Desde que o Tinder se tornou um sucesso, outros aplicativos de encontros tentaram a sorte no mercado. Os mais eficientes na competição foram justamente os que focaram num nicho, especialmente entre o público LGBT+. Um deles se chama HER, um Tinder para lésbicas. O app fez bastante sucesso até que suas usuárias começaram a notar uma certa dificuldade de encontrar… mulheres.

Dia após dia, suas interfaces começaram a ficar cheias de figuras com características cada vez mais masculinas. Autointituladas lésbicas com barbas por fazer, queixos largos e grandes pomos-de-adão. Transexuais que se identificavam como lésbicas começaram a ocupar cada vez mais espaço, arrastando para a direita com muito mais empolgação que o público original da plataforma.

As usuárias biologicamente mulheres que tinham o interesse em encontrar outras usuárias biologicamente mulheres resolveram então deixar avisado em seus perfis sua preferência, educadamente. O que a equipe do HER fez? Suspendeu e baniu essas mulheres por transfobia. A CEO até apareceu em um vídeo criticando quem estava excluindo mulheres trans das suas preferências: segundo ela, não existe só um jeito de ser lésbica. Atualmente o app mudou sua identidade para demonstrar que aceitam mais do que lésbicas.

O aplicativo vem sofrendo com a queda no número de usuárias desde então. A cada dia que passa, mais lésbicas biologicamente masculinas ocupam as suas páginas. A maioria das pessoas não vai começar um protesto, vai apenas se distanciar silenciosamente. Até porque parece especialmente problemático para uma pessoa da comunidade LGBT+ aparecer publicamente pedindo a exclusão de um público como o de transexuais.

As que discutem essa questão acabam automaticamente colocadas na categoria de TERFs (Feministas Radicais que Excluem Transexuais, numa tradução direta). A autora dos livros do Harry Potter, por exemplo, é considerada uma TERF. Mesmo com toda a lacração de transformar personagens em gays pós-escrita do livro, para o público mais progressista ela é um ser humano terrível e preconceituoso. Quando você vir protestos contra produtos baseados nos livros do Harry Potter, pode ter certeza de que são pessoas furiosas com a posição de J.K. Rowling sobre mulheres trans não serem mulheres de verdade.

E essa é uma discussão mais complexa que ativistas dos dois lados da cerca tentam fazer. Quem está lacrando à direita diz que mulher é apenas a versão biológica da coisa, quem está lacrando à esquerda diz que mulher é quem disser que é mulher. Ambos os casos nos levam a problemas. O lado de quem quer excluir é um pouco mais fácil de ser percebido como algo negativo: a maioria de nós sabe como ser excluído é doloroso. Somos seres sociais.

Mas existe um ponto cego até mesmo na visão das pessoas mais progressistas e focadas em justiça social: a falsa inclusão. Sim, em tese é positivo que as pessoas possam se identificar como quiserem, mas assim como não podemos deixar criança só comer doce o tempo todo, não podemos só achar que permissividade vai levar à felicidade.

Vou ser escroto, mas vou ser honesto: o quão bizarramente masculina precisa ser sua imagem para ser identificado imediatamente num aplicativo de encontros entre lésbicas? Muitas lésbicas adotam uma imagem mais masculinizada, é a identidade delas sem necessariamente quererem ser homens, mas algumas realmente podem gerar confusão na cabeça de um desavisado.

Não é como se num aplicativo para lésbicas as usuárias estivessem acostumadas com imagens clássicas de feminilidade o tempo todo. Nesse espectro da sexualidade humana, as coisas são mais fluidas mesmo. As pessoas sentem atração pelo que sentem. O problema das mulheres transexuais aparecendo no app é muito relacionado com aquele tipo de pessoa que faz um péssimo trabalho em demonstrar ser do sexo oposto.

Uma transexual extremamente convincente poderia até frustrar um pouco a lésbica média usando o aplicativo, mas seria um problema eventual. Quando sua tela fica lotada de seres que são obviamente homens de peruca (às vezes nem isso), é mais do que humano notar algo fora do lugar. Nossos cérebros trabalham com reconhecimento de padrões. Um cidadão de meia idade que tem o fetiche de se vestir de mulher não é a mesma coisa que uma mulher transexual que se esforça desde criança para ser mulher.

