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Nem as moscas…

Nem as moscas…

| Desfavor | | 14 comentários em Nem as moscas…

A gente ficou em dúvida sobre qual delas escolher:

Em desenvolvimento pelo Instituto Butantan, a vacina contra a dengue começará a ser distribuída até o fim de 2024, informou o jornal O Globo, na terça-feira 4. Em março, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária aprovou um imunizante com 80% de eficácia no enfrentamento da doença. A mercadoria pertence ao laboratório japonês Takeda. O governo, contudo, prefere aguardar um produto 100% nacional. LINK


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse na 5ª feira (29.jun.2023) que o conceito de “democracia” é relativo. A declaração foi dada em entrevista à Rádio Gaúcha, quando o chefe do Executivo foi questionado sobre o motivo pelo qual parte da esquerda defende o regime de Nicolás Maduro na Venezuela. LINK


Então, vamos com as duas. Desfavor da semana.

SALLY

Você sabe que um governo está se esforçando para fazer merda quando precisamos dividir o tema no Desfavor da Semana. Ficou impossível determinar o que é pior: o salvador da democracia dizer que a democracia é relativa ou o militante das vacinas não comprar vacina contra doença que mata.

Eu fico com a parte das vacinas, já que coube a mim as postagens sobre o tema e sobre a pandemia. Se por um lado estou indignada, ultrajada e afrontada, por outro, não estou surpresa: nós sempre dissemos que o PT não é o amigão da ciência, ele apenas a usou de escada para bater no Bolsonaro.

O que me surpreende é a cara de pau das pessoas que até ontem acusavam Bolsonaro de genocida por não comprar vacina e agora justificam a atitude do Lula, com argumentos que não se sustentam. Como sempre, o brasileiro consegue ser pior do que seu político de estimação.

Os absurdos estão por todas as partes: em redes sociais, em comentários deixados em grandes portais de notícias ou na nossa coluna “Ei, Você” desta semana. Essa recusa na compra de vacinas está sendo varrida para debaixo do tapete com as justificativas mais inaceitáveis. Justificativas que, se tivessem sido utilizadas pela militância bolsonarista, seriam sumariamente rechaçadas.

Primeiro falaram que a vacina não havia sido aprovada pela ANVISA. Não é verdade, a vacina desenvolvida pelo laboratório japonês Takeda foi aprovada pela ANVISA em março desde ano, tanto é que será disponibilizada por clínicas particulares. Sem aprovação da ANVISA ninguém poderia aplicar a vacina.

E aí acontece um fenômeno muito curioso: você diz que a vacina foi aprovada pela ANVISA e vem um arrombado e pergunta “Fonte?”. Arial 12, seu arrombado. Não tem dedo não? Não consegue digitar uma porra duma informação no Google? Não consegue entrar no site da ANVISA? Se alguém diz que a vacina foi aprovada pela ANVISA, a fonte é a porra da ANVISA, quão burro tem que ser para ficar pedindo fonte em vez de pesquisar?

Assim como invadir a Ucrânia, torturar soldado, estuprar mulher e montar campo de concentração de crianças “é complexo” ou como eleição fraudada, morte de opositor e prisão de quem fala mal do governo “é relativo”, a não compra de vacinas também foi revestida de um tom de ambiguidade, para fazer parecer que a questão é muito mais profunda do que você pode compreender e que existe, lá no fundo, uma justificativa plausível para a não aquisição.

Não, não existe. Lula é tão filho da puta quanto Bolsonaro e está deixando morrer gente por não querer gastar esse dinheiro com o povo.

Mas boa parte da mídia está sendo muito bem remunerada com benefícios para falar mal do governo, então, o que sai em jornal é “Lula prioriza a indústria nacional”, fazendo parecer que hoje há uma escolha entre comprar uma vacina japonesa e produzi-la no Brasil. Não é verdade. A vacina brasileira contra dengue não está disponível ainda e não estará tão cedo. Com sorte, em 2025. Quem morrer nesses próximos dois anos de dengue morreu em vão, pois poderia estar imunizado.

Como o arrombamento não tem limites e o brasileiro vai até as profundezas da vergonha para defender seu político de estimação, teve gente dizendo que “é diferente” pois não estamos em uma pandemia de dengue.

Oi? Que diferença faz se o mundo todo tem dengue ou não? Se é pandemia ou endemia? Não ter dengue na Europa justifica a não compra de vacina no Brasil? Se está morrendo gente no Brasil e se existe vacina, foda-se o nome que se dá ao alcance dessa doença. Por sinal, deve ser muito mais difícil negociar e comprar uma vacina que o mundo todo quer, a da dengue seria café com leite.

Tem ainda os arrombados master que dizem que “dengue nem mata tanto assim”. Por favor, arrombados master, me digam qual é a quantidade de mortes que justifica a compra de uma vacina?

Quando Ministro do Bolsonaro não quis comprar vacina de covid para crianças com o mesmo argumento (que não morria muita criança de covid), estes mesmos arrombados master acharam um absurdo. E, já que é para comparar com o governo anterior, morreram menos crianças de covid em toda a pandemia do que pessoas de dengue em 2022, portanto, se o argumento não valia para o governo anterior, não pode valer agora.

