Sim, eu vou fazer uma análise de um jogo. Não, não adianta reclamar. E só para tirar o comentário de alguns: Não foi por causa disso que demorou para o desfavor voltar.

Numa era de jogos cada vez mais voltados para múltiplos jogadores disputarem o tamanho de seus pênis virtuais atirando uns nos outros, The Elder Scrolls: Skyrim prova que aquele jeito “autista” de jogar ainda não está morto.

Para quem acompanha minimamente as notícias sobre games, Skyrim era um dos jogos mais aguardados do ano, sequência de jogos famosos como Morrowind e Oblivion. Pessoalmente, e isso é uma vergonha do ponto-de-vista nerd, esse é o primeiro da série que eu jogo. Mas isso não chega a ser um problema para a história, por dois motivos: Primeiro que acontece séculos depois do anterior (não precisa saber da história pra nada), e segundo porque você basicamente corre por aí matando coisas e torce para dar certo no final (não precisa saber da história pra nada).

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You couldn't be mine.Para começo de conversa, esperei por duas horas para que a porra do show começasse. Como sempre, atrasou pra caralho, começou quase três da manhã. Se eu, que estava no conforto do meu lar, já estava puta da vida com a falta de consideração, imagina quem estava de pé na chuva. Agradeci mentalmente pela milésima vez por não ter ido ao Rock in Rio. Maturidade protege a gente dessas furadas.

O show começa. Axl entra fantasiado de táxi (roupa amarela e brilhante), com uma visível calvície disfarçada por uma bandana estrategicamente colocada na testa e com uns 200kg a mais do que o normal. O bigodinho de Hulk Hogan, somado ao peso extra, o deixavam absurdamentre parecido com uma morsa. Os cornos do Leôncio, do desenho do Pica-Pau. Ficou com a capa amarelo-táxi até que todos os fotógrafos fossem removidos do palco. Achei digno, porque pior do que gordinho, só gordinho sem vergonha que expõe o pânceps. Senti muito medo que em algum momento ele troque de roupa e volte com um short de lycra vermelho, uma coisa meio Stallone feelings, de achar que o tempo não passa para ele. Mas não, Axl se cobriu como deveria. Pena que seu bom senso acabou por aí.

Abriu com “Chinese Democracy”, o que eu achei vergonhoso. Essa porra já nasceu com prazo de validade expirado. Ele sabia que neguinho estava ali para ouvir as músicas dos anos 90 e se aproveitou dos fãs para empurrar esta e várias outras músicas de bosta desconhecidas. Praticamente uma venda casada. Achei abusivo da parte dele fazer algo assim. Mas é o Axl, porra. Mesmo todo cagado, é o Axl. A gente sabe que é bem o tipo de coisa que ele faria.

Depois ele fez um afago cantando “Welcome do the Jungle” , foi quando u pensei que a paunocuzação se resumiria apenas à primeira música, mas logo percebi que estava enganada. Mesmo ao escolher as músicas antigas, ele errou a mão várias vezes. Canou algumas músicas menos importantes como “It’s so easy”, “Mr. Brownstone” e outras que com certeza ninguém sentiria falta se não fossem tocadas. Porque vamos combinar, eu amo Guns, mas o repertório do Guns é o mesmo desde o primeiro Rock in Rio.

Querer bancar uma música do Chinese Democracy é escrotidão, o povo tá lá para ouvir o bom e velho feijão com arroz: Sweet Chield o’mine e cia. Show do Guns é quase uma festa Ploc anos 80. Querer negar isto é negar a realidade. Lembro que no último show deles que eu fui, Axl bateu um papo com a platéia e disse que vinha sendo muito detonado pelos críticos por só tocar músicas antigas, mas sabia que era disso que o público gostava e, apesar das críticas, não pretendia negar ao público uma coisa da qual eles gostavam. Então, ele sabe o que fazer, se não fez foi por pura escrotidão.

A voz do Axl que, por mais que eu o ame, nunca foi grandesmerda, estava especialmente de bosta. Fraca, mal se ouvia ofuscada por uma guitarra histérica que parecia ser tocada por alguém com ejaculação precoce (respeite o tempo da música, porra!), além de tudo ele parecia ofegante. Certeza que ele estava muito drogado, mas muito drogado mesmo. Se fizesse um exame de sangue achariam todos os elementos da tabela periódica nele, isso se o sangue não derretesse o tubo de ensaio. Mas é o Axl. Mesmo todo cagado, é o Axl. A gente sabe que não se podia esperar que ele estivesse de cara limpa. Eu o perdôo, o cara é autor das músicas que embalaram os melhores e piores anos da minha vida. Ele é uma espécie de Pilha americano, mesmo todo cagado eu não consigo deixar de amar. Acho que vou apelidar ele de “battery”.

Quando ele cantou “Live and Let Die” quase tive um troço ao vê-lo com uma jaqueta preta de couro brilhante. Foi de morsa a Shamu em dez segundos. Keiko feelings. A jaqueta ainda estava aberta e ele estava com uma blusa branca por baixo, simulando com perfeição aquela barriga branquinha de orca. E o público lá, todo molhado e faminto gritando “GUNS N’ ROSES! GUNS N’ROSES!”, porque vai, é o Axl. Todo cagado, mas é o Axl. Comecei a achar que o show fluiria, mas esqueci de um detalhe: Axl precisa de intervalos regulares para cheirar/fumar/injetar e a única forma socialmente aceitável de fazê-lo é botando aqueles músicos coadjuvantes para solar.

Tremendamente pau no cu quando aqueles músicos piolhentos com aspecto de mendigo bêbado cismavam de solar. Todo mundo sabe que o Guns n’Roses é o Axl, porra! Quem quer tocar lá vai ser um pequeno apêndice do Axl. Vai solar em casa, para sua esposa ouvir. Quem está lá, está para ver o Axl. O Guns tem hits demais para se dar ao luxo de ocupar o show com solo de um nobody piolhento. Tá pensando que é o Slash? Pelo visto sim, usou uma cartolinha igual e jogou o cabelo na cara. Não, Nobody da guitarra, você não é o Slash. Vai chorar lá no cantinho da vergonha, vai.