E é ridículo esperar que o ser humano médio ignore essa diferença. Homem que se veste de mulher por diversão ou por tara não é mulher trans, mas a cultura de normalização da transexualidade gerou essa área cinza. Tão cinza que esses homens, muitos deles heterossexuais, podem se chamar de lésbicas livremente e correr atrás de mulheres que se sentem atraídas sexualmente por mulheres.

Eu lembro que era uma piada: eu dizia que minha orientação sexual era lésbico como uma brincadeira. Mas pelo que muitas lésbicas estão encarando nos aplicativos de encontros hoje em dia, a piada virou realidade. Tem cidadão que realmente passa um batom na boca, cria perfil e tenta se relacionar com lésbicas na internet.

Existe uma linha sim. Não precisa ser uma linha de ódio, mas uma linha de razoabilidade. Assim como é cretino eu brincar que me identifico como mulher para dar em cima de uma mulher que me disse sem sombra de dúvidas que é lésbica, é cretino fazer isso no aplicativo. A diferença básica é que eu posso ser acusado de ser um cretino e ser ignorado depois.

Só que quando a política de inclusividade tolera o fetichista, o golpista e o iludido como representações fiéis do que é ser mulher, cria algo que faz mal para tudo mundo. Lembrando que não é a maioria das lésbicas que vai colocar a cabeça a prêmio batendo naqueles que distorcem o significado de transexualidade como apenas uma roupa que se veste, são pessoas que temem ser canceladas, até porque raramente encontram porto seguro entre grupos que não compartilham dessa insanidade de inclusão a qualquer custo.

Estão presas dentro de um grupo social que vai taxá-las de transfóbicas, mesmo que estejam apenas excluindo homens óbvios. E esse preço pode ser caro demais para pagar. Espero que a maioria dessas mulheres não se sinta obrigada a se relacionar com homens de peruca, mas é uma forma de tortura psicológica também estar vendo uma coisa claramente diante de si e não poder falar.

Infelizmente nem todo mundo bate bem da cabeça. Transição de gênero não é uma doença mental, mas pode ser o sintoma de uma. Claro que pode. Somos todos humanos. Quando você vê um cidadão que do nada começa a colocar maquiagem e usar roupas de mulher para complementar a careca e a barba malfeita, é humanidade se preocupar com o que está acontecendo naquela cabeça.

Eu raramente falo de transexuais esforçadas nesses textos porque mesmo que não sejam indiferenciáveis de uma mulher biológica, todo mundo consegue ver a energia e o tempo colocados naquela transição. Não é curioso que a reação forte contra transexuais começou justamente quando a ideia de popularizou e começaram a aparecer muitos desses homens de peruca? Transexual que passa por mulher numa boa só incomoda gente muito fanática, e olhe lá, considerando quanto pai de família aparentemente tradicional vai buscar diversão nas ruas onde elas oferecem programas.

O problema fundamental da aceitação de transexuais estava num caminho bom até a epidemia de homens de peruca. Essa gente – que como eu disse antes, podem ser pessoas mal-intencionadas ou com problemas mentais que as impedem de ver o papel ridículo que estão prestando – é o problema mais grave rumo à aceitação plena na sociedade.

Repito: uma lésbica num aplicativo só para lésbicas sentiu que você era masculino demais para ser atraente. Algo deu muito errado. O público mais aberto para mulheres com características masculinas se sentiu sacaneado com sua cara de homem maquiada. Não é inclusividade proteger essa gente sem noção, é recompensar comportamento insano e/ou predatório.

Alguém que está visualmente “brincando” de ser mulher, mas se comunica como se fosse algo muito real está claramente fazendo algo errado. Errado para a comunidade, errado para si. Voltando à analogia da criança com os doces: ela vai ficar feliz se você deixar ela só comer doces, mas vai ficar doente depois. Se um juiz ficar sabendo disso, você pode perder a guarda.

A sociedade presume sistemas de controle para gente que está perdendo a linha e se colocando em situações perigosas. Não é a transexual que deixa os homens ao seu redor confusos sobre a própria sexualidade que está entrando em depressão e considerando suicídio, é o homem de peruca dos países mais ricos. Essa onda ainda não chegou com toda força no Brasil, mas é questão de tempo. Vamos começar a ver mais e mais homens perdendo as estribeiras e se tornando transexuais bizarros que todo mundo vai perceber como bizarros.

