam defendendo quem, neste momento, está limpando a barra do Bolsonaro? Vale tudo para o “seu lado” ganhar? Até jogar a coerência na privada e dar a descarga?

Nós, que passamos quatro anos escutando acusações de “passar pano” para o Bolsonaro ou de sermos bolsonaristas, estamos pedindo que tudo seja investigado de todas as formas possíveis, inclusive por CPI, para tirar o cargo e os direitos políticos de quem fez isso. E a gentalha do petê, esses hippies vestindo Osklen, está com o pé no freio, no “não é bem assim”?

Nós, que achamos que esses atos foram apenas arruaça de tiozão sem noção, estamos pedindo que tudo seja investigado de todas as formas possíveis, inclusive por CPI, para tirar o cargo e os direitos políticos de quem fez isso. E a gentalha do petê, que acha que foi quase um golpe de estado, que foi uma ameaça iminente à democracia, está com o pé no freio, no “não é bem assim”?

Caiam na real: o PT nunca quis o melhor para o Brasil, tudo, TU-DO, absolutamente T-U-D-O que eles fazem, dizem e pregam é sempre pensando em interesse próprio. Se isso não te deixa indignado, então no fundo você é exatamente como eles.

Para dar boas-vindas à Sally raivosa de 2008, para dizer que como eles são discretos e fazem por debaixo dos panos é menos ofensivo ou ainda para dizer que ainda está tentando digerir as mentiras públicas da Marina Silva e o veto de recursos para ciência e tecnologia: sally@desfavor.com

SOMIR

O Brasil não é para amadores. E Lula é tudo menos amador em política. Na mesma entrevista que disse que chegou a temer pelo golpe de Estado no dia 8 de janeiro, cravou que não precisava de tudo isso de CPI para investigar até onde iam as relações entre os executores e os mandantes daquela baixaria toda.

O suficiente para manter o clima de medo dos golpistas, que segundo ele realmente geraram uma ameaça contra a democracia brasileira, mas sem chacoalhar demais o barco… vai que cai alguém do suporte político dele? Deveria ser impensável dar qualquer oportunidade para essa gente escapar das punições merecidas. Mas só se você resolver comprar a narrativa dele.

Se você não estiver vendo esse risco todo vindo dos golpistas, começa a perceber que provavelmente Lula também não está. Até agora está mal explicado como tanta gente pode ter deixado passar o perigo óbvio da caravana de malucos rumo à praça dos Três Poderes. Não sou de teorias conspiratórias, mas mantenho que o presidente e sua alta cúpula enxergaram sim a possibilidade de uma ação violenta dos bolsonaristas, mas pagaram para ver.

Se não acontecesse nada, vida que segue. Se acontecesse, o risco de um golpe de Estado real era nulo, e de acordo com o grau de insanidade e violência de seus detratores, poderia se aproveitar de algumas semanas, talvez até meses, de apoio da opinião pública. Quando surge a entrevista que ilustra esta coluna me parece claro que Lula está jogando.

Não só com o suporte dos atos depredatórios dos bolsonaristas, mas com o espírito do tempo moderno: nada melhor do que aplicar um termo negativo para todo mundo que discorda dele. Até o começo do ano, era a famosa “extrema-direita”, termo basicamente sem significado fixo usado para descrever todo mundo que não se curva aos extremos da justiça social do século XXI.

Acha que a imigração deve ter mais controle ou acha que os imigrantes têm que ser executados em praça pública? Extrema direita. Está preocupado com predadores sexuais se aproveitando dos direitos conquistados pelos transexuais ou acha que seu deus te mandou odiar gays? Extrema-direita. Acha coisas como vagas de empregos apenas para negros meio racistas ou segue à risca os ensinamentos de Hitler? Extrema-direita.

É o que eu ando chamando de “todo mundo que eu não gosto é extrema direita”. Virou uma ferramenta de distorção de discursos políticos muito popular no século XXI, pegar qualquer dissidência do pensamento “lacradoramente correto” e tratar como fascismo. É a mesma asneira que fizeram com o comunismo durante boa parte do século passado, com o sinal invertido para as sensibilidades modernas.

Eu já nem sei mais o que pensar quando ouço ou leio extrema-direita. Pode ser basicamente qualquer coisa hoje em dia. Pode ser algo realmente perigoso e/ou estúpido, pode ser um pequeno desvio do discurso padrão. A primeira-ministra da Itália, que toda a imprensa jurava ser extrema-direita, foi uma das primeiras a condenar os atos bizarros de Brasília e demonstrar suporte ao governo eleito do Brasil.

Na entrevista de Lula ficou claro que “todo mundo que eu não gosto é golpista”. Eles até colocaram em documento oficial que o impeachment (legal) de Dilma foi um golpe. E sabe-se lá o que os próximos anos de propaganda petista vão fazer com a mente desse povo. Bolsonaro deu a Lula a desculpa perfeita para esticar a conversa sobre golpe até caber naquele bando patético que foi fazer cocô na sala do Alexandre de Moraes.

