Eu sempre tiro onda aqui que detesto barraco em locais públicos, que acho deselegante, cafona, etc. Hoje venho contar sobre uma noite muito triste onde eu fiz um barraco em público por causa do meu ex-namorado Siago Tomir. Juro que não sei se isto é um Eu, Desfavor ou um Siago Tomir. Decidam vocês. Deliciem-se com a minha história loser.
Era aniversário de uma amiga muito querida. Essa minha amiga muito querida é uma pessoa descolada, moderninha. Escolheu comemorar em uma boate que… bem, não vou dizer que era GLS, porque não é bem isso. Vamos dizer que era uma boate onde tinha muitos GLSs. Porque aqui no Rio tem disso. Tem gradações. Tem lugares que só da GLS, tem lugares onde tem maioria GLS tem lugares onde tem minoria GLS. Mas que tem, tem.
Eu gosto. Na verdade, eu gosto muito. Costumo brincar que eu sou um traveco em um corpo de mulher (e o Somir briga comigo quando eu digo isso, já contei essa história, né?). Acho melhor, porque não ficam aqueles machos no cio te abordando. Na verdade, se eu puder escolher, nem vou a boate, mas se for GLS, dos males o menor.
Já Madame… Não que ele tenha preconceito, propriamente dito. Ele não está familiarizado. Na ChitãozinhoeXororolândia em que ele vive não tem disso não, ao menos não com a naturalidade que vemos aqui, de forma ostensiva. Porque eles não tem o menor problema de assumir sua iniciação sexual com uma cabra ou algum outro animal rural, mas vai um casal homossexual se beijar no meio do shopping para você ver se neguinho não olha torto. Olha sim.
Tudo fica pior se a gente pensar que Madame não gosta se sair de casa. Ponto. Para nada. Então, a primeira batalha era tirar Madame do Hotel. Depois, convencer Madame a sair com meus amigos do mundo da dança, que sofrem altíssimo nível de rejeição. Pior ainda seria convencer ele a sair de casa, com meus amigos e ir para uma boate. Se eu tivesse que citar uma certa predominância GLS, a coisa ficaria inviável.
Deixei para contar na hora: “Se veste que hoje tem aniversário da Fulana”. Madame, deitado na cama, apenas me olhou. Repeti a frase e Siago respondeu: “Está calor, eu não vou sair daqui, muito menos se for para ver homem dando em cima de você”. Sério. TUDO com ele é difícil. Ele tem um prazer quase sexual em dificultar qualquer coisa. Falei que se ele não fosse eu ia sem ele. Siago me olhou, meio que com desprezo e sacudiu os ombros como quem não se importa. A essa altura ele já me conhecia bem o suficiente para saber que não era verdade.
“Ok, vamos encurtar isso. O que você quer para me acompanhar?”. Gente vendida é uma merda. Siago começou a listar algumas exigências. Tinha de tudo um pouco: desde a minha roupa, até não dançar na festa. E tinha o tempo de duração: duas horas. Madame se acha um BBB. Cobra caro para comparecer duas horas no evento. E claro, havia coisas de cunho sexual também. Faltou pouco para ele pedir dinheiro também. Duvido que ele não tenha pensado em um valor em dinheiro.
Negocia daqui, negocia dali, Madame acabou topando. Numa boa? O karma de ex-marido é MEU, mesmo a outra lá tendo ficado casada com ele três ou quatro meses. Eu passei bem mais tempo com ele e tive que passar por coisas que só mulher com vinte anos de casada passa! Ele é MEU ex-marido, certeza!
Enfim, Siago foi se arrumar, resmungando entre os dentes. A cada cinco minutos repetia: “Duas horas, hein? Só duas horas!”. Eu deveria ter feito a seguinte proposta: “Ficaremos lá o tempo que você demorar para se arrumar”, porque puta que pariu, que noiva!
Chegamos ao local. A entrada já era meio moderinha. Siago estranhou. Do lado de dentro, os meus amigos da dança estava na pista, dançando de forma… próxima. Madame já começou com o terrorismo “Se você for para lá, eu abaixo as calças e mostro a bunda”. Ele sabia que me envergonhar surtia mais efeito do que me intimidar.