Uma parta da sociedade vai bater neles pelos motivos errados de fanatismo religioso, outra vai defendê-los por achar que é única coisa certa a se fazer. E eles vão continuar se afundando em problemas mentais e distorção sobre seus fetiches, confiantes que são mulheres e que todas as críticas são transfobia. E aí, começam a se descobrir como lésbicas…

Eu acho que o mundo só vai vencer esse tipo de problema quando a maioria das pessoas forem bissexuais e pararem de se sentir presas em papéis sexuais definidos. Sim, parece que estou jogando fora todo o meu argumento “conservador”, mas se você achou que eu estava sendo conservador, não estava prestando atenção no cerne da questão.

Não é sobre querer que homens sejam de um jeito e mulheres de outro, é sobre parar de se enganar que você tem que entrar em uma categoria e viver sua vida ancorada nessa identidade sexual. O ser humano médio mal entendeu ainda que mulheres podem sair de casa, somos programados para tentar colocar nossas ideias e ações dentro de alguns padrões sexuais ancestrais.

É muito improvável que seu cérebro já esteja nessa etapa da evolução social humana. Eu acho que nem as pessoas que se identificam como homem e mulher ao mesmo tempo tem realmente a base necessária para lidar com a realidade desse jeito. Essa coisa indefinida que muita gente tenta empurrar como a visão correta das coisas em 2023 é algo que só tem cara de funcionar de verdade em 2123.

Enquanto você estiver vendo um homem de peruca, provavelmente é um homem de peruca. Nos tempos atuais, é muito mais lógico que seja uma pessoa ignorando a própria realidade por fetiche ou problemas mentais do que essa mítica figura totalmente descolada de papéis sexuais que a lacração quer que exista. Eu até imagino que essas pessoas vão existir de verdade no futuro, especialmente num contexto de realidade virtual sem compromisso constante com a imagem do próprio corpo, mas atualmente? Não. Ainda não estamos nesse ponto.

E aceitação sem limites acaba sendo ignorar a realidade e bater palma para maluco dançar. A maior parte da população mundial ainda mal tem onde defecar com segurança… estamos superestimando demais nosso estágio evolutivo.

Para dizer que eu sou TERF, para dizer que homem de peruca tem interessado também, ou mesmo para dizer que o meu atraso é só meu e você é um ser especial do futuro: somir@desfavor.com

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Comments (20)

  • Lembrei do caso da UNB onde o ser (claramente um homem de vestido) dá um piti pq foi chamado de “cara”, depois ainda teve protesto contra Transfobia no campus. Essas pessoas socializam como homens, usam de violência como homens e é sempre contra mulheres.

  • Disforia de gênero é uma das condições que banalizou DEMAIS nesse início de século. O que mais tem é autodiagnóstico e contágio social envolvido. Lembram quando todo mundo dizia que tinha intolerância ao glúten porque dava uma inchada depois de comer meia pizza com cerveja às nove da noite? Ou geral dizendo que o filho tem TEA pra não ter que botar limites nas crianças?

    Depois que eu vi uma estatística de que até 95% das “pessoas trans” não tem problemas quanto aos órgãos genitais (OU SEJA, NÃO SÃO TRANSSEXUAIS), eu desisti de tentar encontrar racionalidade nesse grupo. Subi no bonde TERF pra nunca mais descer. Como disse o Somir, a imensa maioria das pessoas tá nem aí para trans no cotidiano. Eu vejo travesti no banheiro feminino desde que me entendo por gente e NUNCA me senti desconfortável ou ameaçada na minha integridade. Agora, se eu tiver que dividir um banheiro de shopping depois da meia-noite com um sujeito de barba e vestido, prefiro entrar no masculino com o meu marido ou pedir pro segurança ficar na porta, porque não consigo acreditar em boas intenções numa figura dessas. Se isso é ser TERF, paciência.

  • No Brasil já temos um caso bizarro, o Laerte, que ficou bilutetéia das idéias depois que o filho dele morreu e resolveu virar uma véia, que é referido como mulher em todos os ambientes, e ai de quem ousar dizer que o rei está nu.

