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Colunas

Cheirinho de Brasil.

O brasileiro não é o único povo fedido, mas faz parte do grupo. Sally e Somir concordam que a higiene nacional não é essa coisa toda que se diz por aí, mas fica um cheiro ruim na hora de definir o motivo. Os impopulares tapam o nariz.

Tema de hoje: qual é a explicação do brasileiro feder tanto?

SOMIR

Senso de comunidade. Ou, a ausência dele. Quem sai do Brasil e vai para outros países sabe que tem muito povo que pouco se importa com o cheiro que emana, o que não quer dizer que o problema tupiniquim esteja resolvido. Mas eu ainda percebo um diferencial nestas terras: o clima.

Em vários países onde essa coisa de banho diário não é padrão a temperatura média explica um pouco a questão. As pessoas vivem num clima mais frio, o que reduz a quantidade de transpiração e até mesmo a potência dos odores. Bactérias gostam de temperaturas mais altas.

O sueco ser meio relaxado com banho é uma coisa, o brasileiro é outra. O potencial radioativo do ser humano tem muito a ver com o clima local. Eu ainda prego o banho diário para todos os povos do mundo, mas psicologicamente entendo como uma sociedade de clima frio acaba se acostumando a viver sem eles.

Você ainda tem um senso básico de comunidade se acredita que um pouco de relaxo com sua higiene pessoal não gera consequências para o outro. Agora, se você vive num país tropical abandonado por Deus e fedido por natureza… deveria ser conhecimento básico do cidadão que qualquer vacilada com seu odor natural leva ao sofrimento alheio.

Mas esse é um ponto fraco de vários países subdesenvolvidos: a ideia de que se está sozinho no mundo. O mesmo povo folgado que faz barulho de noite, fura fila, para em fila dupla, saqueia caminhão tombado… é o povo que acha que a própria merda não fede. Se não incomoda o brasileiro médio, é impossível que incomode outras pessoas. Se é levemente vantajoso para a pessoa, todo mundo que pague o preço por ela.

E eu não sou totalmente insensível sobre como o ambiente gera essa sensação: o Estado não se faz presente para a maioria das pessoas, criminosos e corruptos correm soltos, senso de justiça passa longe. Para esse tipo de coisa, eu não culpo uma índole inata do brasileiro, é fruto do ambiente até que o ambiente mude o suficiente para provar o contrário.

Mas na prática, o cheiro ruim continua lá. E eu realmente duvido que seja falta de conhecimento, vivemos num país quente, e desde cedo estamos expostos ao hábito do banho diário e ao suposto asseio brasileiro. Talvez alguém que tenha nascido na Rússia vivendo com temperaturas médias abaixo de zero possa dizer que nunca teve muita noção de como é importante tomar banho; mas um brasileiro?

Esse povo sabe o que fazer, só não acha importante o suficiente se está incomodando “apenas o outro”. É a mentalidade que se forma aqui, de gente que não pensa que outras pessoas vivem ao seu redor e são impactadas por suas escolhas. O brasileiro só se junta para fazer fila no último dia e linchamento, no resto é cada um por si.

Não é que a pessoa não percebe que fede, é que ela não dá a mínima mesmo. Quando eu sei que suei muito num dia e ainda estou na rua, fico todo preocupado em não ficar muito perto dos outros, dou aquela checada no sovaco (eu sei que não adianta, mas a mente fica mais tranquila, cale-se!) e sei que estou num timer de incômodo alheio. Se não for tomar um banho logo, o perigo aumenta bastante.

Isso impede as pessoas de ficarem grudando em mim em cada oportunidade? Não! Saudades da pandemia quando as pessoas eram obrigadas a ficar longe em filas. Você vai na farmácia e tem sempre alguma alma sebosa para ficar fungando no seu cangote. Eu poderia estar doente, cheio de vírus, mas não estão nem aí, é o hábito, é a necessidade de ficar um centímetro mais perto do começo da fila, é medo de alguém entrar no espaço entre você e ela… sei lá o que se passa na cabeça dessa gente.

