Custa caro.

Graças à internet, é fácil ver quanto os candidatos (a todos os cargos em disputa) estão recebendo e gastando (por cima dos panos) em suas campanhas. A prestação de contas está disponível aqui. E como não é surpresa alguma, custa muito caro ser eleito para qualquer cargo no Brasil. Dilma e Aécio juntos já declararam quase 100 milhões de reais de despesas até o começo deste mês! É democrático precisar de tanto dinheiro para ser eleito?

Sim.

É, aposto que você não esperava por essa. Parece e é escroto ter que dispor de tantos recursos para ter a chance de exercer um cargo eletivo, muito provavelmente é por isso que seu nariz ainda deve estar torcido por causa do “sim” como resposta para pergunta na introdução.

Mas é importante deixar de ligar democracia com decência se você quer entender a democracia. O sistema onde o povo se governa através de representantes também é uma merda, a questão é que é uma merda marginalmente menos fedida que as outras. A democracia é tão confusa e limitada quanto o povo que a aplica. Além disso, não foi pensada para acomodar países de dimensões tão superlativas como o Brasil.

É indecente que a Dilma tenha gastado mais de 50 milhões de reais só com despesas impossíveis de esconder? É. É indecente que Aécio tenha torrado 40 milhões para disputar o cargo? Também! (Estou ignorando a Marina Silva porque ela não entregou as contas ainda) Agora, como é que alguém pode se apresentar num país de milhares e milhares de quilômetros para mais de duzentas milhões de pessoas sem gastar tanto?

Escolhemos representantes na democracia. Um desconhecido não poderia nos representar (tudo bem que os conhecidos não fazem por merecer). Se tem algum candidato por aí que pode te dar voz, não é razoável que você tenha o direito de conhecê-lo? Feliz ou infelizmente, o envio de mensagens via telepatia ainda não está desenvolvido, dependemos de sentidos bem mais concretos para formar nossas opiniões.

E para alcançar tanta gente em tantos lugares, há de se gastar. Tem que estampar a cara em trocentos materiais gráficos diferentes, tem que fazer um jingle para ver se o povão se lembra, tem que produzir vários materiais digitais como sites e participação em redes sociais, e dependendo da estatura do cargo, tem que fazer vídeos.

Sem contar a necessidade de contratar gente para divulgar no boca-a-boca ou mesmo para sorrir e balançar uma bandeira (o sorriso pode custar um extra se precisar de dentadura) para gerar a impressão de popularidade. Além disso, precisa administrar toda a estrutura: candidato aperta mão e come coxinha murcha em bar, não tem tempo de resolver praticamente nada.

Campanha custa caro. Custa caro porque adoram fazer um Caixa 2, mas custa caro também porque é inerente ao processo. Tem que aparecer de forma consistente para muita gente por alguns meses! E aqui entra a parte escrota: pode ser o candidato mais honesto e preparado do mundo, se não tiver como peitar os que mais investem, vai ficar para trás.

Dinheiro resolve eleição. Quem investe mais costuma ganhar. Aposto que é aqui que você vai dizer que isso não pode ser democrático, certo? Pois bem, é democrático que uma Skol da vida venda mais que uma marca de cerveja regional? Oras, a Skol não investe muito mais que essa concorrente pequena? Não está mais bem distribuída e divulgada no mercado? Dinheiro faz isso. Dinheiro qualifica.

A democracia aproxima o processo de escolha política das leis ‘selvagens’ do mercado. Para o bem e para o mal. Não é que uma equipe de vilões tenha planejado o sistema brasileiro, é que a merda é essa mesmo. Está no pacote da democracia representativa presidencialista.

É quase como se nosso sistema recompensasse quem ‘quer mais’. Quer controlar a máquina pública? Custa caro. Vai ser necessário investir tantos recursos nisso que nos basicamente garantimos que nenhum aventureiro vai colocar as mãos no cargo. Ou você tem uma rede de suporte superlativa o suficiente para dar conta de te divulgar no Brasil inteiro, ou você vai aparecer com traço nas pesquisas eleitorais.

