Pillars of Eternity
Sally me pediu para cobrir o texto de hoje, eu só consegui ver muito tarde. Isso gera alguns problemas… o principal é a falta de tempo para pesquisar. Então eu vou falar de algo inconsequente: um jogo que está me divertindo muito ultimamente. O jogo chama-se Pillars of Eternity, um RPG que saiu não faz muito tempo para o PC. Mas eu sei onde estou… tem mais do que uma análise de jogo aqui. E isso tem tudo a ver com quem pagou para produzi-lo: eu.
O conceito não deve ser alienígena para a maioria de vocês, mas não custa explicar. Nos últimos tempos começou a ficar muito famoso o método de financiamento coletivo, puxado pelo sucesso estrondoso de sites como o Kickstarter. O Kickstarter é uma plataforma online no qual pessoas podem colocar seus projetos para apreciação popular e arrecadar recursos para realizá-los. Não deixa de ser uma vaquinha.
Qualquer um pode entrar e dizer que vai pagar para ver o projeto sair do papel. A pessoa não é obrigada a dar o dinheiro “no escuro”, a quantia que você prometer só é cobrada se o projeto alcançar uma meta mínima definida pelos próprios idealizadores do projeto. Se tiver o dinheiro necessário entre todos os participantes, todo mundo é cobrado de verdade e o projeto recebe a obrigação de seguir em frente.
Claro que tem alguns poréns: já aconteceu de gente pegar o dinheiro e sumir. É um risco que todo mundo que investe vai correr. Mas como não tem muito projeto de brasileiro, a tendência é que a maioria seja entregue. Eu gostava da ideia em geral, mas não achava projetos muito interessantes. Quer dizer, isso até a nerdice atacar e eu achar um projeto da Obsidian, uma famosa produtora de RPGs para computador. Eles se diziam de saco cheio de fazer projetos para as grandes distribuidoras de games, que matavam suas ideias mais interessantes e pressionavam demais por prazos.
Quem é macaco velho desse mercado de jogos sabe que a empresa fazia coisas muito boas no passado, onde a indústria dos games ainda era um pouco mais artesanal. A empresa é responsável por jogos muito bons como Neverwinter Nights 2, South Park: The Stick of Truth, Fallout: New Vegas e Star Wars: Knights of the Old Republic II – The Sith Lords. Sim, eles gostam de nomes longos. Se você conhece RPG para computador, sabe que os caras são bons. Mas melhor ainda é o passado deles, quando ainda tinham outro nome (Black Isle), os caras fizeram os primeiros Fallouts, os Baldur Gates e os Icewind Dales. Este parágrafo é para os conhecedores, não se sinta chateado se você não conhecer nenhum deles: você deve ser mais sexualmente ativo de que quem conhece.
Só me deixem fazer um aparte sobre o jogo do South Park: se você é fã da série, vai adorar. Mesmo que ache meio complicado jogar, ainda sim é como se você estivesse interagindo com um daqueles arcos de episódios da série. O jogo foi feito com os criadores da série (eles escreveram a história, as falas… e tudo tem o MESMO visual da TV, sem tirar nem por.) , e pasmem: é como uma versão sem censura dos episódios. Se você é MUITO fã da série, como eu sou, vai ficar maluco com a quantidade insana de easter eggs no jogo. Tem referência a basicamente tudo que aconteceu nas 17 temporadas que antecederam o jogo. Se você só meio que conhece a série, talvez não seja tão interessante, mas é hilário e faz basicamente tudo o que eles nunca puderam fazer na TV.
Voltando ao tema: quando a Obsidian disse que queria fazer um jogo baseado em seus clássicos do tempo de Black Isle com várias ideias bacanas de jogos lançados depois, eu não pensei duas vezes: entrei para o bolo de financiadores. Não, não paguei nem cinquenta reais… até porque mais 77 mil pessoas tiveram a mesma ideia. Alguns malucos (ou nerds ricos) colocaram milhares de dólares por conta própria. O projeto atingiu a meta mínima em poucos dias e foi acumulando mais e mais dinheiro até parecer basicamente o financiamento de uma grande distribuidora.
