Caminhos distintos.

Considere o seguinte: você quer terminar um relacionamento, mas por alguma limitação como distância, não pode fazer ao vivo. Sally e Somir discutem como tirar o melhor dessa situação merda. Os impopulares decidem se precisam ter uma conversa…

Tema de hoje: caso seja impossível um término ao vivo, qual a opção menos pior?

SOMIR

E-mail. Eu até acho que uma carta escrita de próprio punho seria algo mais humano, mas do jeito que os Correios andam, é capaz de você estar casado com três filhos antes da carta chegar. Apostemos então na forma mais instantânea de passar uma informação sem grandes confusões nesse cenário. Pode parecer frio, provavelmente é… mas, vamos pensar nisso com mais calma: você está terminando com a pessoa. Não é como se ela fosse ficar mais ou menos feliz com a forma como a notícia chegou do que pela notícia em si.

Quando você está numa situação difícil, faz muito bem estabelecer prioridades. E nesse caso específico, terminar o relacionamento está no topo da lista. Se você está mais preocupado em parecer bacana para a pessoa do que com terminar a relação, ou você não quer seguir em frente com o plano ou tem algo meio torto na sua cabeça pra começo de conversa. Não vamos perder o foco: o resultado desejado é terminar o namoro. O que por definição não é nem um pouco agradável para quem está levando o pé na bunda.

De forma alguma estou defendendo ser totalmente gelado com a outra pessoa (presumimos aqui que você não está terminando com raiva da pessoa), estou apenas dizendo que tentar arrumar a situação com métodos mais “humanos” é enxugar gelo. Não estamos arrumando nada aqui, estamos terminando um relacionamento. Foco!

Com a prioridade número um estabelecida, vamos para a segunda: se a pessoa serviu para um relacionamento até então (mesmo que à distância), isso significa que você gosta dela. Não o suficiente para manter uma relação que julga falida, mas o bastante para não ser propositalmente escroto com ela. Vamos para a segunda prioridade então: não causar mais sofrimento do que o estritamente necessário. E eu acredito firmemente que a melhor forma de reduzir o sofrimento nesses casos seja esclarecer as coisas e não gerar falsas esperanças. A tentação de confortar uma pessoa (mesmo que previamente) querida é forte, mas passar a mão na cabeça não costuma melhorar a situação de ninguém.

Por isso eu volto ao começo do texto e falo do meio de comunicação instantâneo menos provável de gerar confusões: o e-mail. Uma ligação com som ou vídeo gera muitas interrupções e momentos de fraqueza emocional dos dois lados. Sim, somos humanos, acontece… mas vai deixar a prioridade um e dois afundarem fácil assim? Vai ser uma conversa difícil, a outra pessoa pode reagir das mais diversas formas e te arrastar pra fora do foco, pode criar falsas esperanças com alguma “moleza” sua, ou mesmo pode fazer aquela coisa horrível de se recusar a terminar e te mandar pensar melhor naquilo. Pra que fazer alguém passar por essa situação horrível?

Claro que não estou advogando mandar um torpedo ou uma mensagem de WhatsApp, isso é escrotice porque rouba da pessoa a capacidade de entender o que diabos aconteceu. E parece que você está cagando solenemente para ela. Pela prioridade dois, de não causar sofrimento desnecessário, seria péssimo dar tão pouca atenção para ela nessa hora. Então, o meio termo ideal surge no e-mail: você pode se expressar livremente e colocar na mesa tudo o que se passou na sua cabeça nesse processo. Mande textão sem dó (mas textão mesmo, não essas merdas de achar que escreveu muito depois de dois parágrafos), esclareça tudo o que precisar, porque seu público-alvo vai ler tudo com atenção.