O que também nos protege de extremistas: para garantir que você vá ter dezenas de milhões de reais para gastar na campanha, vai ter que fazer acordo com deus e o com o diabo. Gente com interesses diversos e avessa a radicalismos. É injusto com o bom candidato e com o que não se vende, mas funciona com alguma lógica sim.

Existem várias propostas para deixar todo o processo eleitoral mais justo com os que podem menos financeiramente, evitando que na prática as eleições tupiniquins sejam uma espécie de Campeonato Espanhol de futebol: os dois mais ricos se pegando e os outros como coadjuvantes. Sou favorável a mais competitividade, mas não gosto da ideia de subverter a ideia de eleição-mercado que já temos.

Simplesmente quebrar o esquema de enfiar dinheiro numa candidatura até ela ganhar pode gerar uma série de problemas: os candidatos perderiam visibilidade e a política de um país continental como o Brasil ficaria cada vez mais… feudal. Sem poder gastar fábulas com divulgação, os candidatos teriam que se concentrar em suas regiões para fazer votos suficientes.

Como horário político é muito pouco visto, a tendência é que o cidadão só tenha contato com quem já está por perto dele. E que cada região acabe escolhendo um candidato diferente. Se vocês já acham um acinte o que o pessoal do sul fala sobre o do norte a cada eleição, prepare-se para ver isso elevado ao cubo. A unidade nacional vai ficar fracionada a cada eleição.

E isso obviamente vai beneficiar quem já está nos ‘currais eleitorais’ mais vantajosos. O candidato à presidência com base em São Paulo vai ser quase imbatível. Sem o dinheiro para equalizar essas questões, nascer no lugar certo vai valer mais a pena do que fazer os contatos certos. E isso é ainda mais aberrante que nosso sistema atual.

Além disso, sem o reforço financeiro para a divulgação, os candidatos que já estão no poder vão levar uma vantagem ABSURDA em relação aos concorrentes. Conhecimento do candidato conta muito na hora de decidir o voto. A mídia falaria do político eleito durante seu mandato, e ninguém conseguiria cobrir essa vantagem toda na campanha. Não é à toa que o PT apóia essas propostas de redução de gastos nas campanhas. Quem está no poder só tende a ganhar.

Mas seria preguiçoso vir aqui só para falar dos problemas. Eu tenho uma ideia de como reduzir a injustiça financeira nas campanhas brasileiras: investimento em comunicação. Melhor ainda, investimento na eficiência da comunicação. Placas, santinhos, jingles e vídeos funcionam, mas sua distribuição custa caro! A única mídia que (em tese) não te cobra mais pelo alcance de seu material é a internet.

O problema de usar internet como meio principal de campanha política é seu alcance. Ainda tem muita gente de fora dela, ainda tem muita gente que não tem sequer banda (ou tela) para ver um vídeo online. Se houvesse um esforço considerável em escala nacional para fazer a internet substituir a TV como meio de comunicação de maior alcance, aí sim poderíamos avançar consideravelmente na redução das vantagens econômicas de poucos candidatos sobre a maioria de seus concorrentes.

O que não pode acontecer é barrar propaganda política sem dar uma alternativa de massificação das mensagens. O candidato à presidência com base eleitoral no Tocantins tem que ter como impactar o eleitor gaúcho, por exemplo. E ele ainda sim deve depender de ‘querer mais’ que seus concorrentes para ganhar. Nunca de nascer no lugar certo.

E claro, partido com mais simpatizantes (pagos ou não) tem que ter mais poder de fogo. Os partidos nanicos brasileiros são uma piada internacional. Não é justo que quem tem a melhor estrutura não tenha vantagens para jogar, assim como também não é justo que o sistema seja tão cruel com quem ainda está se estabelecendo.

