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Transtorno de Personalidade Narcisista

Transtorno de Personalidade Narcisista

| Sally | | 18 comentários em Transtorno de Personalidade Narcisista

São pessoas que possuem uma forma diferente de pensar, sentir, agir, interagir e de perceber no mundo, sempre focado nelas mesmas, em sua grandiosidade e em sua superioridade. Se acham melhores, importantes, merecedoras de adulação e não admitem crítica ou não ser o centro das atenções. Todo mundo conhece alguém assim, o que nem sempre se sabe é não se trata de um jeito de ser, e sim de uma doença devidamente reconhecida e catalogada. Desfavor Explica: Transtorno de Personalidade Narcisista – TPN.

O nome vem da mitologia grega. Narciso era filho de um deus (Cefiso) e uma ninfa (Liríope) e era conhecido por sua beleza e arrogância. Muitos se apaixonaram por ele, mas ele desprezava e humilhava a todos. As pessoas desprezadas pediram aos deuses para ensinar uma lição a Narciso.

Então, a deusa Afrodite condenou-o a se apaixonar por ele mesmo: quando Narciso viu seu reflexo em um lago, ficou paralisado se contemplando, definhando até a morte. Depois que ele morreu, Afrodite o transformou em uma flor que ganhou o mesmo nome. Então, o mito de Narciso nos diz, basicamente, que excesso de vaidade acaba mal.

Assim como fazem com outros transtornos, o Transtorno de Personalidade Narcisista é banalizado e atribuído a qualquer pessoa mais vaidosa, ególatra, desesperada por atenção. Mas, é preciso muito mais do que isso para configurar o problema.

O traço que costuma ser mais percebido é a importância exagerada que a pessoa se dá e como ela espera que todos a tratem de acordo com esse autoconceito tão elevado que ela tem de si mesma. Essa sensação se superioridade é a marca registrada: a pessoa sabe tudo, a pessoa é melhor em tudo, a pessoa superestima suas habilidades e exagera nas suas realizações e quer que todos vejam quão foda ela é. São especiais, superiores, originais, geniais.

Isso pode se traduzir de várias formas. Por exemplo, a pessoa que se sente afrontada quando é tratada como todas as outras: não lhe permitem que fure fila, não lhe dão privilégios, não lhe dão tratamento especial. “Eu exijo falar com o gerente!”, afinal, ela não qualquer uma, ela só fala com superiores como ela. Quando tratada de forma normal, a pessoa reage mal, toma isso como um desaforo, como uma afronta de quem o faz. Ser igual aos outros é ofensivo.

Mas isso também pode ser externado em uma necessidade enorme de se diferenciar dos outros: “vejam como eu sou diferente, vejam como eu sou especial”. Daí a pessoa faz coisas que os outros não costumam fazer, geralmente de forma pública, para mostrar como é especial. Pode ser pintar o cabelo de uma cor chamativa, pode ser quebrar algum recorde mundial, pode ser se dizer ser detentor de alguma verdade que os outros desconhecem, pode ser qualquer coisa que chame a atenção e que a diferencie do resto.

Há uma necessidade patológica de ser visto e tratado como especial e, em alguns casos, de ser obedecido também, afinal, a pessoa é superior, ela deve guiar os outros. Podem ficar agressivos quando contrariados. Frequentemente tem comportamento arrogante, discriminatório ou insolente. Desmerecem tudo de negativo que lhes é atribuído, não aceitam críticas, atribuem as críticas a fatores externos como inveja, racismo e outros. Eles nunca estão errados. Eles sabem mais do que os outros. Eles são melhores do que os outros.

A pessoa com Transtorno de Personalidade Narcisista quer ser considerada a melhor em tudo, costuma ser altamente competitiva e desmerecer quem ela acha que, de alguma forma, pode ofuscá-la. E, para conseguir ser a melhor (ou parecer ser a melhor) em algo, ela ultrapassa barreiras da ética, bom-senso e até de sua própria segurança.

Não estamos falando apenas da pessoa que dá um puxão de tapete no colega de trabalho para conseguir uma promoção, estamos falando de pessoas que desafiam as leis, até mesmo as leis da natureza – e muitas vezes acabam mal. Mentem, manipulam, cometem crimes, vendem a própria mãe, tudo para parecerem fodas, para serem admiradas, para serem vistas e aplaudidas.