No e-mail, você controla a narrativa. Sugiro que comece forte, estabelecendo claramente o que vai acontecer. O aviso de término deve estar na primeira ou segunda frase, no máximo. Não é hora de criar suspense. Depois disso, é só estabelecer os motivos, tentar não bater na pessoa (ela não precisa disso nessa hora) e demonstrar firmemente que a decisão já foi tomada e não tem volta. Eu seria cauteloso com elogios ou com frases do tipo “eu sei que você vai encontrar alguém perfeito para você”, porque nessas horas isso só gera putez. Não queremos putez. Queremos que o choque desarme a maioria das minas que surgem no terreno e só fazer o gerenciamento de crise dali pra frente.

No texto, você diz o que quer e da forma como quer. Não pode ser interrompido ou chantageado emocionalmente. Porque embora tenha muita gente que simplesmente pega as coisas e vai embora quando ouve que não é mais querido, outras pessoas teimam e lutam. Principalmente se você for homem, é fácil tomar uma invertida de uma mulher quando ela está lutando com unhas e dentes por uma relação. O e-mail enfraquece esse tipo de comportamento, porque tira dela a vantagem do campo (o campo da fala, que elas dominam e muito). Dessa forma, você atinge o objetivo primário de terminar, porque fica documentado; e o secundário, pois não gera esperanças vazias na pessoa por alguma vacilada que você der em vídeo ou áudio (novamente, somos humanos, isso vai acontecer).

Pode ser que você receba uma ligação logo depois? Sim, é quase certeza. Mas aí o pior já aconteceu, você já falou o difícil e deixou bem estabelecido o que quer. Basta repetir e confirmar. Não tem como evitar o problema de estar terminando, mas dá para tirar um monte de armadilhas do caminho. Se você consegue expressar a informação certa, está fazendo um bem para ambos. Se você se embananar, causa mais sofrimento de ambos os lados.

A não ser que a sua prioridade seja fazer pose de atencioso e bacana enquanto chuta alguém fora da sua vida. Nesse grau de auto-enganação, não tem opinião ou plano que te ajude. Términos são ruins. Não adianta maquiar o porco, ainda vai feder. Faça rápido, faça limpo e não faça confusão. A única forma de acertar esses três pontos de uma só vez é o e-mail. A informação chega de uma só vez, bem explicada e sem espaço para discutir. Não é frieza, é racionalidade; é fazer o melhor para os dois com as ferramentas que você tem em mãos. Se não pode ser ao vivo, vai ser distante de qualquer forma…

Para me chamar de insensível, para dizer que receber esse e-mail vindo de mim é uma sorte, ou mesmo para dizer que sua prioridade é achar que tudo o que faz é bom para os outros: somir@desfavor.com

SALLY

Em não podendo ser ao vivo, como seria, por exemplo, no caso de um namoro à distância, qual a forma menos cretina de terminar um relacionamento?

Por telefone, gente. Uma conversa é o mínimo que você deve a uma pessoa com a qual você se relacionou. A menos que a pessoa seja surda, não tem outra resposta para esta pergunta.

A regra é clara: estamos falando, no mínimo, de um namoro, ou seja, um relacionamento que foi expressamente estabelecido pelas partes onde ambas empenharam tempo e energia em um projeto de futuro comum. Não estamos falando de um flertezinho, um passatempo ou uma brincadeira qualquer. Nesses casos, não vejo nem necessidade de conversa alguma para estabelecer um ponto final, comunica como quiser e segue o baile, faz quem quer, por mera cortesia.

Em um relacionamento onde se empenhou mais esforços, acredito que o fim deva se dar através de uma conversa. Em um mundo ideal, a preferência seria por uma conversa olho no olho, mas, na impossibilidade disso, a versão mais próxima de uma conversa onde ambos possam falar, expor seus sentimentos e perguntar é o telefone.

Um término de relacionamento é um evento desagradável e, às vezes, traumático. Ele demanda uma conversa. Uma conversa consiste em ambos falarem, interagindo em tempo real. Se uma pessoa tem dúvidas, ela pergunta e a outra responde. Se uma pessoa tem considerações, ela as expõe e a outra pessoa se posiciona sobre elas. Não se trata de convencer o outro a não terminar, se trata de compreender as razões desse término, para que as feridas cicatrizem o mais rápido possível, de forma saudável.

