Corredor – Parte 3

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S0822 prende um dos braços na jaqueta de Marcos, e com o outro aponta sua arma fixamente para S9134, que reage guardando o revólver e mostrando as mãos em resignação. Um vento gelado começa a soprar dos confins do corredor.

VOZ: Melhor atirar logo.
S0822: Cala a boca.
VOZ: Não é assim que se fala com a única chance de salvar seu amigo…
S0822: O que eu faço?
VOZ: Venha. Escute a minha voz ficando cada vez mais alta… eu vou te guiar o caminho todo, 822. Se eu soubesse que você viria me visitar, teria preparado mais surpresas.

S0822 vai entrando na escuridão, que o engole de forma sobrenatural a partir de um certo ponto. As sombras vão se moldando ao redor de seu corpo como se fossem braços ansiosos. Os dois desaparecem em segundos. S9134 coloca as mãos na cabeça, coçando o couro cabeludo como se estivesse tentando massagear o cérebro em busca de alguma resposta.

Um bipe quebra o silêncio.

VOZ: Equipe zero, status?

A voz é diferente, metálica e sem posição aparente.

S9134: Oi? Tem alguém aí?
VOZ: Equipe zero, aqui é Unidade de Contenção doze. Status?
S9134: O S0822 entrou no corredor! Me tira daqui!
VOZ: Código de liberação?
S9134: Dois… Kilo… Oito… argh… eu esqueci…
VOZ: Repito, código de liberação?
S9134: Eu não consigo lembrar dessa merda! 2K8JS0… argh! Espera… 2K8JS0B?
VOZ: Aguarde.
S9134: Essa coisa vai vir me buscar! Me tira daqui, caralho!
VOZ: Liberação em progresso.
S9134: Vai logo!

S9134 corre em direção ao elevador, único acesso ao andar. As luzes de segurança acendem em vermelho ao seu redor. O som seco de metal se chocando com metal anuncia sua chegada. As portas se abrem exibindo quatro homens fortemente armados, todos usando máscaras de oxigênio e uniformes militares. Todos estão com fuzis armados e apontados para a saída. O segurança em pânico é a primeira coisa que veem.

SOLDADO: NO CHÃO! AGORA!

S9134 vacila por alguns segundos, o suficiente para ser derrubado por um dos dois soldados que disparam de dentro do elevador. O soldado radpidamente o vira, prendendo suas mãos por trás das costas e apertando seu rosto contra o chão. O segurança sente o metal do cano do fuzil em sua nuca.

S9134: Eu não estou armado! Calma! Calma!

O soldado faz uma revista rápida, mas logo vira S9134 com o rosto para cima novamente. Com uma pequena lanterna, ilumina seu rosto e procura por algo em seus olhos.

SOLDADO: Liberado.

Sem trocar mais uma palavra, os quatro avançam em direção à entrada do corredor. S9134 interpela pela liberação do elevador, mas é ignorado. Logos os militares prostram-se diante da última parte iluminada do caminho. O segurança aproxima-se novamente:

S9134: Eu tenho família, deixa eu sair.
SOLDADO: O protocolo F100 está em ação, o elevador já está desativado. Homens, temos trinta minutos. Sigam o treinamento. Todos com suas palavras de segurança memorizadas?

Os outros soldados confirmam com a cabeça.

S9134: Você é o líder deles, né? Você sabe o que tem lá dentro?
SOLDADO: É confidencial. Espere no saguão.
S9134: Vocês vão entrar?
SOLDADO: Em frente!

Os soldados correm em direção às sombras, que assim como antes, parecem ansiosas em abraçar novos visitantes, desobedecendo as leis da física em seus tentáculos negros.

S9134: NÃO! VOLTA!

Eles desaparecem. Silêncio. S9134 senta-se no chão, olhando profundamente para a escuridão. De tempos em tempos olha para trás, em busca de algum sinal de funcionamento do elevador. Ele olha para o relógio, passaram-se dez minutos. O frio retorna subitamente.

VOZ: S9134, você por aqui?

O segurança fecha os olhos e tapa os ouvidos.

VOZ: Você vai continuar me ouvindo normalmente.
S9134: O que é você?
VOZ: Vamos fazer o seguinte. Você me diz uma coisa, eu te digo outra. Qual o seu nome?
S9134: Eu já te disse demais.
VOZ: Sua filha? Aposto que você sempre conta isso, a batalha dela contra a doença… você adora ser consolado, não? Você me contou sobre isso antes de me dizer o seu nome.
S9134: Seu desgraçado!
VOZ: Você que sabe. Eu tenho todo o tempo do mundo. Você, nem tanto.
S9134: Como assim?
VOZ: Quem fez tudo isso não vai desistir sem uma última tentativa. Um dos soldados me contou sobre o protocolo F100. Em vinte minutos, eles vão explodir tudo isso aqui. Você já é uma casualidade para eles.
S9134: Esse prédio vale bilhões! Nunca que eles explodiriam, isso é um truque.
VOZ: Bom, vamos descobrir em… 19 minutos.

S9134 fica em silêncio. Ele vira as costas para o corredor, fecha os olhos e respira profundamente. O tempo passa.

VOZ: Dez… minutos. Minha proposta ainda está de pé. Você me conta uma coisa, eu te conto outra em troca. Talvez eu possa te salvar.
S9134: Eduardo.
VOZ: Prazer, Eduardo. O que você quer saber?
EDUARDO: Como eu saio daqui?
VOZ: Que desperdício… essa você já sabe. Pelo corredor.
EDUARDO: Não! Outro jeito!
VOZ: Você ficou aliviado quando ela finalmente morreu?
EDUARDO: O quê?
VOZ: A pequena Paula… já nasceu doente, pobre alma. Deve ter sido um sofrimento cuidar dela por sete anos.
EDUARDO: Para de falar dela, seu filho da puta!
VOZ: Você ficou aliviado?
EDUARDO: Porra…
VOZ: Temos um acordo.
EDUARDO: SIM! Fiquei! Eu via ela sofrendo todos os dias, eu não conseguia fazer mais nada… minha mulher… pronto! Disse!
VOZ: As lágrimas me dizem que você está sendo honesto. Sua vez.
EDUARDO: O que é você?
VOZ: Eu prefiro te mostrar do que te contar…
EDUARDO: Você tem que falar!
VOZ: Como preferir. Eu sou… eu sou um pai ressentido, como você.
EDUARDO: Hã?
VOZ: Eu só quero a minha criança de volta. Só isso.
EDUARDO: O que você está dizendo?
VOZ: Minha vez!
EDUARDO: Não, você não respondeu o que eu perguntei!
VOZ: Cinco minutos. Quer gastar mesmo esse tempo todo?
EDUARDO: Pergunta! Pergunta!
VOZ: Você ainda ama a sua mulher?
EDUARDO:
VOZ: Então?
EDUARDO: Não sei mais… é complicado. Ela ficou muito diferente… a nossa filha… é como se ela tivesse morrido junto. Eu não consigo mais ficar muito tempo perto dela.
VOZ: Acredito. Sua vez.
EDUARDO: O que aconteceu com quem entrou aí?
VOZ: Eles estão onde deveriam, sendo o que deveriam… dois minutos. Não quer vir para ver com os próprios olhos?

Eduardo começa a chorar.

VOZ: Um… minuto.

Eduardo dá o primeiro passo em direção à escuridão.

Continua…

Para dizer que isso está ficando cada vez mais bagunçado, para dizer que vai ser mais um projeto abandonado só que maior, ou mesmo para dizer que os fortes entendem tudo no penúltimo capítulo: somir@desfavor.com

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