Tchau, otários!

O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Dias Toffoli anulou nesta 3ª feira (21.mai.2024) todas as decisões sob juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba, sob o comando do então juiz e atual senador Sergio Moro (União Brasil-PR), contra o empresário Marcelo Bahia Odebrecht na operação Lava Jato. LINK


A pizza demorou, mas foi servida. Desfavor da Semana.

SALLY

Vamos inverter as coisas para fins didáticos? Imaginem que no Governo Bolsonaro o Velho da Havan é flagrado cometendo uma série de crimes que lesam o patrimônio público em mais de 40 bilhões de reais. Ele é investigado e se descobre o maior esquema de corrupção que o país já viu, envolvendo 415 políticos de 26 partidos diferentes. Os diversos processos contam com inúmeras provas testemunhais, documentais e periciais.

Contam ainda com a confissão do próprio Velho da Havan, admitindo os crimes. Ele é condenado por dezenas de juízes diferentes, em instâncias diferentes, em processos diferentes. Além disso, sua empresa está sendo processada em mais de dez países por esses crimes, ou seja, não foi apenas o Judiciário brasileiro quem reconhece estes ilícitos.

As investigações levam à prisão de muita gente e ainda conseguem trazer de volta parte do dinheiro que foi desviado (vulgo roubado) no esquema de corrupção. A Havan publica uma nota com o título “Desculpe, a Havan errou” na qual não apenas admite as tramoias, o roubo e os crimes, como ainda pede desculpas a todos prometendo tomar medidas para que a empresa volte a ser séria. Usa termos incontroversos, como “admitimos nosso envolvimento”. Também dá entrevistas admitindo o que fez.

Anos depois, Bolsonaro se reelege. Sua primeira providência é colocar no STF um Ministro que já foi seu advogado pessoal. Ato contínuo, esse Ministro, que já foi seu advogado pessoal, anula todos os processos contra o Velho da Havan e sua empresa. O que os petistas estariam dizendo neste exato momento? O que a mídia estaria dizendo neste exato momento? Será que o assunto seria tratado com a mesma irrelevância que está sendo trata a decisão bizarra envolvendo Marcelo Odebrecht?

Eu não vou ficar me repetindo aqui do quanto isso é bizarro, afrontoso, aviltante, baixo, desmoralizante e criminoso. Quem não está cego, quem não é paquita de político, sabe o quão bizarro é tudo isso que está acontecendo.

Também não vou ficar me repetindo sobre o quanto é contraproducente um país polarizado, com povo dividido e políticos unidos, que se alterna entre duas bostas, já foi dito demais e todos nós sabemos dos ganhos secundários dessa polarização, inclusive para o povo (sensação de pertinência, de superioridade moral, facilidade de não ter que pensar apenas aderir e tantos outros). Nós todos sabemos que isso não vai mudar tão cedo.

Então, por pior que seja a realidade, hoje quero lidar apenas com ela não com soluções utópicas que em tese seriam as melhores opções. A realidade é um país dividido que pende para dois extremos: um que se diz esquerda e um que se diz direita. Na real, política brasileira passa longe de ideologia, é apenas disputa por poder, em essência são todos a mesma cambada de filho da puta, só muda a alegoria que reveste os discursos.

Discurso ecológico é lindo, mas não adianta nada se floresta bate recorde de queimada e desmatamento. Discurso humanitário é lindo, mas não adianta nada quando colocam questões humanitárias como resgate de vítimas condicionado à cor da pele. Discurso ético é lindo, mas não adianta nada se os sigilos e o orçamento secreto continuam. Discurso de tolerância é lindo, mas não adianta nada quando se abre inquérito para investigar quem diz que o governo agiu de forma morosa e incompetente. Discurso pró-vacina é ótimo, mas não adianta nada quando se deixa faltar vacina contra dengue e covid. Discurso pró-ciência é ótimo, mas não adianta nada quando se corta verba para pesquisa e educação para “emendas do relator”.

Então, vamos para o ponto do texto de hoje: a simetria é verdadeira no que diz respeito a aquilo que são em essência, porém, ela é rompida quando falamos de fiscalização, de oposição e de mídia. Isso quer dizer que se Bolsonaro fizesse metade do que o Lula está fazendo, a gritaria seria ensurdecedora, tanto na mídia como nas redes sociais.