Um término onde apenas um fala me parece muito mais traumático e sem consideração. Você é mero expectador daquilo que deveria ser parte ativa. Você é obrigado a escutar tudo que o outro fala sem poder interagir. O outro está pegando um projeto conjunto e demolindo tudo unilateralmente sem sequer abrir a questão a debate. Novamente: não se trata de convencer ninguém a mudar de ideia, pois términos podem ser uma decisão unilateral, se trata de ajudar a parte que está mais fragilizada nesse processo, para que a ruptura aconteça da melhor forma possível.

A chave para superar uma questão é aceita-la. A melhor forma de encontrar aceitação, é a compreensão. Ninguém aqui é cachorro, para aceitar comando “porque sim”. Precisamos compreender o que está acontecendo para, só então, assimilar e trabalhar o processo de aceitação, de modo a seguir com nossas vidas. Um comunicado unilateral, sem interação, dificilmente vai fornecer ao outro todos os subsídios que ele precisa para compreender e elaborar essa perda. Só a pessoa que sofre o baque sabe o que ela precisa compreender e perguntar quando confrontada com uma notícia dessas.

É um momento horrível, desagradável, chato e constrangedor para ambos. É como lavar uma ferida: na hora dói muito, dá vontade de não mexer e deixar quietinho, mas se não lavar enquanto está aberta, pode infeccionar e aí vai ser muito pior. Acreditem, eu sei bem o quanto é horrível fazer isso, mas é melhor para todo mundo: peguem o maldito telefone e liguem, assim, quem sabe, pode sobrar uma amizade aí e no futuro vocês até escrevem um blog com o seu ex.

Qualquer outra forma onde apenas um fala e o outro tem que ficar refém, escutando calado o outro, é falta de consideração. É mais fácil? Porra, muito mais, tentador, eu diria. Mas também é burro. Logo na primeira frase por ter algum erro de julgamento, mal entendido ou qualquer outra situação que inutilize totalmente o resto que vai ser dito. Se fosse em uma conversa, a outra parte esclareceria na hora e um novo rumo de argumentação seria imediatamente estabelecido.

Eu entendo que quem não quer mais, não quer mais e não tem o que fazer. Mas é muito duro para o outro, escutar esse “não quero mais”. A pessoa terá questionamentos, dúvidas, perguntas, não para fazer mudar de ideia, mas para entender onde foi que a coisa falhou, até mesmo para ter ciência e não cometer os mesmos erros em uma futura relação. Término também é aprendizado, mesmo que o erro não seja só de um, e sim da dinâmica do casal. E sem um debate, uma conversa, fica muito difícil extrair um aprendizado, então, negando uma conversa, você nega à pessoa o que talvez seja o único lado bom do fim de um relacionamento.

Por mais que você não queria mais estar com aquela pessoa, acho impossível que não nutra ao menos um carinho ou consideração por ela. Não importa o que ela te fez, seu caráter deve ser independente e desvinculado do outro. Se o outro foi um escroto comigo, eu não vou me portar como uma escrota em resposta, pois eu não sou uma pessoa escrota e meus valores não estão condicionados ao mundo externo, estão dentro de mim. Seja superior e faça a coisa certa: termine com uma conversa, independente da babaquice que aconteceu.

Então, deixe de ser arrombado e passe por esse mau momento, para que as coisas seja mais fácies para quem está sofrendo o baque da sua decisão. A pessoa precisa entender, precisa poder perguntar, questionar, conversar sobre o assunto, dizer como está se sentindo, caso contrário o término será mais sofrido e doloroso. Tudo que a pessoa iria perguntar para você, ela ficará perguntando para si mesma, sem respostas. Independente do que a pessoa te fez, permita que ela possa conversar com você, expor o seu lado, dizer como se sente, caso contrário você estará fazendo um mal enorme a ela. Foda-se se te fizeram mal, isso não te autoriza a fazer mal aos outros.