Mas ao invés de querer resolver tudo na canetada, que se pelo menos pense em corrigir o problema óbvio do custo inerente a se apresentar para milhões de pessoas! Se tirarmos o dinheiro da equação sem nenhum planejamento, os candidatos vão ser menos conhecidos, e só. As pessoas vão ficar amarradas nos candidatos regionais, ou vão ter que ralar bastante para escolher o seu.

E como o brasileiro é médio e o voto é obrigatório, evidente que vão escolher a via do menor esforço. Sem alcance das campanhas, vota-se em quem prometer algo mais imediatista ao invés de se procurar um representante verdadeiro. E isso não soa democrático.

Democracia presume liberdade de informação e escolha. Universalizar o acesso à banda larga e a dispositivos que possam acessá-la vai fazer mais pela justiça no processo eleitoral que qualquer uma dessas propostas de redução de gastos na marra.

Os gastos são obscenos sim, mas… democracia é assim.

Para agradecer por eu ter completado o texto dessa vez, para dizer que eu só digo isso porque quero uma chance de ser contratado por político, ou mesmo para dizer que só a canetada constrói: somir@desfavor.com

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Comments (15)

  • Ainda consigo ficar surpreso com os valores exorbitantes gastos com a campanha.

    Mas quero compartilhar com os impopulares o que têm sido trágico se não fosse cômico: as fotos dos canditatos.

    Tem um pastor com uma BÍblia aberta numa mão e um butijão de gás apoiado no ombro.

    Outro candidato tirou foto com um monte de filhote de cachorro e gato.

    Popó continua com suas luvas de boxe.

    Tiririca é o único autorizado a fazer coisas ridículas, afinal é um palhaço mesmo… Tem mais, mas nao lembro agora.

    Parece que se trata de uma necessidade de “contar a sua história” usando apenas uma foto. Isto deve explicar as imagens bizarras.

  • Protógenes NÃO!

    Lembram daquele “gênio” que levou o filho de 11 anos para um filme com classificação etária de 16 anos e deu faniquito por isso?

    Pois é, olha ele aqui de novo querendo se (re)eleger deputado depois de ter sido conduzido a câmara graças a meteórica votação do Tiririca.

    E a cereja do bolo no panfleto desse ANALFABETO FUNCIONAL que agora também está do lado LUIZA MELL da força é justamente a presença do termo ESTATUDO no lugar de ESTATUTO.

    Está tudo errado. E eleitores paulistas, tirem esse trolha da câmara tirando votos dele (número 6555) e da coligação proporcional que pode elegê-lo (PT – PCdoB).

  • Hoje, em alguns currais eleitorais como SP, já é possível fazer uma experiência social gastando pouco e elegendo o meme do Youtube. Ao menos para cargos “menos importantes” como deputado ou vereador. Não sei se em pouco tempo teremos investimento real em infraestrutura de rede para que o acesso seja realmente “universal” (como gostam de alardear alguns candidatos).

    Poderíamos lançar um Impopular como candidato. Somir seria o publicitário responsável pela campanha, Sally seria a conselheira jurídica.

    • Nem reeleição nem “cargo menor”. Por exemplo: foi Presidente, acabou, já era. Se foi Governador pode tentar a presidência, etc. Assim evita a “carreira” de político. Também instituiria mínimo esperado: faculdade completa (apesar de saber que o povo compra diploma) e um curso obrigatório de gestão pública como o da GV.

  • Não esperava que o texto fosse seguir essa linha de raciocínio. Fiquei surpresa. Achei que você, como todo mundo, iria criticar duramente os gastos abusivos.

    “Não é que uma equipe de vilões tenha planejado o sistema brasileiro, é que a merda é essa mesmo.”

    E concordo: não adianta proibir de gastar, porque sempre haverá caixa 2. Mas a quem interessa universalizar o acesso à banda larga? A Internet é perigosa, há todo tipo de versão, de opinião perigosa, de piadas, de ideias revolucionárias e de informações que podem arranhar a imagem duramente conquistada pelos candidatos espalhadas pela rede…

    Como confiar em jogadores que fazem as próprias regras do jogo?

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