Enquanto isso…

Enquanto isso, numa base secreta:

JONES: …e aí, minha mulher ficou puta da vida! Acredita?
MARK: Hmhmm.
JONES: Ah, você acha que ela está certa?
MARK: Foda, né?
JONES: Foi quando o Pé Grande apareceu e matou todo mundo.
MARK: É.
JONES: Mark, estou falando com você!
MARK: Hã? Ah! Mulher é complicado, né?
JONES: Você está distraído, eu estou falando com as paredes. O que que você está vendo?
MARK: Nada não… um negócio aí…
JONES: Deixa eu ver.

Jones levanta da sua cadeira dentro do que parece ser um bunker cheio de equipamentos antiquados. Luzes, botões e alavancas decoram as paredes. No colo do Mark, a única pessoa além dele no local, um notebook.

MARK: Já falei que não é nada não.
JONES: É sacanagem?
MARK: Não!
JONES: Então eu estou mais curioso ainda! Você está quebrando umas vinte leis só de ter esse treco aqui.
MARK: Achei que você fosse meu amigo…
JONES: Não vou te denunciar, Mark. Mas deixa eu ver o que é, a gente morre de tédio aqui embaixo.
MARK: Tá bom.

Mark vira o notebook para Jones.

JONES: Ah, era mulher mesmo! Gostosinha!
MARK: Feliz?
JONES: É tipo namoro virtual?
MARK: Não, é uma coisa mais platônica…
JONES: Vocês ainda não se encontraram?
MARK: Não, não.
JONES: Mas não tem problema, o meu filho tem uma namoradinha virtual, ela mora em outro estado. Hoje em dia é normal. Como vocês se conheceram?
MARK: Eu estava vendo um pessoal jogar na internet e aí encontrei ela.
JONES: Ah, meu filho também gosta de ver gente jogando. Nunca entendi a graça. Não é mais divertido jogar você mesmo?
MARK: É complicado, Jones.
JONES: Eu estou ficando velho mesmo, hahaha! Qual o nome dela?
MARK: Luvluv.
JONES: Ué, não parecia estrangeira…
MARK: É o nome de streamer dela.
JONES: Streamer?
MARK: É quem joga os jogos online para os outros assistirem.
JONES: Ah! Agora eu entendi. Peraí… então… você não está falando com ela de verdade, ela está fazendo isso para todo mundo.
MARK: É… mas eu tenho alguns privilégios, virei moderador do chat.
JONES: Mark, a cada vez que você fala, eu entendo menos. Fiquei curioso, coloca o note na mesa para eu ver também.

Mark pensa por alguns segundos, e faz o que o seu colega pediu. Os dois começam a assistir.

LUVLUV: …então, eu acabei pegando o de chocolate, porque era o mais gostoso. Mas aí derramou no meu decote, aqui ó. Ficou uma sujeirada. Hã? O chat está falando para eu mostrar onde derramou de novo? Hihihi…
JONES: É, rapaz, até que tem sua graça.
MARK: Tá vendo esse cara chamando ela de vadia? Meu trabalho é expulsar esses folgados.
JONES: Você recebe por isso?

Mark desconversa. Pelas próximas duas horas, os dois homens continuam assistindo a bela Luvluv jogar alguns jogos e falar sobre banalidades. Jones ainda desvia os olhos algumas vezes para ver os indicadores nos computadores e máquinas, mas Mark não desgruda os olhos.

JONES: A moça é bonita mesmo. Você vai tentar algo com ela?
MARK: Não! Quer dizer… não sei… às vezes a gente conversa um pouco sobre a parte da moderação, e ela sempre agradece quando eu mando dinheiro pra ela… mas não vai muito além disso.
JONES: Você manda dinheiro pra ela?
MARK: É… eu…

Um alarme começa a tocar na base.

JONES: Protocolo D-1!
MARK: Deve ser treinamento… faz mais de seis meses que não tem.
JONES: Seja como for, Mark, tem que colocar as coisas em ordem.
MARK: Tá bom, vou avisar no chat que eu vou sair, senão os trolls ficam à solta para xingar ela.
JONES: Mark, se mexe!
MARK: Calma, calma!