E mesmo o Slash, só fazia por causa daquele cabelo dele, que despertava um misto de curiosidade com repulsa. Raspa o cabelo do Slash e me diz se alguém tem saco para aturar um solo dele. Ódio especial de um guitarrista que parecia o Charles Manson de rabo de cavalo, com duas guitarras, solando sempre que sobrava um espaço. Eu ri quando ele tropeçou e caiu, pena que a Globo Toque de Merdas (Multishow entra junto) não deram ênfase a esse momento, porque não condiz com a imagem de evento perfeito que eles alimentam.

Não pude deixar de reparar o que o Axl se encheu de cordões, pulseiras, anéis e outros badulaques tamanho GG. Ele usava uns troços no pescoço que mais parecia uma coleira de Pit Bull. E óculos escuros, embora fosse madrugada e estivesse chovendo torrencialmente. Óculos escuros? Aff… Assim o Axl me desaponta, porque porra, depois de tantos anos de estrada ainda estar na maconha é retrocesso. Axl é hardcore o suficiente para que seu patamar mais baixo seja a cocaína. Mesmo assim as pessoas estavam lá: “GUNS N’ROSES! GUNS N’ROSES!”.

Senti um alívio egoísta vendo aquele povo gritar. Sabe quando você fica aliviado porque descobre que não é débil mental sozinho, que tem um bando de débil mental como você? Então, quando eu descobri que tinha mais cem mil babacas que amavam o Guns todo cagado, por mera fidelidade às alegrias já proporcionadas, me senti menos otária. Sei que não sou, mas me senti. Não é a voz e o corpo cagado do Axl o que se venera e sim o que o Guns representou para todos nós.

Quando Axl finalmente tirou os óculos escuros, me assustei. Seus olhos estão estranhos, tão apertadinhos que ele parecia japonês, na verdade, ele parecia um sushiman com aquela bandana. Foi quando o guitarrista de merda com ejaculação precoce colocou um cigarrinho no canto da boca fazendo mais um cosplay de Slash e solou de cartolinha novamente. O carisma do Axl fez com que o público tivesse consideração e não atirasse objetos nele. Axl-Pilha é todo cagado, todo decadente, mas surfa em seu carisma. Mesmo sem produzir nada novo, ele se mantém de seu passado. Tava lá, soberano, do alto das suas duas toneladas. Nem se deu ao trabalho de decorar uma ou duas palavrinhas em português para fazer média. Ele caga e anda, mas caga com um carisma…

Adorei que o Multishow só colocava o nome das músicas conhecidas, quando ele cantava algo que ia além do Use Your Illusion, não aparecia a legenda com o nome da música. A certa altura, Axl e seu layout de caminhoneiro estuprador apresentou os músicos da sua banda e mais um solo paunocuzou minha noite. Fulano Cartolinha e sua guitarra toda trabalhada no Swarovski me permitiram ir até a cozinha fazer um lanchinho. Axl também saiu do palco, deve ter ido encontrara com Mr. Brownston no camarim. Avisa para todo o resto que eles não são Guns n’Roses, eles são apenas instrumento de reprodução das músicas do Guns n’Roses, porque as músicas do Guns n’Roses (que prestam) foram compostas com Slash, Izzi e Duff. Os nobodies que tocam hoje estavam se achando demais para quem é apenas um playback com pernas.

Axl volta depois do solo pau no cu em grande estilo: “Sweet Chield O’Mine”. A voz fraca, meio que com falta de ar, mas porra, é o Axl. Todo cagado, mas é o Axl. Nesse ponto eu já apresentava uma preocupação doentia de fã: o que aconteceria quando ele desse aquele berro final na música Don’t Cry? Estava com medo que a cabeça dele explodisse ou algo do tipo. Axl não estava bem, estava ofegante e aparentando uma certa tremedeira ao segurar o microfone. Ele já tem uma certa idade, aquela friagem não pode fazer bem.

Fiquei me perguntando porque eu e mais outros cem mil babacas continuamos seguindo o Guns onde quer que ele vá, mesmo estando todo cagado. A conclusão que eu cheguei é que o Guns é rock palatável. Poucas bandas ainda são rock, quem dirá palatável. Difícil achar uma banda de rock que agrade a todos hoje em dia. Guns agradava a todos em seu tempo. E pelo visto, não surgiu nada melhor, nada unânime, então nos resta continuar venerando o vovô Axl, porque por mais cagado que ele esteja, em vinte anos não surgiu um filho da puta que fizesse melhor. Por isso ele pode ser grosso, gordo e atrasado sem consideração. A gente vai aturar porque não tem outro melhor naquilo que ele fez.

Chovia tanto que o palco estava encharcado, a ponto do Axl pisar e esguichar água, acho até que ele colocou um chapéu panamá bege na cabeça por causa disso. Sim, eu prefiro pensar que foi necessidade. Se no palco estava assim, imagina o que não estava acontecendo com quem estava lá embaixo, o povão. Imagina o cheiro de cachorro molhado. Ah, a maturidade. Bendita seja a maturidade, me deixando cada dia mais pau no cu e querendo conforto. A maturidade me salvou dessa furada. Tinha que ter algum lado bom nessas porras de rugas que estão aparecendo.

Axl continuava cantando na chuva, com um microfone bem anos 80, enorme e com uma espuminha vermelha na ponta. Em determinado momento, ele começou a dançar. Mas não era aquela dança bacana de jogar o corpo de um lado para o outro (para quem não sabe, Axl é o pai do arrocha), era uma dança meio pulada, tipo um cabrito. Me assustei, porque parecia com o Somir dançando. Até tem que dar um desconto pro Axl, porque ele está muito drogado, mas o Somir não tem desculpas para aquilo. Virei o rosto para não ver, mas acabou em poucos segundos, Axl não tem fôlego para muita coisa.

