Terremotos.

Poucos dias atrás um grande terremoto provocou caos e destruição na Turquia. Essa tragédia vai repercutir por um bom tempo e o número de mortos certamente vai passar (e muito) da previsão inicial. Então, aqui vai um rápido guia para entender e participar de qualquer conversa sobre o assunto: Desfavor Explica – Terremotos.

Como o próprio nome já diz, terremoto é um tremor da terra. Ele pode acontecer por diversos motivos, como atividades vulcânicas ou grandes impactos, porém, o mais comum é que ocorra pelo chamado “tectonismo”, movimento das placas tectônicas sobre as quais vivemos.

A crosta terrestre, parte superficial do planeta na qual vivemos, não é composta por uma camada única e sim por vários blocos separados, chamados “placas tectônicas”. Essas placas não estão apoiadas em uma superfície dura e firme, elas estão boiando em um líquido espesso que se movimenta. Sim, o planeta Terra é líquido no meio e duro na superfície.

Como qualquer sólido que boia em um líquido, eventualmente essas placas se mexem e dependendo da forma como isso ocorra (ângulo, força e velocidade) afeta quem mora por cima delas. Não é bonito, mas é algo inerente ao planeta. Ao contrário do que andaram dizendo aí no Brasil, mudanças climáticas não podem ser responsabilizadas por terremotos, eles são naturais e fazem parte da Terra.

Trazendo para algo do nosso cotidiano, é possível explicar um terremoto fazendo uma comparação com um quebra-cabeça: imagine colocar um quebra-cabeça boiando em uma bacia de água sem que as peças estejam encaixadas, apenas encostadas umas nas outras. Fatalmente, em algum momento, dependendo de algum estímulo, essas peças podem se separar ou colidir umas com as outras, certo?

Pois é, nós somos a formiguinhas que moram na superfície desse quebra-cabeça que se move. A boa notícia é: sabemos exatamente onde está cada peça. Se quiser conhecer um mapa das placas tectônicas do planeta, é só clicar aqui. A má notícia é: não conseguimos prever quando e como elas vão se mexer.

Ainda no exemplo do quebra-cabeça, o impacto de uma peça batendo na outra é maior quando você está bem na junção entre duas peças (o que no mundo dos terremotos se chama “falha”). Então, quem está da fronteira entre placas, nas partes chamadas “falhas”, é quem mais vai sofrer o impacto caso elas se mexam e colidam.

Em contrapartida, quanto mais longe da fronteira entre placas estiver um país, menos ele vai sentir um eventual impacto entre elas. Isso pode ser bastante útil quando você escolher em qual país quer morar ou em qual país quer passar férias: por mais que terremotos possam ser imprevisíveis, o lugar onde eles podem acontecer é extremamente previsível.

Durante muito tempo se mediu a intensidade de um terremoto pela Escala Richter, mas hoje ela é considerada obsoleta. Eu sei, eu sei, boa parte da mídia ainda fala em “Escala Richter”, ignore, eles estão errados. Atualmente se utiliza a Escala de Magnitude do Momento, que representa a quantidade de energia liberada por um terremoto. Então, quando falamos da “magnitude” de um terremoto, estamos falando da quantidade de energia que ele liberou e, consequentemente, do estrago que foi capaz de fazer.

Isso pode gerar alguma confusão na forma como mensuramos o “tamanho” dos terremotos, pois essa escala não é linear. Na Escala Richter o 7,1 era apenas um pouquinho mais forte que o 7,0. Agora não. Cada degrau representa 32 vezes mais energia liberada. Isso significa que um terremoto de magnitude de 7,8 libera cerca de 16 mil vezes mais energia do que um terremoto de magnitude 5, por exemplo. Então, muito cuidado para não achar que décimos são insignificantes. Por essa escala, eles representam um dano muito maior.

O ponto abaixo da Terra onde acontece o terremoto é chamado “hipocentro” e o ponto da superfície onde ele se manifesta é chamado “epicentro”. Então, quando falarem que o epicentro do terremoto foi em tal cidade ou em tal país, isso quer dizer que foi dali que o tremor partiu e, consequentemente, onde os danos foram maiores.

O que não quer dizer que o terremoto (e os danos) fiquem restrito a esse lugar. Dependendo da magnitude, ele pode atingir muitas zonas à sua volta, até mesmo países vizinhos. Mas, é certo dizer que o lugar onde ele causa seu efeito mais forte é no epicentro. No entorno, o tremor se sente, mas vai perdendo força.

Quando as placas tectônicas se movimentam, três coisas podem acontecer: elas podem se afastar, elas podem colidir ou ainda podem se sobrepor. Em qualquer dos casos, nós, pobres seres humanos que moramos nas placas, acabamos sentindo os efeitos.