Outro fato importante é a necessidade de poder e controle. Para demonstrar poder a pessoa esquece os limites ou sequer os percebe. Ela se acha tão especial, tão foda, tão inteligente que minimiza os riscos: não usa cinto de segurança, afinal, ela sabe dirigir muito bem, não usa capacete afinal não vai cair da moto, entra em mar que sabe que tem tubarão pois ela entende tudo e vai saber quando um tubarão se aproximar.

Essas pessoas vivem em uma eterna fantasia de poder, de fama, de reconhecimento e sucesso. Não necessariamente fama mundial, muitos se contentam em ser a referência no seu grupo de whatsapp ou na sua rede social, porém outros tem sim um delírio de grandeza que beira o ridículo.

Também vivem uma fantasia de amor onde devem ser adorados e admirados pelos parceiros, o que faz com que, frequentemente, mintam compulsivamente a respeito de si mesmos para impressionar ou escolham pessoas emocionalmente frágeis para se relacionar, que se sujeitarão a dar a adoração que eles procuram para não perder o parceiro.

Não se importam com os sentimentos alheios, não por serem incapazes de empatia, como os psicopatas, mas por não validarem nada que eles não concordem: se eles discordam, então não merece respeito. Eles são os donos da razão, se uma pessoa está sofrendo por algo que eles não concordam, é besteira e não há por que acolher a pessoa. Então, se calhar dela sofrer por algo que o narcisista concorda e se identifica, ele vai se indignar, caso contrário, vai desmerecer e não vai se importar, afinal, tudo é sobre ele. Ele é a referência universal de bom-senso, bom-gosto e razoabilidade.

Curiosamente, a regra é que pessoas narcisistas sejam medíocres. Faz sentido, afinal, se a pessoa precisa o tempo todo se dizer superior ou especial, este é o maior sinal de que ela não o é. Porém são boas de engenharia social: se “vendem” muito bem, convencendo os outros de que são excepcionais e não raro enganam muitas pessoas por um bom tempo.

Uma pessoa inteira, com autoestima boa, não fica perto de um narcisista. Primeiro por serem insuportáveis: ególatras, egoístas, mitômanos e realmente chatos. E normalmente os próprios narcisistas não tem interesse em pessoas inteiras, bem resolvidas, pois elas não compram suas baboseiras, os vêm por aquilo que eles realmente são: uns inseguros que precisam se afirmar através do olhar de terceiros o tempo todo.

Porém, pessoas mais frágeis são presa fácil para o narcisista, que já é um bom manipulador por natureza. Pessoas frágeis acreditam que o narcisista é foda, pior ainda, acabam acreditando que elas são pouco, já que para se sentir cada vez mais superior o narcisista tende a diminuir aqueles que estão à sua volta.

Então, é comum ver narcisistas reagindo muito mal a quem os critica ou até mesmo a quem não os idolatra, estilo “Você tem 24 horas para retirar seu conteúdo sobre mim. Depois disso é processo ou bala. Você escolhe”. Eles criticam os outros sem o menor problema, mas quando a crítica é voltada para eles…

E quando um narcisista se depara com uma situação de fracasso, por menor que seja, seu mundo desaba. Ele reage mal, reage exagerado, tenta esconder, tenta distorcer, tem crises de fúria. O narcisista acha que errar ou fracassar é algo humilhante, e não uma parte normal da vida. É normal para os reles mortais como nós, para seres superiores como eles não. Ele não fracassa, a culpa é sempre do outro.

Por isso é muito comum ver narcisistas evitando (de forma camuflada, é óbvio) situações onde possam fracassar. A dor de ter o ego ferido é insuportável para eles, a menos que consigam reescrever a história e se convencerem (e convencerem o resto) de que não foi um fracasso, eles quiseram desistir pois aquilo não estava à altura da sua grandiosidade ou outra pessoa foi a responsável pelo fracasso.

E, que fique claro, não estamos falando apenas de realizações profissionais. A afirmação de um narcisista não necessariamente vem do seu sucesso profissional, ele pode, por exemplo, querer ser reconhecido por uma beleza avassaladora, uma riqueza imensa, uma capacidade gigante de conquistas amorosas, uma inteligência espetacular, poder, prestígio, influência e muito mais, inclusive, muita mulher narcisista adora ser reconhecida como super-mãe, posando como mãe perfeita em público e em redes sociais.