    Enfim, não sei quem, não sei por quê, mas estão validando esses malucos, que muitas vezes tem algum nível de autismo e passam a acreditar que se declarar mulheres vão ser protegidos e aplaudidos pela sociedade. O resultado é esse bando de maluco que no máximo bota roupa de mulher e uma peruca e exige que todo mundo em volta aja como se eles fossem indistinguíveis de mulheres de verdade. E o pior é que você pode sofrer sanções em ambientes online se não elogiar a roupa do rei.

    • Faz sentido. Uma característica do autismo é hiperfoco ou obsessão por algum tema. A Greta Thunberg, por exemplo, é focada em ambientalismo. Outros autistas são focados em programação, matemática, música e outras coisas.
      menos em procurar emprego
      Talvez alguns casos sejam autistas hiperfocados no tema sexualidade. E também explicaria por que essas pessoas são tão difíceis de lidar, parecem não ter o mínimo de capacidade de socialização.

    • Era Cross Dresser (CD – não confundir com Berin CD). Ou seja, um cara, hétero, que curtia se vestir de mulher.

      A palhaçada que começaram a destilar sobre a sexualidade dele mostra que tem tempo que só querem inventar novos nomes de farofas pra coisas que já tem a tempos.

      • Essas ressignificações são com vistas a tentar mitigar o peso do estigma, só que essa gente falha miseravelmente e pior, acaba criando problemas por conta de seu narcisismo alavancado pela era das redes “sociais”.

    • Dão validação pra essa onda porque isso entrou no hype, sendo que o Junk Info dá bem mais relevância para questões assim do que no passado. Um efeito nefasto do “lazy journalism”.

  • Eu super entendo lesbicas não curtirem mulher com layout masculino. Eu sou gay, não sou efeminado e gosto de homem com aparência masculina. Se eu curtisse homem que se confunde com mulher eu pegava logo uma mulher.

  • Mesmo que todo mundo vire pansexual e nasça sem gênero definido no futuro… Quanto mais se forçar as pessoas a algo, mais vai ter recalque.

    Se eu fosse as trans, começaria a levar bem a sério a ameaça dos “homens de peruca”. Inclusive, hoje as mulheres cis que são alvo desses caras, mas amanhã o jogo pode mudar.

    E por essas e outras que assexualidade (e seus espectros) é um privilégio. Ninguém nem mesmo da turminha do lacre pode te forçar a dormir com ninguém… Ainda.

  • Contraponto: Não acho que essa moda pega no Brasil e outros países pobres, porque a vida social em países pobres é muito melhor do que em países ricos. E isso até explicaria os resultados daquelas polêmicas pesquisas sobre índice de felicidade. Dizem que quem é muito fodido mal tem cabeça pra pensar em ser preconceituoso ou infeliz, mas acho que também tem outros fatores…

    Pobres são menos materialistas, trabalham só pra pagar o essencial, então possuem mais tempo pra aproveitar a vida. Em países ricos as pessoas gastam boa parte da vida se matando de trabalhar pra comprar coisas, depois passam o tempo comprando, organizando e consertando essas coisas. Além disso, há diferenças nas normas sociais. Por exemplo, em alguns países ricos é impensável visitar alguém sem avisar antes, fazer small talk com desconhecidos no ônibus, dizer tudo o que está sentindo ou pensando. Pobres não têm essas normas, esses joguinhos sociais. Somando com as religiões e seus vários eventos, reuniões etc. tudo isso faz as pessoas de países pobres desenvolverem laços sociais mais facilmente.

    PS.: mesmo assim eu preferia mil vezes morar na Suécia ou na Alemanha do que no Brasil, pela questão da segurança e dos serviços decentes. Não existe lugar perfeito…

    • Mas hein?

      Olha… Se me dissesse que muito países desenvolvidos tem aquela “ingenuidade de quem nasceu em berço de ouro” sobre as mazelas de países mais pobres e o preconceito de imigrantes religiosos, ok (vide o que ainda acontece da França e Itália pra cima). Mas essa aí é nova.

    • Então seu ponto é: apesar dos preconceitos, os trans brasileiros são mais acolhidos e socializados, devido à cultura super socializada, do que trans gringos em seus respectivos países, pois a cultura lá é mais “fria”?

  • Lembrei de uma colega de faculdade que se diz em um relacionamento “lésbico” com uma “mulher trans” e recentemente teve um bebê. Quer dizer, no fim das contas é só um casal heterossexual comum mas que precisa se sentir muito especial rs

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