Um relacionamento envolve e afeta duas pessoas, então, seu término tem que ser em uma dinâmica entre duas pessoas. Qualquer coisa diferente disso é uma falta de consideração desnecessária.

Para dizer que custa caro ligar para o exterior, para dizer que você está cagando para o que é certo e quer apenas o que é fácil ou ainda para dizer que quem topa relacionamento à distância tá tão fodido de cabeça que merece levar umas pancadas da vida para aprender a lição: sally@desfavor.com

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Comments (14)

  • E-mail realmente pela chance de elaborar a explicação sem interrupções. Assumindo que nada impeça uma ligação ou uma conversa pessoal depois. O tempo para o outro avaliar a situação e as próprias emoções deixa as coisas mais fáceis.

  • O mais próximo do ideal seria via skype ou, mais fácil ainda, por vídeo no celular, já que o whatsupp, dentre outros aplicativos, também traz essa possibilidade. E pode-se levar o tempo que for, pois a ligação terá custo zero se partir do wi-fi de casa ou de qualquer outro lugar que ofereça. Não tem desculpa.

    • Tem que ser permitido ao outro interagir, perguntar, compreender. Negar isso e se apropriar do término, discursando sozinho, é muito ruim.

  • “do jeito que os Correios andam, é capaz de você estar casado com três filhos antes da carta chegar…”

    Recebi uma carta de 2004 esses dias… então… não é impossível mesmo….

  • Concordo com a Sally. É o minimo, né?

    Esse papo de mandar e-mail porque mulher “dá invertida” é enrolação pra não ter que lidar com a situação!

    Aliás, taí um ótimo filtro pra saber se o par vale a pena (além de observar como ele/a trata a mãe e garçons): como foram os términos anteriores!

    • “Invertida”

      Olha, nem sei o que dizer. Melhor não dizer nada, não tenho mais 15 anos de idade…

      Sim, sempre observo como é a relação do homem com sua mãe, como ele trata prestadores de serviço e como foram os términos.

  • Acho fundamental terminar qualquer relação, mesmo uma paquera sem tanto envolvimento, deixar tudo combinado, esclarecido, sentenciado. Entretando, cada vez mais as pessoas estão agindo com silêncios e sumiços, deixando tudo no ar… Não entendo esses novos comportamentos das pessoas, até mesmo as mais velhas, mais sensatas estão agindo assim. As pessoas não querem mais ter trabalho algum, nem mesmo um telefonema, lamentável pra onde caminha a humanidade….

    • Deram o nome de Ghosting a isso, algo que existe desde que o mundo é mundo. O digno é deixar tudo às claras, mas hoje as pessoas preferem ou sumir ou manipular/aborrecer o outro para que o outro ponha um fim à relação.

  • Na época que não tinha zap, uma vez a mina terminou comigo por sms, nem respondi. Por escrito é de cair o cu da bunda, pq não dá nem chance de argumentação. Acho mó covardia!

    • Olha, nem sei se tem o que argumentar, pois se a pessoa não quer ficar com você, automaticamente, por amor próprio, você não tem que querer ficar com ela. Mas a pessoa tem o direito de querer entender melhor o que aconteceu, e isso só com uma conversa.

  • Quando eu estava quase querendo terminar, mandei uma mensagem via WhatsApp dizendo “não sei se nosso relacionamento tem futuro”. Para preparar o terreno. Ela me pressionou a ter certeza do que eu queria, disse que sempre fui assim, e aí ela terminou. Consegui o que eu queria e ainda, sem o ônus de culpa por tomar a iniciativa.
    :)

    • Me desculpa, mas achei sua atitude infantil, covarde e babaca. Você está comemorando ter manipulado uma pessoa. Acho digno de pena e, pode ter certeza, isso não gera coisas boas para você.

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