Mas os chefes da Obsidian nesse projeto éramos nós. Dissemos para eles fazerem do jeito que eles sempre quiseram fazer, para colocar todas as coisas que o público médio acha chato, para estender conceitos interessantes que não pareciam comerciais… e mais importante, dissemos para levar o tempo que quisessem. Quando estiver pronto, entrega. Eles disseram que iam lançar no meio de 2014, entregaram nos primeiros meses de 2015. Teve gente que chiou? Teve. Foram a maioria? Não.
E sabem por quê? Porque era a porra do jogo que a maioria de nós queria jogar desde… desde o milênio passado! Nenhuma distribuidora de games tinha mais coragem de soltar um jogo onde você lê paredes de texto para entender a história e passa perrengues severos para conseguir vencer a primeira cena do jogo! E só para avisar: se não ler a história, o jogo te pune. Se quiser jogar com o cérebro desligado como um RPG online, o jogo te pune. Tem estratégia e ela não é opcional.
Pillars of Eternity não é exatamente original, já que tem o jeitão de Baldur’s Gate (você controla até seis personagens ao mesmo tempo) e versões “genéricas” dos arquétipos de personagens dos RPGs tradicionais, tem lutador, mago, etc. A história não é completamente nova, até porque isso é meio que impossível, mas é muito completa. Se você for curioso e gostar de fuçar cada canto de cada tela, tem muita coisa para descobrir e fazer. Tem uma trama central e centenas de histórias paralelas nas quais você se embrenha se quiser. Eu sei que essas coisas tem nomes que jogadores mais experientes sabem, mas eu tenho um público leigo nas mãos.
Longe de mim dizer que esse tipo de jogo meio das antigas é melhor para todo mundo, ou mesmo que há alguma superioridade em gostar dele. Mas eu posso dizer sem medo: estava achando os RPGs de ultimamente cada vez mais focados em gráficos bonitos e histórias rasas. Estava perdendo a graça. E se eu dependesse de uma distribuidora (como a Electronic Arts) para encomendar um jogo do jeito que eu queria, morreria esperando.
Tudo bem que o mercado parece focado em outras coisas agora, mas eu e os mais de 77 mil que compraram essa ideia mostramos que dá para contratar nossa produtora preferida e dizer para eles fazerem algo com a nossa cara. Eu queria o Baldur’s Gate com adições especiais de outros jogos lançados depois e uma história um pouco diferente, foi isso o que eu recebi.
É divertido aprender a gostar de um jogo diferente, mas tem algo de muito especial em abrir um e perceber que ele faz tudo o que você queria que ele fizesse! Mesmo quando eu tenho um restinho de tempo para jogar, eu dou meu jeito e não deixo de avançar um pouco mais. Pillars of Eternity é um jogo maduro (até no conteúdo, meio Game of Thrones com mais mágica e menos peitos) porque não tenta inventar demais, ele apenas faz com maestria o básico que sua base de fãs queria, e entrega mais algumas novidades na medida certa, sem te tirar do que você quer fazer.
Se eu recomendo para todo mundo? Não. Grandes chances de você sair berrando de raiva logo da primeira batalha do jogo por não conseguir fazer porra nenhuma além de apanhar. E isso só chega depois da leitura de várias e várias páginas de texto expositivo, com imagens bacanas, mas sem os efeitos 3D imersivos dos jogos famosos de hoje em dia. Você tem que imaginar bastante. Eu sei que é um gosto adquirido e experiência prévia nesse tipo de RPG de computador faz toda a diferença.
Mas mesmo assim eu faço questão de dizer que esse projeto todo funcionou. Deu certo pagar para os caras fazerem o jogo e dar toda a liberdade do mundo para eles. Atrasaram? Foda-se. Eu não sou distribuidora, eu sou consumidor final. O jogo está instalado no meu computador e eu posso jogá-lo por umas horas a cada final de semana (ei, melhor do que nada!). Financiamento em conjunto pode não ser a solução para todos os problemas de produtos toscos sendo lançados no mercado, mas com certeza faz feliz quem sabe o que quer.
Pillars of Eternity está disponível no Steam, por um preço mais salgado do que o pago pelos aventureiros do Kickstarter. Se você tiver umas 100 horas para gastar (mesmo que a prestações) e gostar de RPGs mais clássicos, vale cada centavo. E se isso não for sua praia, fica a dica para procurar projetos mais com a sua cara. Quando funciona, é uma beleza!