Só sei que a noção de espaço pessoal não existe e a mínima preocupação em incomodar o outro com seu cheiro também passa longe. Acho esperar muito do brasileiro médio a ilusão que está sempre agradável à proximidade extrema, a lógica diz que é muito mais provável que simplesmente não se importem. Se são folgados em todas as outras partes da vida em sociedade, não seria nessa que a coisa mudaria, né?

Se você sabe que está num ambiente onde todo mundo acaba suando muito e o calor potencializa qualquer cheiro negativo, é noção básica de vida em sociedade pelo menos dar um espaço para o fedor dissipar. Esse povo é muito grudento, eu entendo estrangeiro que vem para cá e fica assustado com a proximidade do brasileiro. É isso que me faz acreditar que a teoria da Sally não explica de verdade as coisas: a vontade incontrolável de ficar se esfregando com todo mundo ao seu redor denota o componente comportamental acima do de conhecimento de como se manter agradável às narinas alheias.

O espaço do outro não existe, todo espaço é espaço do brasileiro médio, ele ocupa quando quiser, faz a bagunça que quiser nele e ai de quem reclamar. Na melhor das hipóteses vem barraco, na pior vem tiro. Não me entendam mal, todo mundo pode feder. Eu posso feder, você pode, é natural que aconteça e não vai ser 100% das vezes que vamos poder evitar. A melhor coisa depois de um bom banho e um uso consciente de desodorante é dar espaço um para o outro. Isso muitos dos povos estrangeiros mais fedidos entendem. Não é normal aglomeração por esporte, como fazemos aqui. Já percebeu que as pessoas nunca se espalham em ambientes compartilhados? Fica todo mundo esmagado na frente do bar e espaços enormes vazios ao redor.

Um povo com um pouco mais noção de distância e convivência não ficaria tão grudado. E um povo que não ficasse tão grudado causaria muito menos situações incômodas com fedor. Claro, falta educação higiênica, e muitas vezes até condições de ter acesso a coisas caras como desodorantes (se você ganha um salário mínimo ou menos custa muito caro).

Mas falta mais ainda noção. Falta espaço pessoal. Falta preocupação com o que o outro está sentindo. O brasileiro médio é dono do espaço dele e do seu. Ô gente para gostar de aglomeração…

Para dizer que você nunca fede, para dizer que só sabe o que é o Brasil quem anda num ônibus lotado às seis da tarde, ou mesmo para dizer que dar espaço ofende o brasileiro médio: comente.

SALLY

Talvez em outra época do ano não nos interessasse abordar este tema, pela enxurrada de gente contestando e relativizando. Mas agora, no verão, vai ser bem difícil que alguém consiga argumentar contra, pois é uma experiência diária: no transporte público, na academia ou até no trabalho, provavelmente todo mundo já sofreu com isso: qual é a explicação para o brasileiro feder tanto?

O fedor, no Brasil, independe de classe social ou de qualquer outro critério. É algo democrático. O brasileiro fede muito. Alguns, afortunadamente, descobrem qual é o desodorante que melhor funciona e fazem uso correto dele. Mas a maioria não. Eu lembro bem o que é viver no Brasil no verão: é a certeza de que ao longo do dia você vai esbarrar em alguém fedido.

O que mais me intriga é que o brasileiro é um povo que, ao menos no discurso, parece preocupado com a questão do cheiro. Ele acha demérito feder, ao contrário de outros povos, que não se importam. E mesmo assim fede. Eu já vi um brasileiro muito fedido reclamando que outra pessoa estava fedendo.

É intrigante: a consciência do fedor (no outro) existe e a consciência de que é desagradável também. Então, se todo mundo acha ruim pessoas fedendo, por qual motivo é simplesmente impossível sair nas ruas no verão sem cruzar com um fedido?

Eu tenho uma teoria: é um combo de alimentação errada + higiene pessoal errada.

Em tese, feder seria vergonhoso para a maioria das pessoas. Não é que elas fedem e não se importam. Elas acham que não fedem. Geralmente, a pessoa fedida não sente o próprio cheiro pois quando qualquer odor muito forte nos cerca, nosso bulbo olfativo “desliga” a percepção dele depois de um tempo.

