Siago Tomir: Aquela do traficante…

siago-traficante

Tomir: *batendo a porta com força
Sally: *indo ver o que estava acontecendo
Tomir: Cheguei
Sally: Olá, como foi seu dia?
Tomir: *bufando
Sally: Estamos de mau humor?
Tomir: Sabe o que vão construir nesse terreno baldio aqui do lado?
Sally: Não. Nem sabia que estavam construindo alguma coisa
Tomir: UMA IGREJA EVANGÉLICA!
Sally: *palavrão
Tomir: Você sabe o que isso significa, né?
Sally: Sim, o fim da nossa paz
Tomir: Isso não pode acontecer, eu não vou ser vizinho de uma igreja evangélica
Sally: Mas já foi vendido?
Tomir: Parece que sim, esta semana ainda as obras começam
Sally: Como você sabe?
Tomir: Acabo de encontrar com o engenheiro responsável ali na porta
Sally: Fica calmo, obra demora
Tomir: Não quando se tem dinheiro, além disso, obra também incomoda
Sally: Pelo menos vão capinar esse mato do terreno baldio…
Alicate: VÃO TIRAR O MATEL?
Sally: Você estava aqui o tempo todo?
Alicate: Sim, vim com o Tomir
Sally: *lançando olhar de fuzilamento para o Tomir
Tomir: Sim, eles vão tirar o matel
Sally: O que é o “matel”?
Alicate: É como se fosse um motel, só que no meio do mato
Sally: Oi?
Tomir: Alicate usava a área como motel, levava umas mulheres para lá…
Alicate: *sorriso orgulhoso
Sally: NO MEIO DAQUELE MATO?
Alicate: Nem toda mulher é fresca que nem você, algumas curtem a natureza!
Sally: Você não vive dizendo que tem dinheiro? Custa pagar um motel?
Alicate: Tem umas vadias que não merecem!
Sally: Realmente, mulher que dá para você merece carrapato na bunda mesmo…
Tomir: FOCO! FOCO! O que a gente pode fazer para impedir essa obra? Não tem nenhuma medida legal, Sally?
Sally: Se eles compraram o terreno e estão fazendo tudo dentro da lei, acho que não

Siago Tomir andava de um lado para o outro como um leão enjaulado. Alicate cutucava a unha do dedão do pé. Siago Tomir adorava sua casa, mas certamente não conseguiria ser vizinho de uma igreja evangélica.

Tomir: Vamos pensar… do que evangélicos tem mais medo?
Sally: Do demônio?
Alicate: Eu posso me vestir de demônio e…
Sally: Porque você trouxe ele para cá? Porque?
Tomir: Ele disse que poderia ajudar
Sally: Porque você acreditou nisso?
Tomir: Sally, é uma emergência! Toda ajuda é válida!
Sally: Podemos espalhar que somos satanistas
Tomir: Não, é tudo que eles querem! Um inimigo em comum para unir a comunidade evangélica!
Sally: Podemos nos mudar
Tomir: Eu gosto daqui, Sally!
Sally: Eu também, mas não vou mais gostar quando acordar todos os dias com um pastor pregando aos berros…
Tomir: Não pode ser, tem que ter um jeito de impedir!
Alicate: Alicate tem uma sugestão…
Sally: CALA A BOCA! Sério mesmo, se você vai ficar aqui, pelo menos fica de boca fechada!
Alicate: *levantando os ombros e abrindo uma revista
Tomir: Evangélico tem medo de traficante?
Sally: No Rio eles são basicamente a mesma coisa, andam de mãos dadas
Tomir: Mas aqui o povo não está tão acostumado com traficante
Sally: Você tem certeza que quer espalhar esse boato sobre você mesmo? Ficar conhecido como traficante?
Tomir: Claro que não!
Sally: Ainda bem, pensei que…
Tomir: Eu não, o Alicate!
Alicate: * fazendo sinal com o dedo como se fosse uma arma

De todas as ideias que Siago Tomir já havia inventado, essa era uma das piores. Mas, como sempre, na hora parece uma boa ideia e ele é incapaz de perceber os problemas que isso pode acarretar.