Rolou um bate papo com o público, onde ele mais uma vez trouxe ao palco Roberta (Beta, segundo ele), sua assistente brasileira (não foi o primeiro show onde ele fez isso). Pude perceber que Roberta também engordou bastante, as turnês do Guns devem ter comida muito boa. Mas Axl não estava muito para papo, não fez o longo e comovente discurso que fez no último show que eu fui, onde contou como Robrta o ajudou a sair do buraco das drogas, o qual foi traduzido por ela a medida que ele ia falando. Talvez porque esteja todo emburacado novamente. Falou em inglês, quem entendeu entendeu, quem não entendeu foda-se. Continuou o show, com sua cara de Tiozão que passa cantada no elevador. Reparei que, apesar de visivelmente velho, sua cara não tem rugas, na verdade, sua cara não tem expressão facial. Tá uma vibe boneco de cera, todo cheio de botox. Mas é o Axl, todo cagado, mas é o Axl.

Tome mais músicas desconhecidas. Axl abrindo a boca, parecendo que iria engolir aquele microfone gigante. Eles seria um gay de sucesso. Quando ele apresentou o baterista, um cospaly de João Gordo dos EUA, eu achei que vinha um solo de bateria, mas foi pior, porque depois ele apresentou a um pianista que deu um solo de piano. O cara, um Kenny G do subúrbio, solou com os cabelos molhados na cara, pingando no piano. Foi meio nojento. Solo de piano no show do Guns é desaforo. Duvido que esses solos todos sejam para prestigiar os músicos, acho que foram apenas bons pretextos para ele ter tempo de consumir mais drogas. Podia pelo menos disfarçar e voltar com roupas novas, assim as pessoas achariam que ele estava trocando de roupa. Mas o que resta de neurônios no Axl ele deve usar para cantar e não deve sobrar muito mais.

Em um determinado momento, as luzes se apagaram. Eu não sabia se era defeito técnico (sabe como é, evento no Rio… a gente sempre pensa no pior) ou se era estilo. Vi Axl voltando com os olhos arregalados e coçando o nariz de uma forma muito suspeita. Emendou na música “You Could Be Mine”, bem difícil de cantar para quem não está em plena forma cardiorrespiratória. Axl sofreu, em determinado momento achei que ele fosse se cagar todo de tanta força que estava fazendo. Fiquei esperando aquela giradinha Zinho-Enceradeira que ele sempre faz nessa música mas não aconteceu. Tudo bem, se fosse para reviver o passado ele estaria em um short de lycra e essa cena com certeza não valeria a pena. A barriga do Axl estava tão grande e branca que se colocasse uma ameixa no umbigo ficava igualzinha a um manjar. Olho pro relógio, quatro e quinze da manhã. Axl tem mais fôlego que eu, estava caindo de sono. Axl deu mais uma saidinha do palco e deixou seus músicos pau no cu solando. Depois que ele fez o que tinha que fazer, voltou e emendou “November Rain” no piano. Apropriado, já continuava chovendo pra caralho.

Mesmo sendo uma música fácil de cantar, a voz dele continuou fraca. Vamos dar o benefício da dúvida ao Axl, talvez fosse a friagem. Estava chovendo, ele estava molhado e ele já é um senhorzinho com uma certa idade. Vendo ele de perfil ao piano pude perceber que ele estava com a bochechinha brilhante, típico de quem faz algum tipo de preenchimento. O rosto dele está tão mudado que não me espantaria se descobríssemos que na verdade era o Slash com chapinha fazendo uma pegadinha em cem mil pessoas. No meio da música ele pulou um pedaço, e errou ao letra ao retornar. Isso mesmo, chegou a vez dele cantar e ele se manteve em silêncio sob o olhar de wat dos músicos e quando retomou, voltou errado. Axl, faz assim: quando você estiver ofegante demais, ou doidão demais (ou ambos) para cantar, estica o microfone para o público e coloca a outra mão na orelha como quem quer ouvir, deixa que neguinho canta. Nem vão perceber que é truque para esconder que você não está conseguindo cantar. Segundo show do Guns que eu vou que ele erra a letra de November Rain, deve ter algo karmico com esta música.

Mais um solo de guitarra, desta vez um nobody tocando a música tema da Pantera Cor de Rosa. Axl volta com a mesma roupa e cantando “Knockin on heavens door” com os olhos esbugalhados e petrificados. Parecia eu quando vejo uma lagartixa. Levantou o pedestal do microfone e tudo, como nos velhos tempos, mas depois ficou ofegante uns cinco minutos, daí pediu para o publico cantar junto (acho que no intervalo alguém deu a ele a orientação que eu sugeri no parágrafo acima). Enquanto ele berrava pude perceber que, assim como tantas outras celebridades, ele pesou a mão no clareamento dentário e seus dentes pareciam balas Mentex. Aquilo não é cor de dente de gente, fica medonho. Quem disse a essas pessoas que é bonito ter dente branco-geladeira? Depois ele perdeu tempo tocando “Nightrain”, música antiga que poucas pessoas conhecem e ninguém se importa.

Axl brincou de Ivete e passou pelo corredor no meio do público, cercado por seguranças enquanto seus musicos quebravam os instrumentos no palco. Avisa pra ele que os anos 80 acabaram. Voltou ao palco, mandou um “Thank You” (que para brasileiro tanto faz, porque se mandar um Fuck You nego bate palmas do mesmo jeito) e foi embora. Voltou para o bis assoviando Patience. Eu tinha esperança que ele cantasse Love of my Life do Queen, um hino do Rock in Rio, já que ele participou do tributo a Freddie Mercury, e antes tivesse cantado, porque fez feio no Patience. Ele conseguiu a proeza de ficar sem fôlego na parte do ASSOVIO, cagou tudo e fez os músicos errarem o tempo, principalmente o baterista, que se enrolou todo. Ainda errou a letra e mandou um embromation em determinado momento. Mas é o Axl, todo cagado, mas é o Axl.