Logo, temos dois lados com discursos antagônicos, mas que na prática fazem as mesmas bostas, sendo que um faz impunemente, sem reprimenda, sem indignação, sem freio e o outro lado apanha para um caralho quando o faz.

Na minha opinião, esse é o critério de voto daqui para frente no Brasil: quem vai ter menos mobilidade para fazer merda. A quem vai custar mais caro fazer merda. Quem estará mais vigiado, quem terá que enfrentar uma chuva de críticas, quem terá mais dificuldade para fazer merda.

E não falo de dificuldades no Legislativo e do Judiciário, pois estes se compram com facilidade no Brasil. Falo da opinião pública mesmo, que vocês, brasileiros, parecem achar irrelevante por motivos que eu não sei explicar. A opinião pública pesa, o povo na rua pesa, rejeição popular pesa, a mídia batendo pesa.

Qual dos dois lados terá mais liberdade para abusar do poder que tem? Esse é o lado que você não deve eleger. Esquece quem é melhor (não tem político decente no Brasil, chegando ao poder todos se corrompem e se não se corrompem são removidos), esquece quem tem a alegoria que menos te desagrada (alegorias são meros adereços), esquece o que seria o certo para que o país melhore (não vai melhorar, não vai sair dessa polarização tão cedo).

Seja realista: no cenário da data da eleição, quem teria menos liberdade no que diz respeito a mídia, opinião pública e oposição para cometer abusos? Vote nesse.

Percebam que não estou mandando votar em Fulano ou Beltrano, eu nem sei qual será o cenário em 2026. No Brasil as coisas mudam rápido, pessoas são descondenadas, a história é reescrita. Pouco importa se será Lula, Bolsonaro ou uma mula manca. Vote em quem vai pagar um preço caro por cometer abusos, em quem a mídia vai cair de pau, em quem vai ter que tomar ao menos algum cuidado para foder com a vida de vocês. Essa pessoa vai ter mais trabalho para fazer merda e a merda vai lhe custar mais caro.

Chega de utopia, sejam realistas. Hora de votar no filho da puta que estará menos confortável no poder.

Para dizer que quer votar em quem faça William Bonner faniquitar, para dizer espera não precisar votar em 2026 por estar fora do Brasil ou ainda para dizer que vai levar uma britadeira para cravar seu voto na oposição: comente.

SOMIR

Quando a gente fala sobre os perigos da politização, não é uma crítica à ideia de discutir política. Política tem sua função, democracia depende de negociações para chegar a consensos, existem inúmeros caminhos legais para chegar a acordos que permitam o país seguir em frente. É saudável que existam ideias conflitantes, gera equilíbrio quando o sistema funciona.

O que não funciona é politização baseada em manipulação dos sentimentos da população para conseguir vantagens pessoais. Corrupção, ganância, histeria… está tudo interligado numa máquina de desvio de função do agente público para tirar vantagens dos recursos que pagamos em impostos.

A Lava-Jato foi um marco no combate à corrupção no Brasil, mas não era um modelo sustentável. A virada de mesa que acontece diante dos nossos olhos tem sim as digitais dos antigos heróis da República de Curitiba. Moro e Dalagnol, juiz e promotor mais famosos daquele processo, cometeram erros infantis do ponto de vista político. Não por discutirem política, mas por se colocarem como suspeitos em busca de um “plano de carreira” num país viciado em politização histérica.

Moro correu para participar do governo Bolsonaro, por exemplo. Ele pode ter as convicções que quiser, mas a partir daquele momento, ele escolheu entrar numa área do poder público que permitia a participação de pessoas muito mais experientes na politização. Talvez sem perceber, ele trouxe a Lava-Jato consigo para o ninho das cobras.

E uma picada por vez, as cobras mataram a operação que tinha prendido vários dos maiores corruptos do país. De repente, a narrativa de que a investigação de corrupção que tinha admissões, devoluções de dinheiro desviado e ampla documentação provando o acontecido acabou como mais uma discussão politizada entre a turma de Lula e Bolsonaro.