Sentamos na mesa da aniversariante. Estou eu de papo com a minha amiga, enquanto Siago Tomir, muito simpático, olha para seu relógio. Conversei uns quinze minutos com ela, quando vejo Siago Tomir de cara fechada. Estranhei. Ele é doido, mas nunca tinha implicado com conversa entre amigas. Perguntei qual era o problema dele e a resposta não podia ser outra: “Nada”.
Siago e eu sempre fomos um casal muito discreto. Mesmo quando éramos um casal com outras pessoas (entenda-se, ele com outra, eu com outro, antes da gente se conhecer). Detestamos essas demonstrações de afeto em público. Nada contra quem faz, mas a gente não se sente bem. Por isso, nem sempre percebem que somos um casal quando vamos aos lugares.
Estou vendo a tromba da Madame aumentar. Foi quando ele bufou. Quando Siago Tomir bufa, sai de perto! Perguntei para a minha amiga se ela estava percebendo o que estava acontecendo, e ela, que já o conhecia mais ou menos bem, disse “Amiga, acho que vamos ter problemas…”
Um rapaz muito, muito, muito sarado olhava para a nossa mesa insistentemente. Siago Tomir, abusado que é, olhava de volta. E Siago Tomir sofre de uma cegueira de amor perigosa: ele tende a achar que a mulher que está ao seu lado é tão maravilhosa, que todo homem do mundo vai dar em cima.
Siago Tomir achou que o rapaz muito, muito, muito sarado estava olhando para mim e começou a encarar o rapaz muito, muito, muito sarado. O rapaz muito, muito, muito sarado, por sua vez, continuou olhando. Vocês já devem ter percebido o tamanho da merda, né?
Minha amiga me perguntou se eu havia explicado a ele o lugar onde ele estava. Eu fiz que “não” com a cabeça. Por um segundo, cheguei a torcer para que o rapaz muito, muito, muito sarado estivesse mesmo dando em cima de mim. “É gay?” e minha amiga disse: “Não sei, Sally, não ta parecendo não…” Podia não ser, tinha muito homem hetero no local. E estava escuro. Falei para a minha amiga “Tomara que ele esteja dando em cima de mim” e ela “Tá maluca? Já já o Siago vai tomar satisfações com ele e vai apanhar”, ao que eu repondi “Amiga, se ele estiver dando em cima do Siago, quem vai apanhar SOU EU!”.
Tentei distrair Siago de diversas formas. Mas como o rapaz muito, muito, muito sarado não parava de olhar, Siago, em seu orgulho infinito (e em seu ódio de pessoas marombadas) também resolveu que ele não ia parar de olhar. Eles ficaram se olhando, ambos com caras indecifráveis por algum tempo. Me pareceu uma eternidade. Eu estava até enjoada de nervoso.
“Vai pra pista dançar, assim você chama uma briga e vai embora” – minha amiga sugeriu. Mas fiquei com medo de ser comigo, levantar e o sujeito me abordar. Siago ia partir pra cima dele (ou de mim). “Se joga no chão e finge uma convulsão!” eu falei para a minha amiga. Ela disse “Se joga você! É meu aniversário!”, e eu respondi “Eu não, tô de branco, vou me sujar…” e começamos a confabular. Nisso, o rapaz muito, muito, muito sarado levantou. Siago levantou também. Continuaram se olhando. Minha amiga juntou as mãos como quem reza e ficou repetindo “Não seja gay! Não seja gay! Não seja gay!”.
O rapaz muito, muito, muito sarado veio vindo na direção de Siago. Me bateu todo um desespero. Pulei no pescoço de Siago e disse “Quero fazer sexo com você A-GO-RA! Vamos para o banheiro!”. Ok, foi falta de finesse, até porque eu falei alto (pô, o som tava alto, foi necessário). Em minha defesa, só fiz isso porque fiquei com medo do cara matar o Siago de pancada. O que Siago fez? Percebeu o golpe e ME AFASTOU dele. Falou “Você! Você FICA AQUI, porque agora eu vou resolver uma coisa” e começou a dar a volta na mesa e esperar o sujeito, que vinha na direção dele.