Para dizer que não paga mensalidade aqui para ler sobre essas coisas, para dizer que eu falei pouco sobre o jogo, ou mesmo para dizer que mal sabe o que é RPG, quanto mais esse monte de coisa que eu falei: somir@desfavor.com
Etiquetas: financiamento coletivo, videogames
Desfavorecido
É…
Sally pedindo pro Somir cobrir postagem. (E Somir cobrindo e justificando).
Somir, respondendo postagem com mais de duas linhas.
É….
Sally
Não tá fácil para ninguém. Eu encarei como uma prova de amor.
it is not brazil
http://tvuol.uol.com.br/video/assista-ao-resgate-incrivel-no-metro-da-filadelfia-0402CC18396ED0A15326
^^^ esse daí é 97 %^^^
se fosse os 3 % nem se moveria, né baby?
Koppe
“Mas como não tem muito projeto de brasileiro, a tendência é que a maioria seja entregue.”
Se fosse uma coluna de jornal ou revista, esse trecho já ia virar mais uma das “polêmicas da semana”.
Anônimo
Somir, você chegou a jogar o The Vinland Saga? Não acho que seja exatamente o tipo de jogo que você citou, mas acho que você vai gostar.
Somir
Numa pesquisa rápida de Google, só achei um mangá com esse nome…
Anônimo
Acontece que… você estava certo. É o The Banner Saga. Como é tudo de viking e tudo é “the alguma coisa saga”, me confundi.
Innen Wahrheit
Oi Somir.
Devo confessar que, apesar de improvável, o texto de hoje foi bem compreensível para mim.
Você se importaria em contar algo sobre os RPGs que já tenha jogado da época em que gráficos 3d ainda não eram utilizados?
(não, isto não é um convite a uma sessão nostalgia… mesmo porque acredito que não seria necessário seguir por essa linha ao responder)
Somir
Tecnicamente, os jogos de RPG já nasceram 3D. Aquele esquema de ver corredores em primeira pessoa foi uma das primeiras utilizações dos gráficos poligonais. Depois deles que surgiram alguns jogos 2D e começou a era de ouro da Square com os Final Fantasies e a toneladas de jogos do tipo para os consoles 8 e 16 bits.
Eu fui apresentado de verdade ao que era RPG de computador jogando um jogo chamado Neverwinter Nights. Um jogo muito parecido visualmente com o Pillars. As personagens eram 3D e o cenário 2D. Depois disso que eu comecei a conhecer e apreciar os outros jogos do gênero.
O bacana do Neverwinter Nights era justamente a parte de se perder no cenário e achar histórias paralelas. Quando eu percebi que logo no começo do jogo eu podia dar uma banana para a trama de “o mundo está sendo destruído”, contratar um mercenário e sair explorando calabouços para achar tesouros escondidos, decidi que era meu tipo preferido de jogo.
jogo_do_bicho
Ultima VII, nada supera…
acertou
Eu mal se i o que é RPG, pra mim era reeducação postural. Esse papo é muito de nerd. Boiei, mas como tô à toa no feriado…
Somir
RPG de computador (desse tipo pelo menos) é mais ou menos como um xadrez animado.
Bruna Viriato
Não é tão caro assim pra quem está acostumado a comprar versões digitais de jogos.
Fiquei bastante empolgada com sua descrição vou experimentar!
Somir
Só uma dica: o começo da batalha é a parte mais importante de todas.
J. M. de S.
1) … e o Somir tem vida sexual ativa!!!
2) Pelo menos um videogame em que sua personagem não precisa dar a bunda pra ser moderninha. Ou precisa?
Somir
1) … a passiva não me atrai.
2) E falando nisso, o pessoal que fez o jogo é meio moderninho. Se você quiser gastar suas suadas peças de ouro com um prostituto elfo, pode. Ou com a anã, que apesar da barba, ainda deve constituir uma relação heterossexual…
J. M. de S.
Apesar do prostituto elfo ser mais feminino, a anã tem a vantagem de não precisar se ajoelhar.
tomem juízo!
Foi só a Sally se ausentar um pouco e isso aqui virou una baixaria…