Então, a pessoa come coisas que deixam o suor com um cheiro mais forte, faz uma higiene errada e acaba não sentindo que fede. Na cabeça dela, sua higiene está correta, portanto, ela não está fedida. Tomou banho, passou desodorante, não tem risco. “Se eu estivesse fedendo eu sentiria”, pensou um idiota qualquer. Não, não sentiria.

Vamos começar pela alimentação. Eu não acho que ninguém deva comer com a preocupação de qual será o cheiro do seu suor, mas, se comer algum alimento que potencialize esse cheiro (você acha facilmente uma lista com o nome deles no Google), não custa redobrar os cuidados com higiene.

Mas, é claro, antes é preciso fazer uma higiene correta, algo que deveria ser ensinado nas escolas, pois vai muito além do cheiro, é uma questão de saúde pública. O Brasil é um dos países do mundo que mais têm casos de câncer de pênis, uma doença que se previne lavando a região com água e sabão. Eu duvido muito que alguém escolha majorar seus riscos de uma amputação peniana, na minha humilde opinião, simplesmente não sabem como se higieniar de forma correta.

O problema é: quem ensina? Acabo de dizer que deveria ser ensinado nas escolas, mas, sejamos sinceros, quantas vezes não tivemos aula com professor fedido? Eu tive, muitas vezes. Aí fica difícil.

Se a pessoa toma um banho e só deixa escorrer água nas axilas, não vai limpá-las. Se a pessoa toma um banho e dá uma passadinha rápida com o sabonete no local, não vai limpá-las. Se a pessoa não ensaboa muito bem e esfrega por pelo menos uns 30 segundos, tem o risco de continuar sujo.

Quando a pessoa se lava ela primeiro tem que tirar a camada de desodorante que está na axila, e só depois é que o sabão vai efetivamente limpar a pele. Se você dá uma passadinha rápida com a mão, não basta. E mesmo que lave direito, quando sair do banho tem que secar o sovaco bem sequinho, caso contrário o desodorante não vai fazer o devido efeito. Passar desodorante em sovaco úmido (de água ou de suor) é jogar dinheiro fora.

E, mesmo fazendo tudo certo, é possível que o desodorante não segure o cheiro até o final do dia. É necessário reaplicar. O que o brasileiro faz? Levanta o braço e joga mais desodorante por cima, criando aquele misto de Axe e azedume. Não tem como não feder, não tem como não transmitir a sensação de ter um anão morto no sovaco. Para reaplicar o desodorante tem que lavar o sovaco muito bem, tirando todo o desodorante antigo e lavando a pele (o que só é possível com muita água e sabão), depois secar muito bem e só depois reaplicar.

Alguém faz isso? Poucos. Os poucos que não fedem.

Eu te garanto que o brasileiro se importa, eu te garanto que o brasileiro não quer feder. Por mais que seja um povo que liga o foda-se e faz muita coisa errada sem se importar com o bem-estar alheio (vide caixa de som na praia), não é o caso quando falamos de feder, pois não é por consideração ao outro, o brasileiro acha uma vergonha para ele mesmo estar fedido.

Então, é falta de informação mesmo. Falta de educação, no bom sentido da palavra. É desconhecimento de como fazer as coisas certas, pois provavelmente os pais e os professores também faziam errado e também fediam.

O que não resolve o problema, pois o brasileiro é também um ofendido por natureza. Certamente vai ter gente se ofendendo aqui pela premissa de que o brasileiro fede, por mais que, no dia a dia, a pessoa cruze com vários fedidos durante o dia no verão. Então, não tem muito o que fazer, pois se você tentar ensinar a alguém a forma correta de alimentação + higiene pessoal para não feder, a pessoa vai se ofender.

Deixemos que fedam, sem perceber que estão fedendo.

Para dizer que gostaria de ver um vídeo nosso com esta discussão, para dizer que todo mundo fede menos você ou ainda, como de costume, para me chamar de fresca pelas minhas instruções de higiene pessoal (fede aí, problema seu): comente.

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brasileiro médio, cecê, higiene

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