O exército, por mais banana que tenha sido com os acampamentos, não estava minimamente interessado em dar suporte aos patriotas. O mundo político estava rindo daquela gente bizarra, Lula sabe que o Legislativo está nessa para se vender para quem pagar mais, e já está negociando tranquilamente com o líder do Congresso que escolheu manter o Bolsonaro no poder sentando em cima das dezenas de pedidos de impeachment que chegaram até ele.

Se Lula realmente estivesse preocupado com alguma ruptura no sistema, teria colocado todo mundo no rastro dos supostos golpistas. Isso chegaria no Bolsonaro, que eventualmente seria preso ou perderia seus direitos políticos. Mas como a Sally já os lembrou: mais um vale um Bolsonaro no segundo turno de 2026 do que dez políticos poderosos atrás das grades agora.

Mais vale o medo de um golpe no horizonte do que a segurança de ter pegado todo mundo que incentivou, planejou, financiou e executou aquele show de horrores. O dito em Brasília sempre foi que todo mundo sabe como CPI começa, mas ninguém sabe como termina. Vai que os safados que apoiaram Bolsonaro até o final do ano passado e já se venderam para Lula pelos próximos anos acabem implicados? Ele deve saber que não é nada pessoal, apenas negócios. Defende o Bolsonaro enquanto ele estiver com a caneta na mão, vira defensor da democracia quando ele perder o poder de distribuir dinheiro.

Se o PT conseguir empurrar a narrativa de que todo mundo que os critica é golpista, fazem desses limões uma bela de uma limonada. Ou você acha que o país passou perto de tomar um golpe, ou você decide não causar muita confusão com uma CPI.

Para dizer que é o mesmo tema da semana passada (sim, mas não), para dizer que Lula vale menos que uma ação da Americanas, ou mesmo para dizer que eu sou de extrema-direita: somir@desfavor.com

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Comments (10)

  • Cleimar da Silva

    Discurso de Lula: “Nós temos instrumentos para fiscalizar o que aconteceu nesse país. Uma comissão de inquérito pode não ajudar e ela pode criar uma confusão tremenda, sabe? Nós não precisamos disso agora.”
    Tecla SAP: “Imagina se a comissão, caindo na mão de gente que não é da nossa turma, acaba descobrindo que a gente sabia e tinha informações de que iria ocorrer aquela manifestação no dia 8, mas a gente não fez nada pra impedir pra não criar um fato político que pudesse resultar em dar força pra oposição. Ai ai ai. É muito pra minha cabeça.”

  • Cleimar da Silva

    O discurso do golpe eu já acompanhava dando as caras em 2005 lá na comunidade BRASIL do Orkut e o pretexto do conspiracionistas da esquerda então era o ocorrido alguns anos antes na Venezuela onde deram um golpe no Hugo Chavez, que só não foi executado na ocasião pela intervenção da Igreja Católica, uma das partícipes na ação golpista e é o que a turminha lulista mais fanática vem usando desde então no sentido de construir sua pós-verdade.
    Já o discurso da fraude eleitoral, que é o embasamento da pós-verdade encampada pelos Bolsonaro e pela sua trupe, é emprestado da política fluminense, sendo que o primeiro político relevante a vir insinuando que a eleição baseada nas urnas eletrônicas eram fraudulentas (são fraudáveis, mas daí a fraudulentas são outros quinhentos) foi a trupe do Anthony Garotinho, não por acaso o sucessor político de Leonel Brizola na política carioca (a despeito de desentendimentos posteriores) e a raiz disso, bem… Você vai e cai em 1982, que tivemos o caso do infame caso Proconsult e puxando ainda mais atrás, você tem isso como força motriz da Revolução de 1930, onde o governo getulista passou para o controle do judiciário o controle do sistema eleitoral, no intento de evitar problemas como o infame voto de cabresto por exemplo.
    Irônico que Bolsonaro vem usando a vinculação do poder judiciário com o sistema eleitoral na vã tentativa de colocar em xeque o sistema herdado lá do período getulista.

  • Des Qualificado

    Sou leitor do Desfavor há muito tempo mas,se não me engano,nunca comentei nada por aqui,o que pode ser uma coisa boa,poupando inocentes e almas menos tolerantes.Abrindo uma excessão e talvez outras mais,gostaria de dizer que cronológicamente o gado bolsonarista que surgiu do nada assim como o lider da seita só seguiram o que os asseclas PTistas já faziam há tempos:defender cegamente o seu político de estimação.A massa de manobra verde e amarela se infla tal qual a vermelha e as semelhanças não param por aí.São tão parecidos em tantas coisas que deveriam se unir e formar um só “rebanho”.A diferença ideológica que eles pensam que têm seria facilmente contornada por um “intelequitualzinho” qualquer com um xaveco barato.Afinal,nenhum dos dois lados entendem bulhufas das ideologias que defendem.

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