Para fechar tocou Paradise City, quando o relógio já marcava cinco da manhã. Dizer que ele cantou a música seria dizer muito, na verdade ele recitou da melhor forma que pode, pois estava mortinho. Parecia uma versão rap. Nem se mexia, só cantava, parecia que era de gesso. Porque é uma música agitada, que pede deslocamento. Quem mandou fazer um show longo pra caralho? O combinado foi uma hora e meia de show, que seria o tempo dele tocar os hits antigos mais duas ou três novas, mas ficou paunocuzando com música desconhecida e solo de nobodies. No final, em um último suspiro deu uma dançadinha e uma rodadinha segurando o pedestal do microfone. Quando parou parecia um maratonista chegando ao final da corrida. Sua carinha gordinha estava toda rosa, parecia um leitãozinho.

Ficou devendo músicas como I Use To Love Her, Don’t Cry, Since I Don’t Have You, Symphaty For The Devil (na versão deles) e outras, mas ele pode tudo. É o Axl, todo cagado, mas é o Axl.

Para dizer que a validade do Guns n’Roses expirou em 1999, para dizer que achava menos perda de tempo quando eu falava sobre a Fazenda ou ainda para dizer que foda-se que é o Axl, você não vai perder seu tempo com alguém todo cagado: sally@desfavor.com

Fila da banheiro vista de cima.Sabe todas as críticas negativas ao Rock in Rio que você viu respingando aqui e ali? São a ponta do iceberg. São aquilo que não foi possível abafar. A verdade é bem pior. A verdade é que saiu tudo cagado. Um evento para apenas cem mil pessoas deu um nó no trânsito, gerou crimes e confusão e não atendeu às necessidades dos participantes.

Para começo de conversa, as atrações foram um desfavor. Mas já falamos sobre isso no Desfavor da Semana, então, não vou ficar me repetindo: pop descartável ou rock decadente. Uma merda. Uma merda vendida como a oitava maravilha do mundo e comprada com facilidade, afinal, carioca tolera qualquer merda em matéria de música (vide micaretas) para ter um pretexto para beber e fazer putaria. Se colocar Somir e eu cantando “atirei o pau no gato” (sendo o Somir vestido de gato gigante e eu batendo nele com um pau de isopor) e tiver álcool e cantinho para beijar na boca, neguinho VAI e periga nem criticar. Este Rock in Rio foi um desastre. Se a imprensa não quer noticiar, EU QUERO.

Vamos falar dos transportes. Foi amplamente divulgado que seriam montados esquemas especiais, com transporte garantido, incentivando as pessoas a não irem de carro. Primeira questão: o evento é organizado NA PUTA QUE PARIU, em um espaço gigantesco, custava fazer um mega-estacionamento no local em vez de botar uma porra de uma roda-gigante? Segunda questão: fecharam uma porrada de ruas e cagaram o trânsito da cidade toda, quer dizer, além de paunocuzar quem vai, paunocuzaram todos os habitantes da cidade. Terceira questão: quem acreditou e confiou se fodeu, pagou TRINTA E CINCO REAIS por uma passagem de ônibus com hora marcada e se fodeu porque a) não conseguiu chegar b) chegou atrasado c) viajou espremido.

Porque teve essa: os ônibus eram especiais, só para o Rock in Rio. A passagem era comprada com antecedência (filas de mais seis horas). Daí vai um cidadão querer ser correto, perde um dia de trabalho para fazer a fila e comprar esse caralho de passagem especial e só toma na tarraqueta. Na hora do embarque colocavam para dentro pessoas que não tinham o comprado porra de passagem nenhuma mas pagavam vinte pratas na mão do motorista, que embolsava o dinheiro. Foda-se quem fez o certo e comprou antes. Nessa, muito malandro tomou a vaga de quem tinha passagem na mão. Muita gente ficou de fora, desistiu ou não conseguiu chegar. Não custa lembrar que não havia nenhum local nas proximidades para estacionar, então a opção era andar quilômetros ou ficar escravo do transporte público

O que esperar de um evento onde a malandragem vem direto da organização? Vocês sabem que eu não tenho medo de processo, vou falar mesmo: uma “atriz” da Record chamada Livia Rossi vendia nos corredores da emissora ingressos para o Rock in Rio (quando estes já estavam esgotados), por um preço bem acima do valor, para faturar mesmo. Feio? Calma que fica mais feio. Esta moça é namorada de Rodolfo Medina. Para quem não sabe, é a família Medina quem organiza o Rock in Rio. Ou seja, centenas de pessoas encararam horas de fila e não conseguiram comprar ingresso enquanto a namorada do dono ganha um monte DE GRAÇA e revende ACIMA DO PREÇO para COLEGAS.

Quem queria ir de carro também sofreu. No primeiro dia de Rock in Rio a Guarda Municipal do Rio de Janeiro amanheceu em greve, com apenas 30% do seu efetivo na rua. Ou seja, caos no trânsito. Sem contar que não havia local para estacionar, não havia placas indicando o caminho, não havia qualquer suporte para quem pretendia ir de carro, muito menos para quem não conhecia o local. Como se tudo não estivesse suficientemente cagado, o trânsito ainda era tumultuado por uns crentes que fechavam as ruas com faixas de protesto escrito “Um mundo melhor? Só Jesus” (com as letras do logotipo do Rock in Rio). Eram muitos deles, em cada esquina tinha um.

Os infelizes que tiveram “sorte” e conseguiram chegar ao evento também se foderam das mais diversas formas. Na entrada, vários cambistas abordavam as pessoas. Ou seja, você, babaca, que ficou horas na fila para comprar o ingresso e voltou para casa sem, saiba que a culpa foi dos organizadores que não criaram mecanismos para coibir a compra em massa por cambistas para revenda. Pior: permitiram que cambistas lucrem com isso, vendendo ingressos a valores extorsivos como R$ 700,00 a fãs desesperados.