Não se sabe muito bem o que contribui para o TPN, não há estudos suficientes para entender completamente sua origem. Sabe-se que existe um componente hereditário significativo, ou seja, passa de pai/mãe para filhos. Acredita-se que uma combinação de fatores ambientais, sociais, genéticos e neurobiológicos combinados acabem gerando o transtorno.

Estima-se que pelo menos 1% da população tenha Transtorno de Personalidade Narcisista, provavelmente mais, uma vez que dificilmente o narcisista acha que tem um problema e procura um médico para pedir ajuda. Geralmente, quando o narcisista procura por ajuda, o faz por causa de uma comorbidade, como depressão, distúrbio alimentar, vício em drogas, alcoolismo ou vários outros transtornos que comumente coexistem com o TPN. O narcisismo acaba sendo percebido pelo médico, ao tratar o problema secundário.

O diagnóstico é clínico, ou seja, é feito através da observação do médico, ao conversar com o paciente em com pessoas próximas ao paciente. Não existe um medicamento para tratar o TPN, o tratamento é basicamente psicoterapia.

Os psicólogos e psiquiatras provavelmente não vão te dizer isso (acho até que seria antiético), mas, cá entre nós, a pessoa sempre vai ser doente, pois é uma doença para a qual não existe cura. Por mais que melhores um pouquinho aqui, outro pouquinho ali, ela sempre terá um transtorno, então, se houver a possibilidade de pular fora dessa relação (qualquer que ela seja) eu recomendo. Não aposte todas as suas fichas em um tratamento e em uma cura, ela não virá.

Pela subjetividade (o narcisista conta ao médico o que quer), muitas vezes o Transtorno de Personalidade Narcisista é confundida com outras doenças, como bipolaridade, até por ser bastante comum narcisistas terem depressão, portanto, alternarem altos e baixos.

A chave para diferenciar o TPN de qualquer outra doença é que nela, predomina a necessidade constante de ser superior aos outros, que é o que motiva os atos do narcisista. O que quer que ele faça, é para mostrar como é superior e ser admirado. É isso que o move, essa certeza de ser superior. Inclusive de forma negativa: seus rompantes e mudanças de humor se originam de situações em que sua superioridade é questionada.

Em uma convivência superficial, por exemplo, relação cordial de trabalho, é mais difícil identificar um narcisista, a menos que seja um caso extremo, como o da mãe do menino Henry. Seu filho foi brutalmente assassinado por seu namorado e a mulher foi ao salão fazer o cabelo antes do velório. Se você é mãe, me responda: se seu filho fosse brutalmente assinado pelo seu parceiro, você teria alguma preocupação com seu cabelo? A prioridade dela era estar linda para um velório onde sabia que seria fotografada pela mídia.

Quando o caso não é tão grotesco, os sinais que você pode observar para detectar um narcisista são mais sutis. Sabe aquela pessoa que tudo é sobre ela? Você conta que caiu e quebrou um dedo e ela diz “pior eu que já quebrei as duas mãos”? Essa pessoa que compete até em desgraça é forte candidata a TPN. Pessoas que não admitem ser contrariadas, pessoas que fazem qualquer assunto sobre elas, pessoas que tem projetos megalomaníacos, que se acham líderes, que buscam sempre por atenção, podem ter TPN.

Também é importante lembrar que o narcisismo pode se manifestar de diferentes maneiras, em diferentes áreas. O sentimento de superioridade nem sempre vem acompanhado de agressividade. Alguns explodem quando confrontados, outros se fazem de vítimas e jogam a culpa em terceiros.

No que diz respeito à manipulação, podem agir de diferentes formas. Por isso o transtorno é dividido por alguns em subcategorias. Se quiserem, tem uma divisão bem clara e explicativa aqui. Existem narcisistas mais dramáticos, outros mais agressivos, outros mais extrovertidos. Mas todos eles têm uma coisa em comum: se acham mais importantes do que são e demandam adoração e tratamento especial de quem os cerca.

E, nunca é demais lembrar que, quando falamos em transtornos de personalidade, todos nós temos um pouco de cada, em menor grau. Um traço narcisista não significa necessariamente um problema.