Sally: Alicate não mora nessa casa, como é que o fato dele ser traficante vai intimidar essa construção?
Tomir: Se ele for o traficante chefão da área e falar que não quer, pode ser que eles pense duas vezes
Sally: Como é que, em pouco tempo, vamos transformar o Alicate no chefão do tráfico fake?
Tomir: Não precisamos transformar, é só espalhar para as pessoas certas
Sally: E ficar com fama de quem recebe traficante em casa?
Tomir: Melhor do que ter que aturar pastor pregando!
Sally: Faz o que você quiser, eu acho isso uma péssima ideia, nunca vai funcionar
Tomir: Você não vai me ajudar?
Sally: Não
Tomir: Sally, é só para dar uma intimidada nessas pessoas!
Sally: Nada que se precise contar com o Alicate pode dar certo. NADA
Tomir: Tá certo, para variar, EU vou ter que fazer tudo sozinho
Sally: Exato! Não me meta nisso, não quero saber desses seus planos malucos

Passaram-se os dias e eu procurei me manter alheia às loucuras do Tomir. Um belo dia, estou chegando em casa quando vejo um carro todo preto, com vidro tão escuro quanto a lataria do carro, parado na porta do terreno onde estavam sendo realizadas as obras da igreja, ou seja, praticamente na porta da casa do Tomir. Fiquei olhando desconfiada, pois me pareceu ver sair um fuzil da janela traseira. Estava com medo de ser rendida na porta de casa e assaltada. Enquanto pensava se prosseguia ou não os ocupantes do veículo me abordaram:

Marginal 1: Perdeu alguma coisa, Dona?
Sally: Boa noite
Marginal 1: Boa noite
Sally: Vocês estão esperando alguém?
Marginal 2: Fica fora disso, Dona! Circulando! Circulando!
Sally: Só quero saber o que está acontecendo
Marginal 2: A senhora mora na rua?
Sally: Depende
Marginal 2: Não precisa ficar com medo não, Dona. A gente não vai te roubar
Sally: O que vocês querem?
Marginal 1: A gente está procurando por um tal de Alicate
Sally: *arregalando os olhos
Marginal 1: Já vi que a Senhora conhece
Sally: Você pode me explicar melhor o que está acontecendo?
Marginal 2: Esse cara quer roubar nosso ponto, lá ligada?
Sally: Estou ligada
Marginal 2: Ele está pensando que é o novo dono do bairro, tá ligada?
Sally: Estou bastante ligada
Marginal 1: A senhora conhece ele?
Sally: Conheço sim, ele vive me ameaçando
Marginal 1 e 2: * se entreolhando
Sally: Ele não vale nada, eu odeio ele!
Marginal 1: Dona, a senhora tem um telefone para contato?
Sally: Pedir telefone é forçar demais a amizade, espero que você entenda
Marginal 1: Então anota o meu telefone aí, se esse Alicate incomodar a senhora novamente, é só mostrar para a gente quem é
Sally: *anotando
Marginal 2: E se encontrar com ele, avisa que esse bairro tem dono e é melhor ele sair da área, se não vai acabar mal.
Sally: O recado será dado
Marginal 2: Amanhã a gente volta

Os marginais foram embora. Voltei para casa tranquila, afinal, não havia mentido. Siago Tomir estava em casa jogando videogame com Alicate

Alicate: Fala chata!
Tomir: Acho que você vai ficar triste em saber que o meu plano está dando certo!
Sally: Está?
Tomir: Sim. Alicate já deu uma intimidada no pessoal da igreja dizendo que aquele terreno baldio é o lugar onde ele vende o produto dele e que se construírem uma igreja vão se arrepender
Sally: É mesmo, Alicate?
Alicate: Eu sou sinistro! Minto bem pra caralho! A notícia já se espalhou, tá todo mundo com medo de mim!
Sally: Prestem atenção. Eu vou dar um recado
Tomir e Alicate: *olhando
Sally: Parem com isso, se não vai acabar mal
Alicate: Chataaaaaa!
Sally: O recado está dado
Tomir: Sally, você e seu pessimismo galopante!
Sally: Querido, você não prestou atenção
Tomir:
Sally: Eu não disse que essa era a minha opinião, é um recado
Tomir: Guarda seus Mind Games para você, amanhã vamos dar o golpe de misericórdia!
Sally: É mesmo?
Alicate: Observa o Papai trabalhar
Sally: Você não é meu pai
Tomir: Deixa ela, ela está irritada por ver que meu plano que ela esculhambou está dando certo! A Sally gosta de ter sempre razão!
Sally: O recado está dado