A maior falha do mundo está nos EUA, a chamada “Falha de San Andreas”, ela fica entre as placas tectônicas Norte-Americana e Pacífico e se localiza na California. Essa falha tem 1300 quilômetros de extensão e a área tem histórico de intensa atividade sísmica. Existe receio do que pode vir a acontecer por ali, muitos especulam que seja questão de tempo até que aconteça um grande terremoto, que foi apelidado de “The Big One”, um terremoto de magnitude máxima (ou seja, 10) gerando uma catástrofe sem precedentes. E não afetaria apenas a Califórnia, dependendo de como aconteça, é papo de parte dos EUA afundar.

Quando acontece um grande terremoto, não é a pontinha de uma placa que bate na pontinha da outra, como se fossem bolas de sinuca. Para que aconteça um terremoto grande, é preciso que áreas grandes das falhas se movimentem. Por exemplo, nesse da Turquia que foi classificado em 7,8 (em uma escala que vai até 10, ou seja, pode ser muito pior) é provável que tenha havido movimento em uma área de aproximadamente 190 km de comprimento e 25 km de largura. A falha de San Andreas mede quase dez vezes mais. Imagina só.

Lembrando que não conseguimos prever quando vai acontecer, mas sabemos muito bem onde. Turquia, por exemplo, se situa em uma área problemática: fica na interseção de três das placas tectônicas (papo técnico: placas da Anatólia, da Arábia e da África). A da placa da Arábia está se movendo e acaba empurrando as outras duas. Então, se você puder escolher, sempre vá para longe das falhas.

Quando um terremoto começa, a regra é que o primeiro tremor seja o mais forte. Mas, curiosamente, em alguns casos o grande estrago nem vem do primeiro grande tremor. Ele faz estragos sim, mas geralmente os lugares estão preparados para esses estragos pois foram planejados para suportar um terremoto.

UM terremoto. Quando vem mais de um, bem, aí a coisa complica. Em alguns casos quem finaliza a danação são os tremores secundários (chamados “réplicas”), que vem depois. Quando ocorrem tremores grandes dificilmente as coisas param por aí, é quase certo que teremos réplicas. E, se essas réplicas forem muito fortes, as estruturas que já foram impactadas pelo tremor inicial mas bravamente ficaram de pé, podem acabar sucumbindo.

As réplicas acontecem por uma questão básica de física: quando uma coisa sai muito do lugar, ela raramente se reacomoda de forma rápida. Geralmente demoram alguns dias até as placas “se acomodarem” na nova posição definitiva, o que significa que depois do primeiro grande tremor virão outros, geralmente menores. Então, se você sentiu um tremor pequeno, não se preocupe. Mas se houve um terremoto grande, se prepara, pois vem tremores secundários, muitas vezes em questão de minutos.

E, nesse caso específico da Turquia, um dos tremores que se seguiu ao principal foi quase tão devastador quanto, chegando a 7,5, o que fez com que muitos o considerem um segundo tremor autônomo. As demais réplicas continuaram muito fortes, 11 minutos após o tremor principal um tremor secundário de 6,7 ocorreu e centenas de outros menores. Não há estrutura que suporte intacta três tremores seguidos dessa magnitude. Há um limite para o que o ser humano é capaz de fazer em matéria de segurança.

Mesmo quando você constrói uma cidade toda programada para terremotos, é muito difícil criar estruturas que sobrevivam a esse cenário. Depois de um tremor grande, estruturas racharam, canos de gás racham, estragos ocorrem. Estragos que precisam ser reparados. Mas, se por cima de um 7,8 vem um 7,5 e depois um 6,7, fica tudo muito mais difícil. E muitas vezes não é apenas o tremor: vazamento de gás gera explosões, por exemplo. Uma sequência de desastres contribui para os estragos.

Isso obviamente aumenta o número de vítimas também. Não basta desabar tudo e a pessoa ficar entre os escombros, os escombros são sacudidos com a pessoa dentro. Cano de água arrebenta e inunda por cima dos escombros. Cano de gás arrebenta e bota fogo nos escombros. É um cenário de horror. Tanto é que o número de vítimas não para de subir e provavelmente vai ser muito maior do que o estimado. Quando eu comecei a escrever este texto se falava em 3 mil vítimas, mas eu sinceramente duvido que sejam menos de 10 mil, se não mais.

Porém, terremotos como esse da Turquia são uma grande exceção. Todo ano são registrados cerca de 200 mil terremotos no planeta e a maioria não chega nem perto disso. Em sua maioria, os terremotos são inofensivos, mas, quando fazem estrago, a coisa é feia. Por isso são tão temidos, os que fazem estragos sempre são lembrados.

Não podemos escapar, eventualmente esses grandes terremotos acontecerão novamente, isso é uma certeza. Em todo caso, se você mora ou vai para alguma área de risco, informe-se sobre os procedimentos de segurança, pois se acontecer, não vai dar tempo de pesquisar nada. Se quiser saber como proceder em caso de terremotos, temos este texto dando algumas dicas.