Se eu soubesse rezar, eu tinha rezado naquele momento. Minha amiga, desesperada, puxou Siago gritando “Você nem me deu um abraço de parabéééééns!”. Corri para interceptar o rapaz muito, muito, muito sarado antes que ele chegasse em Siago: “Dá em cima de mim!” eu disse. Ele me olhou com cara de pena. Naquela hora eu soube como deve ser doloroso ser uma baranga, deve ser uma bosta homem te olhando assim sempre. “Por favor, DÁ EM CIMA DE MIM!”. Foi quando, para o meu desespero, ele soltou um “saaaaeeeee forrrrraaaahhh” completamente afetado. Virei para minha amiga, que abraçava Siago sem parar e fiz sinal de “fudeu” com as mãos.
Minha amiga me olhava com cara de desespero. Eu disse “Beija ele!”, apontando para o Somir. Ela me olhou em pânico. “BEI-JA! BEIJA NA BOCA!” – Eu repetia isso e simulava um beijo para ver se ela entendia. Se ela beijasse Siago, o rapaz muito, muito, muito sarado ia desistir dele e voltar para sua mesa. Ela fez que não com a mão. Eu gritei “PUTA QUE TE PARIU, FULANA! BEIJA ELE MASQUEMEEEERDA!”. Todo mundo me olhou estranho.
Não teve jeito. O rapaz muito, muito, muito sarado chegou no Somir. Corri para o lado dele. Começou o diálogo:
Rapaz muito, muito, muito sarado: “Percebi que você estava me olhando…”
Siago Tomir: “Eu que percebi você olhando” *estufando o peito
Minha amiga disse no meu ouvido “O cara vai beijar seu namorado na boca! Faz alguma coisa!”
Rapaz muito, muito, muito sarado: “Entaaaaaaoooouuuummm, a gentchi tava se olhaaaaandooo…”
Nesse momento caiu a ficha em Siago Tomir. Um dos seus olhos começou a latejar, coisa que sempre acontece quando ele está muito puto da vida. Quando o rapaz muito, muito, muito sarado deu pinta falando, Somir entendeu. Além do olho latejando, a veia na sua testa começou a saltar. Vi ele fechando o punho. E minha amiga me cutucando “Faz alguma coisa! Faz alguma coisa!”
Foi então que tudo aconteceu:
Sally: “Tu ta olhando pro MEU HOMEM, MERRRRMÃO?”
Somir fez uma cara de espanto como poucas vezes eu vi na vida. O rapaz muito, muito, muito sarado também.
Sally: “PERDEU A NOÇÃO DO PERIGO FOOOOI?” (detalhe que eu batia na cintura dele)
O rapaz muito, muito, muito sarado não sabia o que fazer. Acho que ele ficou paralisado em estado de choque. As pessoas do local começaram a parar para assistir.
Sally: “TE ENFIO A PORRADA, HEIN? TE METO A PORRADA!”
Minha amiga deu um tapa na própria testa
Sally: “LÁ FORA! EU E VOCÊ! VAMOS RESOLVER ISSO LÁ FORA SEU MERDA!”
Minha amiga começou a pedir que chamem os seguranças
O rapaz muito, muito, muito sarado começou meio que a rir de mim.
Sally: QUE QUE ÉÉÉÉÉ? TÁ ACHANDO GRAÇA Ô PALHAÇO!”
Minha amiga gritava pelos seguranças dizendo coisas como “Rápido, Sally vai morrer!”
Somir olhava com cara de “eu vou te matar assim que minha mulher parar de surtar”
Sally: “VEM! VEM NA MÃO!” e empurrei o rapaz muito, muito, muito sarado
Nessa hora surgiu um segurança não sei de onde e se meteu no meio. Comecei a me debater mais ainda e fui arrastada para fora do local pelo segurança. Quando estava sendo retirada, gritei “SIAAAAAAGOOOOO! Vão me bateeeeer” e ele veio correndo junto. Só me colocaram para fora ( e hoje eu estou na lista das pessoas que não são mais bem vindas no local).
Fomos para o carro. Silêncio ensurdecedor. Chegando no Hotel, um típico diálogo azedo do casal Sally e Tomir:
Siago: Se você tivesse me dito…
Sally: Você não ia, você sabe que você ia se recusar!
Siago: Não estou mais falando com você
Sally: O que eu te falei sobre usar essa barba no Rio de Janeiro?
Siago: Eu não estou mais falando com você…
Sally: Eu devia ter deixado aquele viado te enfiar a porrada!
Somir: Eu é que ia enfiar a porrada nele!
Sally: Tá bom Siago…
Somir: Não estou mais falando com você
Sally: Três dias?
Somir: A confirmar