Pior do que pagar caro por um ingresso verdadeiro é pagar caro por ingressos falsos de cambistas na porta, coisa que também aconteceu. Que tipo de organizadores permitem que cambistas vendam ingressos na porta de um mega-evento, ainda mais quando tem o apoio do Estado e Município para fiscalizar e coibir esse tipo de coisa? Na fila para entrar pessoas praticavam furtos na cara de pau: puxavam a bolsa e saiam correndo ou metiam a mão e furtavam pertences de dentro da bolsa. Outros pequenos crimes corriam soltos. Na entrada, as pessoas eram informadas que não poderiam levar alimentos. Quer dizer, você é obrigado a chegar com uma antecedência enorme por causa da má organização do evento e ainda é obrigado a pagar um preço extorsivo pela comida do local, isso quando ela não acaba.

Sim, vários pontos ficaram sem alimentos. Os shows menos importantes começam às duas da tarde, então, imagina a demanda. Ainda assim, acabou comida e acabou bebida. Isso porque um copinho de água custava CINCO FUCKIN´ REAIS e um sanduiche R$29,00. Mas isto não foi tudo. Filas enormes obrigavam as pessoas a esperar horas para ter acesso a comida cara e ruim. Quando falo “as pessoas” me refiro às pessoas educadas. Pessoas mal educadas como o diretor global Wolf Maia saiam furando fila do Bob´s e gritando “Dá licença que eu sou o Wolf Maia”. Uma pena que eu não tenha nascido homem para poder cobrir esse cara de porrada (vale a cesta básica) e uma pena que as centenas de homens no local tenham menos testosterona do que eu. Para completar o pacote, em determinado momento os caixas ficaram sem troco e só comprava comida quem tivesse o valor certo, trocado, ou abrisse mão de receber o troco. Muito bem organizado.

Já prevendo a muvuca, os organizadores quiseram pagar de espertos e espalharam uns cervejeiros ambulantes, uma espécie de São Bernardos humanos, que andavam com um barril de chopp a tiracolo vendendo doses de cerveja. Mas quando o povo é corrupto e sem educação, nada dá certo. Surgiram as “máfias do barril”, pessoas que pagavam subornos (em torno de R$ 250,00) para que o cervejeiro privilegiasse seu grupo. Quando outras pessoas pediam por cerveja, o cervejeiro dizia que tinha acabado, minutos depois ele era visto servindo com exclusividade o grupo que o subornou. Nessa brincadeira, só conseguia cerveja quem subornava, e formou fila para subornar! Tem coisa mais carioca que isso? Fila até para subornar! Resultado: muita gente não conseguiu beber, pessoas foram obrigadas a assistir Claudia Leite SÓBRIAS. Isso é tortura e crime contra a humanidade.

Por falar em Claudia Leite, vocês sabem, a gente tem todo um carinho especial por ela. Continua a mesma arrogante escrota sem carisma de sempre. Ela foi responsável por dezenas de feridos graças à sua falta de consideração e arrogância. Explico: uma de suas músicas mais “famosas” chamada “Caranguejo” (na verdade é da sua ex-banda, Babado Novo) tem uma coreografia conhecida. Na hora em que ela canta o refrão “Segura na corda do caranguejo… pra lá e pra cá” as pessoas pulam e se empurram de um lado para o outro. Vejam bem, meu professor de axé parou de passar essa música NA AULA porque pessoas se machucavam. Sempre tem um sem noção que empurra forte demais. Estou falando de uma sala de aula ampla, com vinte, trinta alunos. Parece uma boa idéia cantar esta música para uma muvuca de cem mil pessoas?

Claudinha da perna de saracura achou que seria uma boa idéia. Normal, ela também achou que seria uma boa idéia parar de amamentar o filho para tomar bomba e estar em forma apenas 30 dias depois do parto e quase matou o moleque de meningite porque o bichinho não tinha um anticorpo. Esta pessoa não tem bom senso. Deu merda. Pessoas se machucaram, várias pessoas chegaram a DESMAIAR. A multidão pedia aos berros para que ela pare de cantar. O que ela fez? Mesmo vendo pessoas caídas no chão e pessoas sangrando ela parou a música e disse “Se você não agüenta o curso, então porque se matriculou?” e continuou cantando o refrão. Mais gente machucada. Foi vaiada pela multidão por causa desta atitude e continuou cantando mesmo assim. Também machucou os ouvidos de todos os presentes, porque desafinou absurdamente, principalmente nesta música. Tá se achando, né Claudinha? Esqueceu que sem plástica você é o diabo de alpargatas. Eu não esqueci. Quem quiser conhecer Claudinha antes de ser tunada para virar uma estrela pop dá um look neste vídeo. Mas você era baranga, hein filha? Eu sou 100% natural e sou bem melhor do que isso.

Fato: Claudia Leite desperta o que há de pior nos seres humanos. Foi durante o show dela que teve um FUCKIN´ ARRASTÃO onde os pertences de centenas de pessoas foram roubados. Sim, isso aí que você ouviu, teve um arrastão do lado de dentro do Rock in Rio. Neguinho paga ingresso caro, comida cara, sofre para chegar e ainda tem arrastão. Isto é Rio de Janeiro, bem vindos. Tem como culpar pessoas que estão sendo obrigadas a ouvir Claudia Leite por algo? Se o caso fosse de Júri e eu fosse jurada, eu inocentava. Além de arrastão também ocorreram muitos furtos e outros crimes do lado de dentro. No dia seguinte disseram que iriam “reforçar o policiamento” do lado de dentro como se isso fosse um cala a boca. Meus queridos, vão reforçar seus caralhos, porque deveria estar policiado desde o primeiro dia! INACEITÁVEL que tenha ocorrido. Mania nojenta de carioca de esperar dar merda para depois se mexer. Na Copa do Mundo como vai ser? Vai desabar o Maracanã lotado na final e no dia seguinte vão dizer que vão “reforçar as estruturas do estádio”?