Jones se levanta e começa a apertar diversos botões, ler códigos de um livro e digitar no computador central. Mark vai fazendo algo parecido, mas com os olhos ainda grudados no notebook.

JONES: Se fosse treinamento, já teria parado o alarme!
MARK: Eu duvido que os russos estejam atacando.
JONES: Não é o nosso trabalho duvidar. O nosso trabalho é responder!
MARK: O radar não está acusando nada. Ou é treinamento, ou é alarme falso.
JONES: A gente tem que deixar os mísseis em estado de… ela está com os peitos de fora?
MARK: Hã? Caralho!

Luvluv está sem a parte de cima da roupa, chacoalhando os seios e rindo na sua transmissão. Os dois homens se aproximam do notebook.

JONES: E você me disse que não era coisa de sacanagem…
MARK: Ela nunca fez isso antes.
JONES: Eu queria apertar é esses botões! Hahaha!
MARK: Ela vai ser banida, mas eu nem ligo mais. Esperei mais de um ano pra ver…

Na transmissão:

LUVLUV: Bombman92, esses são pra você!

Mark arregala os olhos.

MARK: É o meu nome de usuário! É pra mim!
JONES: Se precisava de convite, não precisa mais. Você sabe onde ela mora?
MARK: Não, ela nunca passa essas informações, para se proteger de tarados.
JONES: O sotaque dela é pesado, não deve ser daqui.
MARK: É, eu desconfio que ela seja do leste europeu, Ucrânia, Rússia…

Os dois se entreolham por alguns segundos antes da explosão.

Para dizer que é sempre culpa de mulher, para dizer que é sempre culpa de homem, ou mesmo para dizer que não se arrepende de nada: somir@desfavor.com

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Comments (14)

  • Para dizer a verdade, você precisa ter um QI muito alto para entender os DesContos. O humor é extremamente sutil, e sem uma compreensão sólida de física teórica a maioria das piadas não será entendida pelos leitores. Há também a visão niilista de Somir, que é habilmente tecida em sua caracterização – sua filosofia pessoal se baseia fortemente na literatura de Narodnaya Volya, por exemplo. Os leitores entendem essas coisas; eles têm a capacidade intelectual para realmente apreciar a profundidade dessas piadas, para perceber que elas não são apenas engraçadas – elas dizem algo profundo sobre a VIDA. Como consequência, as pessoas que não gostam de DesContos são verdadeiramente idiotas – é claro que eles não apreciariam, por exemplo, o humor no fraseio existencial de Somir “Wubba Lubba Dub Dub”, que em si é uma referência enigmática para o épico russo de Turgenev, Pais e Filhos . Estou sorrindo agora, apenas imaginando um desses simplórios coçando a cabeça em confusão enquanto o épico do Desfavor se desenvolve em suas telas de celular. Que tolos… como eu tenho pena deles.

    E sim, a propósito, eu tenho uma tatuagem do Desfavor. E não, você não pode vê-la. É apenas para os olhos das moças – e mesmo assim elas têm que demonstrar que tem ao menos 5 pontos de QI próximos aos meus (de preferência mais baixos) de antemão. Nada pessoal, criança.

      • hahahaahh! Foi mal, Somir, mas eu tive que rir desta situação. Porque a verdade é que os melhores comentários daqui são feitos por HOMENS. Mas pode ser implicância minha.
        E sim, eu estava me segurando para fazer esse comentário a muito tempo.

        • “Toda comunidade que se diverte fingindo ser idiota acaba infiltrada por idiotas que acham que estão em boa companhia.” – Esqueci, O Autor

          A gente se diverte aqui empurrando a linha do aceitável, eu gosto da ideia que o Desfavor continue desconfortável para quem só quer fazer pose de politicamente correto, mas não da que gente descompensada e radical ache que está em casa.

          Mas que a internet era muito divertida quando menina ainda não podia entrar… era sim. Hahahaha!

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