Natureza brasileira.

O g1 teve acesso a imagens exclusivas que mostram crianças yanomami desnutridas em busca de atendimento. Os registros são fortes e denunciam que, mesmo um ano após o governo Lula decretar emergência de saúde pública na região, o retrato ainda é de fome, doenças e mortes. LINK


Quando apareceu pela primeira vez, era culpa do Bolsonaro. E agora? Desfavor da Semana.

SALLY

O brasileiro é fascinante. Quando os preços aumentam na Argentina 15 dias após o Presidente novo assumir, a culpa é toda do Presidente novo, mas quando tem criança yanomami morrendo de desnutrição no Brasil, um ano após o Presidente “novo” assumir, a culpa é do Presidente anterior.

Nem mesmo as fotos de crianças desnutridas, pele e osso, tal qual crianças das zonas mais pobres da África, são o suficiente para que a pessoa bote a mão na consciência e diga “fiz merda em votar no Lula, fiz merda em defender o Lula publicamente, além do Bolsonaro existiam outros 9 candidatos e eu poderia ter votado em qualquer um deles”.

Não. Tá tudo bem em subir a rampa com índio para ostentar diversidade e depois deixar criança morrer de desnutrição. Tá tudo bem em fingir que as únicas opções eram Lula e Bolsonaro. Tá tudo bem em relativizar todo tipo de corrupção, abuso ou mentira, pois é preferível isso a rever o pensamento e admitir que o político de estimação é a mesma bosta do anterior.

A situação indígena nunca será resolvida, pois nunca será tratada de acordo com a realidade no Brasil. Tudo é idealizado. E esse conceito flutuante vai sendo distorcido para promover ou atacar as pessoas desejadas.

Vamos ser bem sinceros aqui? Brasileiro bobo nasce morto. Índio, assim como qualquer brasileiro na média, é um grupo desassistido, brutalizado e malandro toda a vida, não porque sejam ruins, mas pela realidade na qual eles são colocados. Crescem vendo que essa é a forma padrão de conduta, de sobrevivência, de se dar bem num mundo cão sem regras nem justiça.

Permitam contar algumas histórias sobre indígenas, os mesmos que depois aparecem na frente das câmeras choramingando da opressão do homem branco.

A regra é que os próprios índios permitam que o “homem branco opressor” explore suas terras em troca de pagamento ou percentual nos lucros. Hoje, os índios são uns dos que mais contribuem para que as florestas, para que a fauna e a flora nacionais sejam violentamente depredadas.

Esse índio na oca, 100% selvagem e sem compreensão da sociedade praticamente não existe mais. E não é esse o que está desnutrido, esse consegue subsistir. O índio que vocês estão acostumados a ver é um índio “capitalista”, ambicioso, com perfeito entendimento e expertise em estelionato e ganância. Os exemplares desassistidos, que estão passando necessidades, são, antes de mais nada, desassistidos pelos próprios índios.

Um exemplo: índio que cobra pedágio (ilegal) para que as pessoas passem pelas estradas próximas às suas terras. De dia, o pedido é de boa, de noite, é com violência e o pedágio fica um pouco mais caro, não incluí apenas pagamento em dinheiro, também pode incluir favores sexuais, revista e apreensão de bens que você tenha que agrade a eles ou até o confisco do seu veículo. Esses índios extorquem diariamente o “malvado homem branco” mas deixam os seus passarem fome, mesmo nadando em dinheiro.

Outro exemplo em maior escala: “homem branco malvado” explorando terra indígena sem a anuência de índio é a exceção da exceção. A regra é o índio que permite que suas terras sejam exploradas (por exemplo, por empresas que buscam pedras preciosas) em troca de um mensalão ou da participação nos lucros. Tem índio ganhando mais do que Ministro do STF aí, e sua tribo passando necessidade.

O que eles fazem com esse dinheiro? Muita coisa, por exemplo, um puteiro para explorar sexualmente as próprias índias da tribo, obrigando-as a fazer sexo com o “homem branco” em troca de dinheiro, multiplicando seus lucros diariamente.

E a melhor parte é: não pega nada pro índio, pois quando uma coisa dessas vem à tona, ele veste a carapuça do bom-selvagem, dá entrevista com tempo verbal no infinitivo relembrando todos os abusos do “homem branco”, se vitimizando e se fazendo de idiota. E cola. Chegam de Hilux, com tênis da Nike, trocam de roupa e aparecem de tanga se vitimizando.

Eu tenho história para encher dez páginas, mas como hoje meu texto é mais curto, vou direto ao ponto: sim, o Poder Público tem obrigação de prestar assistência a todo brasileiros, seja ele índio ou não, e se tem criança desnutrida ele está falhando. Mas o índio não é esse pobre coitado inocente que a maioria das pessoas pensam não.