Outra inoperância digna de nota: os “brinquedos” que instalaram ali. Tinha roda gigante, montanha russa… e fila de, no mínimo quatro horas para usufruir. Pior do que isso: os brinquedos chegaram a ser fechados por causa do mau tempo e dos ventos. Colaram com cuspe que não pode funcionar se ventar? Um cidadão que passou exatas quatro horas na fila da roda gigante teve um dia de fúria quando finalmente chegou a sua vez e lhe disseram que fechariam a roda gigante porque estava ventando. Não sei que fim ele levou, mas se estiver vivo, queria parabenizá-lo, o show dele foi o melhor da noite.

E por falar em brinquedos, tinha uma Tirolesa. Para quem não sabe, é uma espécie de bondinho do Pão de Açúcar, só que de gente. Você desliza por um cabo preso a duas extremidades. Parece simples, né? Não precisa de nenhum milagre da engenharia para amarrar um cabo em cada ponta e fazer uma pessoa cruzar usando uma roldana. Mas até a Tirolesa estava toda cagada. Pessoas ficavam presas no meio do caminho, suspensas no ar, esperando pelo resgate. Puta merda, que vergonha.

Além de fazer um evento todo cagado, ainda mentem para o público. Mentem e dizem que fora “pequenos imprevistos” (tipo falta de comida? Falta de bebida? Arrastão?) correu tudo bem. Daí pintam aquele quadro bonito de que o Rio de Janeiro está suuuper preparado para eventos de grande porte. NÃO ESTÁ, acreditem em mim, FOI UM DESASTRE, UMA VERGONHA E UM CAOS.

Curioso que todo ator global entrevistado na área VIP (que ficava na puta que pariu de distância do palco, bem feito!) repetia feito um papagaio, fora de contexto com o que era perguntado, que o Rio está super preparado para sediar grandes eventos. Sabe como é, semana passada a FIFA ameaçou tirar a Copa do Mundo do Brasil e levar para a Alemanha, o cu piscou. Imagina o dinheiro que neguinho perderia se isso se concretizasse! Sabemos que não vai acontecer, mas, puta que me pariu, o simples fato da FIFA anunciar publicamente a possibilidade de tirar a Copa do Mundo do Brasil já é uma MEGA VERGONHA. Não me lembro disso ter acontecido antes.

E por falar em mentir para o público, a mentira não se limitou à organização e segurança do evento, se estendeu a seus artistas também. A “cantora” (sério, muitas aspas aqui se você tem um pingo de bom senso e não teve sua cabeça estuprada pela mídia) Rihanna atrasou bastante o começo do seu show, razão pela qual foi até vaiada (Chris Brown, mandou bem) . Trataram logo de espalhar através da mídia no dia seguinte que ela teve uma dor de garganta e teve que ser atendida às pressas por um médico que mandaram vir de um hospital em outro bairro. Tentativa idiota de salvar a reputação do evento.

Sério, gente. Quando eu digo que as pessoas tem que contratar o Somir como assessor, eu não estou brincando. Porque ele faz melhor do que 90% dos assessores que estão por aí. Se queriam inventar uma emergência médica, tivessem a decência de inventar algo plausível. Ela acordou bem, chegou no camarim bem, mas, curiosamente, uma hora antes do show, ela foi acometida de uma dor de garganta súbita? ALOOOOOOU? Dor de garganta não vem de uma hora para a outra, e depois que ela vem, não existe tratamento imediato que deixe a pessoa com a voz bacana em quinze minutos! Chocada como as pessoas engolem tudo que sai na imprensa.

Rihanna, PROCESSA EU, porque eu vou contar o que realmente aconteceu. Por motivos óbvios vou preservar a minha fonte. Seguinte: o show da Katy Perry, no mesmo dia, algumas horas antes, correu muito bem, tudo dentro do que era esperado. Daí ela montou uma mega-comemoração no seu camarim. Rihanna deu uma passadinha na festinha armada pela Katy Perry e… digamos assim… se excedeu no uso de algumas substâncias. Ficou de-to-na-da, incapaz até de andar com dignidade. Precisou de uma ajudinha médica, de diversos medicamentos e de uma horinha para se recuperar para conseguir subir ao palco. Observem a moça durante seu show, vocês sentirão uma vibe meio Amy, ela não estava purinha não. Uma informação que não pude apurar: será que a Christiante Passarinho Imaginário Torloni também passou no camarim da Katy Perry?

Gentem, to no fim da quinta página, hora de dar tchau. Uma pena, tava uma delícia essa meteção de pau (quem fizer trocadinho com esta frase será considerado infantil). Semana que vem prometo que faço um Desfavor Explica para compensar, sobre algum assunto bem interessante e instrutivo.

Para fechar, acho que o pior desfavor não foram os organizadores. Eles só fazem isso porque sabem que neguinho engole. O que mais me aborrece é ver gente que ESTAVA LÁ achando tudo muito lindo. As pessoas são IDIOTAS, só pode! Fico me perguntando como vai ser na Copa do Mundo, onde cem mil deve ser o número DE JORNALISTAS do evento. Tô falando muito sério, eu quero sair do Rio de Janeiro antes de Copa do Mundo e Olimpíadas. Aceito propostas de emprego em outros estados. É sério.

Para dizer que prefere acreditar na versão colorida e açucarada da mídia, para dizer que está muito feliz por não ter ido ou ainda para dizer que cada dia aumentam as probabilidades de que eu encontre uma bala perdida quando sair na rua: sally@desfavor.com

Você não vai acreditar...Confesso que fui ao teatro arrastada e de má vontade. Eu não queria ver aquela peça por um único motivo: eu não gosto da atuação do ator desta peça na TV. Acho seu programa uma titica e seus personagens um desfavor. Mas fui. Fui esperando o pior, esperando duas horas de piadas sem graça onde todos se divertiriam menos eu.

Não custa lembrar que aqui a gente não se prostitui nem prostitui texto. Nunca ganhei nada de ninguém para escrever sobre assunto nenhum, nem vou. No dia em que eu aceitar um ingresso de teatro considerarei que a minha parcialidade para escrever sobre o assunto estará comprometida. Não conheço o ator e não fui com o objetivo de divulgar, criticar ou fazer propaganda. Sinceramente, fui com a intenção de dormir e nem ao menos sonhei que pudesse escrever sobre a peça.

