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Carnaval seguro.

Carnaval seguro.

| Sally | | 46 comentários em Carnaval seguro.

Você gosta de carnaval? Provavelmente não. Não gostamos de carnaval por aqui: muito suor, muita urina, muita música ruim. Pessoas andam em bandos se portando como símios, em um misto de violência e promiscuidade agravado pelo calor extremo e consequente suor. Carnaval é uma festa tupiniquim indigna e primitiva. Mas, ainda assim, apesar de todo meu desprezo, acho que vale uma análise sobre o que carnaval está se tornando.

Vamos falar de apropriação cultural. Mas não muito, no começo do mês fiz um texto só sobre isso. Você tem o desafio de achar uma fantasia não relacionada com qualquer cultura, para não correr o risco de virar alvo viralizado de ataques em redes sociais pelo rolo compressor da lacração ou até mesmo de ser hostilizado no meio da rua. O problema é: quase tudo que existe deriva de alguma cultura. Talvez se fantasiar de alienígena? Menos provável que você seja confrontado, pois um alien que tem inteligência suficiente para chegar na Terra certamente não perderá seu tempo com essa ofensa de apropriação cultural.

Também há regras para fantasia expondo corpo feminino. Pode se você for empoderada, feminista e lacradora, leia-se feia, mole, gora e peluda. Aí ok. Se for linda, em forma e despertar olhares masculinos não pode, pois é objetificação do feminino. Sim, seu corpo, as regras dela. Se você quer se objetificar não pode, será patrulhada, recriminada e esculhambada por pessoas que, em tese, estão aí para impedir que patrulha e esculhambação aconteçam com mulheres em função de sua escolha de roupas. Eu sei, complexo. Não pergunte, não rebata, elas são chatas pra caralho, não vale a dor de cabeça.

Mas, ao mesmo tempo, se usar uma fantasia que cubra muito o corpo você também pode sofrer ataques, afinal, é repressão da sociedade machista, mulher tem que sair na rua com os peitos de fora para resolver qualquer mazela social. Sim, difícil, eu sei: se mostra é objetificação, se não mostra é opressão de cultura patriarcal machista. A solução? Passar carnaval em Veneza, com pessoas civilizadas que não barraqueiam com quem pensa diferente delas.

Tem também a questão racial, muito cuidado com isso. Quem não lembra a merda que deu aquela criança fantasiada do macaquinho do filme Aladim? Tinha o pai de Aladim, a mãe de Yasmine e o menino, por sinal, adotado, ou seja, especificamente escolhido por aquela família, vestido de Abu, o macaquinho mascote do Aladim. Gerou até investigação do Ministério Público, viu? Então, cuidado, se você for negro ou tiver filhos negros, existem uma série de fantasias que você não pode usar, afinal, a luta contra o racismo taí justamente para isso: para limitar mais ainda a vida do negro. Não é recomendada nenhuma fantasia relacionada a: símios de qualquer tipo, bananas, alusão a cabelo crespo, alusão a escravatura. O lado bom é que negros estão autorizados pela patrulha pau no cu a usar turbante.

Black face nem pensar. Não importa o contexto, não pode pintar o rosto de preto nem mesmo para peça de teatro, quem dirá para carnaval. Perucas black também são um risco, pois o cabelo crespo não pode mais nem ser cantado, já que marchinhas como “o teu cabelo não nega” e músicas baianas como “escovadinha” foram banidas. Fantasia de “nega maluca” é certeza de linchamento. Evite a todo custo.

Fique de olho no politicamente correto no geral. Para facilitar sua vida, fizemos uma breve lista com os temas que podem ser objeto de sátira em fantasias de carnaval. Pode: japonês, português, argentino, políticos no geral. Não pode: judeus, negros, deficientes físicos, crianças, idosos e pessoas mortas. Mas cuidado, existem zonas cinzentas: muçulmano pode, se for com uma leitura alegre, se for segurando uma bomba não pode. Político pode se forem uma alusão a punição, atrás das grades, ou ridicularizando sua postura, como homenagem, não pode.

Fantasias nerds não serão compreendidas, mas, tudo bem, dificilmente ofenderão. O populacho associará com algo de mais parecido que conhecer. Por exemplo, se você for vestido de Tardis, pode ser que achem que está de caixa de fósforo. Se estiver vestido de Efeito Dopler, como Sheldon Cooper, acharão que está fantasiado de zebra. A gentalha bêbada encontrará algum significado. Em todo caso, sempre pode apelar para o nerd que favelizou, como Star Wars e Pokemon. Fantasias de super-heróis foram promovidas, saíram da categoria nerd e estão na categoria cool, graças à massificação de filmes de heróis dos últimos anos. Quanto mais gorda for a mulher, mais empoderada e questionadora dos padrões de beleza vigentes ela se sentirá com aquelas roupinhas pequenas e justas da Marvel.

A última novidade é que adultos vestidos de bebês no carnaval poderiam, de alguma forma, estar estimulando a pedofilia. Sim, sim, bem provável. Adulto saudável vê uma pessoa fantasiada de bebê e pensa “olha só que bacana, e se eu começar a fazer sexo com crianças? Essa fantasia me deu uma ótima ideia!”. Um perigo. Por isso, nada de fantasias de bebê ou de crianças. No aguardo de banirem o seriado Chaves da televisão brasileira.

Homem se vestir de mulher, por farra, para sair no bloco das piranhas, também não é mais bem visto. As trans, cross e todas as derivações de homens que se vestem com roupas femininas acham desrespeitoso. Homem tem que usar fantasia de alguma entidade do sexo masculino, para não debochar de pessoas que, durante todo o ano tem bilau e se vestem com roupas femininas. Homem com roupa de mulher não é fantasia, é direito e não pode ser motivo de banalização e brincadeira.

Ah sim, o Rei Momo tem que ser magro, pois é uma apologia à obesidade e às possíveis doenças que ela acarreta. E se você quiser jogar confete, trate de comprar confete ecológico, feito com papel reciclado, afinal, você sabe quantas árvores morreram para que você possa jogar papelzinho para o alto? E, por favor, nada de cantar “olha a cabeleira do Zezé”, vocês viram o que aconteceu com o pessoal do Charlie Hebdo quando brincou com Maomé, né? Todo cuidado é pouco. Bom carnaval.

Para dizer que acha ótimo que estejam matando essa festa pau no cu, para dizer que depois da quinta latinha de cerveja tem feminista de burka ou para dizer que torce mais é para ter briga entre esses animais suados: deixe seu comentário.


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