O problema ocorre, neste e em qualquer transtorno, quando ele impacta a vida, a funcionalidade e os relacionamentos da pessoa. Se a pessoa frequentemente tem problemas no trabalho, não consegue construir uma carreira, não consegue manter um relacionamentos saudável (ênfase no “saudável”), se coloca em risco ou causa danos significativos a si mesmo e/ou aos outros, aí sim ela precisa de ajuda. O problema é que a pessoa narcisista admita isso. A culpa é sempre dos outros, nunca dela.

Infelizmente a sociedade atual parece encorajar o comportamento narcisista. Então, muitas vezes, os problemas acabam sendo vistos como qualidades: “liderança”, “autoestima”, “confiança”, “ambição” e outros adjetivos positivos mascaram pessoas egoístas, escrotas e delirantes. O brasileiro adora dar poder a narcisistas. O clássico “você sabe com quem você está falando?”, carteirada padrão, quase sempre usada por pessoas que não são tão importantes quanto se acham, é um belo exemplo de comportamento narcisista.

A coisa fica mais cruel quando pensamos e mães narcisistas, algo muito mais comum do que se imagina (e menos diagnosticado também). No contexto atual, ser mãe ainda é considerado uma grande realização para uma mulher, o que leva a mulher narcisistas a fazerem questão de ter filhos. Inclusive o argumento de “deixar sua marca no mundo” ou “dar continuidade a sua linhagem” são típicos de narcisista. Quem se acha assim tão importante?

Quem sofre são as crianças, coitadas. Talvez, ser criado por uma mãe narcisista seja um dos maiores danos que uma criança pode sofrer, quando falamos de violência psicológica. Nada será sobre ela, enquanto a mãe posa de “super-mãe” em público, no privado criará crianças como emocional destruído e sem autoestima. A boa notícia é: a criança pode se recuperar no futuro, com muita terapia, quando compreender que sua mãe era uma pessoa doente.

Assim como existem deficiência físicas, também existem pessoas deficientes emocionais. Assim como um paraplégico não pode correr mesmo que queira, uma pessoa com uma deficiência emocional também não pode dar certos tipos de afeto. Na cabeça de uma criança isso repercute mal, pois ela acaba não se achando merecedora disso, mas, quando adulta, a pessoa consegue entender que uma deficiência gerou aquele comportamento e dar a volta por cima, se assim o quiser e se fizer por onde conseguir.

Então, se esse é o seu caso, se você foi criado por uma mãe narcisista, ela não tem possibilidade de cura, mas você sim. Terapia, reconstrução e perdão. Não dá para culpar alguém por ter uma doença, certo? Se a pessoa ainda te faz mal, se afasta. Compreenda que não é culpa sua e deixe ir raiva, mágoas e ressentimento. A vida só melhora quando se vira essa página.

Normalmente os sintomas de TPN começam a aparecer na adolescência ou no início da vida adulta e podem se acentuar com o passar do tempo. São pessoas muito hábeis, aprendem a camuflar sintomas e a convencer os outros de que são perseguidas e criticadas sem fundamento. Dependendo do meio que a pessoa frequente, ela pode de fato enganar a todos por muito tempo, fazendo com que as pessoas pensem que sua superioridade é real e não um transtorno. A coisa que a gente mais vê é coach, guru e subcelebridade com Transtorno de Personalidade Narcisista.

Por isso, fica aqui meu apelo: fuja como o diabo da cruz de alguém que se diga superior a você em algo. Alguém que vai te “ensinar” “a verdade”. Alguém que se coloca em um patamar acima de você, no sentido de se sentir apto para mandar em você. Guru, coach, propagadores de teorias da conspiração, líderes religiosos… Uma pessoa bem-resolvida faz o seu, não precisa bater na porta de ninguém para lhe dizer como viver a sua vida, muito menos cobrando para isso.

Talvez se a sociedade parar de recompensar e aplaudir narcisistas, essas pessoas se vejam obrigadas a procurar ajuda, pois não terão mais o reconhecimento social que tanto precisam. Faça sua parte, não alimente o narcisista.

Para contar sobre sua mãe narcisista, para comentar sobre algum famoso narcisista ou ainda para me acusar de ser narcisista após 15 anos de anonimato e gratuidade: sally@desfavor.com


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