Não poderia ter me surpreendido mais. Surpresa dupla: com o ator e com a imbecilidade da platéia, que foi muito maior do que eu pudesse mensurar. Contarei com detalhes, mas não muitos, para não estragar a proposta da peça.

Eu já estava esperando que ele entre em cena todo paramentado como um de seus personagens televisivos. Foi um alívio quando o vi de cara lavada e apenas uma calça e uma blusa branca. Foi um alívio quando ouvi sua voz normal, que diga-se de passagem, é bonita e não irritante como aparece na TV. Mas, acima de tudo, vi uma calma e segurança incomum em um rapaz de 22 anos que estava prestes a fazer o que ele ia fazer.

Ele começa a peça conversando com a platéia. Simples, humilde. Na platéia pude sentir uma impaciência coletiva no ar, como se todos estivessem pensando “Tá, tá bom, mas… quando é que a peça vai começar e você vai fazer seus personagens?”. O ator não está nem aí, ele continua falando na maior calma. Mais para frente ele diz com todas as letras que se alguém foi até lá esperando que ele faça o que ele faz na TV, perdeu seu tempo. Eu comecei a bater palmas nessa hora, mas fui contida mediante esporro.

O ator desenvolve a peça de uma forma genial. Ele faz o que ele quer, não o que o mercado demanda. Ele faz o tipo de teatro que ele gosta e de vez em quando prende a atenção da parcela acéfala da platéia (99%) com um palavrão ali, uma escatologia ali. Mas deixa claro o tempo todo seu propósito e a platéia sem perceber o segue, como filhotes de patinho atrás da mãe. Ele mantém a platéia refém, através de um palavrão aqui, uma baixaria ali, fazendo-a assistir ao que ele quer.

As pessoas ao meu lado comentam cochichando “eu não acredito que ele não vai fazer o personagem tal… eu vim só para isso”. Eu rio por dentro. O ator mostrou que é muito mais do que seus personagens burlescos de televisão. Isto o fez subir muito no meu conceito, porque ele sabe ser tudo: personagem medíocre ou bom ator. Gente que só sabe ser cult ou só sabe ser trash é igualmente medíocre. Aqueles que transitam por todos os meios e sabem interagir com todos os públicos sim são os que tem mérito. Mais: ele deixou claro que sabe o que o público quer e teve culhões de não dar.

Assim como a gente do Desfavor, o ator fazia a peça por amor. Ele não recebe um centavo por essa peça. O dinheiro vai para as pessoas que trabalham com ele no teatro. Ele vem de uma família ligada a teatro, tem amor pela causa. Quando você faz as coisas só por amor, sem interesse em uma contraprestação financeira, tudo fica mais sincero. Não que ele seja santo, ele deixou muito claro que sabe dar o medíocre a quem quer o medíocre, como faz uma vez por semana na televisão, me troca de dinheiro.

Daí você deve estar pensando: se as pessoas são babacas a ponto de consumir esse tipo de merda, não resta nada além de lamentar, certo? Errado. Resta outra alternativa escolhida pelo ator: caçoar do próprio público. A peça dele é filosofia 100% Desfavor. Ele se aproveita da idolatria do público massivamente retardado nutre por seus personagens televisivos para mantê-los reféns e fazê-los ouvir o que ele tem a dizer. Genial.

Pude perceber que no correr da peça o grau de deboche com o público que consome seus personagens de TV aumentava progressivamente. Eu estava quase subindo no palco para beijar os pés dele. O mais engraçado é que o público estava perdido, confuso, sem entender absolutamente nada mas tentando desesperadamente encontrar alguma lógica naquilo para fingir que entendeu. Afinal, só os sábios conseguem ver a roupa invisível do rei. As risadas nos momentos inadequados, os comentários cochichados e as caras da platéia me faziam ter certeza de que ninguém ali estava entendendo a real proposta da peça.

O ator prosseguiu com sua proposta, até chegar a um ponto em que burrice e a inadequação da platéia foi tanta, que o fez abrir mão da sutileza e ele disse com todas as letras o que pensava. E ainda assim a platéia não entendeu e riu. Pois é, foi isso mesmo. Ele esculhambou com a platéia, e a platéia não entendeu e riu. Foi desesperador para a meia dúzia de seres humanos pensantes presentes. Ele disse com todas as letras que as pessoas não sabem apreciar uma peça de teatro, que estão idiotizadas pela televisão e que são ignorantes o suficiente para ir ao teatro e esperar uma reprodução do que se vê na TV. Pensa que ficou cheiro de merda no ar? Nada, todo mundo riu achando que era piada.

O ator, com expressão impaciente e desolada, ainda chamou a atenção para o fato da platéia rir sempre que ele fala um palavrão, destacando que isso não é humor. E disse com todas as letras que quem ri de palavrão É BURRO. Quando ele estava se lamentando, na maior educação, que todo mundo riu quando ele falou palavrões ao longo da peça, eu, por instinto, fiz um sinal de “não” com o dedo. Por um segundo ele me olhou e lançou um sorriso maroto.

O auge foi quando ele disse que iria provar como todos os que estavam ali eram burros e ria por pouca merda e começou a imitar seu personagem mais famoso. Antes de começar disse que quem risse daquilo era BURRO. Começou a imitá-lo e todos caíram na gargalhada. Senhoras e Senhores, trollagem no teatro é possível. Meu herói!

Mas a humilhação unilateral não parou por aí. Em determinado momento ele se impacientou, colocou as mãos na cintura e disse “Vamos lá, vocês querem o que vocês viram na TV? O que vocês querem que eu faça?”. A platéia começou a gritar nomes de personagens. A medida que a platéia ia gritando, ele ia fazendo trechos dos personagens e depois dizia coisas como “Tá, e aí?” como quem diz “grandes merda fazer isso”. Passeou por cinco ou seis personagens que ele faz e quando acabou deu uma grande lição na platéia, pena que poucos entenderam o que ele estava dizendo. Adorei a forma como ele tratou com desdém seus personagens da TV.