“Fonte?”. SEU CU. SEU CU É MINHA FONTE, que de tão arrombado pude ler uma planilha de dados lá dentro. Se eu estou falando em mortalidade por doença, a fonte é o Ministério da Saúde, seria pedir demais que a elite intelectual do país saiba isso? Pelo visto seria. Tem que ser tudo mastigado e vomitado, tem que ter um link, pois o Fulano Estou Lendo um Livro não é capaz de entrar na caralha do site do Ministério da Saúde.

Por fim, tem o total e completo devaneio, a mais selvagem desconexão da realidade, o último degrau em cognição e dignidade: o que dizem que o pobre Lula não comprou vacina contra dengue por culpa do Bolsonaro, que deixou o país quebrado.

E dizem isso na mesma semana em que Lula liberou mais de CINCO BILHÕES de reais de orçamento secreto, às vésperas da votação da reforma tributária. “Fonte?”. O cu da sua mãe, igualmente arrombado, como o seu, onde pude ler em detalhes como chamar Orçamento Secreto de Emenda do Relator ou Emenda Pix é o suficiente para confundir o brasileiro.

Tenham vergonha nessa cara! Os mesmos que pouco tempo atrás estavam chamando de genocida um Chefe de Estado que não comprava vacina aprovada pela ANVISA contra uma doença que matava pessoas no Brasil agora estão “é complexo”, “é relativo”. Sabe o que é complexo? Isso mesmo, seu cu e o cu da sua mãe.

E ai da gente se insistir que são a mesma merda apenas com alegorias diferentes: “falsa simetria”, “o rancor de vocês os cega” e daí para baixo, como se fosse uma questão de opinião nossa. Não estamos inventando nada do que está neste texto, está tudo documentado, inclusive em fontes do próprio governo (e do cu da sua mãe).

Mas nada vai mudar, o brazuca vai continuar chamando Bolsonaro de genocida e fingindo que se o PT estivesse no poder a pandemia seria melhor. Vocês teriam é tomado a porra da Sputnik para enriquecer o amigão Putin (imagina se Lula ia negociar vacina com os EUA), o brasileiro teria saído para bundear na rua da mesma forma e teriam morrido mais de meio milhão de pessoas.

Falsa simetria é o seu cu (e o da sua mãe). Este Presidente, assim como seu antecessor, gasta o dinheiro público sem pensar no interesse do povo e vai deixar morrer gente por não comprar vacina. Relativizar isso é ser muito escroto, mais ainda se, no outro governo a pessoa criticou a não compra de vacinas. Aí deixa de ser escroto e passa a ser mau-caráter.

O que falta fazer? Lula recomendar Cloroquina para tratar dengue? Não faria diferença, seria “complexo”, seria “relativo”. Se Lula fizer (mais um) aborto na sua amante e rodasse o feto pelo cordão umbilical feito um caubói de rodeio em praça pública a militância encontraria uma justificativa. Isso é uma doença. Uma doença. Por favor, não participem disso, não se deixem cegar.

Cada semana surge um exemplo mais grotesco do que a semana anterior de como esses dois bostas (Lula e Bolsonaro) são exatamente a mesma coisa e ainda tem quem defenda ambos. Francamente, o brasileiro merece os Presidentes que tem.

Para dizer que é complexo, para dizer que é relativo ou ainda para dizer que os anti-vacinas estão felizes com o Lula: sally@desfavor.com

SOMIR

Ainda bem que o Brasil não escolheu o candidato que ia contra as vacinas e achava democracia desnecessária, não?

Depois de um texto carinhoso da Sally sobre a parte das vacinas, é minha missão analisar mais uma frase tenebrosa de Lula sobre uma das suas ditaduras de estimação. Vamos estabelecer uma coisa primeiro? Lula é um senhor de quase 80 anos de idade. Não só passou e muito da linha de corte de adulto, como também passou boa parte da sua vida inserido no contexto de político profissional.

É absurdo tratar o atual presidente como alguém que não quer efetivamente dizer o que diz. Lula sabe o que está falando e tem convicção sobre o que pensa. Não é inocência ou mesmo um espírito zombeteiro baixando nele para colocar palavras em sua boca. Quando um moleque nos seus 20 e poucos anos fala alguma bobagem radical, podemos entender que ainda falta maturidade e conhecimento para entender todas as nuances da sociedade humana.

Quando um quase octogenário no seu terceiro mandato como presidente do Brasil diz que democracia é relativa, não é um acidente. Ele realmente acredita nisso e pode ser julgado por essa opinião. Num mundo ideal, Lula teria dito isso para fazer uma análise mais aprofundada sobre a dificuldade de manter um sistema democrático justo, um que mantenha maiorias e minorias se sentindo representadas e permita uma saudável alternância de poder. Existem democracias e democracias.