A Lava-Jato não foi sobre esquerda ou direita, porque o dinheiro realmente foi desviado e acabou na mão de corruptos. Mas ela se tornou elemento de politização quando Moro e cia. tentaram saciar o próprio ego entrando para a política. A politização é um jogo que Lula sabe fazer como poucos. A cada dia que passava, mais reputações eram moídas e mais acordos eram feitos por trás dos panos. Bolsonaro se aliou com o Centrão durante o seu governo, e depois de brigar com Moro, começou a abrir a porteira para o movimento de revisão de tudo o que já estava provado de corrupção.

De repente, o que era técnico começou a ser analisado sob a ótica das posições políticas daqueles que investigaram. Falha de Moro e cia., plano de Lula e cia., tudo ao mesmo tempo. E quando o jogo virou para discutirem quem estava perseguindo quem, o STF, que é tudo menos técnico, sentiu a mudança nos ares e começou a desmantelar a Lava-Jato, só lembrando que o STF tinha validado tudo pouco tempo antes.

O “golpe jurídico” começou com a liberação de Lula, e termina de ser aplicado com o financiador Marcelo Odebrecht tendo suas condenações anuladas. A Lava-Jato pisou no campo da politização e foi trucidada por uma força-tarefa de direita, esquerda e centrão fisiológico. De Moro e Dalagnol eu não tenho pena, eles realmente quiserem jogar esse jogo e descobriram da pior forma possível que não estavam nem próximos do nível necessário para ganhar.

Eu fico chateado pelo Brasil, que vê corruptos escapando felizes da vida, e de toda a equipe técnica que se matou para investigar e juntar provas contra vários dos corruptos mais poderosos do Brasil. Esforço desperdiçado e risco assumido à toa. O chefe do esquema de corrupção escapou e é o presidente do país! Esses técnicos da Polícia Federal e do Ministério Público viram seu trabalho ser desmantelado com um brinde de champagne importado entre esquerda, direita e todo tipo de corrupto.

Não só é triste ver bandido escapando, como é terrível para a motivação de quem ainda tenta enfrentar corruptos nesse país. O povo morde a isca de populistas imbecis falando sobre comprar picanha ou proibir aborto, e no pacote compram junto a garantia de impunidade para quem rouba dinheiro público. Essa é a politização nociva, a que distrai a maioria de questões práticas e libera grandes acordos para liberar os safados que tiram dinheiro de saúde, educação, segurança…

Que se exploda a questão técnica: a imagem de Moro foi arrastada para a lama da politização (também por culpa dele) e essa foi a brecha para desvirtuar o assunto todo para gostar ou não do Lula. E baseados nisso, a mais alta corte do país foi liberando a imensa maioria dos culpados, muitos assumidos, pelo maior esquema de corrupção da história do Brasil, e pelas somas, talvez da humanidade.

A politização entrou, a lógica saiu. Cada vez que uma pessoa cai na armadilha de achar que Lula ou Bolsonaro representam algo a mais do que um grupo de pessoas específico para onde é desviado dinheiro público, reforçam esse desvio de função do agente público. Politização histérica sem análise técnica dá nisso, em pizza. Pizza que pobre nunca comer.

Para dizer que o lado que você gosta é inocente (os dois lados jogaram juntos), para dizer que sabia que seria um vôo de galinha, ou mesmo para dizer que foi só uma pressão evolutiva nos corruptos: comente.

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Comments (5)

    • Capitão Impressionante

      Sim. E as poucas coisas boas nesta joça tem mesmo a duração de um voo de galinha: melhora de níveis sociais, desenvolvimento, crescimento econômico, combate à corrupção…

  • “a politização nociva”

    “a lama da politização”

    Dallagnol que (também) nunca vai admitir o resto da própria trajetória? Eu mesmo fui aquele que, há meses, já acreditava que a última razão que teve foi na treta (tão óbvia desse “ganhar” quanto a perda de tempo!) contra o Nelipe Feto, “daí é mais submerso até” que possa ficar “quase mainstream” aquela discussão (com potencial?) a partir da aceleração da babaquice do “NoOvo” (aquele do “Amerdedo”, segundo Charles D.G.) até a muitíssima derrotada e parte supostamente em ascensão (e o quanto com imagem de inovadora?) do tal do “Livres”.

    Mais um gigante sábado daqui de uma gigante semana “até sobre polarização (afetiva ou sentimentalista?)”!

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