Não vou falar mais para não estragar a peça e a proposta da peça. Quero falar agora do pós-peça, quando o ator saiu de cena, de forma pouco convencional. A reação da platéia se dividiu em basicamente duas: aqueles que, sem perceber, se assumiram burros e acharam a peça uma merda ou aqueles que ficaram com vergonha de não ter entendido nada e saíram dizendo coisas genéricas como “ele é muito doido, né?” ou então se apegaram aos quinze segundos que ele fez as imitações televisivas (com o claro propósito de avacalhar com a platéia) dizendo “Viu? Viu? Viu que maneiro quando ele fez o personagem tal?”. Só isso que eles assimilaram da peça, os quinze segundos do personagem tal.

Foram programados para ver o personagem tal e diante da mudança proposta pelo ator não souberam reajustar suas expectativas. Não souberam nem ENTENDER que seria necessário fazer esta adequação. Ficaram idiotizados, sem saber lidar com o imprevisto. Porque jogo de cintura para se adaptar e lidar com imprevistos requer um mínimo de inteligência. Infelizmente a cultura e os meios de comunicação estão tão padronizados e previsíveis que quando algo sai do esperado as pessoas não apenas não entendem como muitas vezes nem percebem. É nisso que dá ninguém inovar, as pessoas estão idiotizadas por causa do humor massificado. Desaprenderam a interpretar.

Juro para vocês que eu fiquei deprimida ao final da peça. Como pode tanta gente burra com tão alto poder aquisitivo? As pessoas são incapazes de depreender o conteúdo global (no sentido de conteúdo total) da peça e de conectar idéias. De todas as coisas interessantes que ele fez e disse o que ficou marcado na cabecinha tosca das pessoas foram aqueles quinze segundos de personagem televisivo (para o qual a platéia se programou) ou aquela piadinha escatológica ou com palavrões, contada justamente para provar o ponto do ator: a platéia é burra.

As pessoas não entenderam nada. E, ao não entender, a reação foi dizer que gostou, que achou bacana. Porque? Porque é um ator de televisão com personagens famoso, então, tem que achar bacana, afina, o cara deve ser bom, né? Se todo mundo gosta, se o programa dele tem audiência, melhor achar bom, vai que alguém te acha burro por contrariar a maioria! Gente sem juízo crítico sofre desta mazela: tem sempre que acompanhar a maioria sob pena se ser taxado de imbecil. Porque ao discordar da maioria você tem que apresentar argumentos muito bem fundamentados, caso contrário é execrado. Falo com conhecimento de causa, porque escrevo uma coluna aqui chamada “Flertando com o Desastre” destinada justamente a discordar da maioria nos mais diversos temas.

Durante a peça toda, ele oscila em diferentes tipos de estímulo que joga para a platéia, quase que em uma experiência antropológica, medindo até onde chega o grau de burrice das pessoas hoje em dia. Tal qual traficante, liberando aos poucos droga para o viciado, o ator vai dando seu recado e mantendo a platéia presa em seu relato com eventuais gotas do humor que eles demandam, coisas como “quando eu era pequeno enfiei uma escova de dentes no cu”. Assim, ele manipula as pessoas (para o bem delas, diga-se de passagem) e as faz ouvir o seu recado. Pena que ninguém entende, por mais claro que ele tenha falado. As pessoas estão retardadas, mentalmente bloqueadas e cegas a qualquer coisa que fuja de linguagem simplória de TV ou 140 caracteres de Twitter.

Momento fofoquinha mesquinha de espírito sem luz. Porque se não tivesse um momento fofoca, não seria eu. A Gracyanne Barbosa (porque pobre adora consoante?), aquela moça cuja profissão é se esposa do Belo e madrinha de bateria de escola de samba paga pelo Belo, estava na platéia, perto de mim. Em determinado momento da peça, o ator narra um encontro dele com o demônio, e ao descrever o demônio informa que ele tinha chifres, rabo e a cara do Belo. Gente, eu ri tão alto, mas tão alto… Que merda, hein? Você, mocinha que está cursando o segundo grau: ESTUDE, MINHA FILHA, se não você vai ter que se juntar com alguém com a cara do Belo para te sustentar e comprar tua maconha básica do dia a dia… ops! Falei demais. Vamos voltar para a peça que é melhor.

Confesso que hoje veria o programa de TV do ator com outros olhos, porque sei que ele sabe fazer mais, pode fazer mais e só faz aquilo porque quer. Me identifiquei. Eu me dou ao luxo de escrever sobre cocô porque sou segura o bastante a ponto de saber que posso escrever também sobre política internacional e direito. Bacana, versátil. Agora os personagens do ator na TV não me irritam mais, os encaro como deboche a toda essa massa burra que os assiste, ri e bate palminha, como focas retardadas, em suas poltronas.

Eduardo Sterblitch, suas sinceras desculpas estão aceitas. Sua peça é muito boa. E olha que em três anos de blog não me lembro de ter elogiado aberta e sinceramente quase nada. Você usou como isca seus personagens de TV para reunir pessoas e falar-lhes umas verdades na cara, com muita educação, muito charme e muita sutileza. Você fez a sua parte, se eles não entenderam, problema deles. Você contribuiu para um mundo melhor. E me divertiu por duas horas.

“Minhas sinceras desculpas”, monólogo de Eduardo Sterblitch, humorista do pânico que faz, entre outros personagens, Freddy Mercury Prateado, Ursinho Gente Fina, Cesar Polvilho, Malisa e outros. Desfavor recomenda.

Para dizer que se a gente recomenda deve ser uma bosta, para dizer que você gosta de Pânico na TV e está ofendido com o texto ou ainda para dizer que você está ofendido com Eduardo Sterblitch sem sequer ter visto a peça: sally@desfavor.com