É por isso que nenhuma discussão no Brasil leva a lugar nenhum nem chega perto de esbarrar em uma possível solução de nada: todas partem de um lugar mentiroso, de premissas falsas, se alegorias mutáveis que se distorcem dependendo da conveniência do interlocutor.

Quem discutir questão indígena tratando-os como selvagens, inocentes e alheios à civilização não vai chegar a lugar nenhum. Mas convém vender essa imagem, afinal, quem defende os bonzinhos só pode estar do lado do bem, não é mesmo? Índio ser amigo. Índio ser vítima do homem branco. Índio subir a rampa do Planalto e depois índio e governo deixar crianças morrer de desnutrição. Mas não tanto quanto no governo Bolsonaro, pois no governo Bolsonaro as crianças estavam MAIS desnutridas, as mulheres estavam menos grávidas e a água era menos molhada.

Francamente, não dá nem vontade de discutir, pois quem parte da premissa errada não chega a ponto algum. Porém, mesmo sem discussão, continua sendo um absurdo que o candidato que se escorou na causa indígena para se eleger deixe criança morrer de desnutrição impunemente, canalizando a culpa para tudo, menos para ele: o governo anterior, o clima, mercúrio retrógrado.

E também cola. O mais triste é que cola, pois o brasileiro não consegue se desfazer de seu político de estimação assim como uma criança medrosa não consegue se desfazer do seu cobertor de estimação, velho, imundo e cheio de ácaros, por pensar que essa nojeira de alguma forma o protege ou lhe dá segurança. Patético.

Bando de fodidos… se fosse foto de criança argentina desnutrida tava todo mundo “AIN MIMLEI ASSASSINUUUU”. Bando de fodidos. Tomem vergonha na cara.

Para dizer que não veio aqui em um sábado para ser xingado (estamos falando com Paquita de Político), para dizer que só é genocídio se quem comete é o Bolsonaro ou ainda para dizer que a culpa é do governo anterior: comente.

SOMIR

Eu acredito que está mais do que na hora do Brasil decidir o quão índio é o seu índio, de verdade. Os povos originários desta terra ora são mera parte da fauna local, ora são nobres defensores da floresta. Sem contar todas as vezes que são acusados de vagabundos desperdiçando as oportunidades econômicas ao seu redor.

Nenhuma dessas visões que esquerda e direita defendem em seus discursos cada vez mais radicais contempla o fato central da coisa: índios são seres humanos. As qualidades e defeitos encontradas nos humanos das cidades e das áreas rurais são encontradas neles também.

Até porque já ocorreu uma contaminação sem volta da nossa sociedade na vida deles. Povos realmente isolados são notícia pela sua raridade, temos algumas tribos relativamente intocadas no meio da floresta amazônica e meia dúzia perdida em outros lugares do mundo. O número de humanos que vive sem noção do que é a humanidade moderna dificilmente passa do número de habitantes de um bairro de uma grande cidade.

São estatisticamente irrelevantes para a discussão. Eu tenho minha opinião sobre a responsabilidade de levar tecnologia e conhecimento científico para esses povos, mas respeito a visão oposta de mantê-los isolados. Não tem resposta perfeita, é mais uma questão ideológica de como queremos tratar o ser humano. Todas as opções vão ter seus problemas.

Então, quando eu penso no tema dos povos indígenas brasileiros, eu levo em consideração que eles são, em sua esmagadora maioria, povos que já foram irrecuperavelmente impactados pela sociedade ocidental moderna. Não dá para separar índio de brasileiro médio. Inclusive porque mesmo que o Estado decida se manter afastado, a iniciativa privada criminosa já se decidiu pelo contrário.

Do jeito como se noticiam os acontecimentos na floresta, parece que facções criminosas invadiram o local e mantem todos os índios como reféns. Não é tão simples assim: o povo local é parte da organização criminosa. Assim como numa das inúmeras favelas no resto do país, não é que todos os locais sejam parte do crime organizado, a maioria não é, mas é evidente que eles usam locais para montar a estrutura das atividades ilegais.

A verdade é que tem índio participando dos crimes e índio sofrendo por causa deles, da mesma forma que no resto do país. A estrutura de comando e o financiamento vem de condomínios fechados e gabinetes políticos assim como o tráfico e a milícia, mas os soldados do crime são basicamente locais. Gente que destrói a comunidade em busca de lucro pessoal. Gente que coloca o lucro acima de tudo ou gente que nunca teve outra opção na vida.

A diferença é que naquele inferno verde que é a Amazônia, a prática da vida do pobre é diferente: estão extremamente isolados da estrutura pública e uns dos outros. As cenas de desnutrição severa entre os índios são mais parecidas com as cenas de desnutrição severa no sertão nordestino ou em países africanos do que a cena histórica do europeu invadindo território ancestral que passa pela cabeça das pessoas.