Muita gente se pergunta por qual motivo não foi possível prever algo dessa magnitude, afinal, conseguimos prever furacões e outros desastres com dias de antecedência. Infelizmente ainda não conseguimos prever terremotos com antecedência suficiente para salvar vidas, o máximo que se consegue é prever minutos antes, um tempo ineficaz que não permite sequer que uma pessoa saia de um andar alto de um prédio.

Se consegue saber onde pode haver terremoto (regiões próximas das falhas, entre placas tectônicas) mas não quando nem em que intensidade, pois tudo depende do grau de tensão que há sobre as placas e, em havendo tensão, não se sabe a forma como essa energia será liberada. Isso quer dizer que mesmo que uma placa esteja “pressionando” a outra, isso pode ser liberado tudo de uma vez em um grande tremor ou gradativamente em pequenos tremores.

“Mas Sally, tem algum sinal que possa dar um indício de que vai ter um terremoto?”. Tem. Observe os animais. Assim como ocorre com muitas outras catástrofes, como por exemplo no caso de tsunamis, eles percebem antes da gente. Animais geralmente podem sentir as primeiras ondas de um terremoto, que são imperceptíveis para humanos e ficam muito nervosos com isso.

Então, está em um lugar passível de grandes terremotos e animais estão se portando de forma estranha? Tente se precaver. No geral, o que foi registrado é que eles fazem mais barulho (por exemplo, cães latem mais). Também há relatos de animais selvagens que abandonam a área em massa. Se for este o caso, siga os animais.

Há um caso relatado na China, onde os animais estavam muito estranhos, agitados, agindo de forma incomum e os moradores do local acreditaram que podia ser um aviso de terremoto e optaram por dormir nas ruas. De fato, horas depois o terremoto aconteceu e a maior parte das pessoas se salvou, pois as casas desabaram.

De qualquer forma, mesmo que animais consigam dar o aviso, não será com dias de antecedência. Será antes do terremoto ser sentido por humanos, mas não muito antes. Já é algo, às vezes algumas horas são o tempo necessário para se salvar.

Como saber se está acontecendo um grande terremoto e o quanto ele é perigoso: basta observar como se sente o terremoto, isso vai dizer se ele é grande ou não e se você está próximo do epicentro. Vamos para as diferentes possibilidades.

Se você estiver próximo do epicentro e ocorrer um terremoto forte, a primeira sensação que você vai ter é de um grande “tranco”, uma única grande sacudida repentina, como se o chão estivesse se “desencaixando”. Depois, começam tremores fortes, que podem durar segundos ou minutos, que serão sentidos mais como um balançar, um sacudir contínuo. Nesse caso, o risco é maior. Adote todas as medidas de segurança o mais rápido possível.

Se você estiver relativamente longe do epicentro e ocorrer um terremoto grande: Você vai sentir o mesmo solavanco inicial, só que ele será suave, não será suficiente para te desequilibrar ou quebrar coisas na sua casa. O tremor que se segue passará rapidamente, vai durar apenas alguns segundos. Nesse caso, você não corre grandes riscos.

Se você estiver distante do epicentro ou se o tremor for muito leve: é provável que algumas pessoas nem sintam, mas se você sentir, não terá o tranco inicial, vai sentir poucos tremores suaves (poucos = 2 ou 3) como se a terra estivesse apenas se acomodando. É aquela coisa tão leve que fica a dúvida, você se pergunta “a terra tremeu ou eu estou ficando louco?”. Nesse caso, fique tranquilo, dificilmente você corre riscos.

Uma informação errada que foi divulgada sobre esse terremoto da Turquia é que “o chão se abriu e tragou as pessoas”. Alguns filmes de ficção colaboram para esse equívoco mostrando cenas desse tipo. Se o chão pudesse se abrir, não ocorreriam terremotos, pois não haveria atrito entre as duas placas. Então, pode seguir as orientações de segurança e se te mandarem ir para a rua, pode ir, pois o chão não vai abrir e te engolir. Acredite, a rua é onde você quer estar quando uma casa desaba.

Quais são as chances de um terremoto grande acontecer no Brasil? Muito, mas muito baixas. Se você olhar o mapa das placas tectônicas que a gente postou lá no começo, vai ver que o país está no interior da Placa Sul-Americana, ou seja, longe das falhas.

O máximo que se espera para um lugar com esta localização é um terremoto 4,5. Geralmente danos a estruturas só ocorrem em terremotos 5 para cima, muitas vezes um terremoto abaixo disso nem é sentido. É mais fácil o chão tremer por reflexo de terremoto no vizinho do que o Brasil ter um terremoto grande para chamar de seu. O Chile que lute, vocês estão a salvo.

É feio, é perigoso, faz estragos, mas terremotos fazem parte deste planeta, é bom que os compreendamos, saibamos tomar todas as precauções e façamos as pazes com a ideia de que, de tempos em tempos, um grande terremoto vai dar as caras.

Para perguntar quem apostou em terremoto como Comoção do Ano no Bolão, para dizer que o Brasil não precisa de terremoto pois tem brasileiro ou ainda para dizer que o planeta nos odeia e quer nos matar: sally@desfavor.com

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