No dia seguinte, acordamos com um barulho de obra

Tomir: Não é possível! Eles vão levar essa obra adiante?
Sally: Uma única vez na vida, posso te fazer um pedido e ser atendida?
Tomir: Sim, sim
Sally: Vamos encontrar outro jeito de resolver isso
Tomir: NÃO, SALLY! Do meu jeito está dando certo!
Sally: Está? *apontando em direção à obra
Tomir: Eles só precisam de um susto final…
Sally: Você vai mandar o Alicate lá?
Tomir: *telefonando

Não se passou nem ao menos uma hora e Alicate estava com cara de mau na porta da obra querendo falar com “o responsável”. Siago Tomir decidiu se aproximar, como quem não quer nada, para supervisionar. Eu fiquei preocupada com a situação e fui junto. Depois do Alicate fazer um escândalo, um faniquito vergonhoso que em nada se assemelhava à atuação de um verdadeiro marginal, não demorou nada para que os bandidos reais apreçam. O mesmo carro preto parou na porta do terreno.

Marginal 1: Estou procurando o Alicate, o filho da puta que acha que é o dono da rua
Todos: *silêncio
Marginal 1: *olhando para Tomir
Marginal 2: *olhando para Tomir
Tomir: *encarando
Marginal 1: EU VOU PERGUNTAR PELA ÚLTIMA VEZ, QUEM É ALICATE?
Sally: *apontando discretamente para Alicate
Marginal 1: *descendo armado
Sally: *disfarçando e olhando para cima
Marginal 1: ENTRA NO CARRO, VAGABUNDO!
Alicate: CALMA AEEEE… CALMA AEEE…
Tomir: *ameaçando ir em direção ao carro
Sally: *segurando

O carro foi embora levando o Alicate. Tomir parecia estar chateado comigo. Começou a berrar no meio da rua, sem cerimônia:

Tomir: OLHA O QUE VOCÊ FEZ!
Sally: EU? Fui eu quem quis brincar de GTA Campinas?
Tomir: Sally! Eles vão matar o Alicate!
Sally: Seria sensacional, mas eu duvido muito. Os bandidos daqui são fraquinhos. Se fosse no Rio…
Tomir: Você parece estar achando graça!
Sally: Não vou negar, eu estou
Tomir: OLHA A MERDA, SALLY! OLHA A MERDA!
Peão de obra: O pessoal daqui é perigoso, né?
Sally: MUITO. É que vocês escolheram uma localização ruim, esse ponto é disputado por facções criminosas
Peão de obra: Aqui?
Sally: Sim, exatamente aqui. Não parece mas tem um crime organizado forte por aqui…

Mais peões forma se aglomerando para ouvir a conversa

Sally: Sinceramente, eu vou me mudar daqui assim que puder. Mês passado mesmo teve um tiroteio horrível nesse terreno, morreu gente até
Peões: *ouvindo e se entreolhando
Sally: Eu não recomendo a ninguém ficar em uma área disputada por facções criminosas, francamente, acho um péssimo lugar para abrir um templo
Peões: *comentários desencontrados
Sally: Bom, vocês fazem o que quiserem, mas se fosse eu, não voltaria aqui amanhã não, a gangue do Alicate vai voltar querendo vingança… deve ter troca de tiros de novo

Os peões ficaram assustados, mas Tomir não parecia feliz e continuou brigando comigo no meio da rua

Tomir: SE ACONTECER ALGUMA COISA COM O ALICATE…
Sally: A gente dá uma festa?
Tomir: VOCÊ É UMA IRRESPONSÁVEL, SALLY!
Sally: Eu, né? Eu que mando meu melhor amigo se passar por um traficante e ameaçar os outros?

Após bastante discussão, o carro preto parou novamente no mesmo lugar. A porta se abriu e sai o Alicate, assoviando.