Não é mais o bandeirante tocando o terror floresta adentro como no passado, é a lógica de exploração criminosa das cidades modernas adaptada à realidade dos pobres vivendo na região Norte do Brasil. Não se trata do tema com mentalidade de preservação de natureza, o índio brasileiro é tudo menos bicho solto na floresta. O Brasil já chegou neles, e foi justamente a parte mais escrota da nossa sociedade: a vida de favela abandonada pelo poder público.

É impossível tratar do tema pensando que é para deixar os nobres selvagens em paz, porque sem Estado para regular, os índios vão continuar se integrando com criminosos e exploradores para causar esses problemas nas próprias comunidades. Não tem separação entre morador de morro carioca e yanomami no meio do Amazonas: ambos os grupos estão integrados com a sociedade moderna, mas o grupo que chamamos de povo originário não tem nem o pouco de estrutura governamental que o povo da cidade tem.

Os índios não estavam passando fome porque o Bolsonaro queria cimentar a Amazônia e fazer um estacionamento no lugar, eles estavam naquela situação precária porque o Estado estava ausente e os criminosos estavam correndo soltos. Bandidos que vieram de fora e bandidos que nasceram nas tribos unidos para tirar valor da terra, considerando que não tem polícia, hospital, escola, economia tradicional nem nada no lugar para oferecer opções para o povo.

Tanto que por mais que Lula tenha mandado fazer uma operação espalhafatosa para espantar os garimpeiros e oferecer cestas básicas para os índios passando fome, não mudou o cerne da questão. Os índios não têm mais a opção de viver como viviam milhares de anos atrás, eles já são parte do Brasil moderno e precisam de alguma economia ao seu redor. Os garimpeiros voltam porque o povo local precisa deles, e voltam também porque boa parte deles nunca saiu: eram os índios.

E isso só acontece porque o Estado não existe por lá. Tem gente esforçada que tenta ajudar os locais, é claro, tem gente que se preocupa com a preservação da natureza e quer criar opções mais sustentáveis para gerar uma economia saudável por lá… mas é um território maior que a Europa com uma população menor que cidades interioranas do Sudeste. É óbvio que não funciona, não tem gente suficiente para lidar com a região e o Estado está uns 300 anos atrasado em ocupar o território para oferecer alternativas ao crime organizado.

As cenas terríveis continuam acontecendo porque continuamos confusos sobre quão índios eles são de verdade. E talvez pior: que continuemos achando que índio não é um humano como qualquer outro. Imagina só tratar uma favela como área protegida e proibir qualquer um de entrar lá dentro para tentar criar uma economia? Bom, não precisa imaginar, as favelas controladas por tráfico e milícias nos provam o resultado.

A diferença é que as cestas básicas chegam mais fácil na favela abandonada pelo Estado e conseguimos evitar desnutrição em massa perto dos nossos maiores centros urbanos.

Não é papo de ministra usando cocar gigante nem mentalidade de proteção de “espécie ameaçada” que vai resolver o problema dos índios brasileiros; a solução é a mesma que funcionaria nas regiões urbanas: presença do Estado e oportunidades para evitar que a população local acabe cooptada pelo crime organizado. É falha do governo. Uma falha que não se importa se você chama índio de vagabundo como Bolsonaro e a direita ou se trata índio como animal selvagem como Lula e a esquerda.

Só se resolve se eles forem gente para o Estado. E mesmo assim, só se o Estado se preocupar com gente de verdade, além dos discursos populistas. O que não era o caso do governo anterior, nem do atual.

Para dizer que prefere imaginar que índio é bicho, para dizer que tem índio rico (tem gente na favela que é rica também), ou mesmo para dizer que a solução é transformar num estacionamento mesmo: comente.

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Comments (4)

  • Se produz o suficiente para alimentar o mundo três vezes, a fome e a sede são ferramentas de controle do povo. Dinheiro e logística para causar dor, desgraça e morte não faltam. Oras, as elites mundiais podem criar dinheiro do nada hoje em dia, literalmente. Só existe fome porque os donos do mundo querem e em parte porque a população deixa eles fazerem isso.

  • Yanomami passando fome é tão novidade que já ouvia falar disso há mais de 30 anos atrás.
    O importante é a pose dos oligarcas e dos capitães do mato de nossa BURROCRACIA.

  • Cara, eu tô cansado de ser brasileiro.
    Entra ano e sai ano e a gente é governado pela mesma meia dúzia de famílias podres que enxergam a gente como bichos, ou coisa pior.
    Esses merdas não vão pro inferno nunca?

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