No mundo real, temos todo o histórico desse cidadão de tolerar e muitas vezes celebrar sistemas totalitários que se declaram de esquerda. Uma das formas de aplicar uma ditadura é tomar o controle de todos os poderes e criar uma fantasia democrática com eleições controladas. China, Rússia, Venezuela e até mesmo Cuba fazem coisas do tipo: em tese as pessoas votam, na prática, elas sempre votam em quem conta os votos.

Então, não dá para engolir a teoria que Lula estava discutindo as nuances do sistema democrático, e sim dando suporte a quem distorce o sistema em ganho próprio. Se ele acredita que o ditador da vez está do “lado certo”, ele também acha compreensível ter democracias de mentirinha, ou, nas palavras dele, democracias relativas.

Uma tangente: eu não sei dizer se o ser humano médio nunca se importou tanto assim com democracia ou se está ficando cansado da promessa de um mundo perfeito surgir a partir dela. Desde que os EUA se tornaram potência dominante, empurraram a ideia de que seus ideais democráticos eram a resposta para nossos problemas. Claro, foi só propaganda, porque eram os primeiros a ajudar ditaduras aqui mesmo na América do Sul quando se sentiam ameaçados pelos candidatos eleitos pelo povo, mas isso adentrou o inconsciente coletivo de todo mundo que viveu na era de expansão cultural americana pelo mundo.

Digo isso porque eu consigo enxergar a relatividade da democracia: é um sistema de governo que pode ser muito frustrante. As coisas demoram para acontecer, tem que lidar com um monte de interesses conflitantes, é complicado apontar um país numa direção bem definida, ainda mais se tiver tanto território e população como o Brasil. Eu acho terrível viver num país onde igrejas não pagam impostos e abortos são ilegais, só para dar dois exemplos de onde a vontade da maioria difere da minha.

É difícil ter que carregar todo mundo junto para onde quer que quisermos ir. Mas depois de milhares de anos de evolução social, essa é o remédio amargo que descobrimos: ou vamos juntos, ou ficamos dando voltas inúteis. Quer fazer diferente? Só precisa olhar para a história para ver como simplesmente não funciona. O ditador puxe o povo numa direção, mas mesmo que ele não os guie para um precipício (e historicamente, eles vivem levando o seu povo para precipícios), eventualmente a pressão é tanta na corda que ela estoura e deixa todo mundo confuso num vácuo de poder e propósito.

Lula acredita que democracia é relativa porque nutre a esperança que se for ele puxando a corda, vai dar certo. Essa é a mentalidade de muita gente nesse mundo, arrisco até a dizer que é como funciona a cabeça da maioria das pessoas. O problema sempre é que todo mundo precisa ser guiado na direção que você acha certa. Talvez o mundo consiga tirar mais valor de suas democracias se mais gente conseguir abandonar essa fantasia de poder (próprio ou focado em algum líder/guru/ser mágico) e começar a enxergar que vai ser complicado mesmo e que precisamos ir em grupo.

Quando comparamos Lula e Bolsonaro no seu desdém pela democracia, estamos comparando a base do pensamento, não a alegoria como ele é apresentado. Bolsonaro tem fetiche com uniformes militares, Lula não liga para isso. Os dois tem essa ideia medíocre de que só precisamos de um déspota esclarecido para resolver os problemas do mundo, e o ego os faz acreditar que esse ser mítico pode ser um deles.

Eu já pensei assim também, aí eu pensei de verdade sobre o assunto e percebi que eu, mesmo que tenha boas intenções, nunca ia conseguir carregar todo mundo nas costas rumo a um futuro ideal. Democracia é o jeito complicado de convencer as pessoas antes de levá-las para algum lugar, mas é o jeito que faz a manada andar por conta própria, mesmo que seja a passos lentos.

Pode ter algo ainda melhor que democracia para fazer a evolução social humana ser mais rápida e mais permanente? Pode sim. É fazer a porcaria da mesma coisa que a gente está fazendo há milhares de anos? Não. Se você acha que se você for o líder vai ser diferente, você não tem cérebro nem para ser síndico. Você vai ter a simpatia de milhares de outros imbecis que acham que isso funciona e até mesmo ter uma chance de aplicar esse poder se der sorte de ser popular o suficiente, mas isso não quer dizer que você vai ser capaz de resolver esse problema fundamental.

Lula e Bolsonaro relativizam democracia porque são representantes de povos que relativizam democracia. O ego é muito mais forte que o bom senso: “todo mundo faz e dá errado, mas quando eu fizer vai dar certo”. E bônus, o plano é exatamente o mesmo das pessoas que fizeram e erraram antes de você.

Não acho que Lula consiga emplacar uma “democracia relativa” no Brasil, assim como não acreditava que Bolsonaro teria apoio real para ser ditador, mas é triste como o tempo passa e o povo continua escolhendo gente com essa mentalidade que é a definição da insanidade.

Depois não sabem por que o Brasil é o eterno país do futuro.

Para dizer que eu só apresentei problemas e não soluções, para dizer que você faria dar certo, ou mesmo para dizer que um dia a IA assume e resolve: somir@desfavor.com


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