Tomir: VOCÊ ESTÁ BEM?
Alicate:
Sally: Bandidos de merda! Precisam ir ao Rio fazer um estágio…
Tomir: Bateram em você?
Alicate: Claro que não! Alicate tem, né?
Sally: Tem… tem mais é que se foder!
Tomir: Você deu dinheiro para eles?
Alicate: Digamos que a gente fechou um acordo bom para ambas as partes…
Tomir: Que acordo?
Alicate: Eu pagava e parava de vender drogas e em troca eles não quebravam todos os meus dentes
Sally: Belo acordo
Tomir: Teve que pagar caro?
Alicate: *fazendo que sim com a cabeça
Sally: Pergunta… o dinheiro bastava para ter comprado esse terreno?
Alicate: Sim. E sobrava
Sally: Parabéns, Gênio *dando tapinha no ombro do Tomir
Alicate: Mas Alicate tem, né? Posso subornar bandido E comprar terreno!
Tomir: Não, chega… essa história já deu muito problema
Alicate: Alicate tem, né? *empurrando Tomir e indo falar com os peões

Saldo final: Alicate acabou comprando o terreno por um preço bem baixo por ser “área de briga de facções criminosas”. O terreno existe até hoje, continua sendo usado com a mesma finalidade. E sim, continua conhecido como “Matel”.

Para rir da minha cara porque sem querer eu fiz um trabalho conjunto com o Alicate, para dizer que é melhor que o proprietário do terreno ao lado seja uma igreja evangélica do que o Alicate ou ainda para dizer que em Campinas até os bandidos são viadinhos: sally@desfavor.com

Se você encontrou algum erro na postagem, selecione o pedaço e digite Ctrl+Enter para nos avisar.

Comments (32)

  • Moro perto de uma igreja evangelica. Admito que num primeiro momento até fiquei aliviada pois eu vinha de um lugar que era muito habitual eu acordar com bebado cantando, briga de mulheres por conta do bofe… Odiava aquele bar com todas as minhas forças.

    Depois de um tempo comecei a perceber a folga. Ocupando vagas de moradores, estacionando de qualquer jeito, alguns entrando na contra mão… Ja até presenciei uma briga conjugal (“kkkkk”). Olha entendo a angústia que vcs vivenciaram. Imagina, Somir entrando em sua casa e encontrando carros de fieis na porta de sua casa… Chamando o cachorro pelo nome (HAHAHHAHA…) Pq vou te contar, dependendo de como for, eles estacionam longe pra andar a pé ate o local.

    • HAHAHAHAHAHAHA

      Tem muito leitor de Campinas aqui… ok, não é uma cidade pequena, mas são grandes as chances de muitos de vocês conhecerem Siago Tomir e Alicate!

      • Sally, o Siago Tomir eu tenho certeza que não conheço kkkkk Mas o Alicate acho que talvez conheça sim kkkkkkk

        Esse cidadão fez faculdade? Porque se ele fez Puccamp deve ser mesmo a criatura que estou pensando kkkkk

  • Como natural de Campinas, fico triste em ver que a cidade, antes com a pecha de ser a capital dos viadinhos, agora é a capital dos viadinhos noiados. Malditos traficantes, vidalokas e outros feladaputas!

    • Traficante tem em qualquer lugar no Brasil, mesmo em cidades pequenas de interior, não é demérito não. O demérito é ter traficante amador que em vez de matar rival se vende!

  • Ate que desta vez o Alicate nao foi uma anta completa e resolveu a parada. Pensar que os traficantes iriam matar ele? Aquilo la se entrosa numa boa com a bandidagem igual a ele.

      • Sally, aliás, curiosidade: depois de “tanto tempo”[?] separado do Somir e tal, tu e o Alicate ainda continuam arqui inimigos ou fizeram as pazes?

        • Adoraria vê-lo morrer de forma lenta e dolorosa e se um dia me for dada a oportunidade, providenciarei isso com minhas próprias mãos. Não quero armas, não quero facas, quero sentir minhas mãos estrangulando-o e tirando a vida dele lentamente enquanto olho nos seus olhos e sorrio.

          Acho que isso responde a sua pergunta…

  • No final deu tudo mais ou menos certo… Ou não.

    Sei lá porque saco jogo as alicatices e vejo logo um potencial de trollagem inimaginado pela Sally.

    • Matel foi piada pronta… Não sei como é que a Sally não aproveitou a deixa para fazer a piada se não era lá que o Alicate “fabricava” as barbies alicatenses fazendo filho nas peguetes, até porque sabemos como é que o cara é exemplo de responsabilidade, né?

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.

Relatório de erros de ortografia

O texto a seguir será enviado para nossos editores: